quinta-feira, 1 de janeiro de 2015
CENA BAURUENSE (128)
“JÁ ESTOU CANSADO DE VIRAR O ANO E NÃO VIRAR A MESA” Essa lapidar frase dando título ao meu primeiro escrito do ano não é de minha autoria, mas de um dos maiores poetas dessa terra, LÁZARO CARNEIRO, digno representante e defensor não só do cerrado, mas do que ainda nos resta de dignidade num país querendo se perder na lambança do tempo. Pessoas como Lázaro insistem em resistir e eu vou com eles, aliás, estou na deles. Tento fazer as palavras ditas e seguidas por ele como minhas em tudo o que digo e faço. Começo o ano e a primeira frase que escrevo na minha agenda de ano novo, a desse 2015 é essa do Lazinho, uma espécie de mantra para mim nesses próximos 365 dias pela frente. Estamos mesmo virando muito ano e virando cada vez menos as mesas. Acomodados, parece que sem forças para reagir não podemos mais deixar o barco rolar. Algo precisa ser feito e na sacada do poeta essa incomodação que também é a minha e de tantos outros (as).
Aproveito a frase e suas várias possibilidades de interpretação para resenhar três escritos produzidos por mim no último dezembro. Três dolorosos momentos onde a mesa não foi virada.
Em 05/11/2014 publiquei o texto “O Solitário da Tenda urbana”, com fotos de Alex Mita, contando a história do sr WILSON JOSÉ DE OLIVEIRA, morando numa tenda lá nos altos da avenida Moussa Tobias, nômade e sem ninguém ao seu lado. Eis o texto: http://mafuadohpa.blogspot.com.br/2014/11/memoria-oral-169.html. Momentos antes da passagem do ano passo no local e percebo que a tenda não está mais lá, foi removida. Fico incomodado. Pergunto aos comerciantes nas redondezas e hoje pela manhã, primeiro dia do ano, descubro dua nova morada, num imenso terreno bem atrás do Posto de Saúde da Vila São Geraldo. O vejo e vou até ele. “Foi o rapa. Chegaram e me deram um curto prazo. Ou tirava tudo, ou derrubariam tudo. Transportei tudo para cá, mas hoje estou chateado, chego aqui e entraram na minha tenda. Essa molecada não me dá sossego, eu junto papelão e latas e eles roubam de mim”, conta. Não consegui ainda identificar quem seria esse “rapa”, mas lhe digo que agilizarei a ida ao INSS e Receita Federal ver das possibilidades concretas de viabilizar suas aposentadoria. Do local anterior, debaixo de uma frondosa árvore, hoje piorou, pois a montou diretamente ao relento e quando estive com ele, sob o inclemente raios solares.
Em 21/12/2014 publiquei o texto “Andreza vai ter esse filho no meio da rua...”, repercutindo o que todos os moradores das imediações dos trilhos urbanos de Bauru, proximidades da rua Antonio Alves vivenciam a todo instante. Essa moça, ANDREZA OLIVEIRA CAETANO está com a gravidez beirando os nove meses e continua pernoitando debaixo das marquises aqui da região. Eis o texto: http://mafuadohpa.blogspot.com.br/search?q=ANDREZA+OLIVEIRA+CAETANO. Daquela data até hoje nada mudou. Ontem, 31/12 veio até o meu portão e me pede dinheiro para um sorvete. Como recusar dar um dinheiro para uma mulher grávida e prestes a parir? Dei. Dei também dias atrás camisetas, mas no retorno seguinte já estava sem nenhuma delas. Levaram tudo. A vida das ruas é assim, nada é seu, pois a qualquer instante aparece um mais forte e exige aquilo para si. E leva. E ela voltou hoje, havia conseguido algo para comer e queria misturar aquilo tudo com maionese, algo que segundo ela, lembra muito esses dias de Natal e Ano Novo. Por sorte tinha na geladeira e lhe arrumei. Hoje, numa foto tirada quando a noite já caia sobre acidade, disse ter passado o dia na casa da mãe, mas não consegue ficar lá e voltou para as ruas. Sai do meu portão e some na escuridão da noite. A filha, que diz se chamará GABRIELA, pode nascer a qualquer instante.
Em 23/12/2014 saiu primeiro publicado no Jornal da Cidade e depois no blog e facebook o texto, “Chega o Natal aos muitos Reginaldos...”, contando a saga de REGINALDO CAMPANHOLLI DA SILVA, um jovem vivendo do que vendo nos sinais de trânsito da cidade e tendo que fazê-lo em mais de R$ 40 reais dias, para não pernoitar na rua. Eis o texto: http://mafuadohpa.blogspot.com.br/search?q=Reginaldo+campanholli. Após a publicação do texto enviei carta de agradecimento do JC, sendo a mesma publicada na edição de 27/12: “Primeiro o agradecimento pela publicação em destaque do meu texto. A repercussão sempre é muito além das expectativas. O melhor de tudo veio do Reginaldo, no final do dia: “Meu telefone não parou de tocar. Ganhei tanta coisa que você não tem nem noção”. Ele me contou, foram calça, camisa, cuecas, meias, sapato social e uma primeira proposta de emprego. Esse, acredito, o melhor presente de Natal para mim e todos do JC. Pintando o tal emprego, daí a certeza de ser esse mesmo um dos mais relevantes papéis da imprensa. Podemos e devemos fazer muito mais e até transformar esse país. Imagina uma união pela sua transformação? Boas entradas e saídas para tudo e todos (as)!”. Volto a falar por telefone hoje com Reginaldo e ele em Jaú, tentando o melhor para si, quase uma nova possibilidade de reconciliação com a melhor pessoa a lhe prestar ajuda nesses últimos seis anos, a mulher com quem morou e volta a lhe abrir as portas. Falo com ela, diz que o mais sensato seria ele ter um emprego de carteira assinada e lutará muito para conseguir esse intento. Eles estão se entendendo muito bem, mas o emprego ainda não pintou, mas ambos não desistem. É o que também torço e muito, para que a matéria no jornal possa lhe possibilitar isso. São três improváveis viradas de mesa em pleno andamento, fora as outras todas.
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