sexta-feira, 28 de setembro de 2007

UMA ALFINETADA (3)


Antecipo aqui o que sairá amanhã lá n'O ALFINETE, de Pirajuí.

WAL MART, A EMPRESA QUE ODEIA OS SINDICATOS

Dia desses retornei com amigos ao templo do consumismo, o Wal Mart, que possui loja aqui em Bauru. Fui contrariado e explico os motivos de não gostar do tão "conceituado mega-híper-ícone, representante do desenfreado neoliberalismo globalizado". Não pensem que não gosto de mercados novos, modernos. Aliás, adoro, conforto é comigo mesmo. Só não gosto de freqüentar aqueles que desrespeitam as mais elementares leis trabalhistas, tratando seus funcionários sob o regime do medo. Como ainda tenho livre arbítrio para gastar o que ganho onde melhor me aprouver, decido ir lá só em último caso.

A empresa de supermercados Wal Mart foi denunciada nos EUA pela organização de direitos humanos Human Rights, pela sua política corporativa de não permitir que seus funcionários sejam sindicalizados. Nos EUA, eles são o principal empregador privado do país, com 1.900.000 empregados. É uma potência mundial em todos os sentidos, sendo o principal deles a insensibilidade. Cada loja, dentre as tantas espalhadas pelo planeta, empregam muitas pessoas, em sua maioria jovens, com modalidade de contratação diversa: contratados diretamente, terceirizados e através de agências.

A investigação da Human Rights constatou que nenhum dos trabalhadores do Wal Mart é sindicalizado. No Brasil, são quase 300 lojas e nenhum sindicalizado. Essa é a regra geral e a desobediência tem como resultado a não contratação ou demissão imediata. Não se trata de algo fortuito. Os gerentes recebem instruções explícitas sobre como evitar a formação de sindicalizados. Tudo nas lojas é monitorado e qualquer movimentação suspeita é alvo de vigilância. Eles fazem qualquer coisa para se manterem livres de sindicatos e funcionários mais conscientes, daquele tipo que sabe reivindicar e cobrar os seus direitos.

A situação é similar, lá nos EUA, aqui no Brasil, na Argentina, no México e em qualquer outro canto. O Wal Mart, como tantas outras empresas desse globalizado mundo, vive os efeitos de um verdadeiro terrorismo de Estado e a debilidade dos trabalhadores. Os salários são baixos, condições precárias, trabalhadores jovens sem experiência e sem conhecimento de atividades sindicais ou políticas de qualquer tipo. Verdadeiros escravos do mundo moderno, sempre de bocas fechadas.

A forma adotada é um verdadeiro desterro das autoridades e das leis locais. O trabalhador modelo da rede é aquele totalmente despojado de uma percepção do mundo como campo de forças, capaz de entregar-se de corpo e alma, de forma reiterada à metáfora empresarial da "grande família". O passado do futuro contratado é investigado, suas formas de pensar e conceber as relações, sua opinião sobre a empresa. Em caso de qualquer dúvida, descarta-se a contratação, afinal, a mão de obra é abundante.

É utilizada uma tal de política de "portas abertas", onde os funcionários tendo algum tipo de problema não podem se dirigir diretamente a seu superior imediato, tendo de fazê-lo a gerência de Recursos Humanos. Experimente perguntar a qualquer funcionário se há delegados sindicais por lá. A resposta é que não precisam, pois a empresa adota a política de portas abertas. É claro que para que isso prospere é necessário ter a cumplicidade entre o sindicato e a empresa. A lei é a do medo.

Por todos os lugares onde existe uma loja do Wal Mart, essa é a informação que corre de boca em boca: por lá ninguém é sindicalizado. Isso é um grande retrocesso. O funcionário não possui nenhuma proteção, não tendo a quem recorrer. Acaba por se submeter, sempre calado, passivo. É a necessidade do emprego. Tente falar sobre isso com alguém por lá e verá a reação de receio. Discutir esse tema em qualquer cidade onde funcione uma loja Wal Mart é coisa para louco, pois afinal, eles dão empregos e em grandes quantidades. Ninguém mais quer discutir a que custo isso é feito. Por essas e outras é que continuo gastando o meu rico dinheirinho no mercadinho do seu Zé Mane ali na esquina.

Henrique Perazzi de Aquino, 47 anos e cada vez mais confuso com o mundo high-tech, pois acabo de teclar minha senha bancária no microondas. Tenho salvação?

Em tempo: a foto saiu publicada no jornal argentino Página 12, numa de suas edições de março 2007.

UMA FRASE (2)

ACHTUNG

“Quando você conhecer uma pessoa e sentir súbita e extrema admiração, não aja intempestivamente. Colha informações de amigos que bebam melhor do que você, espere mais cento e trinta e cinco dias, acrescente sua idade, faça um negócio importante com a dita pessoa e só então dê queixa no distrito policial mais próximo”.

Millôr Fernandes, em 1981 (hoje, aos 83 anos, permanece como um dos mais finos pensadores brasileiros, mesmo escrevendo semanalmente na mais indefectível revista semanal brasileira, a Veja).

Só mais uma dele para adocicar essa sexta-feira que promete:

"Sou um crente porque creio na descrença".

