segunda-feira, 6 de maio de 2019

O QUE FAZER EM BAURU E NAS REDONDEZAS (113)


OS TRÊS PORCOS - ASSENTAMENTO KANNÃ BAURU

Uma peça teatral com temática infantil, mas também para adultos sendo apresentada no interior do maior assentamento urbano de Bauru, o Kannã. É possível isto, e ainda mais, quase as vésperas da decisão final sobre sua desocupação ou mesmo resistência? Sim. Foi o que de fato ocorreu na manhã de hoje quando a Próxima Companhia (www.aproximacompanhia.com.br), numa ousada produção da conhecida teatróloga Solange Borelli, por intermédio do Proac SP, chega até Bauru e escolhe como local de apresentação da peça "OS TRES PORCOS - FUÇANDO NAS RUAS", um espaço central dentro do referido assentamento, pois a temática tem tudo a ver com o local e seus moradores.

Sinopse: "Três porcos procuram por um espaço para construir suas casas e aos escolherem um local desocupado descobrem que ele pertence ao Lobo, e que deverão pagar para morar ali. Logo, o Lobo decide transformar aquele espaço em um empreendimento imobiliário, e tenta tirar os porcos do lugar, manipulando os suínos por meio de cartas de despejo, incêndios "acidentais" e outras manobras, por vezes utilizando um dos porcos como seu funcionário. Dessa forma, os procos deixam de trabalhar juntos para a manutenção da vida coletiva e passam a preocupar-se com a manutenção do seu conforto individual, mesmo que para isso tenham que sacrificar seus laços e as moradias dos outros".

Uma belezura de texto e de interpretação. Tudo começou há uns dois meses atrás, quando o amigo José Vinagre me liga e pede se tenho o número de alguém do Kannã, pois estava em contato com uma diretora teatral paulistana querendo aqui se apresentar e justamente lá com eles. Passo o do Cláudio Lago e este a coloca em contato com o pessoal do assentamento. Me esqueço do assunto e nessa semana, para minha grata surpresa, tudo já está devidamente montado e a única apresentação na cidade ocorreria no Assentamento, na manhã deste domingo, 11h. Claro que vou, levo Ana Bia junto, o Vinagre idem, Lago e Sivaldo Camargo seguem por outras vias e todos lá aportamos.

Um maravilhamento total e absoluto. A temática se encaixa visceralmente com a vida dos moradores, ainda mais por estarem passando neste exato momento um dos mais cruciais da luta pela definição ou não do lugar como o de suas definitivas moradias. As crianças adoraram e os adultos saíram de lá com a pulga atrás da orelha, pois a peça é mais do que fazer pensar, sendo na verdade, um fazer lutar, resistir e enfrentar o tal do "lobo" com garra, disposição, coragem e união, muita união, pois sem ela nada é conseguido a contento neste país. Todo o pessoal envolvido na apresentação de uma simpatia enorme e o trato deles para com a comunidade, algo que nunca mais esquecerei. Emoção do começo ao fim, inclusive dos atores no contato com a realidade ali vivida.

"A Próxima companhia, formada em 2011, tem em sua trajetória uma prática teatral baseada em pesquisas, experimentações e criações artísticas voltadas ao trabalho do intérprete e sua relação com o público e ao desenvolvimento de uma dramaturgia própria e em diálogo com a cidade", está escrito no folder distribuído no local. Esse diálogo com a cidade, no caso, com a realidade das ruas, com o maior problema vivido pelos moradores do Kannã foi de fazer emocionar os mais reticentes e duros. Não teve quem não tivesse saído dali carregado com uma intensa carga emocional e recarregado para os embates que virão pela frente.

A questão da reforma agrária e urbana sempre esteve na pauta do dia deste país, mesmo que seus governantes ousem descartá-la e como vemos hoje, até criminalizá-la. Bestiais existem aos borbotões, eles sim são os seres descartáveis desse mundo, onde a maioria ainda se submete aos interesses de uma minoria, mais por não saberem a força que possuem quando unidos. Um dia saberão, espero. O que a peça incute em quem a assiste é exatamente isso, o despertar, o abrir dos olhos diante de algo que precisa, deve e já deveria ter sido feito. Enfim, o LOBO não pode continuar ditando as cartas, ainda mais de uma forma autoritária e arbitrária, como o faz. Para reverter isso, o trabalho incessante de formiguinha se faz necessário. A Próxima Companhia faz isso, sendo mais um grão de areia a conscientizar os que um dia irão virar essa mesa e restabelecer a verdadeira ordem das coisas nesse mundo. Torço e luto por isso.

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