quarta-feira, 15 de janeiro de 2020

UM LUGAR POR AÍ (131)


ESCRITOS DAS RUAS, VIAJANDO PELO METRÔ NOVAIORQUINO*

* Enquanto Ana fica atenta se estamos chegando na estação a descer, eu observo as pessoas e escrevo.

1 – O senhor estava na estação 34 do metrô, encostado num pilar e lendo um fino livro, esse quase no final, logo percebi. Chama minha atenção. Adentra o mesmo vagão que o nosso, consegue um lugar para sentar, reabre o livro e absorto, recomeça a leitura, distante de tudo o mais. Na estação seguinte adentra outro senhor, este com grande sacola. Não consegue lugar para sentar e com a sacola aos seus pés, saca de um dos bolsos seus celular e liga um som em alto volume, falatório que todos são obrigados a escutar. O senhor lendo o livro se dirige a ele de forma educada e pede para desligar, pois está lendo e mais ninguém produz ruídos além dos naturais. O senhor do celular desliga o som, mas continua plugado. Em menos de um minuto resolve aumentar novamente o som. O senhor do livro, agora menos educado, diz da improbidade do som continuar ligado. O som ainda permanece ligado por uns 30 segundos, mas é desligado, não sem antes praguejar e ameaçar o do livro. Esse permanece impávido com a ameaça e entregue à leitura. A viagem continua. Duas estações depois, o do celular desce falando algo e o do livro continua a viagem, sentado e lendo. E assim segue por mais algumas estações.

2 – Na cafeteria da livraria Barnes & Nobles, a maior de Nova York, na praça Union Square, região de Est Village, noite de terça, algo me chama a atenção dentre os sentados em suas mesas no terceiro andar. Numa delas, um senhor dorme debruçado sobre os livros e outros pertences espalhados sobre a mesa, enquanto a seus pés, sacolas despejadas. A cena não destoa de tantas outras dormindo pelos bancos da cidade, mas esse é um lugar quente, numa noite fria de inverno por aqui. Minha cabeça gira com a cena e já imagino mil situações até desaguar nos motivos do ali presenciado. O lugar é ótima para a necessária pausa, após andanças mil dentro de uma megalópole, dessas que te dispõe poucos lugares para o devido descanso. E todos, após bater perna, tendo destino certo ou não o tendo, necessitamos desse porto seguro. Qualquer corpo após os embates para lá e para cá necessita de justa parada, até para repor energias e ver para onde continuar a caminhada. Fico a observá-lo durante a estada no andar e tento me por na sua situação. Ninguém o molesta, pelo menos até a loja fechar e deve por lá permanecer até acordar novamente, juntar suas coisas e adentrar a escuridão da cidade. Para os sem rumo e destino nada como a redobrar o corpo num lugar aquecido e ao menos com alguma segurança.

3 –
Quase chegando ao hotel na noite de terça, 14/01, descemos na estação da rua 34, a Penn Station, sempre muito movimentada. Descemos do vagão e seguimos pela plataforma, cada um seguindo seus caminhos. São pessoas pelas quais compartilhamos olhares e gestos por instantes, porém em instantes nunca mais a veremos. Saímos quase por último e na caminhada, antes de subir as escadas, dois montes de malas, quase uma mudança pelo caminho. Na primeira, uma mulher dorme de boca aberta, cabelos em desalinho e sem condições de cuidar dos seus pertences, todos ali expostos diante dos circulando, quase pulando sobre suas malas. Ponho-me a pensar em como chegou nessa situação? Como terá vindo parar ali com tantas malas? A poucos metros, nos deparamos com outro conjunto de malas e junto delas outra mulher, essa falando sozinha e numa estranha língua. Imagino algo como ucraniano ou russa. Fala para ninguém, como perdida. Todos passam rapidamente por ela e seguem para seus destinos. Fazemos o mesmo e ela já ficou para trás. Continuará falando daquele jeito até quando, desabafando não se sabe para quem, talvez a espera de alguém que a salve da situação de sofrimento ali demonstrada. Talvez as duas se conheçam, constituam uma família e os pertences todos ali nas malas. Chego ao hotel e sua imagem permanece na minha retina. São tantos, vejo muitos falando sozinhos pelas ruas, outros largados pelas sarjetas, com cartazes pedindo algo, caneca sempre à frente e assim como os demais passo por eles e me vou.


DEIXA EU ESCREVER SÓ UMA COISINHA SOBRE ESSA LIVRARIA:
COMO VIR EM NOVA YORK E NÃO IR CONHECER A MAIOR LIVRARIA DA CIDADE?
A Livraria Barnes & Noble é um paraíso, espécie de oásis no meio da balbúrdia da cidade grande. Ana Bia me levou até ela de metrô, localizada na praça Union Square, na região do Est Village e quando a vi, fui logo arrebatado e ao adentrar me vejo salvo, pois ali poderia permanecer horas desfrutando de uma das coisas que mais gosto de fazer na vida, me refugiar com os livros. Foi o que fizemos na noite de ontem, após um dia intenso de visitas a museus. Caímos de boca na dita cuja e tentamos em algumas horas desfrutar e conhecer cada cantinho. Inebriante.

"A Barnes & Noble em Nova York é a maior livraria varejista dos EUA, a qual conta com diversas unidades espalhadas pela cidade. Esta rede possui o conceito de “Super Store” nas suas unidades, onde as lojas são enormes, possuem cafés, vendem além de livros, revistas em geral, cds, contam com mesas de leitura, oferecem eventos para a comunidade, entre outras coisas.
Com isso, as livrarias desta rede tornaram-se um local onde os moradores e turistas de Nova York podem descansar, tomar um café e comprar vários produtos além dos livros, incluindo materiais de escritório, por exemplo. Apesar de ser muito grande, esta livraria é toda dividida em setores, algo que ajuda muito na hora de escolher e procurar um livro"
, diz um guia de viagem, mas para quem ama os livros é muito mais.

Ao me aproximar de sua área de alimentação e ver um senhor, com livros espalhados pela sua mesa, café já frio, debruçado sobre os mesmos e dormindo com a fleuma de todos os que o fazem por ter a certeza de estar num local privilegiado, quase fiz o mesmo. Ana não permitiu que ali repousasse, como tantos o fazem, mas por pouco não senti a mesma sensação. 

Livros, enfim, um mundo à parte para quem, mesmo esgrimando durante a maior parte do dia contra todos esses dragões da maldade, num certo momento necessita de um pouco de paz, até para recarregar forças. As minhas eu recarrego em lugares como esse.

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