quarta-feira, 26 de setembro de 2007


MEMÓRIA ORAL Nº 3


O FUTEBOL DAS GATAS QUE AZARAM
O time de futebol feminino, até ontem na cabeça de Rosemeire Maria Martins, ou simplesmente Rose, 34 anos, uma aguçada líder comunitária, adentrou o campo no último domingo de forma bastante positiva, dando o pontapé inicial a um velho e acalentado sonho. O bairro onde reside essa militante política, sindical e umbandista, o jardim Mendonça é nas profundezas da periferia de Bauru SP, passando por todos os problemas de uma comunidade distante dos centros e, consequentemente, das benesses de uma cidade com aproximadamente 350.000 habitantes. Problemas são o que não faltam por lá e Rose continua a seu modo tentando resolver a grande maioria deles. Inquieta por natureza ia vendo aquele amontoado de meninas desgarradas, fruto de famílias desestruturadas, mal constituídas, todas sem rumo na vida e sabia que algo precisava ser feito para tirá-las da marginalidade. Uma tentativa que fosse para devolver a dignidade para a maioria delas.
Foi quando tomou conhecimento que a Liga Bauruense de Futebol Amador estava organizando o I Campeonato de Futebol Feminino, com inscrições abertas para os times interessados na disputa. O click foi dado e mesmo sem nenhum recurso disponível a decisão foi tomada: “Não conhecia nada de futebol, mas algo precisava ser feito para elas, que viviam sob o fio da navalha. Meti os peitos e o resultado é esse aí. Fiz tudo, não para levar nome, mas para ajudar, trazendo mais esporte para o bairro e na valorização delas”. O tal resultado foi que, aos trancos e barrancos, os recursos mínimos foram levantados e o time abriu a 1ª rodada com uma sonora goleada sobre o time do jardim Ouro Verde, demonstrando que Rose estava certa em acreditar no potencial de cada uma daquelas meninas.

O trabalho das últimas semanas havia sito intenso. Junto do marido e massagista do time, Alcides Chamorro e a sobrinha, zagueira e vice-presidenta, Ricieri Alexandre, 21 anos, uniram esforços e tiraram leite de pedra. Realizaram uma verdadeira revoada coletiva aos comerciantes do bairro para conseguir uniformes, chuteiras, pagamento das inscrições e outras despesas. “Eu sempre acreditei. Consegui levar um patrocinador num treino e ele não assumiu nada. Pediu para ver os resultados dos três primeiros jogos para depois decidir. Uma empresa de ônibus urbano acabou doando um jogo de camisas.Um político, mal adentrei sua sala, falei que havíamos montado um time feminino, não havia pedido nada e ele foi logo dizendo que havia esquecido a carteira em casa”, desabafa a presidente Rose. O nome escolhido para o time foi Gallathazaray F.M. de Bauru e perguntei dos motivos do time turco ter tido a preferência. Rose disse que a decisão foi coletiva, onde muitas opinaram: “O começo lembra gatas, que somos nós mesmas e o final a palavra azarar. Ficou sendo as gatas que azaram, dominam a noite, muito paqueradas e chamando a atenção”.

Entre risos ela lembra também que sua vida sempre foi muito dura e que nem por isso deixou de realizar o que tinha em mente: “A luta no bairro sempre fiz sem dinheiro. As pessoas acreditam no que faço, porque faço. Sempre acaba dando tudo certo. Tem dia que não tinha dinheiro para o ônibus, mas quando via a situação delas, abandonadas, se perdendo na vida, sem rumo, decidi que faria algo. E fiz”. Com muita conversa, num verdadeiro trabalho psicológico, uma por uma, foi conseguindo uni-las em torno do objetivo comum. Quem não parece ter entendido muito bem o espírito da coisa foram às respectivas famílias das agora atletas, pois quase nenhuma participou do processo, não acreditando na recuperação delas dessa forma. O sonho, mesmo assim, se tornou realidade e a estréia foi a consumação da primeira etapa.
Vendo elas chegarem ao campo em três carros superlotados e outras a pé, dá para perceber o quão está sendo importante isso tudo. O time oponente, de outro bairro periférico, o Ouro Verde possui melhor estrutura, enche o alambrado com faixas de patrocinadores e possuem seis garotas no banco de reservas. O Gallathazaray são as onze que estão em campo, massagista, a técnica Juliana Pedrotti, a presidente Rose e uns quinze torcedores. Ninguém pode se machucar, pelo menos por enquanto, mas isso não tira o entusiasmo de ninguém. “Não adianta desgastar todas elas agora”, tenta justificar Rose.

Depois de um rápido aquecimento, entram em campo com um juiz homem e duas bandeirinhas mulheres, vestidas com camisas cor-de-rosa. Mal o jogo começa, Rose não se segura de contentamento, pois o time corresponde em campo a todas suas expectativas. O Ouro Verde não consegue passar do meio de campo, não tem padrão de jogo e o primeiro gol sai logo, com Denise, a nº 7, também conhecida por Periquito, por causa do topete no alto da cabeleira. Outros gols foram saindo naturalmente e no final do 1º tempo até a goleira Angélica, que não havia recebido um chute a gol, faz o seu de pênalti.

O time posa para uma foto no intervalo e Rose não para de exaltar o bem que estava proporcionando a elas: “Converso com todas, são crianças, ajudo no psicológico. Se todas as associações fizessem o que estou fazendo, tiraríamos muita gente da marginalidade. Elas estavam largadas, na perdição. Eu falo e elas captam tudo, uma beleza. A média de idade é dos 12 aos 22 anos e algumas já estiveram internadas na Casa de Nazaré, se recuperando de problemas, inclusive drogas. Os pais de muitas saíram de casa e elas não se identificam muito com os homens. Outras já tiveram experiência com futebol, num time da vizinha cidade de Agudos. Eu as compreendo.” Rose chama na beira do alambrado Jéssica, 15 anos, que todos apelidaram de Modelo, pois vive a desfilar. Pede que pergunte a ela o motivo de não estar em campo: “Meus pais viajaram e na volta ainda tive que dar uma convencida para me assinarem a ficha”. Não dá tempo para entrar em detalhes, pois o segundo tempo começa logo a seguir.

O martírio do Ouro Verde continua, só mudando o lado. Vivendo de chutões para os lados, sua melhor jogadora é a goleira, muito exigida. O massacre continua, sem trégua e Rose, eufórica, parece querer por para fora algumas coisas que estavam um tanto entaladas: “Rasguei cartão de dois políticos que queriam tirar proveito do time. Não posso expor elas agora. Muitas não entendem isso. São frágeis até nisso. Descarto aproveitadores, elas não merecem. Prefiro ajuda da cidade. A camisa da goleira veio nº P e não serviu. Emprestei de um conhecido. Tudo foi assim. Fui nas reuniões da Liga e dos doze times, só o meu tinha presidente mulher. Impus-me, como faço aqui com elas. Tenho muitos outros planos. Queria poder dar uma cesta básica para as que não faltam aos treinos, não falam palavrões e deixarem de criar problemas em casa. Elas já possuem um monte de problemas e quando não os resolvem, passam a render menos em campo”. Ela fala mais, muito mais e enquanto isso o time faz mais três gols.

