quarta-feira, 25 de dezembro de 2024

AMIGOS DO PEITO (132)


REENCONTROS POUCO ANTES DO NATAL, GERANDO CINCO ESCREVINHAÇÕES
Andarilhos como eu podem ter muitos pela aí, destes com gosto de andarilhar e ir se reencontrando com gente. Num dia antes do Natal vesti minha camisa de malandro, herdada de minha sogra Darcy, da qual gosto muito, gola canoa, das minhas preferidas e com ela, me sentido mais bonachão, escapuli de casa e fui esbarrando num aqui, outro acolá. Tirei até algumas fotos, aqui expostas, como carne seca ao sol. FaleI destes cinco:

Eu e CARLÃO GRANDINI – Ele é meu tio, gente que gosto demais da conta. Foi o esposo de minha tia, irmã gêmea de minha mãe Eni, ela Edi. Moraram numa inesquecível casa, a primeira na vila lá junto do IBC. Meu tio sempre foi boêmio, contumaz dançarino e assim como eu, gosta de escapulir. Jogou baralho até não mais perder e depois aquietou o facho, porém sem nunca parar de dar uns passos nos bailes do Luso. Aposentou e o vejo cada vez menos. Tem três filhos, dois bolsonaristas e sei, o bicho pega nas conversações, pois ele não se verga. Estava entrando no Banco do Brasil da praça Rui Barbosa e ele saindo. Foi um baita abraço e ele, me pedindo para não esmorecer, pois os FDPs ainda não foram todos presos. Ele gosta de assistir pela TV as sessões da Câmara dos Deputados e do Senado. Assisti e depois, como todos que o fazem, fica muito puto da vida. Hoje, ele continua dirigindo seu carro, mesmo já tendo alcançado a marca dos 90 anos, porém, continua altivo e soberano. É desses que, ninguém verga fácil. Defende Lula com unhas e dentes, pois sabe o que teríamos não fosse ele ter voltado. Não se conforma com estes hoje propondo matar adversários. Conversaríamos horas, pois temos muita coisa em comum. Meu tio soube ser gauche na vida, mesmo que isso tenha lhe trazido alguma dor de cabeça ao longo da vida. Porém, de algo tenho certeza, ele não se arrepende de nada. Adoro reencontrá-lo, continua todo pimpão, cuidando da sua Zo, sobrando tempo para assuntar sobre como anda este País e até para vez ou outra matar saudade das andanças pela Batista e adjacências.

Eu e SUCA MIRANDA – Eu a conheci como servidora da Unesp e logo depois, quando aportei num Festival de Música Sertaneja, realizado na praça principal de Reginópolis, descubro ser ela cantante como poucas. Ela e seu marido formavam uma dupla, digo divinal, pois cantava só sertanejo raiz. Ela, com um chapelão de caipora na cabeça e com aquele baita sorriso no rosto é pra se apaixonar mesmo. Seu marido que o diga. Ela grandona, ouço dizer, encantou a Unesp inteira e depois da aposentadoria, não aquietou o facho. Faz da cantoria seu modo de prolongar a passagem por este mundo. Só de olhar, sei que a danada vai viver muito, pois fazendo algo que gosta, não tem hora para ir embora. Ela estava lá dentro da agência do Banco do Brasil, resolvendo pessoalmente alguma coisinha, dessas que a gente tem que ir presencialmente. Ela me viu, a mim e ao Zé de Pederneiras, outro servidor da Unesp, se achegou e a prosa foi até quase o horário do banco fechar. Ela fala sorrindo, o que é uma maravilha, pois não se esconde, nem tem como, abriu a boca, a gente já tem a plena certeza de estar diante de baita mulherão e dessas sabendo se impor, dominar a cena, ser, fazer e acontecer. Quando a interpelamos do que anda aprontando, sorriu e disse ter cantado em dois lugares nos últimos dias, o que nos causou baita inveja, pois nem cantamos, nem dançamos, quando muito saímos de casa. Suca preenche os espaços por onde circule.

