domingo, 28 de abril de 2024

MEMÓRIA ORAL (305)


O XV DE JAÚ PODERIA TER SUBIDO HOJE – FUI CONFERIR ALGO DO ENVOLVIMENTO DE UMA CIDADE E DA DECEPÇÃO AO FINAL DA PARTIDA

Domingo passado em Americana, o XV de Jaú empata lá com o Rio Branco e, assim a possibilidade de decidir em casa, com direito a vantagem pelo empate, se sobe de divisão, deixando a Bezinha, onde está há muito tempo, para a Série A3 do Paulistão. O XV é um dos tantos times tradicionais do interior paulista, com uma história mais do que valorosa. Diante de tanto tempo tentando subir, sei o quanto isso deve estar mexendo com a cabeça do jauense. Ciente disto, convido um amigo para irmos presenciar juntos essa real possibilidade de ascensão.

Já imaginando o campo lotado no dia, peço ajuda para Emerson Luiz, radialista em Bauru na 96Fm e comentarista, junto com seu pai Lourival Sandi, na rádio Jauense, uma das duas transmitindo o futebol naquela cidade. Ele me indica um local onde os ingressos são vendidos de forma antecipada. Faço contato com o Bar do Célio, tradicional point dos esportistas jauenses, localizado em região nevrálgica na rua Quintino Bocaiúva. Envio o valor correspondente em PIX, ele me envia foto dos ingressos e diz: “Venha tranquilamente, pois o bar estará aberto desde às 7h e não fechará no horário da partida. E mais, se tiver festa, ela ocorrerá aqui”.

Convido quatro diletos amigos para irmos juntos nesta “barca”, mas ao final, somente um topa. Os demais com outros compromissos assumidos para o domingo. Eu e Kyn Junior, saíamos na manhã deste domingo, precisamente 8h rumo à Jaú. Antes das 9, estávamos defronte o bar. O lugar é encantador para os aficionados por futebol, pois em suas paredes toda a história do XV e de todos os times paulistas. O segundo mais representado é o Santos, o do coração do proprietário. Ele me mostra um quadro homenageando o Noroeste e um seu amigo, o goleiro Válter, que começou jogando no XV, depois Noroeste, Corínthians e hoje, no Cuiabá. Falo que quem quase veio de longe para ver hoje o jogo é o craque Afonsinho. Diz também ser seu amigo e me mostra outro quadro, onde ele barbudo defende o Santos, decisão contra o Palmeiras, com Pelé em campo.

Decidimos ir pro campo às 9h10, seguindo orientação do Célio. “Hoje o campo vai estar cheio. Daqui é perto, quando ver o monte de carros, pode ir parando, pois lá perto, uma hora dessas não vai achar mais nada. Mas vá logo, para sentir o clima lá com a torcida”. Estaciono dentro de uma área anexa ao estádio, pela bagatela majorada só neste dia, R$ 20 reais. Uma gostosa muvuca na chegada, com quadra interditada, como não se via nas imediações do estádio fazia muito tempo. Nas calçadas vendido desde bandeira, bandana, faixas, bonés e camisetas. Diante do portão principal uma imensa fila e até um orientador, com megafone às mãos, sugerindo qual a melhor maneira para facilitar a entrada sem maiores problemas.

Quase junto ao portão, uma bela loja com produtos com a marca oficial do XV de Jaú e neste domingo, diria, mais que movimentada, cheia. Como em todo estado paulista, a cerveja não é vendida dentro do estádio e assim sendo, filas nas barracas e isopores das imediações. Na primeira olhada para a torcida, algo a diferenciando de todos os demais jogos. Famílias inteiras ali presentes e muitas mulheres, algumas delas em grupo, sem a presença de homens. Algo chama a atenção, muitos torcedores idosos, todos envergando velhas camisas do XV, acompanhados e amparados de seus filhos. Algo assim cala fundo, pois lindo demais essa identificação com a camisa do time de sua aldeia.

