segunda-feira, 28 de dezembro de 2020

MEMÓRIA ORAL (263)


"EU TRABALHO COM A CRIATIVIDADE" - A HISTÓRIA DE SEU ROBERTO PEDROSO E SUA ÁRVORE DE NATAL AMBULANTE
Essa a frase que mais sai da boca de seu Roberto Pedroso, 48 anos, morador da rua Xavantes, na vila Cardia, quase esquina com a rua Marcondes Salgado, pouco menos de 300 metros do imponente e pomposo Boulevard Shopping. Ele vive num outro mundo, bem diferente do que rola dos muros do shopping para dentro, mas com sua "criatividade", além, de fazer e acontecer, brilha e chama muito a atenção por onde circule. Quando o encontrei estava limpando sua própria calçada, defronte seu lar e na calçada, estacionado e sempre em exposição sua indumentária de trabalho, o que denomino de "parangolé" - em homenagem ao artista Hélio Oiticica e a Bispo do Rosário, que certamente ele não conhece -, numa justa comparação, clara e evidente demonstração de como anda a criatividade na mente e ação de muitos brasileiros, ou ao menos os predispostos a sair pela aí mostrando o que vai pelas suas cabeças.

Roberto ganha a vida, ou sobrevive como ele mesmo diz, na maior dificuldade, antes catando reciclados, mas diante do aumento da concorrência, expandiu suas ideias e hoje, o que mais faz é bater de porta em porta e se oferecer para pequenos serviços. Faz de tudo, desde varrer, podar, limpar, recolher entulhos, ou seja, limpeza geral. Na manhã de hoje, na falta de serviço, fazia algo que tinha em mente há meses e sem tempo adiava, a da execução de uma limpeza no seu próprio espaço, no caso, a calçada de sua residência. Foi quando, passando sem rumo, voltando pra casa, me deparei com a performance propiciada pelo seu meio de locomoção, parei e fui assuntar, em primeiro lugar se podia fotografar.

Permissão concedida, mantivemos a distância regulamentar exigida pela pandemia em curso e fiz mais, tirei um bloco de anotações, sempre presente no console do carro e me pus também, além das fotografias, a anotar. Roberto falava rápido e as vezes pedia para repetir, pois não queria perder os detalhes de seus relatos. "Eu trabalho com a criatividade", ele repetiu várias vezes. Vi isso com meus próprios olhos e me encantei. Ele, na verdade, é o encanto em pessoa. Simpático e falante, confia nas pessoas e se abriu comigo. "Trabalho sozinho, pois cansei das decepções. Muito difícil um parceiro honesto. Muito difícil botar fé nas pessoas. Faço o que posso, sempre só", diz.

Começo a reparar nos vários objetos fixados em seu carrinho e ele vai me explicando. "Esse guidão, o sujeito acha simples, mas ele tem um jeito diferente para conduzir o carrinho. Se não souber, trava em questão de metros. Tem que ser assim, pois tem muita curiosidade. Explico, converso, mas tem os que se aproveitam quando não estou por perto e querem sair com ele, levar embora, roubar mesmo". Aponto um Louro José numa das laterais e ele explica: "Tive que fixar ele, pois a meninada já tentou levar o boneco. Não tivesse parafusado, já o teria perdido e assim faço com vários outros objetos, como esse vaso feito de pneu. O som que vocês vem aqui, já funcionou, mas hoje não mais. Ele permanece, pois um dia conseguirei consertar. Fiz além deste primeiro, mais cheio desses objetos que fui ganhando e recolhendo das ruas outro, para coletar os reciclados. Diminui a coleta, mas por onde ande, continuo juntando o que consigo vender com mais facilidade e me dá melhor retorno".

Ele me diz que ao circular pelas ruas faz uma espécie de "exposição ambulante" e acredito, pois o que me motivou a parar e querer registrar o que estava vendo foi exatamente o inusitado, o diferente e a forma como foi montando. Tudo muito simples, mas de um colorido bem chamativo e que, comparei quando com ele a uma árvore de Natal. Ele riu, concordou e me disse só faltar o pisca-pisca. Para cada coisinha ali presente ele tem uma explicação, uma história e para ouvi-las todas teria que ter muito tempo. No momento da abordagem, nem eu, nem ele a tínhamos. Ele, ali na calçada, saco já cheio de folhas e lixo ajuntados, pronto para adentrar o portão que dá pra rua e continuar a faxina de final de ano do lado de dentro. 

Para os interessados em que leve até eles sua exposição ou mesmo necessite de um serviço rápido, eficiente, bem feito e concluído dentro do combinado, faz questão de pedir que venham até seu portão, na rua Xavantes nº 2-51. Me despeço e ainda tiro mais algumas fotos do outro lado da rua, ainda deslumbrado com a conversa e tudo o que ali presenciei. São pessoas como esse seu Roberto Pedroso, os tais dos encantadores de serpente, os cheios de uma pureza quase não mais existente, os que ainda me fazem parar na rua, mesmo diante de uma avassaladora pandemia, tudo para ter contato e tomar conhecimento de algo, que sabia de antemão, arrebatador. Desta forma, dou de cara com a mais imponente árvore de natal bauruense deste final de 2020.

