domingo, 24 de julho de 2016

CARTAS (161)


RETROCESSO PIOR QUE O DE 1964*
Carta de minha lavra e responsabilidade publicada na Tribuna do Leitor, do Jornal da Cidade, edição de 24/07/16:

Leio aqui e alhures algo pelo qual não dá para concordar. Alguns colunistas, missivistas e até arrivistas insistem em continuar apregoando que o país está se encaminhando economicamente e quetais com esse (des)governo interino golpista em curso. Mas como seria isso possível com tanta iniquidade sendo presenciada? Não é possível. O que existe é a anuência de uma turba não discutindo mais o país e sim, apoiando incondicionalmente a entrega de tudo para o capital estrangeiro e a redução dos direitos trabalhistas, tendo isso como saída para tudo. Pobre de um país com gente pensando e agindo dessa forma.

Mais do que evidente e numa simplista análise, o golpe em curso (tomara que não se consume de fato) é imensamente pior do que o ocorrido no país em 1964. Os militares, instigados pelos mesmos que hoje abertamente estão no leme do golpe, danaram com o país, mas possuíam algo perdido no movimento de hoje. Os fardados daquela época fizeram e aconteceram, mas eram nacionalistas e não pensavam em entregar o país. Já hoje, o pensamento é um só, nada mais nos pertence, tudo o que ainda é público deve ser repassado para a iniciativa privada, conseqüentemente, capital internacional. Não defendem sequer o país onde moram, fazendo aberta campanha para ver tudo nas mãos de outrem e tendo o disparate de levantar a bandeira desse tal progresso. Que raio de progresso é esse que não privilegia mais nada como nosso? Progresso virou entregação nacional.

Muito além de qualquer bandeira partidária, o país está perdendo no menor espaço de tempo tudo o que foi duramente conquistado ao longo de décadas, num retrocesso sem tamanho e com proporções ainda não muito bem definidas. Nunca o empresariado brasileiro se mostrou tão envolvido em pensar somente nos seus botões, estando na ponta de lança de todas as perdas trabalhistas, até então a garantia do bem estar vivenciado no país. Inacreditável percebê-los apostando em legislação que os favoreça descaradamente, só para aumentar seus lucros e nem aí se isso levará à miséria a imensa maioria dos brasileiros.

Triste sina a de um país que, ousou se apresentar diferente ao mundo, mas cai agora na armadilha do andar para trás, como tábua de salvação. Salvação de que e para quem? Para uns poucos. A elite cultural brasileira não tem sólida formação cultural, ela adere a todos os modismos, sempre se mostrou subserviente ao capital internacional. A burguesia brasileira não possui história, tradição. Não existe esse zelo pelo passado, pela legalidade, pelo bem-estar de todos. O que vejo sendo concretamente imposto e aceito por muitos, referendado como o correto nesses pouco mais de dois meses com Temer & Cia é aquilo que vem exatamente em desacordo com o que aprendi com Norberto Bobbio. No seu conceito sobre Direita e Esquerda, esquerda pressupõe que os homens são essencialmente iguais, e por isso a promoção de políticas em prol da igualdade. Já a hoje escancarada direita não se mostra nem um pouco generosa, mas cruel até a medula, insensível e a cada nova ação pensando o país para uns poucos e não na sua totalidade.

Sem defender essa ou aquela proposta. Insinuaram algo salutar num passado não tão distante e irrefutável o retrocesso. Não se faz necessário nenhum esforço para a triste constatação de estarmos caminhando para um mundo mais injusto, excludente, privilégio de uns poucos e para um triste, “dane-se o resto”. O resto somos nós, os assalariados, trabalhadores, classe média para baixo, todos sendo colocados no mesmo balaio do descarte. Aceitar isso como progresso é o mesmo que, se manter calado, indiferente quando uma pessoa como Eduardo Cunha faz o quer desse país, o manipula ao seu bel prazer, tudo porque possui na manga da camisa uma bela moeda de troca, a da manipulação barata. Até quando seremos manipulados por uns poucos a nos ditar o que e como devemos fazer, ser e estar?

Basta de cordeirinhos não enxergando um palmo diante do nariz. Não é esse o país tão sonhado por todos nós. Luto por justiça social e não por conveniências que me favoreçam.

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