domingo, 2 de dezembro de 2018

AMIGOS DO PEITO (153)


COMO GANHEI O DIA NO LANÇAMENTO DO LIVRO "OLHARES", O DOS 15 ANOS DO HOSPITAL ESTADUAL


Foi na noite de sexta passada, 29/11, no salão de entrada do Hospital Estadual. Parece que foi ontem, mas já estão completando 15 anos. Um livro relembra o fato e fotógrafos são convidados para registrar o seu interior, pacientes e acompanhantes relatam algo da vivência em suas entranhas. Por causa de alguns amigos dentre os fotógrafos vou e represento também Ana Bia Andrade, dando aula naquele momento. Ouço parte das falas e uma me emociona, a da representante dos fotógrafos, Loriza Lacerda de Almeida (que pena, perdi de gravar e registrar seu depoimento). Somente uma pessoa lembrou o Hospital ter sido possibilitado por Tuga Angerami, mas gostei quando ouvi a citação e depois fui cumprimentá-lo pela acertada lembrança. Tudo rolou a contento, comprei o livro, cuja arrecadação, leio, será destinada para ações de Humanização no próprio hospital.

Dentre os fotógrafos presentes, coletei dedicatória dos amigos, Loriza Lacerda de Almeida, Calil Neto, Denise Guimarães, Quioshi Goto e Denise Joaquim. Olício Pelosi escapou do local tão logo terminou o evento. A surpresa veio do grandalhão e com uma carinha de quem já presenciou tudo na vida, o fotógrafo Calil Neto, com seus mais de 40 de estrada. Somos amigos internéticos e não nos conhecíamos pessoalmente. Viro para ele entregando o livro com a caneta estendida: "Te conheço pelas fotos e agora pessoalmente". Ele para tudo, segura na minhas mão, olha bem firme na minha direção e diz: "Você não é o HPA, o Henrique. Queria também te conhecer. Gosto muito do que escreve, mesmo não tendo concordância com tudo e queria mesmo te encontrar. Tenho algo pra te presentear, se quiser é claro".


A partir daí passa a contar o que irá fazer de sua vida daqui por diante, aos 60 e poucos anos, cansado desse lado do mundo. Conseguiu à duras penas amealhar uns valores, aposentadoria junto e decidiu sair pelo mundo. De posse de um bela bicicleta quer sair daqui, no máximo em fevereiro próximo, pouca bagagem, uma pequena barraca e um cartão de banco no bolso. Seu rumo inicial será as Chapadas encravadas no coração deste país, que já conhece e irá revisitá-las em detalhes. Sai pedalando daqui e me disse não ter mais intenções de voltar, para desespero da irmã, me apresentada ali no ato. "Vou estar em permanente contato", ela me diz. A decisão está tomada e está nos preparativos finais. No evento trouxe um belo livrão de fotos e presenteia Loriza. Faz isso com diletos amigos e considerados. Ele me envolveu de uma certa forma que, mesmo não sendo indelicado com ninguém, não consegui mais falar de outra coisa, tal o arrebatamento pelo tema e pelo sua pessoa.

Mas o que me toca nesse cabimento? Sim, Calil reservou algo para mim. "Henrique, leio você e percebi que gosta muito do Henfil (havia publicado um texto sobre ele um dia atrás). Tenho a coleção das revistas do Fradim, editadas por ele décadas atrás. Você tem?". Já prevendo o que viria digo: "Tive. Décadas atrás doei para o ator Paulo Betti, quando esse estava montando o espetáculo Revista do Henfil e hoje, recuperei alguns exemplares esparsos, pouca coisa", digo.

Ele me segura pelos braços: "Pois não vou levar nada disso na viagem, nem tem como e para ti reservei essa coleção. Ficaria muito contente se a aceitasse como um presente de amigo e admirador". Caio das pernas. Claro que aceito, já estava a ponto de pedir o endereço e se possível passar amanhã buscar. Com seu jeito manso e calmo, desses que meticulosamente calcula cada gesto, não me deixa tocar no assunto: "Pego seu endereço pelas vias internéticas e nos falamos na sequência".

Ganhei meu dia. Confesso, nem deu tempo de folhear no local o belo livro de fotos e registros, pois fui envolvido por outro clima. Flanei no lugar, divaguei aqui e ali com outro tanto de pessoas, mas o ocorrido com o Calil, que só conheci ali naquele momento foi para mim uma prova irrefutável de que, existe salvação para esse mundão querendo se perder de vez. Saio de lá com a sua história na mente e imaginando como seria a tal viagem, ele grandalhão daquele jeito, montado numa bike e pedalando mundo afora, sem eira nem beira, enfrentando tudo o que vier pela frente, tudo para se ver livre das amarras que nos prendem a lugares e situações. Calil está se despregando, se libertando e soltando de vez o que lhe resta de cordas o prendendo com essa aldeia. E fico com parte preciosa do que conseguiu amealhar ao longo do tempo, guardou com tanto carinho e irá com o devido louvor para o acervo do Mafuá. A cada história dessa acontecendo comigo, fico desconsertado, mas com a certeza de que, algo de bom eu devo estar plantando em tudo o que faço.

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