quarta-feira, 22 de outubro de 2025

DROPS - HISTÓRIAS REALMENTE ACONTECIDAS (245)


TEMPO
1.) BAURU VISTA POR ALGUÉM QUE A OBSERVA DE LONGE
Conversei hoje com um conhecido assessor parlamentar numa cidade vizinha de Bauru e dentre todos os assuntos abordados, um ficou gravado fundo em minha memória: Bauru. É sempre bom ouvir alguém de fora, observador atento, tecer observações sensatas sobre sua cidade. As ouvi atentamente, trocamos diálogo revelador. Eis algo extraído desta conversa:

“Trabalho pela região há mais de 20 anos. Viajo muito pelo interior do estado de São Paulo. Sou do interior, daqui de perto de Bauru e estou lotado na Alesp – Assembleia Legislativa. Meu trabalho é este, circular, fazer contatos, estabelecer relações e assim sendo, como bom observador, contato algo inevitável, fácil de ser comprovado, o da cidade de Bauru ter perdido sua pujança e hoje estar numa espécie de limbo, sem se mover e fadada a ser ultrapassada por outras, em situação bem distinta.

Eu entro em Bauru e não consigo descobrir uma definição adequada para lhe designar. Tem cidades que só de adentrá-la isso já está mais do que evidente. Em Bauru isso não acontece. Não tem isso em Bauru. Você fica sem saber pra que veio, no que está envolvida e qual seu modo de caminhar, de ser e de estar. O desenvolvimento não ocorreu de forma a lhe favorecer, o tal do progresso não aconteceu de fato. Tem um cheiro de estagnação, de ter parado no tempo. Essa paradeira não tem nada de proteção, mas de algo meio que abandonado, sem rumo e destino. Enquanto cidades, muitas antes muito menos pujantes que Bauru, hoje a ultrapassaram e estão anos luz à frente, Bauru foi deixada para trás. Isso tem lá seus motivos, pois nada ocorre por acaso.

Sinto isso só de adentrar Bauru, muito perceptível. Triste isso, pois em poucas cidades do porte de Bauru isso é tão notado. Sinto isso já na relação com as pessoas, tem algo de estranho no ar, no que você vê e sente. Bauru sempre foi muito importante como polo aglutinador de toda uma extensa região, com cidades menores dependendo dela para quase tudo. Até nisso percebo enorme mudança. O polo educacional um deles, pois antes tudo convergia para cá, com estudante de toda região. No comércio a mesma coisa. Ela já não possui o mesmo poder de atração de décadas atrás. E em outro quesito, o de ser cidade concentrando atividades relacionadas ao funcionalismo público. Seria este o seu destino? Só este? Não vejo mais como algo assim tão marcante e determinante.

Isto tudo se deve a quem a gerenciou e a destinou para que, essas perdas fosse ocorrendo e se acentuando. Não sou contra Bauru, enfim vivi nela bons momentos, mas o que lhes digo é sobre ela já não representar para muitos, eu um destes, o que já foi no passado. É com tristeza que lhe digo isso. Queria enxerga-la de forma diferente e assim como, muitas outras souberam caminhar de forma diferente, o que teria acontecido com Bauru que a travou. Sim, é assim que vejo Bauru, uma cidade TRAVADA. Não me critique pelas observações. Poderíamos conversar muito mais sobre isso tudo, pois sei é um assunto não para uma só observação. Só quis colocar um pouco mais de lenha na fogueira dessa boa discussão”.

E assim me foi dito. Argumentamos muito e, por fim, repasso aqui o conteúdo principal, para uma reflexão coletiva.

2.) HISTÓRIAS DAS ENTRANHAS DESTE NOSSO MUNDO
Em Arealva 26 km de Bauru, os pais descobrem o filho enforcado em seu quarto na manhã desta quarta, por volta das 5h da manhã. Ambos já passam dos 70 anos e o filho dos 50 anos. Viviam juntos, o filho com todos seus problemas, ligações com drogas e a instabilidade de uma vida que não se acertava. Tocavam o barco, com os pais, compreensivos e tolerantes como quase todos, indo até o limite pelos seus filhos.

