sábado, 24 de abril de 2021

REGISTROS LADO B (42)


NO 42º LADO B A NECESSÁRIA DISCUSSÃO DA QUESTÃO INDÍGENA COM IRINEU NJE’A TERENA
Quarenta e duas semanas e em cada uma um novo personagem, com alguma ligação com essa aldeia bauruense. São 42 abordagens pela vertente oposta da mídia massiva, a hegemônica que predomina e dita as regras na opinião nacional. O “Lado B – A Importância dos desimportantes” é exatamente uma amostragem do que anda acontecendo de fato nas entranhas desta cidade, gente que faz e acontece, na maioria das vezes com muito pouco espaço, mas mesmo assim, com a mão na massa. Executores por natureza, remam contra a maré e assim demarcam espaço, território conquistado no laço, a fórceps. Este HPA cumpre seu papel, o de não esmorecer diante dessa pandemia que nos isolou de todos, nos manteve em casa, reclusos e daí, fazer o que para não enlouquecer? Eu resolvi dar meu quinhão de contribuição para mim mesmo e para tantos outros. Cá estou, buscando sempre novas ideias e em todos, algo muito singular, sempre gente com boas histórias, relatos valorosos de vida.

Hoje quem aqui comparece é IRINEI NJE’A TERENA, índio da nação Terena, origem em Avaí SP, aqui pertinho de Bauru. Muito jovem ele tomou a decisão de sair da aldeia e estudar. Assim compreendeu melhor como se deu a luta de seu povo e com esse conhecimento adquirido, acabou por se transformar num propagador de sua cultura por onde passe. Escolheu Bauru como seu ponto fixo, sua nova morada e daqui irradia para o mundo um maravilhamento de projetos e tudo o mais que consegue ir colocando em prática. Irineu bate nas onze, como se diz na gíria do futebol, pois joga em todas as posições. Ora está escrevendo, publicando, ora está encenando, montando projetos e exposições, divulgando trabalhos seus e de outros, tudo com ligação umbilical com a cultura de seu povo. Ele não é propagador somente da luta Terena, mas de todas as demais, se transformando num porta-voz indígena por onde passe. Falar com ele é se empolgar, ser arrebatado para seguir junto dele numa luta, que ele bem sabe, sem fim. A faz desde que tomou consciência de que, parado nada se consegue. Assim sendo, Irineu vai e está na luta e lida.

Hoje ele nos contará algo de sua história e como se deu o salto para vivendo fora das aldeias, continuar fora delas empreendendo a divulgação de uma cultura milenar. Ele bem sabe, a cultura indígena é bem mais velha do que os 500 e poucos anos do Brasil, pois quando aqui aportou o primeiro colonizador, o índio cá já estava e desde muito tempo. Conhecer um pouco dessa trajetória pela sua própria voz é mais que relevante. Irineu tem muito para falar e quando o faz, sempre com muita propriedade, arrebata. Essa a pretensão deste HPA nessa semana, produzir uma conversa que arraste as pessoas para outro entendimento sobre o indígena. Neste mês de abril, considerado mês do Abril Indígena, monde ocorre muita discussão sobre essa cultura, como ele mesmo ressalta em suas conversas, “todo mundo carrega no próprio sangue a nação indígena, o Brasil tem identidade indígena, Bauru é terra indígena”. Ouvir gente como Irineu é algo mais do que necessário, ainda mais diante dos ataques atuais, onde os atuais governantes não só desmerecem essa cultura, como invadem suas terras, matam seu povo, tudo com interesses financeiras. A resistência deste povo é também a luta de todos brasileiro, inserida na grande luta pela devolução do território brasileiro para quem de direito, o povo e nã oestes tantos, grileiros da boa boa convivência.