Um torcedor do time adversário, bêbado, se aproxima do alambrado e diante do time masculino, que atuaria no jogo de fundo, desfere: “Vejam bem o que essas meninas estão fazendo, para ver o que farão depois”. Aproveito para dar uma geral nos torcedores e não vejo nenhuma família acompanhando o jogo delas. O envolvimento familiar e o calor humano, que faltam do lado de fora, existem do lado de dentro. O jogo termina em 7 x 0 e todas se abraçam alegremente no meio de campo, oram e abraçam a Rose de forma bastante calorosa. Só não a jogam para cima, por ser um tanto pesada. A festa é grande e as comemorações ocorrem ao lado do vestuário, somente com água e nada mais.

O grupo está de alma lavada. O primeiro passo havia sido dado. Todas sabem que isso é apenas o começo. Na segunda-feira recomeçará a luta para colocar o time em campo no segundo jogo, juntando os R$ 40 reais da taxa de arbitragem, outro jogo de camisas, mais chuteiras, gazes, medicamentos, novos patrocinadores e no convencimento junto às famílias, de que o caminho da recuperação é esse. Uma pastelada e outros eventos estão nos planos. Tendo no cartel os 7x0, elas acreditam que a missão será menos desgastante. Além disso, os dois jornais locais lá estiveram e devem falar do que viram. Ansiosas aguardam mais meninas se juntarem ao grupo e mais recursos no caixa.

Ao vê-las lotando os carros para o retorno ao jardim Mendonça, a certeza de que Rose acertou e a de que o futebol feminino é mesmo uma grande festa, pelo menos por enquanto e de encher os olhos. Se não existe muita técnica, sobra dedicação e muitos sonhos. Rose provou que não espera as coisas caírem do céu, arregaça as mangas e vai à luta, mesmo sem a mínima condição. Faz e pronto. Sabe que precisa fazer, tira a bunda da cadeira e faz. A lição é essa, fazer. Elas todas entenderam a lição e venceram a primeira batalha. Domingo que vem tem mais.

Serviço:
Telefones: Rose 14.97995206 / Ricieri 14.97028619
Endereço Rose: Av. Rosa Malandrino Mondelli nº 15-11 Jd. Mendonça Bauru SP


Henrique Perazzi de Aquino, 24 de setembro de 2007

domingo, 23 de setembro de 2007

UMA ALFINETADA (2)

Publiquei esse texto no Alfinete, lá de Pirajuí no final de Julho 2007 e saiu comentário até no Bom Dia aqui de Bauru. Continuo (continuarei...) pensando e agindo da mesma forma. E nem por isso mudei um tiquinho de minhas convicções.

ESTÁ TUDO CONFUSO E EU MESMO JÁ NÃO ME SINTO MUITO BEM
Tem semana em que a escrita fica curta, os temas embaralham-se dentro da cabeça e fico em dúvida sobre o que devo colocar no papel e repassar para os leitores d'O ALFINETE (ó dúvida cruel, ser ou não ser, eis a questão). Sou daqueles que não sai das ruas e o meu coração vira um buraco quando vejo crianças dormindo ao relento, com os pés para fora de uma suja coberta, espichada para dois ou três. E cada vez que tento lhes dar alguma coisa para comer, sou criticado pela grande maioria das pessoas, que diz ser minha a culpa desses "assassinos" não fazerem nada. "Quisera eu ter a vida maravilhosa desses garotos, de só comer e dormir...", comentam. Afinal, quem come e dorme? Quem tem uma vida de dar inveja? Quem são os assassinos? Estou cada vez menos entendendo certas coisas.

Tenho que confessar minha desorientação (perdi minha bússola) e desilusão também em matéria de política. Ando sem paciência com o caso Renan. Aqui por Bauru vivo algo sui-generis para mim. Apoio um provável candidato a prefeito, lançado por um partido que sempre repugnei, o hoje DEM, ontem PFL, ARENA, UDN... Porém, apoio ele sem qualquer constrangimento, pois sei que ele é o que de melhor teremos para as próximas eleições, o conheço, tem comprovada qualificação pública, é honesto, trabalhador e ético. Eu, que continuo de esquerda, votarei num candidato de um partido de direita. E o farei sem traumas, pois todos nossos partidos são muito parecidos hoje em dia. O diferencial são as pessoas e o meu candidato faz a diferença. Não dá para citar um só partido que não está um verdadeiro balaio de gatos. Não escapa nenhum.

Chego à conclusão de que não existem mais os partidos. Não existe o PT (ai que saudade). Não existe o DEM, nem o PSB (socialistas, aonde?). Não existe o PSDB (Aldir Blanc diz que são galinhas travestidas de tucanos). Não há, nem remotamente, resquícios do velho PMDB. O PDT (volta Brizola) e o PPS (cadê os comunas?) não existem. O velho e bom Partidão não é nem sombra do que foi no passado. Existe sim, uma casta em todas essas siglas, que vivem aferradas às "oportunidades" e ao dinheiro, enquanto a grande maioria dos brasileiros passa fome, ralam durante o dia todo e se matam nas ruas. Diante de tudo isso eu pouco me lixo para as siglas existentes. Continuarei votando e escolhendo meus candidatos, onde eles estiverem. Afinal, todos são parecidos uns com os outros. Não vejo diferença nenhuma entre Zé Dirceu e Renan, Duda Mendonça e Roriz, Alckmin e Marcos Valério, José Genoíno e Arthur Virgílio.

Lutarei até a morte pela minha utopia, mas me cansei de defender uma sigla e os aproveitadores encastelados nela. Hoje defendo nomes. Todos fomos enganados e estou cansado de fazer papel de otário. Faço uma lista de gente boa e gente muito ruim e má em cada sigla partidária. E voto naqueles em que acredito, pela trajetória individual, que transcende os partidos. Não nego que continuo vomitando muito com tudo o que presencio, mas não desisto. Esse o motivo por ter escolhido votar em pessoas e não em siglas. Elas caíram no descrédito. Vou parando por aqui, pois a ambulância já está no meu portão, com a sirene ligada. Sigo daqui para a UTI, provavelmente sem vagas.

