quarta-feira, 2 de fevereiro de 2022

FRASES (217)


UMA HISTÓRIA BEM PRÓXIMA DE MIM DE UM DOS TANTOS IRRECUPERÁVEIS

"SEQUESTRO DA LINGUAGEM
Primeiro, disseram que não haveria mais guerrilhas. Acreditei e, junto às botas, abandonei sonhos revolucionários.
Em seguida, disseram que terminara a luta armada. tornei-me violento pacifista.
Depois, disseram que a esquerda falira. Fechei os olhos ao olhar dos pobres.
Enfim, disseram que o socialismo morrera. E que uma palavra basta: democracia.
Então, nasceu em mim a liberdade de ser burguês.
Sem culpa".

Essa poesia de Frei Beto eu a resgatei do livro "A arte de semear estrelas", Editora Rocco, 2007. Ela expressa algo do que quero escrever e por pra fora neste momento. Ando muito angustiado com a retração brasileira de resistir e enfrentar os que apunhalam nosso país. Aprendi desde muito cedo a resistir e não arredo pé deste objetivo, o de toda uma vida. Tenho um primo que, para justificar ter hoje se encastelado no pérfido lado do conservadorismo de direita, antes aliado quase sua vida inteira ao tucanato e hoje, em vias de se aposentar, renegando estes e mesmo sem se declarar, caindo de boca no bolsonarismo. Das vezes quando ainda o encontrava, dizia de boca cheia, como querendo se justificar pelas escolhas feitas ao longo da vida: "Eu na juventude já fui de esquerda, já defendi o que ela defende, mas amadureci e fui vencer na vida".

Evidente não termos nenhum alinhamento político, tendo ficado cada vez mais complicado algum tipo de diálogo. Quando o reencontro - algo cada vez mais raro -, prefiro ficar nos comentários sobre a família, pois do contrário, a certeza de entrar em embates e homéricas discussões. Ele não é o único, aliás conheço vários que, ao longo da vida, usam do mesmo discurso, quando na verdade nunca militaram ou tiveram algum tipo de aproximação com a esquerda. Falam da boca pra fora, pois lá no fundo sabem muito bem estarem do lado errado da vida. Venceram na vida, mas a um preço sem volta, o de se manterem aliados aos pérfidos que destroem essa nação desde seus nascimento. Para gente como este meu primo, o socialismo morreu e a única saída é o capitalismo.

Hoje, mesmo diante de tudo o que de absurdo anda ocorrendo ao país, prefere continuar enganando a si próprio do que admitir ter feito a escolha errada e tudo por grana. Se um dia teve princípios, abdicou de tudo para ganhar algum, mas tendo que fazer o jogo sujo do capital. Gente como ele são os que propagam aos quatro ventos isso da falência da esquerda. Lutar para que a maioria do povo conquiste seus direitos, consiga ter uma educação salutar, quando no mínimo entenda o que fazem é algo praticamente inadmissível, pois quando isso ocorrer, tudo o que trilhou estará correndo muito perigo. No socialismo não é permitido um bajulador do poder, principalmente o que vive das rebarbas do capitalismo, sem se importar com o que acontece com a maioria do povo.

Depois da última enchente lá pelos lados do meu Mafuá eu escapuli e no próprio domingo, diante de uma semana inteira chovendo - e muito -, carro quebrado, juntei meus cacos e ganhei a estrada. Cá de um canto qualquer perdido pela aí, leio muito, reflito muito mais e olho para o passado do que fomos, do que poderíamos ser e dos que, na verdade, somos. Leio vivermos num ambiente, dito e visto democrático e me pergunto a todo instante, que raio de regime político seria este, o desta tal de "democracia", onde as injustiças são a mola mestra de tudo e para uns poucos se dar bem, se faz necessário que a maioria se dane, permaneça emburrecida, sem entender nada e camelando, cada vez mais no obscurantismo, pois isso tudo favorece o que sempre fizeram.