Dentro do estádio, manhã de sol quente, as árvores ao lado da arquibancada são todas ocupadas, lugar muito disputado. O estádio não está cheio, mas tomado pelas cores verde amarela, a do XV e espalhados por todos os cantos, camisetas as mais variadas, sua maioria não de torcidas uniformizadas, mas do time do coração. Ver mulheres, novas e muitas idosas envergando a gloriosa camisa do XV é algo para entender bocadinho de como se dá isso da paixão de uma cidade pelo futebol. Existe espaço para circular e na parte coberta, onde estão dois bares, movimentação intensa e por ser um dos locais mais altos, uma brisa reconfortante, não existente nos demais lugares. O batuque da torcida organizada invade todos os espaços, mas o mais impactante são os atos individualizados dos torcedores, como o do pai, para proteger o filho do inclemente sol, faz uma casinha com uma caixa de papelão.
Oito mil e 300 pessoas em campo.

A partida em sai foi decepcionante. O XV até começou com bom ímpeto, mas foi dominado, como disse meu parceiro Kyn Jr, querendo se mostrar entendido nos meandros do futebol: “O time deles é muito mais alto, melhor posicionado e sabe ocupar melhor os espaço do campo. Não precisou muito para se impor e diante de duas falhas, virou o primeiro já com a vitória assegurada”. O vejo comentando com todos ao lado e parece, obtendo concordância para suas explanações. Por fim, quando a viola já estava em caco, mais da metade do segundo tempo transcorrido, me fala ao pé do ouvido, como um bidu diante de sua lâmpada mágica: “O Rio Branco está mais perto de fazer o terceiro do que o XV o seu primeiro”. Não deu outra e em questão de minutos, isso se consolida. Não deu pra contestar, pois em questão de minutos isso aconteceu de fato.

A chance era realmente muito grande, mas para realiza-la se fazia necessário ao menos empatar e isso não foi possível. O XV não assustou em nenhum momento, não conseguiu impor seu jogo e assim, se deixou vergar dentro de casa. Ouvi toda a narração pela voz do Lourival Sandi, baluarte do microfone no interior paulista. Num certo momento, a transmissão foi interrompida, pois acima das cabines onde transmitia, jogaram um balde de água sobre sua aparelhagem, água caindo também nos torcedores embaixo, na arquibancada. Sandi, lavado, consegue que a aparelhagem volte a funcionar e segue seu trabalho, assim como a imensa maioria dos presentes, esperando a vez do XV chegar. Não foi desta vez, mas diante de tanto tempo na fila de espera e de tudo o vislumbrado e possibilitado com a quase ascensão deste ano, tomara este amor se intensifique, frutifique e não esmoreça.

Na saída, muitas lamentações, mas ninguém propondo na além disto. O jogo, no todo, deixou a desejar, ou melhor, o XV deixou a desejar e assim, nada como desdizer algo do momento vivido e da oportunidade perdida, mas resignação bem assimilada. Dos tantos espalhados em torno dos pontos abertos, cerveja gelada em promoção e dos planos para o futuro. De um deles Kyn Jr ouve algo e me conta: “Eu dou todo ano uma motocicleta para ajudar, minha contribuição, mas vejo que ainda falta algo mais”. Descemos para as despedidas no bar do Célio e agora, intensa movimentação, sua filha o ajuda, não consegue nos dar atenção, pois a casa está cheia e ele lá do fundo grita, “torcedor do XV não desiste, nossa hora chegará”. Vejo um senhor com camiseta toda autografa e lhe pergunto se ali tem uma do japonês Kazu. Ele diz que “nessa não, essa é de 1976, inesquecível para nós e mantida por mim como amuleto”. Assim nos despedimos da cidade, ainda circulando em algumas mesas. Em nenhuma delas, algum tipo de animosidade pelo fato de sermos de Bauru, torcedores do Noroeste, antigo rival do XV. Enfim, havíamos ido lá declaradamente para nos juntar aos torcedores do XV.




e mais essa para lacrar o dia
MEU SONHO ERA PROPICIAR ALGO ASSIM EM BAURU
https://istoe.com.br/e-bar-livraria-cafe-e-tudo-isso...
O Mafuá do HPA possui acervo suficiente para isso. Falta a grana para o empreendimento. Sonhar é preciso. Imagino um dia, recursos vindos lá do céu e eu recuperando, revitalizando, restaurando e devolvendo pra cidade o espaço onde um dia funcionou a Churrascaria Gaúcha, esquina na Antonio Alves com a Primeiro de Agosto. Acredito eu, até por conta de realizar este sonho, continuo jogando regularmente na loteria...

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