Henrique Perazzi de Aquino, 47 anos, querendo comprovar que as siglas partidárias brasileiras não suportam um leve empurrão. Desmoronam feito obra do metrô em Sampa.
Obs.: a ilustração lá de cima é do Luiz Gê e saiu publicada no seu livro "Mocambúzios e Sorumbáticos", caindo como uma luva para esse meu texto. Apliquei um delicado Gilete Press, porém, com citação da fonte de origem.
UM AMIGO DO PEITO
DUKA É DO CACETE

Duílio Duka é o meu irmão de fé, camarada em todos os momentos possíveis e imagináveis. Num mundo onde cada vez mais nos distanciamos das pessoas, ter pelo menos uma amizade sincera e desinteressada é um grande alento. Para mim, essa pessoa é o velho Duka, 55 anos de muita resistência e persistência na busca dos seus ideais.

Professor de História, líder sindical, poeta, escritor, militante do movimento negro, deserdado do PT, especialista na confecção de projetos, pai de 3 filhos e uma filha, eterno quebrado financeiramente, devorador de Paulo Freire e Milton Santos, além de boa praça e consultor sentimental nas horas vagas. Vive aqui em Bauru, sempre com a cabeça fervilhando de novas e mirabolantes idéias. Sobrevive dando suas aulas e trabalhando na confecção de projetos na Secretaria de Educação do município. Divide seu tempo com outras tantas atividades, dentre elas a de presidente na atual gestão do Conselho Municipal da Comunidade Negra de Bauru.

Uma pessoa meio que intocável. Enquanto um desafeto adora me espezinhar, tentando me provocar vorazmente, simplesmente pelo fato de atuar no serviço público, na única administração onde poderia exercer algum cargo, Duka segue incólume, pois ninguém tem coragem suficiente para algo eu o deprecie, onde certamente mereceria o repúdio de todos. Quem não se lembra de recente crônica do Zarcillo, num JC de domingo, quando relembrava a cacetada que ele havia levado na cabeça? Foi tudo na defesa das liberdades democráticas, bem ali defronte nossa Câmara Municipal, resultando em vários pontos no cocuruto, para sempre marcado. Zarcillo diz ser Duka merecedor de uma placa no local, pois ali havia jorrado sangue, num intenso momento de lutas populares.

Não dá para falar mal de uma pessoa dessas, nem que queiram, pois sua ficha é das mais limpas do pedaço. Deve, como a grande maioria do povo brasileiro, mas isso faz parte desse mundo capitalista, que nos oferece tudo, sem propiciar os meios suficientes para quitarmos nossas pendengas. Até suas 4 ex-mulheres convivem maravilhosamente com ele. Não deve ser santo, pois isso deve ser chato paca, mas passa ao largo de críticas. Quem quiser saber mais dele, basta clicar o seu nome no Cadê, lá na internet e terão uma bela surpresa. O cara é universal. Além do mais é um intelectual da espécie aguerrida. Desses que não podemos deixar de prescindir.

Aqui no meu mafuá tenho uma foto dele ao meu lado, ambos com um nariz de palhaço, numa antiga e conturbada sessão da câmara de vereadores. Em outra, ele está ao lado, de nada menos do que Danny Glover, o astro negro do cinema mundial, quando de um encontro em Durban, na África do Sul. Duka é do cacete, acredito até que seja ele a verdadeira identidade do Menino Maluquinho.É pau para toda obra, tanto que lhe deixo aqui uma súplica:
- Empresta algum aí, amigão! Esse mês está difícil de terminar.

sexta-feira, 21 de setembro de 2007


UMA MÚSICA, UM SHOW E UMA BANDEIRA

Quem esteve aqui em Bauru durante o meio da semana foi Jorge Mautner. Estive nesse e no último show dele na cidade, em 2003. Mautner é Mautner, dono de um estilo incomparável, ele está cada vez mais gentil com o público (agradece efusivamente a cada aplauso) e de bem consigo mesmo. Ao lado do parceiro de todas as horas, Nelson Jacobina fez um show do jeitão que todos esperavam, sem muitas surpresas, mas com muito calor humano. Manuseia seu violino com a maestria de sempre, em devaneios bem elaborados e com gestos que encantam a todos. Só a citação de alguns poetas universais, paga a noite. Continua não existindo outro igual. Seus velhos fãs estavam todos lá, desde o Paulão, do Armazém até o arquiteto Edward Albiero. Só não vi a Majô, que sempre bate cartão em seus shows e pede “A Bandeira do meu partido”. Eu a pedi para a volta do palco no final do show, ele ameaçou cantar, mas deixou para lá, dizendo que Jacobina não gostava mais de tocá-la. Foi uma pena. Para todos de uma geração, que a contamos por aí, segue abaixo a letra da famosa música:

A bandeira do meu Partido
É vermelha de um sonho antigo
Cor da hora que se levanta
Levanta agora, levanta aurora!

Leva a esperança, minha bandeira
Tu és criança a vida inteira
Toda vermelha, sem uma listra
Minha bandeira que é socialista!
Estandarte puro da nova era
Que todo mundo espera e espera
Coração lindo, no céu flutuando
Te amo sorrindo, te amo cantando!

