sexta-feira, 5 de janeiro de 2024

FRASE DE LIVRO LIDO(196)

DAS LEITURAS DE UM DIA PELAS ENTRANHAS AMERICANAS 

DOIS AEROPORTOS E DOIS LIVRINHOS DEVORADOS

Sim, trouxe algumas preciosidades para ir lendo durante a viagem. Ao invés de trazer uns catataus, pesados, preferi por 4 pequenos, leves, suaves, boas companhias nas horas vagas dentro de tudo o que existe pra ser feito numa extensa viagem. Existe tempo pra tudo, inclusive aqueles e que, como ontem, em trânsito, longo tempo sentadinho dentro de aeroportos ou de aviões. Dentro dos aviões, na maioria das vezes, inevitável, durmo. Ontem, o sono se foi e, pasmem, quando levantei num momento para ir ao banheiro, encontrei somente mais uma pessoa lendo livros. A maioria dormia e o outro tanto estava vasculhando seus celulares. Ouvia conversa só de um lugar, riam e só não ouvi mais, pois não entendia a língua falada. No mais aquele silêncio sepulcral. Ana dormia e eu lia. Li um nos aeroportos e outro dentro do avião.


O primeiro foi um presente do amigo de Natal RN, o livreiro, ou melhor dono de sebo, o Sebo Vermelho, Abimael Silva, quando de minha última estada por lá, o "A Importância dos Sebos para a Educação, Cultura & Lazer", curto texto de um frequentador do lugar, Fernando Antônio Costa Wanderley. Contando a história dos sebos de Natal RN, ele conta de todos os demais, pois algo existe de muito similar em todos: "o sebo é também um lugar de releitura da própria sociedade, através do público que frequenta esses lugares de cultura e lazer". Num momento, algo que vejo em muitos: "a falta de conhecimento literário de alguns sebistas. Muitos deles abriram seus sebos com a exclusiva proposta de ganhar dinheiro, sem idéia da contribuição que exercem para a cultura de forma geral". Vim divagando com o autor. No mais, ele afirma que "o verdadeiro sebista não visa exclusivamente o lucro e também faz uma leitura da necessidade que um estudante tem de buscar o conhecimento, realizando abatimentos..." e "nos sebos a visitação era um instante para discussões sobre qualquer assunto relevante à conuntura político-social, econômica ao cotidiano", Ou seja, divaguei com ele e viajei pelos tantos que adoro visitar. Foram 70 páginas deglutidas num vapt-vupt e depois, mais algumas horas meditando sobre o lido. Queria prosear com Ana, mas ela dormia ao meu lado e não tendo com quem conversar, fiquei a divagar uma conversa comigo mesmo.

O livro do Henfil, "Diretas Já!", tenho que me penitenciar. Não o tinha lido até então. Achei num sebo meses atrás e o trouxe sem pestanejar. Lia tudo do Henfil, do Pasquim à Isto É, com sua divinal Cartas da Mãe - que tenho. Neste, logo na capa, ele faz uma referência em estilo de devoção para com Teotônio Vilela, usineiro convertido à causa nacional e não a sua própria. Eu também me encantei com Teotônio e toda vez que ouço Fafá de Belém cantando aquela linda homenagem para ele, me arrepio. Aquele vozeirão grosso e ciente de seu papel. Henfil foi um cara muito ciente de como utilizar a ironia em seus textos. Dava enormes toques, sem ser grosso, mas deixando o sujeito sob os holofotes mais do que desconsertado. Que falta nos faz este danado. Num certo momento do livro ele transcreve uma conversa que teve com Alceu Valença, quando lhe perguntaram se estava pronto para enfrentar o povão. Ele respondeu de bate pronto: "Enfrentar não, eu vou é comungar com o povo!". Seu traço é inigualável e ainda de Teotônio: "Ele dizia que nos Brasil não há heróis, há mártires. Ou seja, nós veneramos os que perderão, os derrotados. De Tiradentes a GArrincha". Tem um texto dele que irei compartilhar na íntegra, como estímulo para os que estão claudicando de adentrarem a luta contra as injustiças e a perversidade em curso. Henfil sempre colocou a cara à tapa, foi à luta e fez o que tinha que ser feito. Nos deixa seus textos, límpidos, transparentes e agora, tantas décadas depois, contribuindo para me aquecer a alma, continuar na lida e luta. Enfim, como ele mesmo escreve: "Há cinco séculos o povo tem que consertar e limpar e pagar os estragos feitos por estes zumbis brancos e esquizofrênicos. (...) O povo é quem se mobiliza para consertar o país".