Escrevi algo do Irineu ao longo de minhas publicações no blog do Mafuá do HPA e aqui relembro algumas:
- Em 19/04/2017 publiquei: “DIA DO ÍNDIO EM BAURU E COMOS OS RURALISTAS AVANÇAM O SINAL SOB TERRAS INDÍGENAS
Impossível querer enxergar o índio como aquele numa oca como na época do descobrimento. Já se passaram mais de 500 anos e se evoluímos enquanto seres humanos pensantes, os que esperam vê-los pelados, morando e vivendo em condições precárias precisam se atualizar. Ali na gare da Estação da NOB (a mais bonita do interior paulista, segundo Loyola), do outro lado do túnel, última plataforma, escondido atrás de uns vagões sendo restaurados (ou em fase de), uma exposição mostra isso. Trata-se de uma concepção sob a assinatura da “Araci Cultura Indígena” e nela dois banners com os seguintes dizeres: “Transformação da casa do povo Terena, Guarani e Kaigang ao longo dos anos – Será que só porque o indígena mora em casa de alvenaria deixou de ser indígena?” e “Menos preconceito, mais cultura indígena – Apoie essa ideia”. Ouço pela rádio um dos idealizadores da exposição, Irineu Nje’a dizer que além de tudo, trata-se de uma “necessária provocação, uma demonstração explícita de que o índio não ficou estagnado no tempo e no espaço e aquilo de ter uma parabólica na oca e no seu interior um computador, uma TV, um celular pendurado são sinais, não de deterioração, mas de evolução, de estar sintonizado com os novos tempos, sem perder suas raízes e o sentido de sua causa”. Vou visitar a exposição acompanhado de Ana Bia e a sogra Darcy Soliva da Costa. Entendo aquilo tudo e, com a simplicidade com que foi criada, algo bem didático, sem grandes elucubrações e divagações. Algo tão simples que, nem necessitaria de maiores explicações e entendimentos. Enfim, tudo tão explícito, mas diante desse novo conceito de como tratar o índio empreendido pelo atual (des)Governo golpista capitaneado por Michel Temer e seus aliados, me vejo na necessidade de escrever algo mais a respeito. (...) O agronegócio interfere descaradamente na demarcação de terras e tenta esvaziar cada vez mais a FUNAI. Já tentaram via Ministério da Justiça a criação de um grupo para analisar os processos administrativos internos de demarcação e fazer a revisão beneficiando os invasores, ou seja, o agronegócio. A competência disso ainda é da FUNAI, mas a tentativa é para que seja feita por outro órgão, mais palatável aos interesses dos invasores e exploradores. O que isso quer dizer? Simples. Querem manter os privilégios de poderosos na agricultura, pecuária e no extrativismo. Para tanto, se faz necessário, em primeiro lugar destruir a FUNAI. No Brasil, há 896,9 mil indígenas (a maior parte vive na região Norte, Amazônia) e as reservas ocupam 13% do território nacional”.

- em 07/08/202 publiquei: “ÍNDIOS – A CAUSA E ALGUNS DA REGIÃO COMPREENDIDA POR BAURU - Aqui em Bauru a luta continua. Estamos muito próximos da aldeia de Avaí, reserva indígena distante 20km de nós, daí muitos índios estão aqui residindo, nos visitando frequentemente, nós a eles e dessa proximidade, ressalto duas pessoas, hoje tão próximos de nós, ou seja, nós da luta deles e eles da nossa, numa integração necessária para uma defesa coletiva de interesses em conjunto. Irineu Nje'a Terena (Werá Jekupé), aldeia Kopenoti, do Araci Cultura Indígena, idealizador do Espaço Terena Koixomuneti, com objetivo de orientar as pessoas a nível energético e espiritual por meio do conhecimento e das práticas do Xamanismo terena, além de estar envolvido também o Ateliê Terena de Artes Indígenas e do espetáculo teatral “A Dança da Ema”, junto com Mariza Basso. Aqui curta fala sua: https://www.facebook.com/chicao.terena/posts/3123081231046334. O cacique desta aldeia, Chicão Terena, pessoa querida de todos os na luta social, trava neste momento uma árdua luta contra o coronavírus na aldeia, com um caso já confirmado dentre eles e, a partir daí, isolando mais a reserva, para não propagação. Vê-lo dias atrás, junto dos seus, empunhando arco e flecha na porteira de entrada da reserva é a certeza dele cumprir seu papel com o máximo afinco e dedicação. Chicão não é mero cacique, possuindo formação em Geografia pela USC Bauru, atuando também como professor na rede pública estadual. Ele é muito mais que prefeito da aldeia, sendo também seu atuante representante, voz ativa na defesa dos seus, grito forte e feroz, se preciso for, intransigente e usando da sapiência secular indígena para auxiliar seu povo neste delicado momento do país e do mundo”.
Venham juntos ouvir algo mais dessa rica e contagiante história. Ela não é só constituída de tragédias, pois seus personagens a dignificam por demais. Aqui retrataremos alguns destes e na voz de alguém com conhecimento de causa para fazê-lo. Até lá.

