domingo, 16 de outubro de 2011

MEMÓRIA ORAL (111)

DOIS ATOS NO MESMO DIA, OBJETIVOS SIMILARES
Sábado, 15/10, tempo fechado pelos lados de Bauru com chuvas intensas caindo a qualquer momento e dois atos marcados para a região central da cidade. No primeiro, um Ato de Protesto contra a provável privatização da Saúde Municipal, quando a Prefeitura, por intermédio de sua Secretaria de Saúde tenta fazer vingar a aprovação na Câmara de Vereadores um famigerado Projeto de Lei criando a Fundação Regional de Saúde. Na verdade isso será um enxame de verba pública federal, desistimulando o SUS - Sistema Único de Saúde, fragilizando ainda mais as relações trabalhistas, privatizando mais um serviço público e feito a toque de caixa, em algo com muita coisa a ser explicada e entendida. No segundo, numa reprodução do que acontece nacionalmente, um Ato contra a Corrupção, combinado pela internet e agitado principalmente por jovens, focando nos malefícios da corruptela num todo e a busca de se desviar do foco buscado pelo pessoal ligado ao “Cansei”, com a inclusão de temas locais, afinal, “a revolução deve começar na própria casa”. O primeiro marcado para às 10h e o segundo para às 15 hs.

No primeiro, o local escolhido é o Calçadão da rua Batista de Carvalho, cruzamento com a rua Treze de Maio, local onde todos os sábados o vereador Roque Ferreira – PT mantém uma banca de livros da vertende petista “Esquerda Marxista”. Ponto conhecido e local das últimas concentrações com temática social ocorridas na cidade. Além desse ato, na chegada, o advogado e idealizador do movimento Resgate Bauru, Carlos Augusto de Carvalho, aproveitando o som trazido pelos organizadores do movimento, fala também sobre sua iniciativa popular de redução salários dos vereadores. Ali, uma banca, vários militantes com pranchetas a coletar assinaturas contra a Fundação de Saúde e duas faixas buscando o apoio popular nesse sentido. Cinco cartazes feitos a guache e papel cartão, iam mais a fundo, denominando o que estava sendo criado de “Afundação” e buscando o entendimento de algo ainda não muito bem esclarecido: “Qual o motivo da pressa do vereador Marcelo Borges em querer aprovar a toque de caixa a Afundação Regional de Saúde?”.

Nada começou antes das 10h30 e antes disso o fotógrafo do Jornal da Cidade já havia feito alguns cliques e bateu em retirada. Na organização, muitos funcionários públicos, principalmente ligados à Saúde Municipal, o Sinserm – Sindicato dos Servidores Municipais e o pessoal ligado ao gabinete do vereador Roque Ferreira. Em torno deles, alguns famosos militantes das questões sociais no município. O megafone passava de mão em mão e nas falas, a questão da Fundação a predominar, tendo Carlos Augusto a fazer um contraponto, fazendo a defesa e chamamento para seu abaixo-assinado. A grande sacada do Ato foi despertar na população, com poucas informações sobre o que vem a ser essa tal de Fundação. O que todos tem certeza é de que a Saúde no município deixa a desejar e a maioria das perguntas dos que paravam para tomar conhecimento era: “Mas isso não será bom para a Saúde? Me explique melhor”. E isso foi feito por todos, indistintamente.

Permanecendo mais tempo entre os manifestantes, um repórter e um fotógrafo do diário Bom Dia, coletaram muitos dados, mas pouco foi reproduzido na edição do jornal no dia seguinte. Fiscais da Prefeitura tentam estragar o brilho da manifestação, dizendo ser proibido o protesto com pregação de cartazes. No ajuntamento de argumentos, mesmo eles estando em número de quase dez pessoas são demovidos de continuarem no triste propósito, mais usual nos tempos ditatoriais e saem de cena como chegaram, sem serem percebidos. Movimentação intensa até pouco antes do meio dia, quando tudo foi sendo desmontado e eis que surgem caminhando pelo calçadão, o vereador Marcelo Borges, o líder privatista, junto de dois colegas, de uma legenda supostamente socialista (sic) e ironizam a manifetação. Numa atitude de boas relações entre parlamentares, Roque fica para o bate-papo e a ele junta-se padre Beto, que subindo a Batista tambem adentra na rodinha de final de feira. Uma garoa cai sobre a cidade no exato momento do fim do ato, parece que demarcando a trégua estabelecida para sua realização.

A mesma trégua não foi conseguida no período da tarde, pois pouco antes das 15h cai sobre Bauru um toró daqueles de alagar o centro. Chuva ininterrupta, dessas a desmobilizar qualquer organização. Da mesma forma que veio forte, depois de uns quarenta minutos se foi e a partir daí surgem dos mais variados lugares algumas pessoas e começam a se aglutinar diante do coreto da praça Rui Barbosa. Dois cinquentões e o restante jovens, principalmente os aglutinados a partir do facebook, através do lema “Acorda Bauru!”. Uma conversa foi estabelecida e como ninguém acabou arredando pé, outros foram se juntando. Algumas faixas de pano confeccionadas para o evento foram desfraldadas e a seguir surgem outras cinco em folhas craft, pintadas com guache.

