domingo, 20 de abril de 2025

PRECONCEITO AO SAPO BARBUDO (213)


UM JOGO PRATICAMENTE PERDIDO - COMO TER ESPERANÇAS DE REVERTER ESTE QUADRO?
BOA PÁSCOA, APESAR DE TUDO.
Ela é minha amiga, feirante e neste domingo, bastou me ver, para vir sorrindo, tudo para me dizer: "Agora sim estou contente com o Lula. Viu que ele vai acabar com o Bolsa Família?". Não sei se ela faz isso de propósito, pois sabe eu ser defensor do Governo de Lula ou se é mesmo inocente e pensa exatamente dessa forma.

Ela é feirante, portanto, uma trabalhadora, dessas que acorda cedo todo dia, monta sua barraca e sua a camisa pela aí. Tentou a vereança e se decepcionou com Suéllen Rosin, pois não esperava ter que pagar por sua campanha. Joga a culpa de seu fracasso eleitoral, na falta de apoio. Piorou muito depois da última eleição. Sempre que passo defronte sua banca, quase todo domingo, fala de algo que leu onde busca suas informações e se mostra muito conservadora.

Minha resposta para ela: "Minha querida, evidentemente que Lula não vai acabar com o Bolsa Família. Não sei se lembra, mas nem o cara que você defende, o Bolsonaro, o fez. Ele chegou a mudar o nome do programa, mas continuou. Lula foi o criador do Bolsa Família, do Minha Casa Minha Vida, do Farmácia Popular e tantos outros de auxílio popular e só os incentivaria mais, nunca iria acabar com eles. Tu está lendo algo mentiroso, o que chamam de fake news e pelo visto, acredita em tudo o que lê".

Percebi que ficou desgostosa e quis retrucar: "Eu não preciso de programa como este, eu trabalho". Não aguentei: "Eu também não preciso, mas nem por isso não olho para o meu semelhante. Existe uma infinidade de pessoas que precisam e é obrigação de qualquer Governo decente estar presente. Ninguém precisa passar fome. Este e os demais programas de ajuda para a população mais carente são mais que úteis, necessários. Você queria os ver passando fome? De onte tirou isso, essa insensibilidade?".

Eu sei, o país continua sendo invadido diariamente e ininterruptamente por essa enxurrada de informações falsas, criadas exatamente para confundir a cabeça dos incautos. Confundir, embaralhar e também misturar as coisas todas. Aqui, dois momentos, primeiro promove essa reação dentre os que enxergam em ajudar o pobre como algo depreciativo, daí estes ficam todo contentinhos e depois, nos que recebem o auxílio, para lhes criar minhoca na cabeça. A reação a isso tudo, essa rede de mentira é ainda pífia e creio eu, gente como minha amiga feirante, já posso considerar como um caso perdido. 

Exímia trabalhadora, mas totalmente revertida - diria mesmo, convertida - e transformada num ser enxergando no pobre alguém pelo qual devemos nada fazer por eles, abandoná-los à própria sorte. Como foi moldada a pensar deste jeito? Que poderosa perversidade é essa, transformando em mente apartadora, a fazendo pensar e agir contra os ali ao seu lado, aceitando ideias nefastas? Não paro de pensar em como conseguir reverter este jogo e o que ainda posso fazer para não desistir dela e de tantos outros de uma vez por toda, influenciados totalmente pelo que lêem e acreditam como a mais pura verdade estabelecida? A mentira continua sendo despejada no seu aparelhinho de celular a todo instante.

DESABAFO APÓS DIÁLOGO NA FEIRA E TERMINO LEITURA DO LIVRO DO MOIA, “A DEMOCRACIA DOS AUSENTES” – JOGO QUASE PERDIDO
Saio da feira neste domingo, quando tenho um diálogo desanimador com uma feirante e em casa, após o almoço, sento para terminar a leitura de um livro bem propício para entender o que se passa com a cabeça do povo brasileiro no quesito de sua real e efetiva participação no mundo político deste país. Trata-se do livro “A DEMOCRACIA DOS AUSENTES – UM EXERCÍCIO DE CIDADANIA” (editora Scortecci SP, 1ª edição, 2022, 202 páginas), do amigo Rafael Moia Filho. É meu quarto livro neste mês de abril e este em especial, presenteado a mim pelo autor, passo à frente de tantos outros à espera de leitura e o vejo muito oportuno para o momento.

Moia nos apresenta uma espécie de GUIA para estes tempos. Sim, precisamos de um guia de sobrevivência para não sermos ludibriados no que fazemos e pensamos. A proposta do livro é exatamente essa, a de mostrar por A + B, o quanto agimos contra nós mesmos, sem princípios norteadores, principalmente em sua participação política. Ele, quando escreveu e pensou neste livro, deve tê-lo feito pensando em como reverter este abominável quadro de perversão a que estamos submetidos, pois cada um agindo ao seu bel prazer, contribuímos para essa inevitável erosão social, com ascensão de políticos de ultradireita e de uma predominante mentalidade mentecapta. O livro do Moia não é fácil de ser lido, ou melhor, lido pro quem deveria conhecer deste mínimo necessário para não continuar sendo manipulado e descartado.

