quinta-feira, 15 de outubro de 2020

AMIGOS DO PEITO (178)


DIA DO PROFESSOR, LIDIA POSSAS, MINHA INESQUECÍVEL REFERÊNCIA E REVERÊNCIA
Vou escrever uma redação. Quanto tempo não pratico algo do gênero. A ideia é a de formatar um texto onde possa responder a uma clássica pergunta feita no dia de hoje, Dia do Professor: Quem é aquele professor que você tem mais recordação em toda sua vida? Sento aqui nessa máquina de fazer doido que é o computador plugado à internet e nem preciso pensar muito. Minha resposta está lépida e fagueira na ponta da língua: LIDIA POSSAS.

A maioria das pessoas possuem recordações de professoras dos seus tempos de primário, secundário, dos cueiros, eu não. A minha professora é dos meus tempos de bancos universitários, USC – Universidade do Sagrado Coração Bauru, curso de História e lá eu chegando após ter iniciado Tecnologia na antiga Fundação – tremenda decepção com Exatas, sem condições para confabular contas, desisti em dois meses. O banco onde trabalhava me mandou para Jaú e Marília, eu comecei curso de Direito na ITE, mas também vi não ser aquilo o que queria. Desisti e fiquei entre Jornalismo e História. A questão política já estava entronizada em minha vida definitivamente, tinha feito minhas escolhas e já me considerava um ser das esquerdas. Foi com esse espírito que adentrei à USC e lá, por um desses acasos e sorte - muita sorte -, me deparei com uma turma da pá virada, dessas que te transformam pro resto da vida. Levava o curso meio na flauta, com idas e vindas com essa má afamada turma até o Bar do Lori, cinco quadras da universidade, onde se estendiam as conversações revolucionárias e dali voltávamos para os bancos escolares. Alguns professores nos moviam, outros menos e assim tocava o curso, até o momento em que se deu o toque.

Uma professora de História do Brasil, carioca da gema, jeito diferente de tudo o mais ali existente. Olha que lá também tivemos o privilégio de ter aula de Dialética com nada menos que a Saletinha. Essa nos impulsionava para o lado questionador da vida e foi algo arrebatador ter tido aula com ela. Teve mais e foi com a professora carioca. Ela vinha de outras terras, outra vivência, havia chegado há pouco para permanecer ao lado do marido, um Garibaldi que fazia barcos em Arealva para transpor oceanos pelo interior paulista e aqui foi obrigada a se fixar. Foi amor à primeira vista. Suas aulas de História do Brasil me fizeram enxergar definitivamente estar diante do que queria fazer na vida, ser historiador, ler e escrever. Inesquecível uma prova sobre o Golpe de 64, onde teríamos de descrever as entranhas, motivações do ocorrido e dei o melhor de mim após suas aulas me fazendo transbordar água fora da bacia. Entreguei o texto e ela me deu DEZ. Guardei aquela prova até bem pouco tempo e quando queria transcrevê-la no meu blog, não mais a achei. Queria enquadrar, colocar na sala, mostrar ao meu filho e com todo orgulho ser a parte mais importante e imponente do meu currículo.

Lidia, mesmo sem o saber, mudou os rumos da minha vida. Me fez definitivamente entender o significado de História e de não ser enganado, ludibriado com suas versões e fantasias. Ela ocorreu de um só jeito, mas muitos a interpretam de variados jeitos e maneiras, tudo ao bel prazer das circunstâncias. Daí por diante segui meu rumo, fui ser gauche na vida, ao meu modo e jeito, trancos e barrancos, mas sem nunca mais ter se desviado de algo ali por mim fixado. Quem fez a mais significativa transformação em minha vida foi essa professora. Poderia citar outras (os) tantos, mas nenhuma outra igual a ela. Cada qual recebe o toque de um jeito, o meu se deu com uma porrada assim me desnorteando. Foi quando parei de brincar e vi que a coisa era mais séria do que imaginava. E tem mais, uma última coisa, Lidia era e é linda. Por dentro e por fora. Hoje é minha dileta amiga aqui pelos meios internéticos. Vez ou outra lhe faço um afago, algo das recordações que guardo daqueles tempos. Hoje deu vontade de escrevinhar dela e a submeto novamente, desta vez compartilhando e a marcando aqui pelo facebook. Assim como entreguei aquela prova sobre 64, aguardo ansioso a nota que dela receberei pelo atrevimento de ter revirado algo lá do passado. Eis minha professora mais que inesquecível. Hoje, eu cá com meus 60 anos, olhos para trás e sinto a necessidade de dizer isso em alto e bom som, sem ser piegas, boçal, mas como sincero reconhecimento. 

OBS.: De lá para cá muita água passou por debaixo dessa ponte e a USC nunca mais será a mesma, ou seja, creio eu, professoras ao estilo de Saletinha e Lidia Possas nunca mais terão espaço para lá darem aulas. Tivemos muita sorte, hoje os tempos são bem outros e a Educação ministrada na maioria de nossas universidades, principalmente as privadas, deixa muito a desejar. E se nada fizermos, a tendência é piorar cada vez mais.