Cansei destes todos e hoje, mesmo ciente de que, para vencer este país hoje eivado de ódio se faz necessário a união de muitos, inclusive destes, os perversos, sacanas, que não hesitaram em se posicionar ao lado do ex-capitão, mas hoje, diante do absurdo que é continuar com ele, estão aí à procura de uma insana terceira via. Alguns já se aproximam de Lula e do que representa, pelo menos creio entendem o que está em curso. Gente como meu primo não só não entendeu, como até votam em gente como Moro ou outro qualquer, pois abominam a esquerda. Na verdade, eles abominam a esquerda, pois sabem ela ter ciência de tudo o que fizeram para chegar onde chegaram e como sabem não merecer perdão, preferem continuar do lado danoso. Ouço deste, algo mais abominável: "Eu não tenho culpa, deixei de votar faz tempo". Como se isso não representasse enorme culpa do cartório.

Daqui de onde me encontro, longe de tudo e todos, precisava fazer este desabafo. Hoje não abri os jornais, quis saber pouco sobre Bauru, quase nada além do que ainda tem provocado as chuvas. Quando li este livro do Frei Beto, meio poesia, meio prosa, encontrei a sacada que precisava para alinhar estes escritos, feitos quase no final do dia. Amanhã volto para Bauru e para a vida que levava até então. Diante de tudo o que temos pela frente, meses de intensa agitação eleitoral, creio ser este o momento certo, propício para cada um mostrar a que veio e do seu envolvimento com o Brasil. Eu quero este país de volta e para tanto vou lutar e muito para tê-lo, senão como dantes, ao menos reencaminhado com outra postura e procedimentos. Para que isso ocorra, sei da necessidade de estar engajado, esgrimando sem medo de ser feliz. O que mais pensei neste isolamento é sobre estes que podem se aliar na luta pela recuperação do Brasil e dos já considerados irrecuperáveis. Com imenso pesar, considero meu primo - e também dois irmãos - num patamar cada vez mais distante de pensar coletivamente, mas muito envolvidos com o pensamento e ação de ódio. Entristecido os vejo cada vez mais distantes de algo palatável. Hoje, sei, perderei o sono pensando neles e em tudo o mais, os ainda recuperáveis e os tanto já perdidos para sempre.

Um comentário:

Marcos disse...

Henrique, nos últimos tempos eu tenho dito que as semelhanças entre esses campos políticos que se acham diferentes, na verdade, superam as diferenças.

Não há espectro de esquerda em nenhum partido político no Brasil, somente a disputa eleitoral que se dá no mesmo campo. O processo que passou seu primo e tantos outros, também é o processo que se deu com o PT e demais partidos, e também com os que continuam a se iludir com o campo eleitoral.

As narrativas podem ter uma roupagem à esquerda e à direita, mas ambos os casos são apenas narrativas construídas para que pessoas passem a acreditar nelas e assim nada mudar. A coisa degenerou tanto que nem vergonha na cara se tem mais, talvez até por excesso de ilusão, de alienação... Lula e Alckmin é a expressão maior de tudo isso. Não há esquerda, não há socialismo, não há nada além de oportunismo eleitoral para ver quem administra o capital.

Diante de tudo o que aconteceu na pandemia no Brasil, desmobilizar as ruas para favorecer a disputa eleitoral é cumplicidade... ninguém quer mudar nada, mataram a pauladas mais um jovem negro, e onde estão as ruas em chamas?? Logo ninguém mais falará sobre isso e mais jovens negros continuarão a morrer nas periferias pela mão do Estado opressor com sua polícia, mas quem se importa?? Até o opressor de vice já estão aceitando. O trabalhador continuará a ser explorado porque assim é o capitalismo, casos de depressão seguirão a aumentar porque as desilusões dessa sociedade tendem a sufocar mais e mais.

Sei que no fundo você percebe tudo isso, mas como o seu primo que se auto-engana nas narrativas, vocês também criam suas ilusões para justificar o injustificável que seguirá nos levando para mais e maiores tragédias.

O saudoso Roque me dizia nos últimos anos que princípios não são negociáveis... e não são mesmo. Vou no sentido oposto e com o passar da idade, radicalizar mais e mais na defesa do marxismo.

Roque, presente!! Almir, presente!!