Um tem a idéia de fixá-las no gradil do coreto e o local fica maravilhosamente enfeitado, parecendo uma árvore de Natal. Surgem mais pessoas, aproximadamente umas trinta e um taxista vendo a movimentação aproxima-se e faz questão de deixar sua mensagem: “Que ótimo vocês estarem aqui e falarem também dos problemas de Bauru. A imprensa daqui só quer divulgar algo sobre a corrupção de longe, mas quando resvala em figurões daqui, fogem do pau”. Destacado num dos cartazes, desses citados pelo taxista, com sua frente voltada para a matriz católica está escrito: “Corrupto é tudo igual, em Brasília, em SP ou Bauru: E o lesa Bauru da Associação Hospitalar?”. Novos cartazes são feitos, com embalagens de guache surgindo da bolsa de uma jovem e papel de outro, despontando dois bem elucidativos: “Quem cala conscente” e “Somos indignados pela apatia do povo”.

Quase 18h e uma nova chuva cai sobre a cidade, forçando todos a se agruparem dentro do coreto, surgindo daí uma espécie de espaço aberto para um falatório, ou seja, uma apresentação de propósitos, interesses e alcances. Um fala sobre a importância do entendimento dos motivos de não se aceitar a privatização da Saúde como está sendo apresentada, outro argumenta que a privatização não deu certo em nenhum lugar do mundo e a partir daí os mais jovens deslancham e mostram definitivamente sua cara e coragem. Foi um belo festival de idéias, demonstrando que ninguém ali está sendo conduzido por direcionamento outro, que não o de por fim ao estado de coisas lamentáveis gerado pelas muitas corrupções (e corruptores), conhecidas por todos.

Eis que um pede a palavra e desfere: “De nada adiantará essa nossa movimentação, pois não será acertando algo aqui e acolá que consertaremos nada. A corrupção está alastrada e só existe mesmo um jeito de reverter isso, é alterando o sistema. O sistema é que é podre”. Uma outra jovem começa falar e é insuflada a proferir a palavra que parecia engasgada na sua garganta: “O culpado de tudo é o sistema capitalista. Não existe como efetuar remendos nele, pois não tem cura”. O aplauso foi geral e a chuva continuava caindo do lado de fora do coreto. .

A chuva de pequenos pronunciamentos continuou de forma cada vez mais incisiva. “Eu para fazer política não preciso estar dentro de um partido político, aliás abomino isso”, disse um. “Ninguém aqui vai ser conduzido por ninguém”, “Precisamos começar mudando a nossa atitude diante do mundo, para propormos a mudança dos outros” e “Eu estou mais indignado com os que ficaram de vir aqui hoje e não o fizeram, do que com os que combatemos. Se falo que vou, tenho que ir, mesmo debaixo de chuva”, concluiu outro. Da ampliação do debate algo mais, com a definição do reencontro já para a próxima segunda, 17/10, quando os vereadores votarão o projeto da Fundação e mais que isso, quando outros problemas da cidade de Bauru foram sendo levantados, como o DAE, transporte urbano, etc, a definição que os próximos locais de encontro serão defronte esses lugares, a Prefeitura, o DAE, a EMDURB, o escritório político do deputado e assim por diante.

O dia ia escurecendo quando todos passaram seus e-mails para uma lista e um dos presentes ficou encarregado de enviar a todos, promovendo a partir daí uma intensa troca de recados. “A internet é o ponto de aglutinação, para iniciarmos a conversa, definirmos o assunto do dia e depois sairemos para as ruas”, disse outro, prontamente aceito por todos. Pouco antes da dispersão, a idéia do nome para o movimento veio de outro, devendo levar em conta algo transcrito numa das faixas, "Indignados com o Sistema”, algo assim. Não precisou nem colocar em votação, pois a concordância foi geral. Bauru quase escura, um que saia, da turma dos mais velhos, muita coisa já tendo presenciado faz questão de dizer: “Saio animado, mas não tenho motivos para ficar exaltado. Já me decepcionei muito com outras concentrações que deram em nada e torço muito para tudo dar certo, porém, pela vivência, aguardo. Não me animo mais antes do tempo”.
Obs.: Foi intencional a não citação dos nomes da maioria dos participantes. Mais dos dois atos no http://www.protestojovem.com.br/ .

6 comentários:

  1. "Tenho Orgulho de você Henrique.Sem rasgação."

    Marcia Pestana Mota

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  2. Sr Henrique:

    Acabo de ler isso abaixo nos jornais:

    "Protestos contra as grandes empresas e o setor financeiro resultaram em cenas de violência hoje (15) em Roma, com carros incendiados e gás lacrimogêneo sendo disparado pela polícia contra os manifestantes".


    Em Bauru ocorrerá algo desse tipo?

    Isso não preocupa?

    L.P.J.

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  3. henrique vamos marcar e fazer a materia do gasparini desde inicio ok com varias fotos etc..
    att
    mario roberto cândido

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  4. Não sei quem possa ser LPJ, mas respondo que esse tipo de provocação é simplista demais. Não se analisa o que ocorreu recentemente em Roma dessa forma. Existe todo um contexto e os que protestavam estavam no seu papel. Polícia é polícia no mundo todo, paga pelo estado para defesa do mesmo. Ela respoonde aos impulsos desse estado. Em Nova York outra truculência gratuita contra o povo. Isso se repete por tudo quanto é lugar. A repressão não respeita direitos mínimos dos cidadãos e esses quando aviltados de forma sucessivas reagem. Deu no que deu. Aqui não temos clima para isso, pois nem o coreto ainda lotamos, mas cresceremos e hoje, segunda é uma prova de fogo para todos, quando tentaremos mobilizar um grande número de pessoas para protestar contra a tentativa dos vereadores em aprovar algo impopular e injusto.

    Henrique - direto do mafuá

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  5. Caro Henrique - grato pela mensagem da MEMORIA ORAL 111 - você está ligado nesse tema e tem passado para nós todos com muita propriedade. Parabens-Isaias

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