Eis o link do Bate Papo: https://www.facebook.com/henrique.perazzideaquino/videos/4475508092479165 

COMENTÁRIO FINAL: Irineu Nje'a representa e muito bem a defesa da cultura indígena. Não só a cultura, como com profundo conhecimento de causa, após cursar História e Antropologia, tudo para poder ir mais a fundo nas histórias de seu povo e poder retornar com a ajuda que eles necessitam. No MST  existem os que são levados a cursar Medicina, Engenharia, Advocacia, tudo para depois, quando formados os defenderem. Com Irineu aconteceu o contrário, ele saiu da aldeia muito jovem e quando procurado pelo avô, já morando em Bauru na adolescência, da conversa teve o toque que teria que não só voltar, mas fazer algo pelos seus. E nunca mais parou de se informar e defendê-los, numa luta que perdurará a sua vida inteira. Com muita consciência de classe, criou uma entidade, a Araci Cultura Indígena, o Ateliê Terena de Artes Indígenas e o Espaço Terena Koixomuneti, onde ministra cursos, oficinas, ensina, canta, dança, interpreta, vende, modela, ou seja, faz de tudo um pouco, dentro da tradição de sua etnia, a Terena. fala dos seus com orgulho e conta a história do povo Terena, desde o Paraguai, depois o Mato Grosso, até a chegada em Bauru, por volta de 1932, quando os índios estavam em número muito pequeno na reserva de Avaí, tudo por causa da Gripe Espanhola que quase os dizimou. Vieram para preencher o espaço, ali se fixaram e assim não permitiram que as terras fossem utilizadas para outra finalidade. Ele conta essa e outras histórias em detalhes e com propriedade. Num certo momento se revolta contra a prefeita de Bauru, que por intermédio de sua secretária de Cultura, interrompeu a aplicação para agentes culturais de lei que os beneficiava. Foi algo realmente insano, justamente nesse período de pandemia e sem nada produzir no lugar. Muito trabalho perdido, daí, uma união de interesses contra os desmandos de quem oprime, desde o que fazem com os de sua etnia, desde a isso no momento cultural da cidade. Por fim, uma reverência aos seus ancestrais, avô e pai, ressaltando a importância destes na preservação da memória oral, possibilitando que nada se perdesse até hoje. Ele para se certificar disso, colocou essas histórias no papel e tem um livro publicado e dois no prelo, em busca de patrocinadores, onde pretende difundir a verdade dos fatos nas escolas locais. Irineu não sossega, inquieto e desses que, fazem muitas coisas ao mesmo tempo. Ouvi-lo é muito bom.

ENFIM, QUEM É ESTE HPA, E DE QUE SE TRATA ISSO DE “LADO B”?*
* Meu 10º texto para o DEBATE, de Santa Cruz do Rio Pardo, publicado edição chegando às bancas hoje.

Este meu 10º artigo para o DEBATE e cá estou desde sua última reforma editorial, com ampliação do segmento virtual. Coube dentro do novo formato alguém escrevendo de Bauru, ampliando o leque dos articulistas. Daí, eu velho conhecido do editor Sérgio e de curta data, porém, como se fosse de muito tempo, do André, passei a escrevinhar toda semana e quando me dou conta, já chegamos na 10ª participação.