Mas a bandeira do meu Partido
Vem entrelaçada com outra bandeira
A mais bela, a primeira
Verde e amarela, a bandeira brasileira!

quinta-feira, 20 de setembro de 2007













UMA DICA

Miguel Rep é um desenhista da melhor cepa. Publica tiras diárias no jornal argentino Página 12, de Buenos Aires, demonstrando muita sensibilidade para os questionamentos sociais de nossos tempos. Viajo diariamente por lá (http://www.pagina12.com.ar), selecionando algumas, dentre as mais significativas. Descobri Rep quando estive em Buenos Aires, em março, para o "Fuera Bush", aquele com Chávez e o coloco no mesmo patamar de outros de minha admiração, como Jaguar, Ziraldo, irmãos Caruso, Fausto, Maringoni, Angeli, Nicolielo, Laerte e outros. Conheço a maioria dos homens do traço só de bater os olhos nos seus desenhos. Isso é coisa de velho e dedicado pasquineiro, que faz questão de continuar em atividade ad eternum.






terça-feira, 18 de setembro de 2007

MEMÓRIA ORAL Nº 2

A TROPA JÁ BAIXOU AQUI NA TERRINHA

O filme ainda nem foi lançado oficialmente, mas produz um sucesso estrondoso, principalmente na cidade do Rio de Janeiro, onde se passam todas as cenas de “Tropa de Elite”, a mais nova sensação cinematográfica brasileira. O filme é polêmico pela própria natureza do tema abordado, as ações violentas do BOPE - Batalhão de Operações Policiais Especiais da Polícia Militar do Rio de Janeiro. Não se viu até agora nenhuma propaganda oficial sobre o filme, que segundo o diretor José Padilha (o mesmo de Ônibus 174, de 2002), estreará nos cinemas em novembro, porém, o filme já está praticamente espalhado por tudo quanto é canto, num fenômeno mercadológico ainda inédito para o nosso cinema. Já se viu algo parecido com filmes estrangeiros, tiragens imensas e isso tudo está sendo, nesse momento, vivenciado também pelo cinema tupiniquim. Com o vazamento adentramos o rol dos filmes pirateados antes mesmo da estréia.

Essas coisas de pirataria são um tanto difíceis de serem identificadas. Difícil saber de onde partiu a reprodução da primeira cópia pirata, quem a repassou, para quem e como tudo foi se dissimulando. Muita investigação já foi feita e alguns nomes e suspeitos já estão arrolados e enrolados, com a lei ameaçando seus calcanhares. Isso tudo está merecendo uma ampla divulgação nacional, primeiro pelo ineditismo do feito e depois porque o filme trata de um assunto bem nosso, violência e ação policial. No Rio fala-se que as primeiras cópias foram vendidas a R$ 10 reais, depois a R$ 5 reais e hoje são encontradas até por R$ 2 reais. Pelo visto, por lá está um tanto difícil de encontrar quem ainda não tenha assistido ao filme. Virou febre e mania.
Mas, e por aqui? E no sertão paulista, a quantas anda a tal febre? Fui constatar isso no penúltimo domingo, no lugar considerado o paraíso dos piratas na cidade, a Feira do Rolo, que acontece junto à feira da Rua Gustavo Maciel, no centro da cidade. Circulei de barraca em barraca e não encontrei o filme. Muitos camelôs já ouviram falar e outros tantos estão querendo saber onde encontrar as cópias, pois muita gente já está procurando-a pelas barracas. Numa delas, acompanhado do filho, fiz perguntas demais e de posse de uma máquina fotográfica, causei a maior suspeita, com o camelô vindo na minha direção de forma meio acintosa: “É federal? Não pode ir tirando foto da banca, assim não!” Chegou a brincar que estaria armado e na boa desmontei o clima pesado, com muito papo e bom senso. Afinal, não é de bom alvitre ir fotografando camelôs, principalmente aqueles que revendem produtos pirateados e vivem sob o fio da navalha.

Um outro, mais maleável, acabou me afirmando que só não está vendendo a fita porque ainda não encontrou quem a repassasse: “Pra semana eu devo ter, pois a procura é grande e também quero ganhar algum com isso”. Bisbilhotei por todas as bancas e nada do filme, acabando por constatar um clima de expectativa entre as duas partes, a dos clientes, que especulam, procurando saber quando chega e entre os camelôs, que se movimentam na busca do tal filme, ou do lucro certo, pois a procura só aumenta. Um outro, fez questão de frisar algo interessante: “Nunca vi tanta procura por um filme brasileiro como esse aí. O negócio deve ser bom mesmo e estou também curioso”.

Na segunda, 10/09 rodei os camelôs do centro da cidade. Poucos eram os que ainda nada haviam ouvido nada sobre o filme. Circulei por umas dez bancas e na grande maioria, nada, nenhum vestígio. Numa delas, a grande novidade, o filme já havia passado por ali e estava esgotado, pelo menos naquele dia. Todas as cópias, que esse camelô, de uma das ruas transversais ao Calçadão central havia trazido foram vendidas. Estava cheio de encomendas para o dia seguinte e diante da minha curiosidade, foi logo falando: “Tenho mais dez rodadas lá em casa. Se quiser assistir hoje, te dou meu endereço e vai lá buscar à noite. Do contrário, guardo para ti e pega aqui amanhã. São R$ 5 reais”. Por fim acabei ouvindo mais uma novidade dele: “Em Bauru, por enquanto, só eu e um outro amigo temos. Somos os únicos”. Parece serem mesmo os pioneiros. Quer dizer, a Tropa de Elite já chegou à cidade e se veio para movimentar o comércio de DVDs piratas é algo que veremos a seguir.

Voltei no dia seguinte e quando fui chegando perto, ele já me reconheceu do dia anterior, foi logo me mostrando a banca: “Olha aqui o filme. Tenho duas versões de capas. Uma com o Cristo e outra com a favela de fundo. Em ambas o filme. Já vendi quase tudo que trouxe hoje, uma loucura. Tá entrando uma grana legal”. Comentei com ele, que justo ao lado, um outro filme bem badalado e difícil de ser encontrado, o “Amor estranho amor”, aquele erótico com a Xuxa. Ele é rápido na resposta: “É nessas coisas mais difíceis que se ganha um algo a mais”. Não resisto e faço a pergunta fatal: Como trouxe o filme? Ele pensa um pouco, como quem tem dúvida se deve ou não revelar e acaba falando que: “sou do Rio, tenho muitos parentes por lá e sou cheio de contatos. Acabei pedindo para me enviaram. Sei que logo outros vão vender, mas por enquanto quero ganhar algum a mais. Só isso”. Antes de ir, perguntei-lhe se já havia assistido e sorrindo me disse: “Claro. Acho até que fui o primeiro por aqui”.
Não me prolongo muito e saio pela rua pensando em outra coisa: O cinema brasileiro é viável e muita gente quer assistir aos filmes nacionais. A resposta é essa febre, talvez uma de nossas maiores bilheterias, sem ao menos ter sido lançado. O questionamento é de cunho cultural, envolvendo o preço cobrado pelos ingressos nos cinemas e o da venda dos DVDs. Algo que fica no ar, é como isso chega aos lugares periféricos desse imenso país. Tudo isso deve estar revirando os miolos dos produtores, diretores e de quem investiu nesse inesperado e louco sucesso. Tenham certeza, de que tudo o que foi gerado e criado em torno do filme, guardadas as devidas proporções, acontecerá por aqui e por todo o resto do país. O negócio já pegou e vai ter prosseguimento, talvez batendo recordes de bilheteria, sem que grana alguma entre para os bolsos dos seus idealizadores, pelo menos antes do lançamento. Coisas dos nossos tempos.

