sábado, 3 de agosto de 2019

RELATOS LATINOS / PORTENHOS (69)


O PERIODISTA GUSTAVO CAMPANA NUM BAR COOPERATIVA DE TRABALHADORES EM BUENOS AIRES E ALGO IDÊNTICO PODENDO ACONTECER NO MAFUÁ EM BAURU

Na noite de sexta, 02/agosto estive marcando presença aqui em Buenos Aires numa “charla”, uma exposição pública, lançamento de um livro de Gustavo Campana, periodista famoso na Argentina e radialista junto de Victor Hugo Morales no melhor programa de rádio do nosso mundo, o La Mañana na 750AM, mantida por uma espécie de cooperativa de trabalhadores, mantenedora também do melhor jornal diário da América Latina, o Página 12. Conheço Campana de outros momentos, quando estive com ele e os demais no programa em anos anteriores. Tinha como pauta, sugerida a mim para Carta Capital e aceita por eles, para uma entrevista com Victor Hugo, uma comparação sobre o papel da mídia massiva na Argentina e no Brasil, comparações entre O Clárin e O Globo, mas não consegui cumprir o prometido. Victor Hugo esteve durante toda a semana em viagem a Madrid e Roma. Impossibilitado de entrevistá-lo, acompanhando o programa vejo Campana promovendo o lançamento do seu mais recente livro, “Culpables - Proyecto de país vs. Modelo colonia” em variados lugares e me predisponho a marcar presença em um deles. Foi o que fiz.

O local escolhido não podia ser mais adequado, o bar restaurante “Lo de Nestor – Bar Cooperativo” (facebook: bar lo de nestor), localizado no coração do bairro boêmio de San Telmo (rua Bolivar 548). Chego e logo na entrada a mais grata surpresa, todo o local é uma reverência para Nestor Kirchner e o que representou de salutar para este país. Espalhados em suas paredes belas recordações de seus momentos políticos, com fotos, gravuras, estatuetas, bonecos e os murais, em tamanho gigante na maior parede do bar, bem junto ao palco. Tudo lembra o ex-presidente, até o cardápio, onde se vê os nomes das guloseimas com algo ligando a comida a ele. No lugar, muitas mesas reservadas e quando me preocupo com o lugar onde ficaria, um atendente me aborda e sugere uma mesa coletiva, bem na frente de onde se daria a fala de Campana. Me instalo e logo chegam duas pessoas. Uma senhora argentina disposta a dividir comigo um litro de cerveja artesanal e na sequência Damian, outro ali pelo mesmo motivo. Iniciamos uma amigável conversa, compartimos da cerveja, de uma cumbuca de amendoim e conversamos muito sobre nossos países, Lula e Cristina, as questões todas dessa coleção de golpes sob os costados dos trabalhadores de ambos os países.

Campana senta diante de nós e fala por aproximadamente uma hora. Conta algo sobre a história, não só da Argentina, mas da evolução do capitalismo para esse formato de neoliberalismo predatório, cada vez mais insano. Seus livros tratam deste tema e para descrever o seu conteúdo, prende a atenção de todos com uma fala candente, envolvente e cheia de dados e citações precisas. Assistam ao link do pequeno trecho gravado por mim e publicado em meu facebook: https://www.facebook.com/henrique.perazzideaquino/videos/2818779551485369/. Nele, um bocadinho do encanto proporcionado pela fala de um profundo conhecedor da história de seu país, com citações de datas de memória, demonstrando o seu apreço pelo que faz e o que defende. Estudioso do que faz, em seus livros e em suas diárias falas pela rádio, o real entendimento do que se passa na Argentina. Encerra sua fala com algo bem definido sobre a situação de gente como ele a de quem o assiste: “Nós somos os donos da verdade, porém eles, os que nos governam hoje são os donos da razão, pois os recursos e a força estão com eles. Apesar de tanta coisa, tanta injustiça, tanta maldade, tanta perseguição, tantas mortes, estamos aqui. Estar aqui é de uma vital importância, diz que apesar de tudo, o seu e o meu sonho podem se realizar”. Lembra também frase de revolucionário do seu país diante de algo quase intransponível: “Seu sonho é impossível”. Como resposta teve o ideal de toda uma vida” “O meu sonho é impostergável”. Eis o motivo de todos estarem ali presentes.

Conversei por alguns instantes com ele ao fim da palestra. Ele se mostrou interessado em ver das possibilidades de ainda viabilizar a entrevista com Victor Hugo, mas essa se mostra impossível, pelo meu próximo retorno. Não trago seu livro, pois justamente neste dia não os consegue trazer, por problemas de percurso. Transmito os devidos abraços para Victor Hugo e Fernando Borroni, outro por quem nutro enorme simpatia e o ouço diariamente pelas ondas da rádio.

Na sequência sou conduzido por Damian, ciente de meu encanto pelo bar, o qual lhe havia dito querer tentar montar algo com a mesma conotação política em minha cidade, onde faço parte de agrupamento político ligado do PT, o Núcleo de Base DNA Petista e desta forma me apresenta para Leonardo Duva, presidente da Gestara – Grupo de Empreesas Sociales y Trabajadores Autogestionados de la República Argentina (www.gestara.org), o órgão que além de tantas coisas, administra o bar restaurante. Ficamos a conversar na calçada defronte o bar, ele me explicando o que vem a ser isso da Gestara, muito comum em seu país e da ideia de montar local para agrupar os que tiveram ligação com as transformações propostas por pessoas como Nestor Kirchner ao país. “Não é nada fácil manter um local assim, mas se faz necessário, pois aqui é um lugar para nos vermos, estarmos juntos, conversarmos e desta forma mantermos acesa a chama, não esmorecer”, me diz. Explico a ideia pretendida para com o grupo do qual faço parte, a criação de um lugar exatamente com essa cara, modo e jeito, onde se possa juntar, pelos mesmos motivos, pessoas com identificação de vida, política, social, cultural, interesses em comum.

Trocamos cartões e endereços internéticos para levar adiante, ele me auxiliando com sua experiências, eu e os meus com o desejo de “botar o bloco na rua”, criando algo com o intuito de ser um local de encontros e reencontros, assim como os que o bloco carnavalesco Bauru Sem Tomate é Mixto já tenta fazer em seus esporádicos encontros. Saio extasiado de forma dupla do “Lo de Nestor” e a cabeça gira. No dia seguinte um show musical com apresentação de cantante folclórica e a possibilidade de continuidade da conversa. De Campana, segunda novamente o ouço pelas ondas da 750 e os municiei com alguns exemplares de Carta Capital, principalmente o último, ainda o lendo, tendo Bolsonaro com o nariz de Pinóquio, clara demonstração de seu triste papel na história de meu país. Macri, o presidente argentino, outro narigudo, mentindo também muito, como me foi mostrado com sua contundente fala na rádio e na palestra, ou seja, existe muito o que fazer por todos os injustiçados, desassistidos, perseguidos e calados por esses sombrios tempos.

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