segunda-feira, 1 de julho de 2019

O QUE FAZER EM BAURU E NAS REDONDEZAS (115)


HISTÓRIAS DO FERNANDÃO, HÁ MAIS DE TRINTA ANOS COM SEU TEMPLO BAR

Sivaldo Camargo, meu dileto e considerado amigo, ainda ontem numa mesa de pizzaria me dizia: “As histórias passadas no Templo Bar são merecedoras de um registro, talvez um livro”. Ciente disso, conto algumas, após mais uma passagem por lá no último final de semana, acompanhado deste amigo, da companheira de todas as horas Ana Bia e de dois experts em ballet, Arilton e Luiz, de Salto para o mundo. Jantamos por lá dia desses e tivemos o prazer de ter o Fernando, como sempre nos brindando, quando o movimento diminui, sai da cozinha e vem sentar junto a nós para aquele papo recheado das inenarráveis histórias, enfim, são mais de trinta anos de funcionamento e, reforçado por mim, servindo o melhor filé da cidade.

Conto algumas:


Roberto Sion é um baita músico, dispensando apresentações. Quem dele nada conhece, basta uma clicadinha no google e saberá da imensidão do sujeito. Amigo pessoal do Fernando, até antes dos tempos quando este teve também um bar/restaurante em Sampa, continua vindo para Bauru, sempre se apresentando no Templo. Numa das primeiras vezes, ele se apresenta e todos batem palmas em pé ao final, inclusive o dono do estabelecimento. Terminado o show vão jantar e Fernando como sempre capricha. No meio do regabofe, Sion se levanta pede a palavra e diz: “Agora sou eu que bato palmas e reverencio com todo louvor essa comida”. Fernando relembra em detalhes e cheio de orgulho a homenagem recebida.

Noutra feita o mesmo Sion se apresentou por ali ao lado de outro grande da música instrumental brasileira, Laércio de Freitas, pai da atriz Talma de Freitas. Terminado tudo, noite fria, Sivaldo se encarrega de levá-los embora e saem caminhando pelas ruas. Quando passam diante da igreja Santa Terezinha, envolta no nevoeiro da noite, um olha pro outro e se dizem: “É aqui”. De posse dos instrumentos tocam nas escadarias da igreja algo presenciado só por Siva. Algum tempo depois, Fernando indo embora passa também pelo local e se junta ao grupo, que ali permaneceu até quase clarear o dia. Ambos dizem ter ali acontecido uma cantata de recordações inesquecíveis.
Fernandão, o chef do Templo.

Outro que esteve por ali e retorna todas as vezes em que aporta por Bauru é Francis Hime. Na primeira vez, cantou na cidade e foi ali jantar. No meio do jantar liga para esposa no Rio, Olivia Hime e lhe diz: “Bem, você sabe, estou em Bauru, janto agora num lugar que você precisa conhecer. Estou aqui comendo e repetindo um filé, desses que a gente faz de joelhos diante do mestre da cozinha”. Tempos depois, Olivia ao se apresentar na cidade fez questão de conhecer pessoalmente o lugar.

Yamandu Costa passou algumas vezes pelo bar e numa estava acompanhado da namorada. Ela estava o vigiando, não deixando ele tomar cachacinha. Mesa animada, ele disfarçava para beber escondido e nas saídas dela para ir ao banheiro, Fernando e Siva relembram a sua fisionomia para que trouxessem rapidamente outra talagada. Ela voltando tudo voltava ao normal e ele pedia para que todos ouvissem: “Me tragam mais um refrigerante”.
Paulo Keller n'O Templo



Inesquecível a passagem de Jards Macalé pelo local, hospedado na casa do Fernando, uma com um lindo mosaico em azulejo na virada da Araújo Leite. Ele acordava cedo, se punha à janela e já tomava o café cantarolando, cheio de histórias mil. Dizem ter sido trabalhoso sua despedida, pois dali não queria mais se afastar. Outro que pernoita sempre na casa é Arismar do Espírito Santo, compadres um do outro e todo ano, nem que seja uma única vez, baixa na cidade, se hospeda com Fernando e encanta os abnegados que, avisados, baixam ao local e de queixo caído, contemplam o que de melhor existe em musicalidade neste país.

Paulo Keller era cadeira cativa no bar e tinha um lugar só seu, existente até hoje no bar e agora ocupado por diversos personagens, que dele se revezam e reverenciam o titular do pedaço, falecido anos atrás. É o balcão principal, logo na entrada, cotovelo quase de frente para a Sônia, ali no caixa. Dali Keller vigiava todo o local, sempre com seu copo à mão e aquele sorriso arrasa quarteirão, que tanta falta faz não só ao lugar, mas também para arejar ambientes variados e múltiplos. Só do Keller existem uma variedade de histórias ali ocorridas, pois ele batia cartão, mas necessitando serem confrontadas as variadas versões, pois uns dizem uma coisa, outros outra.


Encerro com uma ocorrida comigo dos tempos quando estudava História na USC e por lá passou um grupo de latinos, cantaram nos corredores da universidade com o chapéu estendido e cairam nas graças do nosso grupo. Ligo para o Fernando, explico a situação, pois queríamos continuar ouvindo aquela boa música noite adentro. Ele me diz, "traga logo, o jantar deles está garantido". Foi o que fizemos. Por lá ocorria naquela noite a comemoração do aniversário do arquiteto Jurandir Bueno Filho e este, reunido com seus amigos, ao ver a chegada do grupo e ouvindo os cantantes, se junta a nós, canta e dança, numa memorável e inesquecível noite, ainda dos tempos do quintal no local, sem a cobertura da nave principal.

Termino com um lamento, expressado pessoalmente pelo Fernando quando desta última passagem, veio à mesa com duas cervejas e nos disse para encher a todos de orgulho: “Vocês tem voltado muito pouco e confesso, tenho vindo cada vez menos me sentar pra conversar com clientes nas mesas. Muitos comem, a maioria conheço, mas intimidade e papo mesmo, conversa fiada e ao pé do ouvido, cada vez menos. Peço, voltem mais, por favor”. Tocados, vamos todos juntar dinheiro em cofrinhos, tudo para atender tão refinado e sugestivo pedido. O Templo Bar mantém música ao vivo, com o melhor de Bauru e região, três dias por semana, terça a quinta, merecendo também por isso efusivos elogios e aplausos.

OBS.: A foto do Paulo no dito balcão é de minha autoria. Tive o prazer de registrar esse inolvidável momento.

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