terça-feira, 2 de julho de 2019

RELATOS PORTENHOS / LATINOS (66)


MEU AMIGO GUSTAVO NO INTERIOR DA COLÔMBIA

Gustavo Mangili, o Cachorro Louco é um jovem querendo conhecer o mundo, mas com parcas possibilidades, enfim como a maioria de todos nós. O faz pela primeira vez num voo internacional, de Sampa para o país de sua esposa, a Colômbia e está conhecendo in loco algo de grande valia para sua vida, como se passa de fato e de direito a vida de hermanos latinos. Tempos atrás fiz uma viagem de pick up com ele, buscando livros de meu sogro para ser entregues numa livraria em Araraquara. Foi nosso road trip, ou seja, possibilidade de rodar e ir parando, principalmente com ele conhecendo algo de um lugar pelo qual nutria grande curiosidade, a cidade do Rio de Janeiro. Sei que para ele, aqueles dias foram inesquecíveis, pois além de sair do trivial, botou de fato os pés na estrada (ele adora motos e Opalas), podendo falar algo mais com conhecimento de causa. Neste momento vive outro momento, esse com um passo a mais, o de ir além, a espaços nunca dante imaginados, o interior da Colômbia.

Conheceu sua esposa por essas plagas e aqui selaram juras de amor eterno. Os vejo na banca do Cláudio, o pai, ali dentro do espaço do antes Paulistão das Nações (hoje já quase Confiança, eles ali resistentes e esperançosos), no seu dia-a-dia, sempre solicito e cordial, aberto para conversas variadas. Um rapaz de bem com a vida, cheio de planos, mas com os olhos bem vivos quando o tema é receber o vento de uma estrada no rosto. Ainda mais quando isso hoje é possível ao lado da pessoa amada. Foi o que fizeram, juntaram forças, financiaram a passagem a perder de vista e foram conhecer não só o país dela, seus parentes, lugares onde conviveu, ou seja, lhe está sendo apresentada a Colômbia, numa opção muito rica, a não pelo seu lado turístico, mas circulando junto com autênticos colombianos. Deve estar deslumbrado e a cada nova experiência, adquirindo mais e mais experiencia para o que virá no seu retorno.


Seus curtos relatos demonstram bem isso. Ele publica uma foto de um típico churrasco local, o tipo de edificação dos bairros onde circula e as diferenças com os nossos, as distrações preferidas, os lugares onde os parentes de sua esposa preferem estar. Circulam por Bogotá e também pelo interior, principalmente realizando o desejo de conhecer Cartagena, para ele, até então pelas fotos, um lugar colorido ao lado do Pacífico. Eu, do lado de cá, observo a viagem do Gustavo e me encanto, o cutuco com dicas e sei, as receberei na volta, quando animado me mostrará seu celular recheado de muitas fotos e as belas histórias que retirará da memória, mais cheia de algo tão necessário a todos nós, as experiências de vida, essas que nos fazem entender de fato o que se passa. Quando verificamos esse algo mais, isso que ouvimos dizer, mas estando lá no lugar para conferir e depois, não repetir como papagaios de pirata o que querem, mas entendendo a realidade, isso não tem preço. Ele vive na carne e na pele essa rica experiência e com uma algo a mais, o de não pagar pela hospedagem, pois vai de uma lugar a outro e fica na casa dos parentes da esposa. Serão quinze dias por lá e sua viagem está nesse momento em pouco mais da metade, portanto, no meio da aventura. Aguardo ansioso seu retorno para as conversas de praxe.

EU E A NICARAGUENSE NA PIZZARIA

Foi no último domingo, quando com amigos numa pizzaria ali ao lado das Nações Unidas, vejo na mesa do lado duas sorridentes mulheres hablando em espanhol. Uma delas envergando uma vistosa camiseta, "Amo a Nicarágua". Foi o bastante para no momento em que pagamos a conta, pedi a todos para me esperar um pouco mais e vou até elas. Pergunto se é nicaraguense e na afirmativa, começamos um diálogo. Sua amiga, também da América Central, República Dominicana, fazem aperfeiçoamento em Odontologia aqui em Bauru. Algo bem comum se deparar com, principalmente mulheres dessa região em Bauru e em cursos odontológicos. Uma delas me explica: "Muitas já estiveram por aqui e muitas estão, pois aqui em Bauru existe um centro de aperfeiçoamento dos mais conceituados, reconhecido por todos. Passamos uma temporada por aqui e voltamos para nossos países com mais conhecimento". Eis um lado palatável desta cidade.

