VENÂNCIO, O AGRICULTOR FAZENDO A DIFERENÇA NO DISTRITO DE TIBIRIÇÁ, PLANTANDO EM UM ALQUEIRE MAIS DE 100 ESPECIALIDADES DE FRUTAS DO MUNDO INTEIRO
Começo contando uma história pouco usual e reconhecidamente das mais interessantes, instigantes e diria mesmo, arrebatadora e a demonstrar com muita limpidez, uma rica particularidade do procedimento do ser humano diante do mundo onde vive. Um casal, sai em busca de um local melhor para viver, após uma vida inteira residindo em Curitiba/PR e o faz, após recomendação médica. A esposa precisaria de novos ares e sair de uma cidade grande, indo em busca de local mais arejado e tranquilo. Percorrem estradas e mais estradas, muitas delas pelo interior paulista. Passam por Bauru e até então nada os havia tocado. Seguem em frente, seguindo placas indicando 250 km até Araçatuba, 120 para Lins, outro tanto para chegar na divisa com estado do Mato Grosso do Sul. Saem de Bauru e logo no começo uma placa indicava, 10km até Tibiriçá. Mas o que seria este lugar? A pergunta que faz para si mesmo é só uma: só indo lá e conhecendo pessoalmente.
Foi o que fizeram. E assim, José Venâncio da Silva, 74 anos ou simplesmente, Venâncio como gosta de ser chamado, aportou junto da esposa e pela primeira vez no distrito rural de Tibiriçá, algo em torno de uns 15 anos atrás. Não teve para tanto a indicação de nenhuma pessoa, tudo ocorrendo por obra do acaso. Chegaram, assuntaram o que viram, rodaram suas ruas e se a primeira impressão é a que fica, gostou. Perguntou na praça principal, obtendo ali mais informações sobre o lugar. Na conclusão de ambos, este poderia ser o lugar que tanto procuravam. Começaram a se informar sobre algum pequeno pedaço de terra disponível. Disseram de um e para lá se dirigiram, olharam, viram das suas possibilidades, num canto do denominado Pé Vermelho, o conjunto de casas situado à direita de quem chega em Tibiriçá, mas precisamente, o último antes de adentrar a efetiva zona rural.
Conversaramn com o proprietário, este desconfiado, querendo e sugerindo que, se o negócio fosse feito, queria pagamento à vista. Se entenderam e para resumir e finalizar essa introdução na transformação na vida de Venâncio dali por diante, em apenas mais dois dias já era proprietário do alqueire de terra, num lugar que até então nunca havia ouvido falar. A área era constituida de uma modesta casa na frente e pouca plantação no restante. Para o casal era o suficiente, ou seja, exatamente o que buscavam. Ali, a possibilidade de colocarem em prática tudo o que vinham acumulando de conhecimento na área de botânica, meio ambiente e uma vida totalmente diferente da vivida até então. O passo seguinte foi arregaçar as mangas, ir à luta, conquistar a confiança dos moradores e iniciar o novo modal de vida.
Passados os quase quinze anos da chegada, nenhum arrependimento e a total transformação do lugar. Com um lema dentro de si, algo como uma filosofia de vida, "gratidão por tudo o que tem recebido", Venâncio olha para trás com orgulho. Deixou Curitiba, onde ainda mantém um pé fincado numa atividade empresarial, da qual não gosta de falar, pois gosta mesmo é de ser reconhecido como agricultor. Quando perguntado sobre sua profissão, responde sempre de forma impositiva: "Sou agricultor. Pouco importa o que já fui um dia. Hoje estou aqui e pronto. Fui bancário por muito tempo, depois comerciante, mas para mim isso é coisa do passado. O que vale é isso aqui a me mover". O casal tem três filhos, dois morando no exterior, um na Austrália e outro na Inglaterra. O mais próximo está em Brodowski, local visitado com certa frequência.
O mais impressionante da transformação na vida do casal é ver o estado, encontrado pelo local adquirido, onde também residem e como está hoje. Venâncio sempre gostou de plantas, verde e principalmente frutas. Em Tibiriçá teve a possibilidade de juntar tudo e mais que isso, colocar em prática, no pequeno pedaço de terra, tudo o que até então, não conseguia expandir de forma prática, primeiro por falta do espaço físico e depois por só ter tido o impulso para tomar a atitude que tiveram, quando diante da necessidade dos problemas de saúde da esposa. E, a partir de então, foram sendo plantados mudas e mais mudas, muitas delas conseguidas ao longo do tempo, outras pelo simples fato de ouvir falar e ir atrás. "Tomo conhecimento de uma muda rara de fruta, um agricultor como eu, mas em Divinópolis/MG. Consigo o contato, ligo e acertamos de ir buscar no dia seguinte. Ele ainda me pergunta o horário que irei chegar. Digo cedo e ele quer saber, o significado deste cedo", conta. Chegou lá antes do sol raiar e desta forma e jeito foi conseguindo algo único e surreal. Cada planta possui uma procedência parecida e história dentro de sua cabeça. Não existe identificação das plantas, tudo dentro de sua cabeça.