Para se ter uma idéia do avanço da tal febre, dei dois dias e voltei no final da quinta até os camelôs do centro da cidade. Fui sondar e o filme estava começando a circular em outras bancas. No último domingo, só espiei a Feira do Rolo e o filme estava em várias delas. Vi no jornal local um representante das vídeos-locadoras, Avanilton Sebastião, 50anos, dando uma entrevista sobre as perdas do setor e uma campanha, que tomou algumas ruas do centro da cidade, numa tentativa de conscientização da população para não consumir DVDs pirateados. Ele explica algo que é o grande problema do negócio hoje em dia: “As videolocadoras pagam em torno de R$ 120 pelos lançamentos. Quando estão disponíveis em lojas do ramo, custam por volta de R$ 45. O consumidor desembolsa de R$ 3 a R$ 5 pelo aluguel do DVD. Nós pagamos impostos e geramos empregos”. Na defesa da economia informal está Cláudio Luiz, 34 anos, representante da Associação da Economia Informal de Bauru, que na mesma reportagem salienta: “A questão do comércio dos produtos pirateados é social e não policial. Se tivesse mais empregos, com certeza não haveria economia informal”.
A questão levantada por tudo isso é a de que o vazamento do filme Tropa de Elite é a prova de que a pirataria nem sempre começa no camelô. Ele é simplesmente a ponta de lança do negócio, propiciando mais um dos tantos negócios ilegais, com permissão meio que consentida pelos ditos poderes constituídos. Outra questão é a do acesso à cultura e como ele se dá. E por último, sem falsos moralismos, a questão das pessoas colocadas na economia informal, como único meio de subsistência. O filme, bem ele já é um grande sucesso e continua sendo visto por tudo quanto é canto, inclusive por aqui, propiciando essa discussão toda. E tenho que confessar: estou louco para assistir e não sei se vou conseguir esperar o lançamento nos cinemas.

Henrique Perazzi de Aquino - 17 de setembro de 2007

domingo, 16 de setembro de 2007

UMA ALFINETADA
Produzo um texto semanal para o semanário de Pirajuí, O Alfinete (pica mas não fere), 40 quilometros de Bauru, há quase uma década e vou reproduzir aqui uma pequena amostragem do que sai por lá. O escolhido para o pontapé inicial foi esse aí embaixo, publicado numa das edições de agosto:

CANSADO MESMO ESTOU DE OUTRAS COISA


Sei que dia 17/08, rolou pelo Brasil algumas manifestações do tal "Cansei". Bato na madeira (toc toc toc) só de pensar em participar de tal atos. Macaco velho, prefiro me abster, pois depois de longos anos penando sob uma cruel ditadura militar, sou totalmente avesso a golpes, provenham de onde vierem. Portanto, não tenho nada a ver com esse grupo (ou seria grupelho?) chamado "Cansei" ou "Cansamos". Tenham certeza de uma coisa, "ainda não estou tão velho que não reconheça um lobo por debaixo da pele de cordeiro" (Fausto Wolff). Cansei de muitas outras coisas. Te juro que cansei!


Cansei desse tipo de passeata que leva os privilegiados paulistas às ruas sob o pretexto de um doloroso desastre aéreo, que ainda está sendo apurado. Conta outra, vai... Os mais velhos ainda devem se lembrar da Marcha com Deus pela Democracia, que apoiava coisas "inapoiáveis". Foram rezar contra o Jango, por um Brasil melhor e desaguaram no golpe militar. No Chile foi idêntico e incentivaram Pinochet. Será que querem esse filme novamente? Quem são os protagonistas de hoje? Deu-me medo só de ver os nominhos das figuras. Vade retro, Satanás!
Se precisar vou participar de um milhão de passeatas, de manifestações, de abaixo-assinados, de notas de repúdio, de missivas para órgãos da imprensa ou qualquer outra coisa para mudar esse quadro de injustiça social que vivemos. Disso eu não vou me cansar nunca. Se precisar estarei aí contra a corrupção, a violência, a falta de hospitais, a progressão continuada no ensino, o neoliberalismo, as privatizações desnecessárias e pela inclusão de todas as camadas sociais na sociedade e pela reforma da Justiça. Agora, apoiar movimentos cujos líderes e mentores são parte da elite nativa, que tanto infelicitou esse país, é assumir que defendo interesses que não são os meus. Tô fora.


Com a adoração pura e simples ao deus dinheiro, dificilmente iremos transformar em cidadãos a maioria dos escravos atuais. A classe média brasileira sempre fugiu dos pobres e miseráveis. Não tem uma ideologia, a não ser estar entre os ricos e não cair no inferno do proletariado. Sua visão de mundo é pessoal e egoísta. Eventualmente, quando está se aproximando demais do abismo do povão, promove passeatas, como a Cansamos, cujos organizadores não têm um só plano de reforma política que vá além do carro do ano. E a classe média, em vez de se aproximar do povo, faz passeatas...


Henrique Perazzi de Aquino, 47 anos fazendo passeatas, carretas, com o megafone mão, mas não se deixando levar por golpistas de plantão.