Porém não era esse, o já conhecido lado do reconhecimento odontológico o que queria tratar no rápido diálogo. Disse para a nicaraguense: "Gosto muito do seu país e sempre tive curiosidade em conhecer, não só Manágua, mas o litoral e seu interior, mas hoje, dizem que a violência se acentuou de mais e até o presidente, antes socialista, hoje anda cometendo barbaridades. Sou amante da revolução sandinista, inspiração para todo e qualquer revolucionário, amante de Sandino e Cardenas". Ela sorri e responde: "Não acredite em tudo o que você lê por aqui". Mesmo com apenas uma semana e pouco de Brasil, entende muito bem o que falei e eu a ela. "As informações aqui recebidas chegam um tanto truncadas. Vejo aqui o mesmo tipo de violência existente lá, sem grandes diferenças. Se lá existe milícias, aqui também. Se lá tem grupos armados nas ruas, aqui também e falta bem pouco para estarem bem mais aparentes. O presidente Ortega resiste num momento de avanço brutal pela implantação do que já ocorreu por aqui, o neoliberalismo descarado e contra todos os interesses do povo. Jogam pesado para integrar meu país no conservadorismo, igual aconteceu aqui e o jogo da informação e da contra-informação é bem acentuado".

Foi o bastante para ter a mais absoluta certeza, precisamos mais e mais conversar com os outros povos latinos, saber da situação real de cada país, eles de nós, nós deles, pois só nos informamos pelo que nos é repassado pela mídia massiva e de uma forma bem distorcida, a dos seus cruéis interesses. Na pressa da despedida não trocamos contatos e hoje, passados dois dias, cá estou com aquela vontade de continuar a conversa e saber mais, não só da Nicarágua, mas também da República Dominicana, trocar experiências e falar dessas agruras que os latinos vivenciam, reviver essa história de dominação já durando séculos, com poucas experiências concretas de libertação. Agora, circulo pela região da Odonto, olhando para todos os lados, na esperança de reencontrá-las e estabelecer uma conversa mais prolongada e conhecer in loco pouco mais de algo pelo qual sabemos quase nada, a real situação dos irmãos latinos. nada como fazê-lo numa conversa tête- à-tête.

O encontro com elas me reavivou outro, esse em Paris, quando num restaurante me deparo com uma nítida latina, carinha da Mercedes Sosa, o que me fez se aproximar, puxar conversa. Naquele dia só decepção, pois era uma dissidente, dessas a enaltecer o neoliberalismo, totalmente contrária ao peronismo, os Kirchner's, só falando bem de Maurício Macri. Ouvi atentamente, mas não prolongamos a conversa, mesmo percebendo, eu e Ana, que após ser tocada, queria ficar falando horas e horas conosco. Ouço os contrários, mas neste caso específico, notei de cara sua não aceitação de outros argumentos que não só os dela, daí não tínhamos mais o que conversar. Troco ideias com diferentes, opositores, até adversários, mas quando nenhuma possibilidade de diálogo aproveitável, regateio e escapo pelas arestas. Não entendo até hoje, como alguém com uma fisionomia tão sofrida como aquela argentina, podia defender quem lhe cravava a estaca, algo surreal e acontecendo também por aqui neste país hoje louvando a boçalidade. No caso da nicaraguense, ampla possibilidade do diálogo se estender por tempo indeterminado.
ELE NÃO MORREU DE FRIO NA MADRUGADA PASSADA, POIS JÁ ESTAVA MORTO FAZ TEMPO
Sergio Zacariaz, de 52 anos, foi encontrado morto de frio numa das ruas do centro velho de Buenos Aires, Argentina, na noite passada, quando o frio começa a se intensificar naquele país e a situação econômica, social está se agravando dia após dia com a intensificação do desGoverno neoliberal de Maurício Macri. Algo salta aos olhos, Sergio não morreu ontem, pois já estava morta faz tempo e só pelo fato de morar nas ruas, nas condições onde se encontrava já evidenciava isso. Estava vivendo à margem da sociedade, com a indiferença dos atuais governantes, com todos os que ignoram situações como essa, se mostram a favor da preservação das desigualdades e não voltam seus olhos e ações para os vivendo em situação de penúria. Desassistido como levava sua vida, sua morte já estava mais do que decretada, não só a dele, mas a de tantos outros. Ler um algo mais dessa triste e repetida história, não só da realidade argentina, mas de todo mundo neoliberal é algo para abrir os olhos de tudo, todas e todos. Eis alguns links do que publica hoje o melhor jornal do nosso mundo, o diário impresso argentino Página 12:
1 - https://www.pagina12.com.ar/203839-morirse-en-el-desamparo
2 - https://www.pagina12.com.ar/203731-se-durmio-muerto-de-frio
3 - https://www.pagina12.com.ar/203839-morirse-en-el-desamparo
4 - https://www.pagina12.com.ar/203706-llego-el-frio-como-estara-el-clima-durante-los-proximos-dias

Um comentário:

Mafuá do HPA disse...

DOIS COMENTÁRIOS VIA FACEBOOK DO MORREU DE FRIO EM BUENOS AIRES:
Carlos Norberto Osilieri - Mais um governo pró-americano. Quando que a América Latina será livre? se observarmos acredito que apenas Bolívia, Venezuela, Nicarágua e Cuba tem governos democráticos.

Cecilia Oliveira - Ai eles aparecem pra retirar das ruas como se fossem lixos!