AS HISTÓRIAS QUE ME COMOVEM
Elas são simples, generosas e cheias de calor humano. A cuidadora de idosos começou a trabalhar naquele Lar de Idosos há bem pouco tempo e por lá, até então, uma monotonia pairando no ar, tudo correndo sem sobressaltos, mas também nenhum arroubo. O atendimento acontecia dentro dos padrões, mas após sua chegada algo mudou, pois ela sorria mais, conversava mais, interagia com os velhos, cantava com eles, os estimulava de forma diferente e em várias vezes elas os levava até a janela para mostrar algo novo. Noutro dia estavam procurando o cometa no céu, monte deles empoleirados junto dela na área verde, com seus olhos já um tanto fracos, mas ela insistindo que se forçassem a vista iriam conseguir enxergar. E os fez ver algo que nem ela conseguia enxergar, mas todos saíram do exercício satisfeitos e renovados.

Poucos dias antes do Natal uma das famílias cuja mãe ali estava internada leva um panetone para ser entregue a cada funcionário e essa senhora fica impaciente quando percebe que todos seriam entregues aleatoriamente ou coletivamente. Consegue se comunicar com a direção e explicita que, o daquela nova funcionária ela mesmo queria entregar. Ela o fez e ao vê-la chegando pela manhã, estava irradiante, se preparou para o que considerava um evento. Vestiu um belo vestido, passou perfume e quando a viu, gritou, a chamou em voz alta, chamou a atenção de tudo e todos. Só acalmou quando ela se aproximou e entregou o seu panetone, após um inevitável abraço, percebido por todos. Era como se estivesse entregando um troféu de reconhecimento por serviços prestados. Choraram abraçadas.

Nessa semana após o Natal, a dona do estabelecimento já tinha determinado o horário para essa próxima semana e a novata estaria no plantão noturno. Se viu obrigada a mudar tudo, readequar o pessoal, pois o rendimento dos internos estava se alterando sem a novata e suas estripulias na parte da manhã. Muitos a vendo somente a noite estavam trocando o dia pela noite e querendo ficar mais tempo acordados e a ouvindo contar histórias, ocorrendo o contrário durante o dia, quando deveriam ter atividades outras, algumas externas, na tal área verde, porém rejeitadas e sem estímulo para suas realizações. Não sei o destino que vai ter essa história, mas fiquei estimulado a conhecer essa cuidadora e tomar conhecimento in loco dos seus revolucionários métodos que, se aplicados ao caso do Brasil e de sua inércia atual, talvez nos motivassem para as transformações que se fazem necessárias, pois por aqui todos atordoados e sem saber como realizá-las. Ah, como gosto das pessoas que fazem e acontecem, com amor e dedicação, não tornando o dia a dia mera rotina. Vou assuntar melhor e tomar umas aulas de como produzir adrenalina e arrebanhar estimulo pra prosseguir na lida com mais gás.

AS HISTÓRIAS NADA COMOVENTES
ESCOLAS MILITARES ESTADUAIS, RETROCESSO SEM PRECEDENTES, AMBIENTE HOSTIL À PLURALIDADE DE IDEIAS
https://www.cartacapital.com.br/.../parana-e-o-estado.../
Meu dileto amigo, o jornalista paranaense do staff de Carta Capital René Ruschel, lotado em Curitiba, publica na última edição do ano da melhor revista semanal do nosso mundo, a Carta Capital, texto elucidativo sobre a invasão das escolas militares, sendo implantadas pouco a pouco na rede estadual de ensino, com a complacência de governadores e também de prefeitos. Um vergonha, um retrocesso sem precedentes para a mente humana ainda em formação, pois as tonará cada vez mais limitadas. Jaú, aqui vizinha de Bauru, prefeitura conduzida até o final deste ano por um ex-petista Rafael Agostini, aceitou e foi encantado pelo canto da sereia e já está fixando datas para aceitação e implantação do novo esquema educacional. O resultado, como sabemos, será "o da intervenção militar e não o de um ambiente construído por profissionais de diversas especialidades. (...) Conteúdo escolar que figura mais como adestramento intelectual, comportamental e moral do que instrumento de reflexão", relata o texto. No Paraná, o pérfido governador Ratinho Jr (que esperar de um governador com este nome?) consegue no apagar das luzes deste ano, aprovar sua implantação, escamoteando informações e fazendo tudo nas sombras, ou seja, tudo o que é feito meio que as escondidas, traz sempre surpresas mais que desagradáveis para o povo. Esse entusiasmo com as escolas militares é algo surreal, demonstrando para onde o país bolsonarista quer e está nos levando. Leiam o texto e tirem vocês mesmo suas conclusões. Pelo que sei, Bauru continua de fora da modalidade educacional, mas com prefeita eleita por partido conservador e bolsonarista, Suéllen Rosim, evangélica neopentecostal de linha conservadora, creio eu, será questão de meses para o anúncio da adesão também ser feito. Veremos...

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