UMA DICA DE LEITURA

Já está nas bancas o mais novo produto do mercado editorial brasileiro, o Le Monde Diplomatique Brasil, ou simplesmente Diplo. Oito anos após surgir no Brasil, finalmente chega às bancas a edição em papel, com tiragem mensal de 40.000 exemplares e na contramão da grande mídia oligárquica.

Tudo foi possível com uma inédita articulação entre o Instituto Paulo Freire e o Instituto Polis, ambos de reconhecido valor, para quem se dedica a boa interpretação do que acontece à nossa volta. Veio preencher uma lacuna que tínhamos em termos de publicações que abrangem as questões internacionais, oferecendo um olhar crítico e analítico sobre esse conflitante momento vivido no nosso globalizado planeta. A primeira edição sai em agosto, com uma entrevistona com nada menos que Noam Chomsky e, infelizmente não veio para Bauru. A segunda, acabo de comprar após rodar várias bancas, pagando R$ 8,90 (caro demais para nossos parcos bolsos). É uma publicação que preciso ler mensalmente. Mais uma que, honrosamente adentra meu mafuá.

Confiram mais em www.diplo.com.br
UMA FRASE – FAMOSO GILETE PRESS

Quando leio os jornalões de hoje é mais do que inevitável uma volta ao passado. Eles não são nem sombra do que já foram. A advertência feita há 196 anos por Hipólito José da Costa, o fundador do primeiro jornal brasileiro, o Correio Braziliense, impresso em Londres, se lida com a devida atenção, caberia como uma luva para expressar o tal pensamento único, tão em voga hoje em dia. Hipólito continua mais atual do que nunca:

“Ninguém deseja mais do que nós as reformas úteis; mas ninguém aborrece mais do que nós que essas reformas sejam feitas pelo povo; pois conhecemos as más conseqüências desse modo de reformar; desejamos as reformas, mas feitas pelo governo, e urgimos que o governo as deve fazer enquanto é tempo, para que se evite serem feitas pelo povo.”

Para bom entendedor meia palavra basta. Não mudou nadica de nada para os dias atuais...
UMA MÚSICA


A MPB embala minha vida. Não escrevo sem estar ouvindo algo. Acompanho os grandes da MPB desde a adolescência e da poesia deles extraio mensagens, que me tocam a vida. Algumas letras me tocam mais fundo. Coleciono LPs e hoje CDs, tendo ao todo mais de 3000 deles no meu mafuá. Compartilho algumas nesse espaço. A primeira delas está aí embaixo:

PROFISSIONALISMO É ISSO AÍ (João Bosco e Aldir Blanc)
Era eu e mais dez num pardieiro
no Estácio de Sá.
Fazia biscate o dia inteiro
pra não desovar
e quanto mais apertava o cinto
mais magro ficava com as calças caindo
sem nem pro cigarro, nenhum pra rangar.
Falei com os dez no pardieiro:
do jeito que ta
com a vida pela hora da morte
e vai piorar
imposto, inflação cheirando a assalto
juntamo as família na mesma quadrilha
nos organizamo pra contra-assaltar.
Fizemo a divisão dos trabalhos:
mulher – suadouro, trotuá
pivete – nas missas, nos sinais
marmanjo – no arrocho, pó, chantagem,
balão apagado, tudo o que pintar.

E assim reformamo o pardieiro.
Penduramo placa no portão:
Tiziu, Cospe-Grosso e seus irmãos
agora no ramo atacadista
convidam pro angu de inauguração.

Tenteia, tenteia...
com o berro e saliva
fizemo o pé-de-meia (bis)

Hoje tenho status, mordomo, contatos,
pertenço a situação
mas não esqueço os velhos tempos:
domingo numa solenidade
uma otoridade me abraçou.
Bati-lhe a carteira, nem notou,
levou meu relógio e eu nem vi
- Já não há mais lugar pra amador!

-Ri melhor
Quem ri impune.

OBS.: Aldir é meu letrista preferido na MPB e sempre esteve presente no meu mafuá. Rendo a ele a primeira homenagem aqui (outras tantas virão). A música aí está no LP, “Bandalhismo”, do João Bosco, da RCA, de 1980. Comprei quando tinha 20 anos, há exatos 27 anos a ouço regularmente. A foto aí de cima foi tirada no bar Estephano's e surripiada do blog do considerado Eduardo Goldenberg (www.butecodoedu.blogspot.com).

sábado, 15 de setembro de 2007

MEMÓRIA ORAL Nº 01 (Regularmente, um texto com esse formato e muitas fotos)


MADALENA FAZ A DIFERENÇA, AO SEU MODO

A Pousada da Esperança é um bairro periférico de Bauru SP, afastado uns 8 km do centro, nas margens de uma rodovia, na saída para a cidade de Arealva. Bairro de trabalhadores que, moram em casas, todas construídas aos poucos, de acordo as possibilidades de cada um. Não é diferente a situação de Madalena Julio Marinho, 58 anos, solteira convicta, morando numa casa de quatro cômodos, num pequeno terreno, que dividiu em dois, para que a filha, Karine, o genro e os dois filhos começassem a construir a deles. São dezessete anos de Pousada, tendo já visto quase de tudo por ali:

- Hoje a situação é até boa. Vi muitas crianças de 12, 14 anos perdidas, dizimadas pela droga e pela violência das ruas. Sempre achei que faltam pessoas para mostrar que a vida não é só droga. Cuidando dessa geração que aí está, eles vão para um outro lado. Os livros transformam. Com a leitura a vida passa a ter um outro caminho.

Dona de uma mentalidade inquietante, não fica parada um só instante. Vive sem renda fixa, tudo o que ganha é conseguido com a venda de produtos de limpeza pelas ruas do bairro. Ela compra a essência, faz a mistura e distribui para uma clientela, dentro da própria comunidade. Também ocupa seu tempo como presidente da Associação de Moradores, gestora do Posto de Saúde e membro dos Conselhos Municipais da Saúde e da Assistência Social. Corre bastante para que nada lhe falte e, além disso, há pouco mais de um ano, encontrou outra atividade, que lhe preenche bastante o tempo, além de ocupar um bom espaço dentro de sua modesta casa.

