domingo, 8 de março de 2015

MEMÓRIA ORAL (176)


DIAS DAS MULHERES, FRIDA, TEATRO E A HOMENAGEM À FANECO

O convite me chegou curto e grosso e via facebook, enviado pelo amigo Sivaldo Camargo:

“No domingo, 8/3, às 20h, o Teatro Municipal “Celina Lourdes Alves Neves” recebe a apresentação do espetáculo Frida, da Cia. Estável de Dança de Bauru (ENTRADA GRATUITA) em homenagem a dez personalidades femininas da cidade: Estela Almagro (vice-prefeita); Telma Gobbi (vereadora); Vera Casério (secretária municipal da Educação); Darlene Têndolo (secretária municipal do Bem-Estar Social); Lázara Gazzeta (secretária do Meio Ambiente). E ainda: Priscila Bianchini de Assunção Alferes (delegada titular da DDM); Gisele Moretti (presidente do Conselho Municipal de Políticas para as Mulheres); Ercy Faria (delegada da União Brasileira de Trovadores); Maria De Oliveira (dona Cotinha) – artesã; Maria Inês Faneco (Idealizadora do Esquadrão do Bem)”.

Veio no meio da semana e depois instigamos o pessoal da Cultura Municipal (o Sivaldo foi intermediário) para uma proposta. Os integrantes do bloco carnavalesco, farsesco e burlesco Bauru Sem Tomate é MiXto queria aproveitar o ensejo e fazer mais uma homenagem para uma das homenageadas, justamente sua rainha desse ano, a Maia Inês Faneco, a pipoqueira, a do muro mais famoso da cidade, a das muitas dificuldades, mas mesmo assim uma das expoentes de uma pá de ações sociais cidade afora e criadora do bordão mais famoso dessa cidade: “Ai, como eu sofro”.

A resposta veio no sábado pela manhã. “Podem preparar, algo simples, sem pompa. Ela será a última homenageada e ao subir o palco do teatro, vocês sobem e executam a trama”, me disseram. Matutamos no que fazer, como e os neurônios estiveram a funcionar. Cada um correndo ao seu modo e jeito, chuvarada brava no final de semana, a ação pelo amigo Esso Maciel e uns trabalhos pessoas de grande monta, ou seja, deixamos tudo para a última hora.

O importante era não decepcionar a Faneco. Nunca faríamos isso. Rose Barrenha não pode comparecer, Tatiana Calmon idem (cuidando dos dodóis do Roque), Silvio Selva lá na entrada do palco trabalhando e nos holofotes do teatro (ficou cuidando das homenageadas para que não caíssem dos seus altos saltos no subir e descer do palco), daí sobrou mesmo para mim, o HPA.

O tempo corria, conspirando contra, relógio voando e parte da tarde passei fazendo inscrição num Encontro de Comunicação. Quando me dei conta já eram 18h30. A ideia era levar uma grande canga em formato de Bandeira do Brasil (mais brasileira que ela, com suas lutas quixotescas, enfim, a própria) e envolve-la no ornamento. Sim, falta o escrito.

Tomei banho, lavei as partes, passei água de cheiro pelo corpo, sentei de cuecas na mesa e rascunhei o que iria falar. Não poderia fazê-lo de improviso, pois nada sairia. Prefiro escrever e ler do que falar assim de bate pronto. Saiu algo, ou melhor, pari o texto ali em parto normal, sem necessidade de cesariana. Já o produzi numa folha sulfite e com caneta pilot, letras grandes, ótimas para serem lidas. Saiu isso:

“Faneco é uma mulher diferente da maioria. Ela inventou sua profissão e assim toca sua vida. Ela não possui um emprego formal, normal e muito menos banal. Faneco sobrevive vendendo pipoca. Ela com seu carrinho sua muito a camisa para pagar suas contas. Ela é povo. Ela rala. Daí o seu bordão: “Ai, como eu sofro!”. Ela sofre, mas faz de sua vida algo muito além do trivial. Não peçam para Faneco ser uma menina comportada. Ela não é. Muito menos segue esse negócio de seguir religiosamente um comportamento dentro do politicamente correto. A vida do povo que rala não é nada correta, daí, como pedir para alguém assim correção. Impossível. Daí o motivo de Faneco ser luz. Ela tem luz mais que própria. Virou musa, rainha, diva, maestra, soberana e guia, além de objeto de desejo. Faneco é a mulher com a cara da Bauru das ruas. Faneco não acumula dinheiro. Ela acumula solidariedade, humanismo, compreensão, compaixão, espírito coletivo e muitos outros ãos. É uma mulher acima de qualquer suspeita. Ela não conspira, ela inspira, transpira e respira. Ou melhor, nos ajuda a respirar. Fanece é a própria Frida, ou sua encarnação, portanto, Faneco está Frita. Viva Faneco!!!”.

