quinta-feira, 24 de maio de 2018

PRECONCEITO AO SAPO BARBUDO (127)


UM DIÁLOGO SOBRE UMA GREVE E CONSIDERAÇÕES SOBRE OUTRAS – DESESPERANÇA BRASILEIRA
Desço lá da lonjura da Unesp Bauru até o centro da cidade dando carona para dois estudantes universitários. Eles na viagem me contam da greve, prestes a ocorrer em todas as unidades, com data já definida para seu início e, pasmem, me dizem, com data para provável encerramento, setembro. Dei risada e eles não gostaram. Expliquei dos motivos. Greve com data marcada para ter início e dando tempo para os patrões se preparem com suas armas para o enfrentamento e depois, algo mais inusitado, com data para término. Não quero tirar o entusiasmo deles e os instigo. Desta forma prolongamos a conversa. O mais falante, natural de Cotia, dois anos de Bauru confabula algo:

- Tudo decidido. Estamos indo de sala em sala, explicando cada detalhe. Vamos encurralar o governo estadual.

- As greves na Unesp, pelo que sei começam com o funcionalismo, os que batem cartão, tem hora para começar e terminar o expediente. Esses estão decididos? Eles são os mais prejudicados em caso da paralisação não bem executada. Eles quando param, o fazem de forma consistente, com alto percentual de participação.

- Sim, todos os seguimentos estão organizados. O empregador governo do estado está acabando com a Educação, tudo degradado, temos que sensibilizar na base da pressão.

- Maravilha, estarei ao lado de vocês todos, mas sei que muitos professores não irão paralisar suas atividades.
Quando vocês falam em pressão, eles também sofrem as suas. Alguns já não param faz tempo, em todas as greves continuam suas atividades, sob a alegação de que a reposição é um desastre para todos, inclusive para vocês estudantes. Parar as aulas é o menos problemático e enquanto for somente isso, a direção da Unesp vai dar risada, pelos menos enquanto tudo o mais continuar funcionando por debaixo dos panos. Quero ver a área da pesquisa parar, a participação nos congressos e eventos externos, a conclusão dos trabalhos acadêmicos. Isso é que pontua a universidade hoje e isso continuando, o governo se lixa se as aulas não ocorrerem por 30, 60, 100 dias. Eles clamam para encurralar a universidade pública e quanto mais sucateada, melhor para o serviço sujo que estão a fazer.

- O comando de greve está atento com tudo isso. O que nos diz é importante, mas não é por causa disso que deixaremos de realizar a paralisação.

- Ótimo. Quanto mais organizado melhor. Só quero que prestem atenção no ocorrido com outras greves dentro do serviço público. Na municipal, a Prefeitura de Bauru com 8 mil funcionários, pouco mais de seiscentos pararam e enfraquecidos não tiveram mais como dar prosseguimento com o movimento grevista. Na área da Saúde aqui na cidade, a greve acabou faz duas semanas e a FAMESP, o patrão de hoje, uma cooperativa que administra o setor, já havia demitido muitos funcionários, principalmente os líderes do movimento e dessa vez, jogam cada vez mais com o medo do cara ser demitido e ficar desempregado. A pressão hoje é essa, fim da estabilidade, o servidor sabe que com a reforma trabalhista tudo conspira contra ele e para ir pro olho da rua é a coisa mais fácil. Daí, a adesão não é a esperada e com mais gente trabalhando que parando, como se mostrar forte perante o insensível patrão?

- Pô, cara, ao invés de ajudar, parece colocar mais dificuldade na parada. Vai ser nossa primeira greve e queria ver tudo dando certo.

- Eu sempre quero isso, mas inegável estarmos hoje num estado de escancarado golpe, onde a normalidade foi pras cucuias. Se com Lula e Dilma, a reclamação já era de perda de direitos, hoje eles não mais existem. Perseguições tornaram-se rotina e cada vez menos gente par de fato. A gente olha pra ação do Governo, chega a achar tudo normal, mas vivemos já num estado de exceção, onde acabou a Justiça do Trabalho e as decisões favorecem meramente os patrões. Greve com esses aí no poder é coisa de louco. Pra virar a mesa só mesmo com muita organização.

E antes de me despedir aperto a mão dos dois e os deixo na Praça da Paz. Ao continuar meu caminho rumo as beiradas da cidade, olho pelo retrovisor e os acho um tanto perdidos, como naquela famosa do Jânio Quadros, com um pé pra lá e outro pra cá. Eles nem imaginam minha torcida para que a greve deles tenha sucesso, mas até nessa em curso a dos caminhoneiros, paradeira nas estradas, antes, por muito menos e todos gritando 'Fora Dilma' e hoje, com preços disparados, nenhum 'Fora Temer'. Um acerto por cima para favorecer os donos das transportadoras e nunca o consumidor de combustível. Gritaria para resolver isso não existe, só a movimentação dos graúdos. A dos miúdos nunca é incentivada e quando ocorre, todos caem de pau, mídia, patrões, Judiciário, direita raivosa e o que era para dar certo, vira poeira. Ando com a desesperança no seu grau mais elevado...

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