sábado, 7 de fevereiro de 2009

COLUNA DO JORNAL BOM DIA (07), ALFINETADA (47) E UMA MORTE

Hoje, junto tudo num só post. Meu texto para o Bom Dia é quase idêntico ao d’O Alfinete (esse saiu um pouco maior), ambos publicados hoje. Já escrevi aqui sobre a morte de Roberto Godoy, depois de dona Jandira e hoje escrevo alguma coisa sobre o arquiteto Jurandyr Bueno Filho. Após o texto dos jornais, meu registro para mais essa partida:

DESISTÊNCIAS E DESISTENTES
Escrever sobre as desistências feitas durante a vida é sempre muito doloroso. São mais freqüentes do que queremos (e necessitamos). Nessa semana mesmo, um amigo se suicidou. Cansado disso tudo, escolheu o caminho sem volta. Não mais poderá retomar e rever posições tomadas.

Na maioria das vezes não chegamos a extremos, circulamos nas imediações. Quantas vezes, cansados, não sentimos uma vontade irrefreável de dar um basta em tudo. Um amontoado de fatores, cada um a seu modo, freia esses impulsos.

Eu mesmo tenho um filho a criar e os pais sob meus cuidados. O barco precisa prosseguir seu curso. Seguro as pontas, revejo aqui, reconstruo ali, engulo sapos diários acolá. Continuo remando, mesmo com o mar revolto e jogando contra. Não temos escolha. É prosseguir e prosseguir.

Nessa semana outra desistência me foi também muito sentida. Nutro um carinho mais do que especial pelo jornalista Mino Carta e por tudo o que representa. Através do seu blog (
www.blogdomino.com.br) comunica o desalento e decide: “despeço-me deste blog e, por ora, calo-me em Carta Capital”. Fecha-se em copas.

Mino é um dos últimos em que ainda me arrisco colocar a mão no fogo. Faz um arrazoado de motivos: decepções com Lula, reeleição de Sarney e Temer, Gilmar Mendes, privilégios a Daniel Dantas, Battisti e o eterno Febeapá tupiniquim. O desalento também me acomete. Sabe aquela sensação de ingresso num beco sem saída, encurralado? Assim estou.

Henrique Perazzi de Aquino – professor de História
OBS. - Comentário pós-texto: São mais de 400 mensagens para Mino em seu blog. Uma grande perda, irreparável. São tão poucos os que ainda persistem na defesa do Brasil, na forma como também o faço, que qualquer perda é sentida profundamente. A imprensa perde muito. Mino é daqueles titulares absolutos em qualquer time e não existe peça de reposição no banco de reservas. Final de semana doloroso. Me tranco no mafuá e fico a ler, ler, ler...

JURANDYR, 66 ANOS
Não privei da amizade de Jurandyr. Nesses quatro últimos anos, quando estive à frente da Diretoria de Proteção do Patrimônio Cultural e presidindo o CODEPAC – Conselho de Defesa do Patrimônio Cultural acabei me aproximando de Jurandyr, que sempre esteve muito ligado nessas questões. Aprendemos a nos respeitar. Conversávamos com certa freqüência. Foi e fazia questão de assim o ser, polêmico por natureza. Sabia do seu valor e se impunha nos questionamentos. Convencê-lo de alguma coisa sempre foi algo muito difícil, mas isso era compensado por seu bom humor e inteligência. Nas discussões coletivas éramos obrigados a abrir um espaço ampliado para suas explanações, pois fazia questão de extrapolar. Era seu jeito, talvez um método. Gesticulava muito e se deixássemos, dominava tudo. Por ser quem era não havia como agir diferente com ele.

Quero lembrar aqui dois momentos onde o arquiteto esteve presente. No primeiro, o Museu Histórico Municipal possuia em seu acervo um mapa, todo em pergaminho, datado de 1924, um dos nossos mais ricos documentos. Imenso, estava guardado na reserva técnica do museu. Jurandyr estava na cola dele há anos, descobriu seu paradeiro e moveu céu e terra para colocá-lo num local de destaque. Cedi e o repassei para que providenciasse uma moldura adequada, conseguida com arrecadação junto a munícipes. Chegou a me mostrar os valores arrecadados. Fez o trabalho de higienização e moldura em São Paulo, trazendo-o diretamente para nosso teatro, onde o descarregamos juntos. Meses depois o prefeito Tuga autorizou sua fixação no hall de entrada do prédio da Prefeitura Municipal, onde está até hoje, imponente e embelezando o local.

No segundo, Jurandyr foi convidado pelo CODEPAC a comparecer numa de nossas reuniões ordinárias. Lá esteve e se o motivo era para falar dos planos e projetos para a Estação da NOB, ele foi muito além. Não se limitou a falar sentado, permaneceu em pé, circulando pelo auditório do Museu Ferroviário e naquele dia, com uma pauta ampliada, tivemos que adiar outras discussões. O convidado estendeu sua fala e quando terminou, nosso tempo estava praticamente exaurido. Naquele dia, diante de vários colegas do ramo, tanto arquitetos, como engenheiros, deu uma aula e foi ouvido com a devida atenção. Não conseguiu desembaralhar a questão da estação, sem solução até hoje, mas fazia questão de demonstrar sua opinião. O registro daquela reunião faz parte de uma longa Ata.

Certa feita me fez chegar às mãos um envelope timbrado do seu escritório com uma etiqueta estampada na frente, “Sr. Perazzi”, com vários documentos facilitadores para Bauru fazer parte do PRONAC – Programa Nacional de Apoio a Cultura, do PAC – Programa de Ação Cultural e até uma cópia do Estatuto da ALIC – Associação Lençoense de Incentivo à Cultura, onde, segundo ele, os recursos para construção de um teatro em Lençóis Paulista puderam chegar com mais facilidade. Ele queria muito que Bauru voltasse a receber recursos para viabilizar sua área cultural. E me instigava a ir à luta, me instrumentalizava para tanto.

Era o que tinha para falar dele. Nada mais. Hoje, ao ler nos jornais sobre sua morte, deixo registradas essas passagens. Gostar ou não de Jurandyr é outra coisa, para outro momento. Dele tenho outra grata recordação. Quando deixei o cargo, com a transmissão do governo municipal, além dos afagos dos amigos, ele me ligou pessoalmente e fez questão de externar sua tristeza. Receber esse afago, vindo dele, teve para mim um valor muito grande. No mais, a vida continua e vamos tratar de cuidar mais de nossa saúde, pois somos todos um tanto descuidados.

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