Acho por bem, mesmo atrasado, me apresentar. Aqui em Bauru mantenho desde 2007 um blog, o Mafuá do HPA (www.mafuadohpa.blogspot.com) e nele, diariamente posto textos versando sobre de tudo um pouco. O tema central é Bauru, mas vale tudo, desde que seja uma boa notícia. Polêmicas não faltam e comprar brigas faz parte do negócio. Isso rende amizades, mas também inúmeras inimizades, além de alguns processos, alguns ganhos outros em andamento. Certa feita, meu guru de plantão, o ex-presidente corintiano Vicente Matheus apregoou: “Quem entra na chuva é pra se queimar”. Peguei o espírito da coisa e passando longe se ser algo parecido com o “dono da verdade”, escrevo de forma enxerida e provocativa.

Escrever dói, ainda mais sendo todo dia. Quem o faz sabe, tem dia que a coisa flui que é uma maravilha, noutros nem a fórceps. Mas sai, é parido ao menos um texto por dia e publicado. Escrevo nas horas vagas – hoje tomando conta do dia em reclusão pandêmica – e nas demais, ganho a vida, não como professor, onde me formei e conclui o mestrado, mas em algo aprendido tempos atrás com o velho bardo do jornalismo tupiniquim, Mino Carta sobre escrever de tudo, sem rédeas: “ninguém me dá mais emprego, daí inventei o meu”. Isso mesmo, inventei o meu e vendi chancelas pelo país quase inteiro. Usava o útil ao agradável, até quando meu corpo começou a dar sinais de dores interiores e desde então, tive que me conter. Isso se juntou à pandemia e estou desde então em standby – toc toc toc, tomara não seja eterno.

Vivo de vendas. Camelô do século XXI, algo como fazia os antepassados, até em lombo de burro e no meu auge, de cidade em cidade. Peguei gosto por estar em lugares diferentes, a cada dia num novo, conhecendo gente, batendo muito papo. Hoje recluso, sinto falta e me dói tudo, articulações pedem rua. Sim, sou um sujeito rueiro, adoro o pó da estrada, ele me movimenta, diria, meu combustível. Gosto mesmo é de escrever disso, do que vi nas andanças, mas hoje, diante deste país em frangalhos, governado por um capiroto, tenho que usar minha escrita para espezinhá-lo, mesmo minha lança sendo de pequeno alcance. Faço a minha parte. Desde então escrevo sobre tipos populares, personagens da rua, invisíveis e gente que trombo pelas ruas. Detesto escrever de figurões e daí faço hoje uma Live semanal em Bauru, sempre aos sábados, a “LADO B – A Importância dos Desimportantes”, onde retrato os que saem pouco na mídia e quando o fazem, possuem um lado, o da defesa dos fracos e oprimidos.

Cá estou, lépido e fagueiro. Escrevo de tudo um pouco e do nada faço uma enormidade. Tento tirar leite de pedra e assim prossigo. Já escrevi para tudo quanto é lugar, tendo textos em diversas publicações, sendo a que mais me honra, Carta Capital, a melhor revista semanal do nosso mundo. Sou jornalista, mesmo sendo professor de História, tenho também um livro publicado e três no prelo, ao menos mais um destes devendo sair este ano. Antes que me esqueça, quando resolvi criar o blog, um amigo, Sivaldo Carmargo, bailarino na Cia Estável de Dança de Bauru, atuávamos juntos da Cultura municipal, conversava comigo sobre o nome e como minha mesa não era lá muito organizada e nem onde armazenava o ajuntamento de coisas que fui reunindo ao longo do tempo, teve a brilhante ideia: “Isso tem a cara de um mafuá”. Assumi assim ser o mafuento HPA e cá estou agora escrevinhando também para o DEBATE.

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