Circulo com ele toda a área, ele com uma pequena faca nas mãos e diante de cada fruta, a corta e me oferece. Impossível não ficar impressionado, pois a variedade é realmente única. Fui anotando os nomes das muitas frutas, a maioria provada ali mesmo. Cito algumas: sapoti, limão australiano, bacupari, amora paquistanesa, achachairo boliviano, mangustão amarelo, manga manteiga, maracujá pérola do cerrado, canisteo do sul do México, cereja do Rio Grande, sapota peruana, marangue do sudeste asiático, manga chok jambo, abacate da Guatemala, cabeludinha, olho de dragão chinês, abiu roxo e tantos outros. Inclusive, o abiu, que disse num primeiro momento, parecido com figo, me diz: "Não tem nada a ver. Prove". Provei, a fruta tem algo a amarrar levemente a boca, doce, suculenta, carnuda e algo que nunca até então tinha provado.
Venâncio é o tipo de pessoa que não se abre facilmente. Ele precisa primeiro conhecer um pouco mais do oponente está ali diante dele. Já no primeiro contato, diz algo bem esclarecedor de sua personalidade: "Você disse que viria na parte da tarde, não marcamos hora, daí te espero faz tempo. Gosto de marcar hora e da pessoa chegar no horário". Estava me esperando do lado de fora de sua casa. Aprendi, ou seja, melhor assim. Depois de quase uma hora circulando pela sua plantação, comendo tudo o que me foi oferecido, nenhuma à venda. Consome e doa tudo. A única que revende é o palmito pupunha, nada mais. E conta mais sobre o procedimento do lugar, onde o terreno pode não estar muito limpo, pouco rastelado, pois diz tudo ali ser reaproveitado pelo próprio solo, desce cascas de árvores e bagaços das frutas. Em quase toda a área, uma folhagem seca cobre o solo e isso, segundo ele, é fonte de riqueza para o lugar. Tudo devidamente reaproveitado e assim vejo isso ali acontecer na exata acepção da palavra.
Circular com ele pelo local é mais que uma aula sobre botânica e aproveitamento do solo. Mesmo já tendo passado dos 70 anos, pela continuidade do trabalho ali existente, algo oxigenador e também recarregador de baterias, afirma tudo necessitar de continuidade e perseverança. "Por aqui, todo dia tem trabalho e o lema é não reclamar da vida. Eu pergunto sempre para ela e a resposta recebida é um puxão de orelha contínuo", me diz e lhe pergunto quem lhe disse isso, quem lhe chamou a atenção. Ele: "Ela, a natureza". Ali percebi definitivamente da simbiose com a natureza, algo realmente colocado em prática. Venâncio respeita os sinais dados pela natureza e assim tocam a vida. Num certo momento, comparo o que ali vi com a terra que o famoso fotógrafo Sebastião Salgado, comprou décadas atrás em Aimorés, vale do Rio Doce/MG, área totalmente devastada, pelada e depois de alguns anos, com o verde predominando. Ele ri, concorda e diz, que o que Salgado fez foi algo em grande proporção e na dele, muito pequena. Porém, a similaridade está estabelecida e constatada, querendo e, é claro, podendo, tudo pode acontecer.
Continuei ouvindo nomes de mais especialidade ali plantadas, como a árvore couve, a fruta santol, laranja boliviana e poucas na qual já conhecia. Vivem ali o casal, três cachorros e alguns moradores lhe prestam serviço, como quando da saída, um deles me esperava na modesta porteira, fechada impreterivelmente às 17h, para tudo recomeçar no dia seguinte. Confesso, é muita coisa para ser assimilada e compreendida assim de uma só vez. Venâncio é um visionário, diria mesmo, um realizador, destes dispostos a mudar o estado vigente. Tem quem colecione livros e discos - como eu -, outros gostam de juntar coleções variadas em estantes e tem, gente como ele, diante de um pedaço de terra pra chamar de seu, vão atrás de sementes raras, as fazem frutificar e assim se dão por felizes, satisfeitos e com aquela fisonomia de ter realizado algo de bom pro mundo.