QUEBRADAS É A SAÍDA PARA ESTE PAÍS*
"Poesia na quebrada
É das quebradas que vem as melhores poesias,
lá a poesia já nasce com sangue, mortalha e chumbo,
encharcada em lagrimas de mãe de pretinho adolescente,
de criança que perdeu o pai no corre do dia e noite,
lá na periferia a poesia é ritmada no choro da fome e do medo,
a poesia dos que são unidos nos guetos úmidos
fala de esperança em uma estrofe e de desgraça na outra, fala de vida e morte no mesmo verso
é com rima e raiva que se faz poesia nas quebradas", poeta das quebradas Lázaro Carneiro (uma das melhores e mais pulsantes cabeças desta terra sem limites).

Eu quando queria me recarregar ia para as quebradas (disse ia não por ter morrido, mas pelo impedimento pandêmico - oito meses confinado) e ali no meio da balbúrdia tudo se restabelecia, plenamente recarregado. Não tem como se recarregar no meio da perdição consumista e capitalista. O dinheiro move a gente, com ele compramos tudo, fazemos tudo, mas nada é igual ao proporcionado por tudo o que encontro de benfazejo nas/das "quebradas do mundaréu" (termo criado e utilizado pelo poeta marginal Plínio Marcos). Nada é igual a um cerveja muito bem tomada num boteco na encruzilhada do Mary Dota com o Chapadão, algo que todos os barzinhos juntos da Getúlio, mesmo quando unidos, não vão conseguir me dar. Experimente sair pra uma prosa lá defronte o Barracão do Santa Edwirges, naquele monte de camelôs ali ganhando a vida com seus pertences espalhados na calçada e o faça depois com aquele pessoal que ferve lá defronte o Confiança Max. Um tem liga pra dar com pau, outro não tem, falta o principal, o calor humano, a sensibilidade pra vida e pro que tem de mais sadio e puro. Experimente sentar e ouvir as conversas que fluem lá na barraca do Saco Murcho, debaixo do linhão do Gasparini e depois tente fazer o mesmo lá no cheiroso barzinho defronte o Villagio - existe botecos ali?

Não é a mesma coisa. Vá ter uma relação de vizinhança, papo amigável, saudável e pedir emprestado um simples abridor de latas, quando este lhe faltar lá pelos lados do Jardim América, algo tão trivial e simples nas quebradas, quando tudo é conseguido com a boa conversa e aquele papo rendendo horas de sadia conversação. Eu, vivo do lado de cá, mas com o pé fincado do lado de lá. Se hoje estou aqui, uso a frase do ex-ministro Eduardo Portella como mantra, "não sou daqui, estou aqui". Sim, viver aqui é bom, mas falta algo. O máximo que converso aqui com meu vizinho é lhe dar um Bom Dia. Aqui do meu pedaço, se consegui conversar com uns dois, algo profundo e sustancioso foi muito. Até na padaria da esquina os papos são atravessados e dia desses algo mais, o que faço para encerrar a prosopopéia. Chego com meu carro vermelho e adesivo do candidato a vereador Claudio Lago no vidro traseiro e lá, percebo ao estacionar um candidato do partido do Bozo, fazendo campanha, velho conhecido. Paro bem na frente, adesivo na cara deles. Todos se calaram e enquanto descia do carro, percebo o dono do estabelecimento falando algo para o então candidato ali presente. Imagino o que seja, algo como, "esse mora no lugar errado, aqui não é reduto dele". Chego na cara de pau, cumprimento o candidato e deixo claro que, o que faz mesmo falta lá dentro da Câmara é um candidato com a cara e as atitudes das quebradas, pois dos que defendem o outro lado já estamos cheios até as tampas. "Ou a gente muda, ou tudo continuará como dantes, piorando cada vez mais", disse. Minguou a conversa deles e assim vivencio um bocadinho do que é pensar igual as quebradas, mas morando no reduto dos que a abominam.
 
A gente precisa é urgentemente saber fazer voltar aquilo do pessoal lá das quebradas não continuar sendo engambelado, pelos tantos que chegam com discursinho renovador, todo empoados, mas só jogando bola nas costas dos interesses do povão. Será que vamos conseguir que a coisa se reverta e esse povão não seja mais enganado pelos que saem de seus redutos empoados e induzem o povo das quebradas e estes se deixem levar pela sua enganosa pompa e verve mais falsa que o Bozo dizendo ter dado cabo na corrupção? Minha modesta conclusão: a única coisa que podem ter é dinheiro. Não tem moral, pudor, decência...

* Daí quando louvo Cuba, alguns ainda se assustam, talvez por não saberem o quanto é salutar viver em paz, sem muita grana, mas fazendo de tudo e mais um pouco, livre das amarras do dinheiro acima de tudo e de todos. Se não entenderam, busque as respostas comparando um quintal das quebradas do Jardim Tangarás e dos altos da Cidade, lá nas imediações do Cristino Cabral?

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