quinta-feira, 4 de abril de 2019

OS QUE FAZEM FALTA e OS QUE SOBRARAM (124)


CARDEAL ARNS, RELIGIÃO E O MOMENTO ATUAL*
* Enfim, quantas vezes morreu Dom Arns? Essa só mais uma, daí aproveito para tecer essas mal traçadas. Ontem rivalizou nas redes sociais a informação da morte de Dom Arns, tendo ele falecido em 2016. Aproveitei o ensejo e escrevi o texto:

Primeiro escrevo da foto aqui postada. Ela me foi enviada hoje, numa triste coincidência, pelo fotógrafo bauruense Calil Neto, pois estamos juntos montando um painel da resistência operária paulista e brasileira durante a ditadura militar e o então cardeal Arns foi um dos baluartes da luta contra o período opressor. Sua participação é mais que grandiosa e extrapola o âmbito religioso. Calil Neto registrou por décadas o Brasil de cabo a rabo, tendo fotos de variados e múltiplos acontecimentos, esse um deles e Bauru terá a oportunidade de ver tudo isso exposto, ainda num lugar não definido no dia 1º de Maio, Dia do Trabalhador. Portanto, essa foto não foi escolhida ao leu, tratando-se de uma com profundo significado, peça rara e única, acervo pessoal do brilhante e efervescente Calil, testemunha ocular da História.

Dom Paulo Evaristo Arns faleceu hoje e sempre esteve nas graças desse intrépido fugitivo de igrejas e cultos. Sua ação, grandiosa na sua essência, transcendia a religião. Nos tempos em que foi tirada, anos 80, exista uma religião, principalmente a católica, a protestante e algumas evangélicas com interesses e olhos voltados para o povão. Eles não estavam interessados no dízimo e sim, em possibilitar ao povo o entendimento do que de fato acontecia com o país. Nesse período me encantei com a Teologia da Libertação e dela cheguei a ser adepto, leitor voraz e divulgador. Foi um único momento em que a religião me tocou, pois queria dizer algo pro coletivo e não para o individual. Hoje, olho aqui na Diocese de Bauru e não consigo identificar nenhum padre com essa disposição de luta. Vejo um, o padre Severino Leite Diniz Diniz, junto aos trabalhadores em Promissão, Diocese de Lins, carregando esse piano praticamente sozinho, como uma espécie de Dom Quixote na eterna luta contra os moinhos. E como são tantos os moinhos nos dias de hoje, muitos se mostrando intransponíveis diante da brutal desunião em que nos encontramos. No segmento evangélico neopentecostal tudo devidamente perdido, sem salvação, todos domesticados para atuar dentro das leis de mercado e contra os interesses do zé povinho. Uns papa niqueis sem nenhum valor, porém fortalecidos, pois souberam se aproveitar de um povo desprotegido, sem cultura e deles tira todo proveito possível.

Onde estaria Dom Paulo nos dias de hoje? Certamente esgrimando contra os bolsarismo e tudo o que ele representa. Tentando também instruir e não domar as massas. Quando a igreja, num todo hoje, praticamente se deixa vergar diante dos poderosos, os resistentes padecem e os vejo cada vez mais alijados, encostados num paredão, calados, contidos e esquecidos. Aquela igreja dos anos 80 não existe mais, como dom Paulo, corintiano como eu, se foi e com ele parte da esperança de dias melhores dentro da profecia religiosa. Persistem baluartes, como o citado, mais frei Beto, Leonardo Boff, Casaldaliga e alguns poucos, que conto nos dedos. Talvez o próprio papa Francisco, ele mesmo travando uma luta contra os dogmas e o conservadorismo instalado dentro da arcaica estrutura, praticamente não aceitando mudanças. Ele é um estadista e tenho certeza, se daria muito bem com Evaristo Arns. Não posso dizer o mesmo das relações do papa Francisco com, por exemplo, o atual bispo bauruense. Nem Francisco, muito menos Arns são da cepa dos atuais religiosos. São poucas as disponíveis peças de reposição. Arns é merecedor do meu respeito e consideração.