Grandioso lugar, único na região, grandiosa pessoa, com quem, ganhando sua confiança, um ótimo papo e além de tudo, podendo até trazer na algibeira, frutos variados para seu consumo, sem ter que dispor de nenhum real em sua compra. Essa história não se encerra por aqui, pois além de contar algo de cada planta ali existente, tem isso da motivação que o faz seguir adiante e isso só é alcançado após várias incursões. Viajado, conhecedor de estradas, lugares e pessoas, um autoditada, que não gosta de falar de seus estudos, mas sim do que faz atualmente. Vive num local simples, casa levantada segundo sua concepção arquitetonica, sem grandes arroubos, dentro deste distrito rural de Bauru, Tibiriçá, cheio de histórias arrebatadoras. Essa a de hoje, mas por lá muita gente com outras tantas, cada qual com seu apreço e valor.
Recebo do professor Silvio Durante uma indicação para escrever algo sobre livro de sua autoria. Leio, me entusiasmo e publico o texto enviado a mim por ele:
"Meu caro Henrique, boa tarde! Minha dissertação de mestrado foi publicada como livro recentemente. Infelizmente tenho pouquíssimos exemplares impressos, que serão todos doados para bibliotecas públicas e universitárias. Mas se eu te emprestar um exemplar para leitura, você poderia fazer uma postagem/resenha dele aqui nas suas páginas e no Mafua do HPA? A aquisição é apenas pela plataforma virtual UmLivro.com (Link: https://loja.umlivro.com.br/o-canal-de-desvio-do-rio-parana--itaipu-na-cobertura-do-jornal-o-globo--1975-78--7417345/p ) Se estiver afim de uma boa leitura, me fala onde posso deixar o livro pra você. Um abração, Henrique!
No instagram, fiz esta postagem do livro, explicando um pouco do que se trata a pesquisa: "O Canal de desvio do Rio Paraná: Itaipu na cobertura do Jornal O Globo (1975-78) é um trabalho realizado no PPGHis da UNILA, sob a orientação do historiador Dr. Paulo Renato da Silva (@pauloparesi). Belamente produzido pela editora Diálogo Freiriano, versa sobre uma etapa construtiva da colossal usina hidrelétrica de Itaipu, na época a maior obra do Brasil e uma das maiores do mundo. Tido como obra crucial pelos generais da ditadura militar do Brasil e do Paraguai, o Canal de Desvio é uma etapa pouco conhecida do empreendimento e o livro mostra como o Jornal O Globo apresentou ao país tanto a obra, quanto seus proponentes e, em menor monta, os trabalhadores barrageiros. Alias, à estes "homens de aço" dedicamos não apenas páginas do livro, mas toda esta obra em si, pois do esforço destes operários, espremidos entre a lama do Rio Paraná e as enormes máquinas das escavações, ergueu-se a imensa detentora dos maiores recordes energéticos do mundo, a usina de Itaipu, que no idioma dos parentes guaranís significa "a pedra que canta"".
No instagram, fiz esta postagem do livro, explicando um pouco do que se trata a pesquisa: "O Canal de desvio do Rio Paraná: Itaipu na cobertura do Jornal O Globo (1975-78) é um trabalho realizado no PPGHis da UNILA, sob a orientação do historiador Dr. Paulo Renato da Silva (@pauloparesi). Belamente produzido pela editora Diálogo Freiriano, versa sobre uma etapa construtiva da colossal usina hidrelétrica de Itaipu, na época a maior obra do Brasil e uma das maiores do mundo. Tido como obra crucial pelos generais da ditadura militar do Brasil e do Paraguai, o Canal de Desvio é uma etapa pouco conhecida do empreendimento e o livro mostra como o Jornal O Globo apresentou ao país tanto a obra, quanto seus proponentes e, em menor monta, os trabalhadores barrageiros. Alias, à estes "homens de aço" dedicamos não apenas páginas do livro, mas toda esta obra em si, pois do esforço destes operários, espremidos entre a lama do Rio Paraná e as enormes máquinas das escavações, ergueu-se a imensa detentora dos maiores recordes energéticos do mundo, a usina de Itaipu, que no idioma dos parentes guaranís significa "a pedra que canta"".
Valorizando quem pesquisa, quem produz e insiste em trabalhos elucidativos, o livro do Silvio se enquadra nisso tudo, daí eis minha crontruição para que, interessados o busquem pelo canal Loja.umlivro. Uma delícia observar amigos sendo, fazendo e acontecendo.









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