sábado, 5 de dezembro de 2020

REGISTROS LADO B (23) e BAURU POR AÍ (184)

23º LADO B CONTARÁ HISTÓRIAS DE ESTRADA, RIO DE JANEIRO, CULTURA POPULAR E PERCALÇOS DE UMA VIDA ENFRONHADA JUNTO AO POVO, CONTADA PELO FOTÓGRAFO E JORNALISTA RUI ZILNET

Rui é gaúcho, 72 anos e 59 destes vividos no Rio de Janeiro, onde acompanhou boa parte da história do mais famoso balneário deste país, desde quando deixou de ser a capital federal da nação. Foram muitas transformações as vislumbradas e presenciadas pelo menino gaúcho que, fugido de casa, acabou dando com os costados no lugar para onde todos aportavam, a Cidade Maravilhosa. Dessa escolha, por buscar algo novo, fez disso um mantra e transformou sua vida numa eterna busca, algo que nem sei se já foi encontrado, mas as histórias, ocorrências, intercorrências e tudo o mais vislumbrado foram sendo armazenados no fundo da memória, algumas colocadas em prática e daí foi se consolidando o sr Zilnet.

Confesso que, por estes dias estava com muita vontade de falar sobre o Rio de Janeiro, mas precisava fazê-lo com alguém conhecedor de suas entranhas, mazelas e tivesse também vivenciado pessoalmente tudo o que por lá aconteceu nos últimos tempos. A cabeça girou, até o momento, quando no meio de uma tarde no começo da semana, fui interpelado pelo Rui num questionamento feito pelo facebook: “Henrique, o que acontece com sua cidade. A gente tem visto por aqui na TV o caso da prefeita perseguida pelo racismo. A primeira mulher negra na história da aldeia bauruense e já começa assim. Me explica?”. Tentei explicar, finalizando com algo bem ao meu estilo: “Rui, por fim, o Rio de Janeiro conseguiu via urnas se livrar de um desgoverno, o do Crivella, fundamentalista religioso neopentecostal, predatório e perigoso, exterminando com tudo, principalmente com a cultura popular e para tristeza, quem adentra o rol dos sendo governado por estes é Bauru”.

Pronto estava dado o mote para o próximo papo e a partir da conversa inicial escolhido o 23º personagem para o projeto “Lado B – A Importância dos Desimportantes”, o bate papo semanal com gente que não está na mídia e nem possui espaço para deixar registrado algo do que faz, como faz, com quem faz e tudo o mais na sua volta. Rui Zilnet é fotógrafo de reconhecido valor, com trabalhos publicados nos mais diferentes órgãos da imprensa nativa, portanto, também jornalista, com trajetória singular, desembocando no que faz hoje, a dedicação exclusiva para com a Cultura Popular, mais especificamente para com a Capoeira, percorrendo seus caminhos, trilhas e traçando os perfil de quem nela está inserido. Claro, tudo foi interrompido pela pandemia, enfim, Rui chega na casa dos 72 anos, muita estrada, muita poeira pelo país afora e muita história guardada na cachola, pronta para ser despejada, contada quando inquerido. Ele é um bom contador de histórias, memória viva e com os detalhes, enriquecendo cada acontecimento.

Falar de um Rio de janeiro que não mais existe, falar de sua passagem por Bauru, por onde andou por aqui, o que deixou registrado e também de seus trabalhos, posicionamento de vida e observador da vida urbana é pra lá de uma boa conversa. Triste demais ver o Rio com essa conotação miliciana, o tráfico junto, a violência urbana, culminando com a crise, não só provocada pela pandemia, mas se agravando demais da conta por causa dela. Juntando isso, nada como sentar pra conversar e ouvir, escutar seus relatos e ir, primeiro se enchendo de saudade, depois de boas reflexões sobre o presente e o futuro. A ideia é essa, proporcionar uma boa conversa, agradável, elucidativa e instigante.