DESVENDANDO O OUTRO LADO DE TEXTOS PUBLICADOS NA IMPRENSA
Ando entesudado por causa de um projeto novo. e antes de falar dele, escrevo de outro, um livro do gaúcho Moacyr Scliar, que por décadas foi colunista da Folha de SP e ali manteve um primoroso texto semanal onde dissecava à sua maneira de matérias corriqueiras extraídas do jornal. Pegava o cara, por exemplo, que aplicou o golpe do baú e recontava tudo ao seu modo e jeito. Uma delícia. A capa do livro reunindo essas crônicas eu publico aqui. Essa semana vi um texto no JC de mais uma senhora caindo no golpe do baú,m perdendo 23 mil reais. Quando vi aquilo mais uma vez no jornal, pensei comigo mesmo, preciso escrever disso, até para sugerir não penalizar o cara que aplicou o golpe e sim, quem se disse lesada. Antes mesmo de pensar em fazer, aqui mesmo pela internet o jornalista Nelson ItaberáGonçalves já o fez e com a mesma pegada que pensava dar, ou seja, a mesma também que o Scliar dava nos seus textos na Folha tempos atrás. Num certo tempo juntei recortes de jornais com essa intenção, mas com essa enchente lá na barrancas do rio Bauru, desta feita perdi tudo. Não desisto. Penso em começar tudo de novo e daqui pra frente. Escrevinhar em cima de fatos tidos como triviais é o que me move, aliás, tento seguir os passos de Luiz Antonio Simas, historiador das quebradas, carioca dos cafundós da cidade, quando se intitula: "Sou historiador das INSIGNIFICÂNCIAS". Como é bom ser insignificante e assim ir tocando o barco. Outro dia meu filho me dizia disso: "Pai, a Islândia é tudo de bom. Ela está lá num canto da Europa, segue seu caminho fazendo e acontecendo, mas como é pequenina, sem grande importância, passa desapercebida e daí apronta todas e poucos notam". Nem notícia sai deles...

QUE BOM, AINDA TEM QUEM GOSTE DA GENTE...
Hoje tem uns cidadãos que te param na rua para discutir. Não falo debater, conversar, parlar sobre questões divergentes, mas para te admoestar, provocar, espezinhar e até botar o dedo na cara quando se vê mais forte que tu e na falta de argumentos convincentes, já quer ir descendo o braço. Gosto disso não. O que gosto foi o que me aconteceu dias atrás quando fui lá no Teatro Municipal presenciar a tal da conversa do prefeito com gente da classe artística bauruense. Fiz até uso da palavra e nisso alguém que ali estava junto de representantes do Clube da Viola alevantou o pescoço quando estava com o microfone na mão e no final de tudo, quando estava nos preparativos para zarpar fora, se achegou e puxou conversa: "O sr não é o Perazzi de Aquino?". Como era eu mesmo, confirmo e ele se apresenta, primeiro como irmão de um baita amigo, o poeta que leu Nietzsche, o caipora do Lazaro Carneiro Carneiro, por quem tenho grande admiração. Depois, diz quem é, Cândido Edith Carneiro e me enche de alegria e contentamento ao dizer: "Te leio todo dia. Gosto do jeito como escreve e das cutucadas que dá nos poderosos. O Lazinho fala muito de ti e queria te conhecer, quando te vi falando, olhei e ao falar o nome, vi ser muito parecido com o careca da internet, pronto, quis vir aqui te dar um abraço". E nos abraçamos como velhos novos amigos. Esse mundão que tando desaproxima, também aproxima e providencia uma carga de aconchego em algumas situações. Sai de lá em estado de júbilo e contentamento, primeiro por confirmar existirem mesmo gente que lê a gente, depois por conquistar mais um amigo, desses da mesma laia que a minha, gente boa de prosa, cheio de histórias pra contar. Só não deu tempo dele assuntar mais e oferecer pra ir ter com ele em sua casa prum cafezinho, bolo caseiro, essas coisas, algo que muito me apeteceria e aceitaria assim de bate pronto. Diante de tantas brigas sem sentido, eis um acontecimento para ser registrado, mais um amigo conquistado, até ontem oculto, a partir de agora declarado. E mais que isso, o danado é um autêntico caipira, matutos dos bons, como gostaria te poder ser um dia na vida (labuto para isso) e me disse no pé do ouvido: "Desça o pau, sou tão esquerdista como tu. Esse mundo direitista é mesmo uma nhaca, vamos virar essa mesa". E ainda me deu força pra continuar na mesma toada.

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