sexta-feira, 25 de outubro de 2019

RELATOS PORTENHOS / LATINOS (71)


O TAXISTA TENTA ME APRESENTAR PRA VIDA POLÍTICA DO SEU PAÍS - PROVOCO, PORÉM OUÇO MAIS DO QUE FALO E ASSIM COMEÇA MINHA ESTADA POR TERRAS ARGENTINAS

A gente tem que começar do princípio e aqui pela Argentina, conto tudo desde a chegada para presenciar a eleição presidencial no próximo domingo. Pra começo de papo, uma informação que não sabia. Chego na sexta e ontem, quinta foi o último dia oficial de campanha, ou seja, hoje tudo parado e proibição total de qualquer tipo de campanha. A legislação eleitoral por aqui é rigorosa e logo ao chegar no aeroporto percebi um clima diferente do que imaginava. O taxista que me trouxe do aeroporto de Ezeiza até o hotel na avenida Corrientes, aproximadamente 40 km, horário de pico, parece ter sentido minha desilusão pro ter encontrado um clima diferente do que imaginava e como já me conhecia de outras corridas, das vezes anteriores me esclareceu:

- Até ontem a cidade estava fervilhando, quando ocorreram os dois últimos comícios, a dos dos dois verdadeiramente na disputa, Alberto Fernandéz e Cristina Kirchner pelo Frente de Todos e Maurício Macri e Miguel Angel Pichetto pelo Juntos pela Mudança. Ambos não realizaram seus últimos comícios aqui em Buenos Aires, mas as campanhas estavam no pico. o sr perdeu, pois a partir de hoje, por 48 horas nada pode ocorrer e todos respeitam, pois qualquer violação pode incorrer em graves penalidades. Vai perceber que a cidade hoje nem parece estar vivendo um clima eleitoral tão nervoso e cheio de ataques, mas domingo tudo volta a ferver. Aguarde para ver.

A tranquilidade das ruas só se alterava pelos outdoors ao lado da pista, esses ainda espalhados pela cidade, do contrário, nada, nem santinhos nas ruas. Para quebrar a monotonia, peço licença e lhe digo:

- Já que começamos, quero que sejas o meu introdutor na vida política argentina. Se topar, irei te fazendo perguntas e vais me respondendo dentro da sua concepção e vivência. Aceita?

Ele aceitou e por meia hora viemos conversando, não num tom de entrevista, mas de conversa entre alguém local e outro munido de muita curiosidade.

- Carlos (esse o nome que lhe darei, trocado para evitar ser identificado), me diga, percebo que não gosta muito de Cristina e me disse ter votado no Macri, por que isso dela ser corrupta e Macri não, sendo que ela terminou o governo dela e o país estava bem melhor que hoje?

- Votei no Macri, mas hoje não o farei mais, como votei no marido dela, no Nestor e não votei nela. Vejo isso como o ocorrido no Brasil, quando Lula foi ótimo, mas sua sucessora deixou a desejar, sendo bem diferente dele. Nestor tinha um propósito e Cristina conduziu o país para outro. Ela é dona de rede hoteleira, todos de luxo e seus hotéis viviam cheios de funcionários públicos, gente, por exemplo das Aerolíneas Argentinas e na verdade nem se hospedavam, só constavam seus nomes nas fichas. O sr acha certo isso? Já o Macri, isso dele ter grana em paraíso fiscal, os tais Panamá Papers é coisa antiga, muito antes dele ser eleito, coisa das empresas deles. o procedimento dele enquanto presidente é diferente do que tinha nas empresas. O sr me fala dos Correios Argentinos que é do grupo empresarial da família dele, mas nada tem a ver com o governo.

- Pera lá, seu Cláudio, o sr me diz que a Cristina é corrupta por ganhar dinheiro proveniente de grana de vagas supostamente ocupadas nos seus hotéis e que com Macri faz vista grossa, mas com ela, um horror. O que vale para um, deve valer para o outro ou não?

- Veja bem, Cristina era para estar presa, mas Macri preferiu não fazê-lo, pois não quis incendiar o país. Eu já lhe disse, não tem como esconder, o país piorou muito e ele não soube administrar bem, a pobreza aqui aumentou demais, as firmas maiores estão fechando e a Argentina está de um jeito que nunca vi, nem nos tempos do Menem. Eu não posso mais votar nele, disso tenho certeza e se não votaria na Cristina, não irei votar em nenhum dos outros cinco candidatos e talvez o faça em Fernandéz, pois sei, ele fará um governo independente dela. Ela será respeitada, mas não terá voz no novo governo, pois o desentendimento deles não é de hoje. Se ela se intrometer, haverá um rompimento logo de cara. Creio que ela terá um cargo decorativo, sem intromissão nenhum e ele , com seu jeito de bom advogado, professor de Direito, vai saber olhar mais para os pobres e devolver um pouco da dignidade perdida nesses tempo. Veja nas ruas, essa população de rua cresceu demais. Por aqui os índices de violência são baixos, o sr pode andar tranquilo nas ruas, vai ver muitos pedintes, muita gente morando nas ruas, mas eles não irão lhe roubar, não são acintosos.

- Tudo bem, Carlos, vejo que assim como capitulou e não vota mais no Macri, por outro lado não mudou sua opinião com Cristina, mas é inegável, o povão gosta dela. Que me diz disso?

- Macri não soube atender as necessidades do povo e sim, dos seus amigos. Eu reclama que alguns ministros de Cristina ficaram muito ricos, com alguns deles tendo mais de cem imóveis na cidade, mas hoje percebo o mesmo ocorrendo com os de Macri. Eu não gosto do estilo dela, não vou mudar de ideia, mas vivendo aqui nas ruas, circulando pela cidade o dia inteiro não tenho como esconder, o país piorou e se Macri se reeleger vai piorar ainda mais, daí o melhor será mesmo tudo acabar agora na Primeira Volta, ou Primeiro Turno como dizem no seu país. Se Alberto tiver uma diferença de mais 10% do Macri ou atingir mais de 47% dos votos estará eleito e assim deve ocorrer. Eu torço pela Argentina e assim sendo, ao menos entendo que com Fernandéz, essa população hoje mais empobrecida terá mais atenção. Tenho que ir com eles.

Antes de me deixar no hotel, nas preliminares de minha estada, ainda conversamos sobre a eleição para governador da província de Buenos Aires, com o candidato peronista Axell Kiciloff praticamente também eleito, ele muito jovem, ex-secretário Finanças da Cristina e a maior esperança peronista para o futuro futuro dessa linhagem política. "Ele é bom, nada sei dele, o que sei é que é muito mais eficiente do que o filho de cristina, o Máximo. Deve ganhar, mas a coligação de Macri deve reeleger o prefeito Larreta", me diz. Não entro em dividida, mais ouço e não o provoco, enfim, ele me leva e traz pela cidade, me explica algo mais da vida da metrópole e me cobra um valor honesto pela corrida. Na despedida me provoca ou me instiga, fingi não perceber direito e me fazer não ter entendido o sentido do que me diz:

- Quero conversar com o sr novamente na despedida, depois da eleição e continuar. Vai me dizer o que achou do resultado, como fez seu trabalho e se precisar, digo como acho que vai ser daqui pra frente com quem ganhar. Na terça a gente continua, tudo bem?

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