Cheguei ao local, eu e Ana por volta das 19h50 e na frente do Centro Cultural, adivinhem quem lá estava TRABALHANDO com seu carrinho de pipocas? Sim, Faneco. Ela e sua trupe. Quase me mijo todo nas calças com a cena. Ela, ali a certeza, supera a Frida em alguns pontos (uns sim, outros não, daí a importância de todos). Vejo outros homenageadas todas no rigor da noite e ela ali de calça jeans, tênis e sua camiseta profissional, com os dizeres pipoqueiros. Ou seja, ela como sempre foi, sem tirar nem por.

Tentei colocar a canga dentro do pequeno chapéu e desconsertado fomos procurar assento. Papeamos muito até o início do evento. é sempre muito bom estarmos rodeados de gente amiga, propondo conversa sadia e também fiada. Antes do espetáculo Frida, a solenidade. Suzana Libório, a chanceler da Cultura para esses eventos estava a postos e começa a chamar as homenageadas ao palco. Uma só não veio, justamente a vice-prefeita. Perdeu de ganhar palmas, boba ela. Todas as outras foram ovacionadas, umas mais, outras menos. A secretária Marlene Tendolo quebrou o protocolo e falou em nome de todas. Curto e grosso, bem posicionada. Adrei ver no palco duas senhoras dessa cidade, a trovadora Ercy Faria e a artesão dona Cotinha. Vibrei com elas.

Chegou a hora da Faneco. Recebeu seu buquê de flores e seu diploma e me chamam ao palco. Subo na tribuna e enquanto ela lá no meio do palco fica meio boquiaberta. Sou um bobão, fico meio nervoso nessas horas. Acho que é por causa da homenagem que iria fazer. Não podia mesmo decepcionar alguém como a Faneco. Li tudo, com algum enrosco, mas em alto e bom som. E depois no momento em que deveria sair da tribuna, dirigir-se a ela no centro do palco, tirar o chapéu de malandro (usado no desfile do Pé de Varsa) para ela, dei uma embaralhada e tirei o chapéu ali mesmo na tribuna. Mas todo mundo viu o que tirei de dentro dele, a canga. E daí fui em direção a ela e a envolvi com a bandeira do Brasil.

O significado disso tudo estava mais do que explícito. Faneco era a mais simples dentre todas e batalhando ali no próprio evento. Ela faz parte de um Brasil que resiste e não provoca retrocessos. Bati palmas para muitas das homenageadas, umas mais, outras menos. Com umas poucas me limite a permanecer calado. Nada mais normal dentro de um leque grande de homenageadas. O fato é que festei muito fazendo a homenagem para a querida Faneco e ao sair do palco e ser fotografo pelo Guedes, disse a ele que me via tão pequeno diante dela e de sua importância. E assim me vejo mesmo.

Depois das homenagens veio a peça Frida, espetáculo magistralmente dirigido pelo competente bailarino e professor de Ballet Sivaldo Carmago, diretor da Cia Estável de Dança de Bauru. Uma das iniciativas mais louváveis do prefeito Rodrigo Agostinho foi oficializar a criação da Cia Estável, que dá bons frutos e encanta a todos. Viajo assistindo esse espetáculo e não consigo compreender muito bem como alguém vem para um lugar assim e permanece o tempo todo, com os olhos voltados para suas mensagens no celular. Quando perguntado (a) se gostou é bem capaz de dizer que adorou. Eu adorei. Faço questão de abraçar Sivaldo em nome de todas as maravilhosas mulheres do espetáculo.

Por fim, no hall do Centro Cultural mais conversa fiada, mais fotos. Conheci o marido de dona Cotinha, o seu Élvio, ali com 90 anos, lúcido, todo pimpão e sagaz. Bati longo papo com dona Ercy, uma figura tão doce e meiga, irradiando simpatia por onde passe. Volto para casa com o livro ‘Mulheres”, autoria coletiva de dez delas e saio com o autógrafo de três, a Madê Corrêa, Luiza Carvalho e Sandra Mardones. E dou muitos beijos na Faneco e depois também na Ana Bia.

E assim deixo aqui, dessa forma e jeito minha modesta homenagem ao Dia Internacional das Mulheres.

2 comentários:

Anônimo disse...

Assim como vc tb adoro pipoca ainda mais feita por pessoa tão e legal e de bem, em tempos passados comprei muito saquinho de pipoca dela.

Agora, tem uns nomes que é brincadeira hein, ainda mais com o tema Frida, Estela, Giseli, Telma, Vera, Darlene, Lázara, parece que tudo perdeu a autenticidade, tudo parece ter que cair no puxa-saquismo político, fazer média. É Sivaldo, pra que ideologia se podemos encher a barriga engolindo sapos não é mesmo??

Camarada Insurgente Marcos

Mafuá do HPA disse...

Caro Marcos

Frida foi convidada para ilustrar o evento e assim o fez.

A lista dos agraciados nem sei quem a montou, mas dentre todos os agraciados, ressalto três, dona Ercy a trovadora, dona Cotinha a artesã e FAneco a pipoqueira.

Essas três são autenticas e merecedoras de muitas homenagens. Das duas primeiras citadas já produzi perfil para meu lado B no facebook, Faneco escrevi dela aqui e em muitas outras oportunidades.

Henrique - direto do mafuá