Todo um corredor e mais a cozinha estão abarrotados de livros. Isso mesmo, a casa de dona Madalena é a mais nova biblioteca do bairro. Muito requisitada pelos estudantes de duas escolas do bairro, uma municipal e outra estadual (a Biblioteca Pública Municipal fica no centro da cidade, assim como as ramais, distantes dali). Sua vida sofreu uma revolução desde que comprou a idéia da necessidade da criação de uma biblioteca, que empreste os livros para os estudantes fazerem seus trabalhos em casa:

- Temos duas escolas por aqui. Uma mais nova, a municipal, ainda não possui biblioteca e a outra, a estadual abre a sua somente a partir das 17h30 e não empresta livros. Toda a pesquisa tem que ser feita no local. O bairro ainda é perigoso e não deixaria meu filho pequeno voltar de lá sozinho depois das 18h. O pequeno Wendell, de 14 anos lhe deu um toque sobre essa deficiência. Ele veio com a idéia de montar uma biblioteca, primeiro em sua casa e depois num outro local. Juntos montaram uma barraquinha defronte a casa dela e receberam os primeiros livros. Um jornal e um programa de TV divulgaram o fato e muitos outros chegaram. A barraca ficou insipiente. Com esforços redobrados, alugou uma pequena casa por R$ 120,00 ao mês e levou tudo para lá. A experiência rendeu cada vez mais estudantes, tendo que ser abortada após seis meses de funcionamento. Primeiro pelo custo, que se tornou elevado, sem apoios, depois pela mudança de Wendell para outro bairro, reduzindo suas aparições. Sozinha, tudo ficou mais difícil. O último recurso, para não fechar às portas foi transferir tudo para sua própria residência. E assim foi feito.

A cada dia os livros ocupam mais espaço dentro da casa. Um corredor, que a corta de fora a fora foi todo ocupado por estantes de aço, chegando até a cozinha. Isso a obriga a fazer uma higienização nos livros todos os dias, para que não fiquem impregnados por gordura. "Limpo diariamente e cheguei à conclusão de que deitados engorduram menos, facilitando a limpeza", diz dona Madalena, enquanto recebe a bancária Lígia Maria Juncal, que ficou sabendo da biblioteca, ligou e perguntou do que mais ela precisava. Trouxe um fichário, pois todos os empréstimos eram feitos e guardados em sua memória. Com a chegada do fichário, terá um melhor controle sobre as entradas e saídas de livros.




Assim como Lígia são poucos. Vieram muitos livros, mas muitos repetidos, outros tantos velhos e de pouquíssimo uso, um tanto ultrapassados e não mais utilizados nas escolas. O grosso são livros técnicos, velhas enciclopédias, muitas revistas religiosas e quase nada dos clássicos da literatura. Dona Madalena não reclama disso, mas é evidente que muita coisa que possui foi descartada da casa das pessoas e hoje ocupam um espaço precioso naquelas estantes, que poderia ser preenchida por livros e revistas mais atuais, de muito mais utilidade para os estudantes. A constatação é de que muitos resolveram um problema de espaço em suas casas, ocupadas por livros velhos e inservíveis, transferindo-o com a doação para aqueles minúsculos cômodos. Ela sabe disso e não reclama, tanto que diante da interpelação de que poderia lhe servir uma caixa cheia de revistas de cunho religioso. Incisiva foi sua resposta:

- Pois foi nelas que as crianças encontraram material para trabalhos sobre aquecimento global. Vasculhamos elas e tudo foi de grande utilidade.





Por falar em religião, o prédio ao lado é a Paróquia Apóstolo Paulo, que passa por reformas, abrigando um salão e a nova casa paroquial. Frei Ernani foi consultado por dona Madalena, que também é católica, mas ele não encontrou possibilidades de levar os livros para uma sala no novo espaço. Pintou logo a seguir no muro a frase "Doações para Biblioteca aqui" e os livros não param de chegar. Ela, resignada, sabe que a continuidade de sua biblioteca passa pela ampliação de suas instalações atuais, pois dificilmente terá como continuar recebendo os mais de 300 estudantes, que já passaram por sua casa. Para isso, quer envolver toda a comunidade numa campanha para arrecadar mil tijolos e uns quinze sacos de cimento. Pretende levantar o barracão no terreno na frente de sua casa, em regime de mutirão. O plano já está todo montado em sua cabeça e precisa nesse momento de divulgação, para conseguir concretizá-lo.
- Não posso parar. Muitos falam que sou louca de fazer tudo isso, mas o que me comove é ver crianças, como uma de nove anos, que veio aqui me pedir um Dom Quixote e eu não tinha para emprestar. Não tenho, mas vou ter. Como sei que irei levantar o barracão lá na frente, muito mais espaçoso e confortável. Se parar com tudo, onde eles irão emprestar livros aqui por perto?

Outra ajuda está vindo da Biblioteca Central do município, que estará disponibilizando uma pessoa para ajudá-la na catalogação do acervo e conseguindo livros bem mais atuais, que fazem parte de seu excedente de reserva existente atualmente. E com a certeza de que vive uma verdadeira missão, ela como toda abnegada, ciente de que é útil, segue fazendo a diferença. A seu modo.
SERVIÇO:
Madalena Julio Marinho - avenida José Alves Seabra n 4-176, quase esquina com a rua José Bombini - Pousada da Esperança - Bauru SP
fone residencial 14.3277.1289

HENRIQUE PERAZZI DE AQUINO – escrito originalmente em 01/JULHO/2007.

sexta-feira, 14 de setembro de 2007

MEUS CAROS
AGUARDEM SÓ MAIS UM POUQUINHO, POIS OS ÚLTIMOS AJUSTES ESTÃO SENDO FEITOS PARA ADENTRARMOS O GRAMADO. A PELEJA JÁ VAI SE INICIAR.
AINDA ESTOU CALÇANDO AS CHUTEIRAS, MAS COMO ESTOU UM TANTO DESTREINADO, ISSO DEMORA UM BOCADINHO.
HENRIQUE PERAZZI DE AQUINO