sábado, 5 de fevereiro de 2011

BEIRA DE ESTRADA (12)

DIPLOMADO E FIRME NO VOLANTE - crônica publicada na Revista do Caminhoneiro, tiragem 100 mil exemplares, edição 275 - janeiro de 2011
Conheci Cardoso numa animada roda de conversa, num posto perdido dentro da imensidão desse país continente. Sua história se mostrou diferenciada desde o princípio. Notava sua animação entre amigos e algo me chamou a atenção. Alguns detalhes, talvez a fala mais rebuscada, fluente, uma riqueza maior de detalhes na exposição dos assuntos e uma demonstração de estar bem informado sobre tudo. Bastou me aproximar para saber dos motivos.

Diz ter começado cedo, aos 19 anos, na sua Imperatriz, no Maranhão, no amado Nordeste. A persistência em tudo que faz na vida, sua marca pessoal, foi também usada para conseguir completar um curso superior. Isso mesmo, Cardoso tanto fez que conseguiu seu intento, concluir o curso universitário. Não se sabe bem nem como, conciliando as viagens, nunca abdicadas, com os bancos escolares. Perguntado sobre isso, conta só ter concluído o curso pela tolerância e compreensão de professores e diretores da faculdade. “Entenderam minha situação e fui aproveitando as brechas, até que finalmente, com quase seis anos de labuta, tornei-me professor de História”, conta.

“E por que continua nas estradas?”, pergunta inevitável, feita por muitos, bastando saberem que mesmo diplomado continua disposto a continuar pilotando um caminhão. Responde sempre com certa animação, pois diz gostar tanto do curso feito, como da vida que leva e da qual não pretende abandonar. Primeiro diz que estudou não para mudar de profissão, pois sempre foi feliz na e com as estradas. Fala também da sorte de ter encontrado um empregador que o compreende e estimula. Esse até investiu nele, botou fé que ele era sincero quando afirmava que a estrada era sua razão de viver.

Tem mais. O estudo, segundo repete sempre, veio para complementar a curiosidade e descobrir a razão das coisas, a procedência dos acontecimentos, uma ampliação de conhecimentos. Foi o que fez. Quando lhe perguntam se encerrou o ciclo de estudos, diz um sonoro não. Concorda que, talvez a dos bancos escolares sim, mas não a que leva consigo em sua boléia. Carrega planos de pesquisa em algo a envolvê-lo nas horas vagas. É sobre a rota do ciclo do ouro mineiro, era colonial, que nada coincidentemente é quase a mesma onde roda com seu bruto. “Nada melhor do que conhecer a história do trecho onde rodo, desde os primórdios. Isso me contagia. Viajo na estrada e nas pesquisas”, diz.

E, segundo ouço, ele e outros de sua empresa ficaram todos pimpões no final do ano encerrado. Tudo porque, ele que já tem o grau máximo na carteira de habilitação para estrada, foi recompensado, recebendo um polpudo bônus adicional de final de ano. Espécie de incentivo para continuar se profissionalizando e não abandonar a profissão. Ele bem que ouviu na TV que faltavam profissionais com sua qualificação. Foi um algo a mais, usado em partes para incrementar a continuidade de suas pesquisas. Cardoso não menospreza quem atua no magistério, mantém o diploma lá na parede de sua casa, só em exposição, preferindo continuar com os pés mais do que fincados nas estradas. “É aqui que vou conferindo in loco o que aprendo com os estudos. Mais para frente vou até fazer algo sobre a história do caminhoneiro brasileiro e nada melhor do que um com conhecimento de causa para fazê-lo. E esse alguém poderá ser eu”, conclui.

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