Ele produz um passo a passo, com história, amostragem de leis e sua aplicação, consequências, usos e costumes, bem detalhista e abrangente. Enfim, um GUIA PARA CEGOS. Sim, a maioria do povo brasileiro está um tanto cega e não mais atina para onde caminha. Ele demonstra sua desilusão com o País, pois sabe, só sairemos da situação atual com entendimento do que nos ocorre. A Educação é prioridade, mas isso é processo lento e nem uma reação revolucionária está em curso neste sentido. Tá tudo muito bem explicadinho no texto do Moia, mas poucos terão acesso a ele, infelizmente. Seguiremos ausentes e ludibriados, ele bem sabe disso.

“Ninguém tem apreço por assuntos que lhe são distantes e obscuros. (...) Quem vive totalmente apartado de um tema ao longo da juventude, tem grande dificuldade para romper o distanciamento ao longo da maturidade”, escreve, porém, leio tudo isso com uma incomensurável dor interna, pois sou do time dos conscientes, dos que sabem ser a “democracia não apenas uma forma de organização governamental. Ela é a forma organizacional do Estado, em que a participação do cidadão é fundamental”.

Dói muito constatar que, tudo isso exposto pelo Moia em seu livro não é do conhecimento da maioria do povo brasileiro. Pouco conhecemos de nossas leis, sua aplicação. Enfim, como aplica-las se nem a entendemos? Que dilema cruel. E a informação construindo a mentalidade do povo continua chegando a estes da forma mais criminosa possível, com muito pouco ocorrendo para reverter essa aberração. “Sabemos que 99% da Constituição Federal não é do conhecimento da maior parte da nossa população”, ele prescreve. Temos leis boas, mas não votamos bem, não fiscalizamos bem e muito menos cobramos bem. Moia deve se remoer com isso. Seu livro demonstra isso claramente. Eu perco o sono pensando em como fazer o brasileiro entender de fato o que estão fazendo com ele. Moia escreveu este livro para mostrar uma saída. Lendo e entendendo, porém, como poucos leem e entendem, pelo visto, tudo continuará uma perdição sem fim.

“Não há ideologia que supere a ganância, a corrupção, a desfaçatez da nossa classe política”, “Onde tem recursos, tem fraudes, desvios, escândalos e a corrupção respira”, “como imaginar um vereador que não saiba interpretar um texto ou não tenha noções mínimas de direito? Enfim, não possuem noções básicas de cidadania, ética, moral e bons costumes”, “...com honrosas exceções, o governo ainda é basicamente formado por meia dúzia de homens brancos endinheirados”, “...a população acredita que a classe política representa apenas ela própria, e não a sociedade como um todo”, “O acesso do cidadão à informação simples e compreensível é o ponto de partida para maior transparência”, “Não há democracia sem povo e sem participação popular”, “...o brasileiro em geral desconhece completamente o sistema eleitoral do nosso país. Sabe votar nas urnas eletrônicas e ponto final”, “A existência de condições desiguais entre os indivíduos desvirtua totalmente o preceito de cidadania”, “O voto é um apoio, não um protesto”, “É necessário que o povo assuma suas responsabilidades de participação” e “É preciso que haja união de propósitos na direção do que é certo para que as coisas se modifiquem para melhorar nossas vidas em vários segmentos, na política não é diferente”.

Grifei o livro inteiro com frases iguais a essas. Uma mais significativa que a outra. No conjunto, reunião delas, algo doloroso. Sabe-se o que deve e precisa ser feito, sabe-se até o caminho, mas este é hoje, por demais pedregoso. Não é mais como dia o poeta, uma pedra no caminho, é muito mais que uma montanha, um Everest. Moia conclui com algo perturbador diante deste quadro: “Talvez no dia em que de uma maneira geral, os eleitores brasileiros votarem com consciência em projetos de governo calcados em propostas fundamentadas a favor do país e do seu desenvolvimento talvez tenhamos algumas chances”.

Talvez, o que ele e eu temos a certeza, será pouco provável com o atual andar da carruagem. Sua conclusão é a mesma que tive hoje ao conversar com a feirante em seu local de trabalho: “A política brasileira infelizmente navega em águas turvas, onde o que importa menos é o progresso, desenvolvimento do país e a felicidade da sociedade. (...) Assim, com baixa qualidade a democracia vai sobrevivendo golpeada naquilo que tem de melhor, que é o seu poder de regeneração”.

Infelizmente, termino o livro com essa sensação de impotência, também inabilidade de uma geração inteira, que viu ir se esvaindo pelos dedos essa possibilidade de mudar para melhor este país. Deixamos essa possibilidade se perder e hoje, com o avanço dos pérfidos, o caos se estabelece. Enfim, “como podemos exigir ou imaginar que o brasileiro possa votar e entender sua participação no processo democrático adequadamente se lhe falta educação, informação dentro de um sistema que privilegie sua formação como cidadão?”. Volto ao “infelizmente”, pois vejo o livro do Moia, ótimo como GUIA para sairmos do lodo que nos envolve, mas sei, ou melhor sabemos, estamos perdendo e feio esse jogo.

Encerro com duas frases, citadas pelo Moia em seu livro: “O sistema político brasileiro é um cadáver, apodrecendo a céu aberto”, historiador Daniel Aarão Reis e “A única coisa necessária para o triunfo do mal é que os homens bons não façam a sua parte”, Edmund Burke.

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