sábado, 29 de agosto de 2015

COMENDO PELAS BEIRADAS (05)


A VILA RICA OFERECE A MELHOR PIZZA DA CIDADE - NO CENTRO VELHO DE BAURU, RESISTE E INSISTE, ISSO HÁ MAIS DE 50 ANOS

Afinal, o que ainda resiste aberto à noite no centro velho de Bauru? Pouca coisa, quase nada. Talvez o último dos moicanos, a casa comercial de maior longevidade, seja uma que vez ou outra os bauruenses mais entrosados com sua cidade acabem retornando e sempre, sem decepções. Trata-se de uma pizzaria, localizada ali na Gustavo Maciel, bem defronte onde antes funcionava o Cine Vila Rica, o último reduto de filmes pornôs da cidade (hoje continua funcionando ali na rua Araújo Leite). Falo da PIZZARIA VILA RICA, entre a Ezequiel e a Presidente Kennedy, um cinquentenário lugar, cheio de boas histórias e como se fosse uma espécie de ilha dessas isoladas e no meio do imenso oceano. Ela resiste por vários motivos, um deles o garçom Ademir Neves, 61 anos, mais de vinte só ali, explica: “O motivo principal é porque somos proprietários do ponto, do imóvel. Isso facilita bastante, talvez se alugado, não tivéssemos permanecido tanto tempo aqui no centro, enquanto tudo o mais foi fechando ao longo do tempo”. Ele é modesto, a massa ali servida é mais do que especial.

Esse “somos” dito por ele é pelo motivo dele ser filho do original proprietário do lugar, o famoso João Neves, um senhor que mesmo hoje, aposentado do lugar há mais de vinte anos é uma das pessoas mais elegantes da cidade, verdadeiro e original personagem bauruense, pois só anda de terno e gravata, numa estica de dar gosto. Ainda circula por ali e é visto diariamente nas caminhas pela região. Seu João, hoje com 94 anos continua morando no prédio construído e mantido pela família, num dos quatro apartamentos construídos bem em cima de onde está localizada a pizzaria. “Precisa ver meu pai, ele está bem melhor que a gente, saúde de ferro, sobe e desce as escadas e sem nenhum problema”, conta. Hoje a gerência do lugar está a cargo da irmã do Ademir, a única que não mora ali em cima, pois resolveu se bandear tempos atrás lá para os lados do Jardim América. Com um público fiel, mais popular, mas com gente de todos os lugares da cidade, essa pizzaria resiste ao tempo e aos problemas, principalmente aos da região central, praticamente deserta à noite.

A casa funciona todos os dias da semana, abrindo na hora do jantar e funcionando no máximo até à meia noite. De segunda a sexta com dois garçons e de sábado e domingo, os dias onde a casa enche mais, com quatro. A especialidade são as pizzas Portuguesa e Calabresa, mas o a Moda da Casa, também está entre as preferidas. O motivo da casa continuar atraindo a atenção começa pela escolha dos seus dois principais funcionários, os que atendem o público, tanto o Ademir, como o outro, o Felisberto, esse com quarenta anos de experiência no ramo e só ali quinze. “Eu trabalhei muito tempo com o Décio no Alternativa e até hoje continuo indo e voltando para o serviço com minha bicicleta. Não moro tão longe, ali na rua Alves Seabra e em coisa de dez minutos estou em casa. Conheço cada detalhe não só da casa, como de boa parte da clientela. Isso aqui é uma grande família e onde tudo é feito com amor e carinho as chances de ser sucesso aumentam”, diz.

Na porta um segurança fica atento ao movimento das ruas. Fico sabendo que ele ganha por hora, mas quando inquerido, diz ter tido muito pouco trabalho com a desertificação do lugar à noite, mesmo quando passam da meia noite. Atrás do balcão e do caixa, além da filha do famoso seu João, seu neto. No dia em que lá estive estavam recebendo dois ilustres clientes, um deles seu irmão, o músico Roger Pereira junto do maestro George Vidal, ambos saídos de um ensaio e indo diretamente para lá comer, o que ambos referendam sem medo de errar: “Aqui se faz a melhor pizza de Bauru”. George fala em detalhes das maravilhas da massa, do seu preparo, do forno e dos dois garçons. “Tem mais, esse aqui (apontando para o Ademir) é um ilustre violinista e oferece para os amigos seu CD, uma preciosidade, só com clássicos do seu de seis cordas”, diz. A pizza chega, comemos e não resisto, incluo o valor do CD, permitido ser pago incluído no cartão. Sem muitos rapapés, quando a iguaria é servida todos param e caem de boca na gostosura indicada pelo George e pelo insuspeito Roger, esse mais do que cria da casa.

A confirmação disso dali ser oferecida a melhor pizza da cidade pode ser comprovada por todos na mesa. Cito os nomes. Ana Bia Andrade, Roque Ferreira, Tatiana Calmon e Sivaldo Camargo, todos ali presentes após assistir a estreia de mais um espetáculo da Cia Estável de Dança de Bauru, pensam e repensam em onde ir comer algo: a Vila Rica quando citado foi aceita por todos. Sivaldo chegando por último e muito bem acompanhado, experimenta uma de rúcula, pedido de sua companhia e ele uma apimentada. A casa com mais de 50 anos serve muito pelo Disk-Pizza, mas suas mesas todas simples, panos verdes sob a mesa e alguns quadros na parede, dentre eles alguns de Baccan, continua apostando no tradicional. Na longevidade das portas abertas, todos ali consultados disseram que se houver uma com mais anos de janela aberta na cidade que a Vila Rica, essa deve ser a Casarão, nenhuma outra. O fato é um só, continuam no centro velho, somente eles, a massa continua a mesma, os mesmos garçons, mesmo atendimento e preço convidativos, tudo com tradição mais do que familiar. Para os que torcem o nariz para virem ao centro à noite, percam o medo, pois ali tudo é de muita calma e paz. E a pizza, como já foi dito e repetido, a melhor da cidade.

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