Terminei a leitura e ainda faltava uma parte do último vôo. E o que fazer? Roer as unhas? Não suporto nestes momentos, não ter nada às mãos, pois ler é tudo. Não existe total solidão para quem se enfronha em leituras dos pés à cabeça.

CAPITULEI - VIM CONHECER A HISTÓRIA DO FEDERAL RESERVE DE CHICAGO
A história do dinheiro norte-americano, contada na versão deles. Entrei, ouvi, tirei fotos, trouxe até um saquinho de dólar em pedacinhos. As várias transformações do moeda e como foi utilizada na cabeça do povo, ano após ano. Como vir até aqui, pisar no solo deles e não querer dar uma espiada em como se deu a conquista. Os cartazes são mais do que instrutivos. Sai de lá, ao menos, entendendo melhor o processo. O capital aqui é tudo, sei disso. Tento desviar a atenção, mas a coisa é latente, indisfarçável.

BARNES & NOBLE, REDE DE UMA DAS MAIORES LIVRARIAS NORTE-AMERICANA
A livraria visitada em Chicago foi essa filial da Barnes. Ana me levou numa delas em Nova York, quatro anos atrás. Fiquei impressionado, gente lendo sentados por todos os cantos. Dormindo na mesa do café alguns fugindo do frio. Hoje, o frio pega forte e lá dentro, além do calor do aquecimento, a do acompanhamento e aquecimento de estar com livros. Fotografei alguns. Em especial uma revista que sempre quis ter um exemplar, a The New Yorker. A brasileira Piauí, sempre achei, foi criada pensando nesta. Adoro bancas de revistas e como já não existem mais por aqui, quando me deparo com algo parecido, mergulho. Enfim, me oxiginei e depois voltei para, tarefas do dia, gastar sola de sapato. 

O dia está frio, mas limpo, belo e o sol deixa tudo límpido. Percorro as ruas com minhas alpargatas - não vi mais ninguém com outra por aqui. Ana riu quando a coloquei nos pés para a viagem. Disse que, na neve não pararia em pé. Tem razão, só que ainda não nos deparamos com neve e, assim sendo, não a tiro dos pés. Escapulo do frio para forninhos bem aquecidos, como as saborosas livrarias. E assim o dia vai acontecendo.

OS BECOS DE GOTHAM CITY AQUI EM CHICAGO
É pura coincidência. Na TV aqui do quarto do hotel, Ana acha um canal e nele só Batman, overdose do herói de Gotham City. Em minhas mais remotas lembranças, o que mais me impressiona nos filmes norte-americanos são os becos, aqueles lugares escuros, sempre aos fundos dos grandes prédios, lugares onde impera a sujeira. Em todo filne retratando um grande centro daqui, tem destes becos. Sempre alguém escondido e na espreita atrás de uma lixeira ou algo desovado nestes lugares. Sempre representaram perigo, um lugar a ser evitado. Mas como todos sabem muito bem, bastou cruzar com um, já quis atravessá-lo. E o fiz hoje à tarde, Ana descansando no hotel e eu perambulando, procurando sarna pra se coçar. Aqui por perto alguns, tiro algumas fotos e o com a cara mais dantesca, aperto o passo e lá fui ter com meus batimentos acelerados cardíacos. Era por volta das 17h, tudo já escuro por estas bandas do mundo. Ninguém aparentemente à vista, nem um gato revirando os muitos luxos. Respiro fundo e atravesso. Lugar cheio de lixo, muitas portas, as dos fundos das luminosas casas comerciais. Gotham City não me saia da cabeça, enfim, como lhes conto, fui um devorador de Batman no passado. Estes becos, na verdade travessas cheias do estrume, o que não pode ficar à vista. O duro é que, no estado em que me encontro, todo acarpetado, cheio de grossas roupas, mais parecendo um astronauta, se houvesse um grito que fosse, creio eu, cairia petrificado no ato. Cagão assumido, mas corajoso pra ir botar o nariz onde não sou chamado. Nada aconteceu de improvável e cá estou a lhes contar o ocorrido. Quem, como eu, nunca se impressionou com estes becos, retratados em quase todo filme policial, que levante a mão...

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