segunda-feira, 9 de abril de 2018

DROPS - HISTÓRIAS REALMENTE ACONTECIDAS (154)


ALGUMAS HISTORIETAS RECOLHIDAS POR ESSES DIAS

A senhora de 90 e poucos anos, muito alegre, esperta, com tudo em cima, rindo na nossa mesa e diante da minha pergunta, “qual o segredo para estar tão altiva nesta idade?”, não se avexa, me puxa para um dos cantos e diz ao pé do ouvido: “Tive sorte na vida, não me considero rica, mas sempre tive de tudo e desta forma, sem ter que me preocupar com o dia seguinte, sem ter que dormir com a cabeça quente e preocupada em como iria resolver aquele problema ou arrumar dinheiro para pagar aquela conta, sempre passei a vida sem sobressaltos e daí, cheguei a conclusão, vivi esse tempo todo”. Sim, ela tem toda razão, pobre vive muito menos, pois as constantes preocupações e agruras da vida são um transtorno para quem quer buscar ter uma vida saudável.

Estava confabulando com meu médico e ele me mostrando algo recente, um medicamento e um tratamento novo para praticamente curar a diabetes. Fico interessado e pergunto: “Mas quando estará no mercado? Deve custar muito caro?”. Ele me olha com aquele olhar calmo e me dá a resposta mais óbvia deste mundo: “Sim, tudo quando é lançado é bem mais caro, depois o preço vai caindo, mas tenha sempre em mente que, nesses novos tempos, cada vez mais, a medicina não é mais feita para todos e sim, para uns poucos, os que podem pagar. Se você tem condições de pagar, muito bem, vai ter a melhor medicina do mundo e se não puder pagar, a pior. Você ainda não percebeu isso”. Fico lá de boca aberta, cara de bocó, como se aquilo fosse uma grande novidade. Ele conclui: “Ninguém faz mais nada para pobre, se toca, ô meu!”.



Fui numa festa previamente agendada, aniversário de um amigo no sábado, horas depois do Lula ter sido levado pelos policiais. O local era a Zona Sul e já fui preparado para ficar na defensiva, mas o que lá vi foi uma indiferença, o furdunço rolava como se nada tivesse acontecido. Uma baita amiga, defensora das mesmas ideias que as minhas, nos vendo chegar, eu a Ana, vem ao nosso encontro e como a pedir socorro, diz: “Me salvem, por favor. Não aguento mais conversinha impertinente de gente que se acha, fazem questão de se mostrarem a cada abertura de boca. São insuportáveis”. Vi que ela estava já um pouco alterada e percebendo ter notado, sem constrangimento me diz: “Bebi mesmo e muito, ainda mais hoje, sabendo onde estaria e para não ter que suportar, já cheguei nos trinques, pra lá de Teerã e assim ouço menos, sofro menos”. Seguindo seu conselho, bebi um copo atrás de outro e assim, se papos não muito retos ocorreram pouco notei (hic hic hic).

Na mesma festa, a mesma amiga me conta detalhes da maioria das pessoas no entorno de sua casa, região da Zona Sul da cidade e me espanto com alguns detalhes sórdidos de algo que achava não ser possível. “Minha vizinha não paga água e sabe o motivo? Por ser rica, de família graúda da cidade, sobrenome importante. Eu pago e muito, outro dia fui questionar o medidor quando auferindo minha conta, perguntei a ele e foi lacônico. ‘Ela não paga, nunca medi na casa dela, o DAE pede para mim pular essa casa. Tem várias assim, que a gente nem mede’. Ela estava puta da vida, citou o sobrenome da felizarda e falava da sua ascendência, família dentro do que é conhecido como “forças vivas” da cidade e daí, creio ser o motivo de estar isenta de ficar pagando essas bobagens de contas mensais, algo reservado somente para os pobres mortais e os que, infelizmente não nasceram com o sangue azul. Se ela me permitir, numa conversa que terei pós-fogo (o nosso nem sei se vai passar um dia), vejo como faço uma denúncia junto aos órgãos competentes, tentando puxar o fio desse novelo.

Reencontro na rua velho conhecido, antes carroceiro, hoje catando migalhas pelas ruas, desde papel, vidro, plástico e tudo o mais que possa ser revertido em alguma comida para ele e a esposa. Caminhando juntos pelas ruas e com um de um desses tantos carrinhos, vasculhando sarjetas e lixos, no sábado, poucas horas após Lula ter sido levado para a prisão. “A carroça e o cavalo tive que vender e o fiz muito mal, pois nunca a vida esteve tão apertada como agora. O fiz para saldar umas dívidas, dessas que não tinha mais como arrastar”. Conseguiu o carrinho não se sabe nem como e com ele tenta continuar trabalhando para não passarem fome. Pergunto sobre o dia de hoje e ele se espanta: “Conheço o Lula, mas nem sabia que iriam prendê-lo. Verdade? E por que? No tempo dele eu tinha não só a carroça, mas fazia serviço de carreto, tinha dinheiro, pouco, mas todo dia. Hoje trabalho muito e mal dá para comer. Nem sei como pago água e luz. Mas me diga, pra mim é novidade sua prisão, tive que vender também rádio, geladeira e a TV, não sei mais de nada”.

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