segunda-feira, 18 de dezembro de 2017

FRASES (163)


PARA CONTINUAR CHORANDO – FIM DO CICLO DE “CAROS AMIGOS”

Uma semana recheada de muitas dores. Mal chego em Bauru, ainda tentando se recompor de dores familiares irreparáveis, aporto pela manhã na banca da Ilda e lá escuto seu doído lamento sobre as dificuldades pela banca fechada e o acumulo de contas de uma sob a outra, praticamente in viabilizando qualquer tipo de festa de final de ano. Olho para a estante e lá algo que a primeira vista não acreditava ser possível. Na capa da edição de dezembro da revista mensal, a “Caros Amigos”, uma manchete estarrecedora: “VALEU! O fim do ciclo e as mudanças no mercado da informação”. Como ilustração uma montagem com muitas das capas da revista. Ao folhear a revista, o editorial da página 3 não deixava dúvidas: “Fim de Caros Amigos”. Virando mais duas folhas, ocupando duas páginas e com um imenso título, “AVANTE!”, escrito pelo diretor geral da editora que publica a revista, Wagner Nabuco. Não havia mais dúvidas, este é a última edição da revista saindo nas bancas. Estou cansado de chorar nesta semana e sento ali num banquinho no meio da banca, espero o vento bater na face e falo para Ilda: “A revista Brasileiros fechou meses atrás, a Carta Capital se segura com unhas e dentes, a Revista de História da Biblioteca Nacional não resistiu e agora, mais essa, a Caros Amigos não tem mais como seguir adiante”. Juntamos nossas dores e tentamos ser altivos conosco mesmo, enfim, resistir é preciso.

Saio lendo a revista enquanto paro nos sinais. Lia em voz alta, sozinho, num doloroso lamento, sentido, triste demais da conta. Passo na banca do Cláudio, ali junto do Supermercado Paulistão da Nações e compro mais um exemplar. Um quero emoldurar, com a capa e charge do Claudius, com um ratão levantando um cartaz e dizeres de escracho para os bestiais que favoreceram este país estar hoje na situação onde se meteu. O outro vou guardar como rara preciosidade. Gosto demais dessas duas bancas, sou amigos dos jornaleiros e divido tudo o que leio entre ambos. Ambos passam pelas mesmíssimas dificuldades de todas as publicações de resistência. Penam e padecem diante de tantas repetidas barbaridades. Folheio a revista e leio algo do lamento do Wagner Nabuco: “A revista deixa de circular em um momento em que a produção, distribuição e consumo de informação passam por profundas mudanças, ataques de fake news, sites maliciosos, youtubers e blogueiros duvidosos. Neste momento em que, mais do que nunca, o bom jornalismo faz a diferença. Apesar da despedida, sabemos, como todos os lutadores por um mundo mais justo, que é hora de se unir, recompor as forças e as estratégias e seguir adiante em busca de horizontes para dias melhores. A luta vale a pena”.

Noutro texto, com a chancela da redação, o “Marcas da História: Ontem e Hoje”, algo marcante: “Somos herdeiros dessa mídia que existe desde o Império, e que na ditadura teve um papel muito importante. É uma tradição de gentes que se unem e abraçam um projeto de produzir um bom jornalismo contra-hegemônico”. Leio isso e a memória viaja com o tempo. Comprei a primeira edição da revista nas bancas e já no número dois tem uma carta minha lá publicada, ou seja, a acompanho desde os cueiros. Vivenciei todos os seus momentos e o momento de hoje é para chorar, igual o que chorei tempos atrás quando o Pasqui, depois o Pasquim 21 e a Bunda fecharem. O mesmo sentimento quando não mais encontrei o Coojornal nas bancas, quando o Folhetim deixou de ser encartado com a Folha SP, quando a Revista de Domingo do Jornal do Brasil feneceu e logo a seguir o jornal impresso por inteiro. Olho para todas as capinhas ali na capa desta última edição e em cada uma delas, um entrevistado e uma conversa dessas de entornar o caldo. Chego ao mafuá, descarrego a mala da viagem feita para Sampa e antes de qualquer outras coisa, faço a festa com o cachorro a me receber no portão, coloco tudo num canto e vou ler a Caros Amigos. Não tentem me animar, hoje mais um dia perdido. Mas como li na própria revista: vamos nos unir e seguir na luta e nas ruas, pois do contrário, entregando as armas, não existirá mais razão para viver. A tristeza continua.


A cada uma do campo democrático que se vai, sem peças de reposição novas em sua substituição, algo de muito triste no horizonte.

Não me separo de minha coleção, agora mais e mais junto de mim. Eu e minhas raridades.

2 comentários:

  1. COMENTÁRIOS VIA FACEBOOK:
    Jussara Nabuco Canella Não temos palavras pra descrever o que sentimos...pelo meu irmão que vê sucumbir seu projeto político ideológico e seu negócio, assim como é menos informação , mais alienação 😞😞😞

    Anaí Nabuco Caro amigo, nos acalenta ler seu texto e saber que podemos, neste momento, compartilhar nossa tristeza. Nosso lamento, em especial de meu irmão Wagner Nabuco de Araujo, um profissional de competência ímpar, é profundo mas não de desistência. Depois da noite, o sol nasce. A luz voltará e a luta valerá a pena! 💪🖤

    Maysa Blay Que difícil está tudo isso. Os tempos, e os tempos no Brasil. Um Brasil que se mostra a cada vez menos leitor, menos debatedor, menos interessado em pensar. Que triste. Que horizonte estranho nos espreita.

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  2. Triste , mas a vida é feita de ciclos . O término desse ciclo não significa derrota , muito pelo contrário , significa início de um novo ciclo , de uma nova vida , agora bem mais fortalecida pela experiência adquirida , e com mais excelência para entender que união e luta são essenciais para viver . Wagner , o momento é de dor , em todos nós , mas quantas dores já não passamos e não sabemos quantas virão , mas temos certeza de que nenhuma delas irá sobreviver . Hj lágrimas de tristeza , amanhã lágrimas de orgulho por ter deixado uma marca na história , pela luta por uma sociedade mais justa , mais igualitária , mais transparente , mais leal , mais ética , com menos hipocrisia . Infelizmente o momento em que estamos , esses valores foram esquecidos , ignorados , deixados de lado e maldosamente invertidos , mas eles são norteadores e nos fazem ter mais força para virar o jogo ..... e o jogo vai virar !!!
    Força Brother , estamos e estaremos juntos em todos os momentos !!!
    Ouça o que diz Guilherme Arantes em sua canção :
    Amanhã!
    Mesmo que uns não queiram
    Será de outros que esperam
    Ver o dia raiar
    Amanhã!
    Ódios aplacados
    Temores abrandados
    Será pleno!

    Zé Canella - Bauru SP

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