domingo, 18 de setembro de 2016

AMIGOS DO PEITO (123)


RELATOS DE TRÊS AMIGOS E TRÊS FOTOS DE UMA VIAGEM AINDA EM CURSO
“A mão que ampara a hóstia á mesma que puxa o gatilho.
O malhete que condena o inocente famélico é o mesmo que se omite ou absolve poderosos corruptos.
A arma que dispara mortalmente na periferia é a mesma que silencia nos jardins.
A imprensa que publicou o massacre de Canudos e as cabeças do cangaço é a mesma que hoje sustenta o golpe de estado”, poeta caipira e nietchziano Lázaro Carneiro.


A) Com essa poesia de um amigo de todas as horas começo minhas escrevinhações deste domingo. Quero juntar aqui três fotos tiradas ao longo desse passeio, viagem à trabalho e lazer. Dez dias longe de Bauru, entre João Pessoa PB e Natal RN. Na primeira foto, um amigo argentino sensível com o momento vivido pelo Brasil nesse pós-golpe, país dilacerado me envia por um colega participando do congresso acadêmico a edição do diário argentino que tanto gosto, o Página 12, edição especial deles justamente do dia seguinte ao golpe fatal que retirou Dilma do poder e o entregou ao golpista Temer. Folheio o jornal e leio suas páginas em estado de puro êxtase, edição que encadernarei e lá algo que a mídia brasileira escamoteia, o com a chamada de capa “La tristeza no és solo brasileira”. Dentro um texto de um dos melhores jornalistas brasileiros, Eric Nepomucemo, me faz literalmente chorar: “Canalhas! Canalhas! Canalhas!”. Um mimo inesquecível, de valor inestimável para esse velho macanudo, lobo cansado de tantas batalhas e esgrimando contra intermináveis moinhos. Paro tudo para folher o jornal como um adolescente o faria diante de um brinquedo tão desejado.

“Fui vacinar os cachorrinhos e tinha uns 45 entregando santinhos. Falei tudo que tinha que ser falado. Lavei a alma! Vai pra puta que pariu Golpista!”, comerciante Guilherme Reis, num sincero desabafo hoje, diante de uma campanha recheada de fascistas na Bauru de todos nós.

B) Circulo pelo Congresso de João Pessoa ostentando um botton do Fora Temer. Sou abordado por alguns e cinco deles ganham de mim a peça a alfinetar minhas camisetas. Uma dona de um bar na orla, um atendente de mercado, um expositor no stand de uma fábrica de redes (o Allyson na segunda foto), uma estudante de enfermagem na universidade privada e um segurança na mesma universidade. Foram cinco pessoas que me abordaram por causa do botton, parei para conversar, trocamos ideias e por fim, temos um entendimento um tanto similar do que está a acontecer com o país. Esses resistem aqui no Nordeste do país, eu junto a tantos outros em Bauru e um país demonstrando repulsa pelos atrasos já anunciados.

“Fui à padaria e, aos risos, a atendente comentava que a Camila ficou sem amante na novela e um rapaz disse que "gostava de uma pitanga"... Segurei a língua e sai de lá chocada com o desrespeito!”, Ana Lellis, uma inconformada senhora, tentando sobreviver diante das barbaridades que ouve pela aí.

C) Já escrevi anos atrás algo de dois irmãos cariocas, livreiros e mambembes, caixeiros viajantes do século XXII. Sabem lá o que venha a ser alguém se especializar em livros segmentados para os mais variados congressos acadêmicos e viajar o país inteiro a vendê-los em quase todos, de norte a sul desse país? É isso que faz garbosamente o Stevenson, hoje morando um Curitiba, mas um cidadão do mundo, ou melhor, das universidades brasileiras. Ele vende muito, conhece todas as universidades, professores e estudantes. Ouvir suas histórias de como faz para carregar de um lado a outro uma infinidade de pesados volumes de livros, driblar o excesso de peso nos aeroportos, do contato que faz aqui e ali é algo inebriante. Se existe uma pessoa pela qual nutro uma pitada de saborosa inveja, esse alguém é do Stevenson, que agora reencontro em João Pessoa, mas já o fiz em outras oportunidades em Caxias do Sul, São Paulo, Fortaleza, Salvador, Curitiba, etc. Ser caixeiro viajante nesses tempos de hoje é algo mais do que encantador e ele, com seu jeito malemolente é desses personagens improváveis, mas bem real. Merece uma observação maior diante dessas tantas profissões se desmilinguindo com o passar dos anos.

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