A relação entre as partes seguia em frente. Os problemas eram constantes e tudo culminou com a ação do filho, que no meio da noite se enforcou, fato descoberto só ao amanhecer do dia seguinte. Desesperados ao se depararem com a cena, ligam em busca de ajuda. A Polícia Militar comparece ao local e determina que, o corpo não pode ser retirado do local até a chegada da equipe responsável pela remoção. Este o procedimento de praxe, habitual e recomendável, até para que não desapareçam os vestígios de como o fato se deu.

Dentro do desespero causado pelo ocorrido, impossível conter a ação de parentes, vizinhos e curiosos, numa peregrinação envolvendo a residência daí por diante. E todos lá dentro numa emoção sem precedentes. O fato em si foi este e a partir daí outro, desde a comunicação para as “autoridades competentes”, estes só compareçam ao local para executar o serviço de praxe por volta das 13h. Ou seja, o corpo permaneceu pendurado numa corda, presa na janela do quarto a manhã toda para desespero do casal de velhos, os pais do enforcado.

A equipe de remoção veio de Bauru e ao chegar, retiraram o corpo e o levaram ao IML, precisando depois, alguém da família pra lá se deslocar, no reconhecimento do corpo. Sem entrar nos detalhes de como se deu a permanência do corpo naquela posição a manhã toda, mais de 7h no local, o fato é que, em tudo nestas circunstâncias, existe uma sequência de burocracia – dita por muitos como burrocracia -, que em alguns casos causa revolta e constrangimentos, além de muita dor. Imaginem a cena dos familiares mais próximos e da curiosidade de todos que ali passaram, querendo ver e até fotografar a cena. Dantesco, algo que poderia ser evitado. O velório começou no mesmo dia, à noite e o enterro na quinta, 23/10, na parte da manhã.

3.) IDOSO DESPARECIDO HÁ 15 ANOS É ENCONTRADO MUMIFICADO EM APARTAMENTO NA ESPANHA
Antonio Famoso morreu aos 70 anos, sozinho, no seu apartamento em Valência. Mas só descobriram agora — 15 anos depois. Ninguém percebeu. Ninguém bateu na porta. Ninguém sentiu falta. Ele simplesmente deixou de existir… e o mundo seguiu.​
Os bombeiros entraram por acaso, por causa de um vazamento de água. Encontraram o corpo mumificado, cercado de pombos mortos, num quarto fechado por dentro. A vida tinha parado ali há mais de uma década. Mas lá fora, tudo continuava: as contas sendo pagas, a aposentadoria caindo na conta, o tempo passando.​
Antonio vivia sozinho há 30 anos, desde a separação. Perdeu contato com os dois filhos. Com a família. Com o mundo. Sua rotina era vazia: caminhadas curtas, supermercado, o bar da esquina. "Era quieto, cumprimentava e ia à sua vida", disse um vizinho. Quando ele sumiu, pensaram que tinha ido pra um asilo. E esqueceram dele.​
Xavi, do prédio ao lado, lembra de um homem cabisbaixo, abatido, quase um fantasma. "Ele deixou-se ir", disse outro vizinho. A maioria nem reconhece o rosto dele nas fotos. Invisível. Esquecido. Sozinho.​
E aí vem a pergunta que ninguém quer fazer: quantos Antonios existem ao nosso redor? Quantas pessoas estão morrendo de solidão enquanto a gente passa reto? Vivemos num mundo onde alguém pode desaparecer por 15 anos… e ninguém percebe.​
Porque solidão não é ausência de pessoas. É ausência de presença. É viver rodeado de gente e morrer sozinho mesmo assim. Antonio não precisava de dinheiro — as contas estavam em dia. Ele precisava de alguém que perguntasse: "Você está bem?"​
E ninguém perguntou.​
Talvez a lição mais dolorosa dessa história seja esta: a gente só é visto quando faz barulho. Quando incomoda. Quando exige atenção. Mas os silenciosos, os discretos, os que sofrem calados… esses desaparecem sem deixar rastro.​
Antonio Famoso não morreu em 2025. Morreu em 2010. Só demoraram 15 anos pra perceber.
Olhe ao seu redor. Pergunte. Estenda a mão. Porque às vezes, a diferença entre viver e apenas existir… é alguém que se importa.

Texto extraído do "CHICO - CARTAS DE PAZ E CONSOLAÇÃO"

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