EU e o ZÉ ROBERTO REGINATO – Ele é de Pederneiras e não sai de Bauru. Aqui se aposentou, atuando lá no Laboratório de Fotografia, campus da Unesp Bauru, onde além se der um renomado técnico, entendido dessa hoje quase esquecida técnica de revelação de filmes fotográficos, quando se aposentou, montou na área de sua casa uma oficina de marcenaria. Coisa linda, outro dia fui lá e fiquei encantado, ele deixa o carro na rua, mas não deixa suas madeiras dormir ao relento. Minucioso, hoje mora ele e o filho, esse estudando engenharia e cada um ajudando o outro nessa peripécia que a convivência humana. Tenho duas fotos dele na sala de casa, uma tirada quando de uma passagem por aqui do escritor e jornalista Fernando Moraes, creio que de quando foi secretário de governos estaduais. A generosidade em pessoa. Estava aguardando o atendimento no banco, quando sou tocado nas costas. Reconheci sua voz de bate pronto e ficamos a parlar, chegando minha vez e a dele, ambos adiando o atendimento. Tudo piora quando a Suca chega junto, daí só mesmo o segurança para avisar que o banco iria fechar. Eles começaram a relembrar feitos e fatos dos tempos quando ambos atuaram lá na Unesp, cada qual em setores distantes, mas na qualidade de servidores públicos, estavam sempre se encontrando, na luta e lida diária, algo sempre cheio de muitas rememorações. Melhor que tudo, o ali acontecido não teve nada marcado antecipadamente, pois aconteceu por acaso e quando isso se sucede, lembranças são afloradas e presenciei diálogos memoráveis. Duas grandes figuras humanas.

Eu e o PADRE MATHEUS BRITO – Eu o conheci quando dividia as atenções lá na famosa igreja da dissidência, a Humanidade Livre. Ele e padre Beto fizeram e aconteceram, depois quando algo começou a se dissipar, cada qual alçou vôo próprio e assim, vida que segue. Hoje, minha irmã Helena, que gosta muito dele e de sua fala, me diz estar atuando na O Povo do Caminho, fazendo algo na contramão de tantas outras, sejam católicas ou evangélicas, na contramão da ressignificação religiosa e, mais que tudo, emancipando o povo para sua libertação. Acredito pouco em religiões, mas muito em alguns religiosos, como frei Beto, frei Boff, padre Lancelotti e na pregação deste Matheus. Cruzo com ele, mais barbudo que dantes e chego pelas costas, sem que me veja e o provoco: “Tem padre parecendo cada vez menos com o padrão de padre”. Rimos juntos e interceptamos um dos corredores do supermercado Tauste, ali da Rio Branco. Papo bom é prolongado até não mais poder, mas como o dia era de últimas comprinhas antes do convescote do feriado natalino, tínhamos pouco tempo. Ficamos de nos ver mais, sem marcar nada de concreto, porém, Matheus é papo reto, psicanalista e padre, convicto que, algo transformador pode ocorrer também pela via religiosa. Eu busco outro caminho, ele é feliz e está, como eu, atrás de outro mundo possível, cada qual fazendo o que pode nesta busca. Sempre bom prosear com ele e, pasmem, falamos de tudo, quase nada de religião.

Eu e ANA BIA ANDRADE – Ela, como até as pedras do reino mineral sabem é mina cara metade. Desde que aqui aportou, creio eu, uns 15 anos atrás, estamos juntos e pelo que imagino, assim continuaremos ad eternum, ou até quando forças existir para nos conduzir adiante. Sou um reclamão, mas reconheço, ela gosta muito de mim, eu dela, tocamos nosso barco, enfrentamos tempestades e tsunamis, mas inabaláveis, continuamos de mãos dadas. Eu, não bobeio, sei ser ela muito forte, força advinda também de sua crença e profissionalismo, quando comigo cruzou, bati os olhos, rodeei, assuntei e me certifiquei, sem pestanejar, estava diante de alguém que iria comigo atravessar esse Rubicão. Ela é a força que me leva adiante, me incentiva e também, me freia muito, pois assim não fosse, já teria dado com a cabeça na parede inúmeras vezes. Gostoso ter alguém assim. Viajo com ela e só falo o português, ela não, poliglota, abre portas e caminhos. Nos completamos, cada qual com sua especialidade dentro da vida. Neste Natal, optamos por não sair de casa. Aqui permanecemos, isolados de tudo, nós e nosso bacalhau, que ela diz não ter ficado a contento, mas o comeu mesmo assim. A gente se curte ao nosso modo e jeito. Uma ajuda mútua, necessária e desta forma, achei que ela teria dificuldades para se entrosar nesta insólita Bauru. A levei para os mais diferentes cantos, conheceu mundos e fundos e hoje, vez ou outra, me surpreende, pois está a conhecer mais gente que eu. Se safou, deu seus pulos e se instalou de vez como mais que bauruense. Eu sou o Henrique da Ana Bia e ela a Ana Bia do Henrique. Somos um casal imperfeito, porém, cheios e acertos, muita coisa em comum. Isso nos faz tocar juntos o barco da vida.

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