Vejam o que escrevi dele nas publicações que faço desde 2007 através de meus escritos publicados diariamente no blog Mafuá do HPA. Uns poucos trechos, até para instigar e provocar que assistam o bate papo e assim, nos esbaldemos com o bom papo e vivência deste Rui, homem perspicaz, sabendo onde pisa e com quem pisa, digno representante de um time de muita importância, pois presenciou pessoalmente as muitas transformações da cidade mais querida deste país. Vamos aos diálogos:

- Publiquei em 20/01/2003: “NOVIDADES DOMINGUEIRAS VISTAS Á DISTÂNCIA - Eu gosto de eventos simples, porém significativos. Um desses ocorre hoje em Bauru. Veja isso: “Após 20 anos de sua passagem por Bauru, e comemorando seus 45 anos de profissão, o fotógrafo Rui Zilnet retorna à cidade mostrando um pouco do seu trabalho, em um Varal Fotográfico, que acontecerá no próximo domingo (20), das 8 às 12 horas, na Feira Estação Arte, que ocorre todo 3º domingo do mês, no Museu da Imagem & Som, da Secretaria Municipal de Cultura de Bauru, localizado na antiga estação ferroviária da Fepasa, entre as ruas Agenor Meira e Rio Branco, no Centro de Bauru. Entrada Franca”. (...) Ainda não conheci Rui pessoalmente, mas já somos amigos internéticos. Fiquei radiante outro dia ao papear com ele pelos meios que o computador nos disponibiliza sobre algo a nos unir, o América do Rio. Ver hoje essa exposição sobre um tema mais do que baurense, o motivo da cidade ser hoje o que é, sua ferrovia é algo inebriante. Eu não posso ir, pois estou fora, mas para quem pode, é imperdível. (...)”.

- Publiquei em 12/05/2014: “UM “FIM” QUE É O COMEÇO PARA PENSAR DIFERENTE ISSO TUDO – (...) Depois dei de cara com o fotógrafo meio gaúcho, carioca e bauruense Rui Zilnet num botequim na esquina da praça, quando terminamos juntos de assistir o primeiro tempo do Fla Flu (Flu ganhou de 2x0) e depois fomos circular pela praça, quando me apresentou um especialista em capoeira, o Carlão, com uma proposta arrojada junto da comunidade e de utilização da Casa Porto, o local onde os debates ocorriam. Tomamos muitas stelas (a cerveja long neck, por favor) e presenciamos a chegada do pessoal para a palestra das 18h, a instigante “Saideira: Minha cachaça é a Imprensa”, um papo com um dos maiores ilustradores e caricaturistas do mundo, o simpático Cássio Loredano (ele confirma que outros três andam por aí) e o livreiro Rodrigo Ferrari, ambos com fardamento feito a mão, versão nada oficial da camisa oficial da Seleção Brasileira. Nada de tão sério, mas com muita risadas, saindo disso tudo o que de mais sério pude escutar em todo o evento e dito por alguém que não me lembro o nome: “Não temos mais espaço para publicar nossos textos e desenhos. E por que não fundamos um jornal?”. Rodrigo, meio sem querer e não medindo o tamanho do imbróglio onde se meteu emendou e foi aplaudido por todos quando sacou o nome, dito em alto e bom som: “Folha Seca”. O compromisso, pelo que entendi, está selado e sacramentado. Na reunião das forças ali presentes, quem sabe, mas que seria bom demais, isso seria. (...)”.

- Publiquei em 10/10/2015: “A VIOLÊNCIA NO RIO DE JANEIRO É TUDO ISSO MESMO? CARIOCA RUI ZILNET SE MOSTRA UM TANTO RETICENTE - Estou lendo a semana toda algo sobre a situação no Rio de Janeiro, onde a Zona Norte e a Zona Sul estariam em pé de guerra. Vejo as fotos dos ônibus vindos da periferia sendo impedidos de adentrar a região das praias. Declarações das autoridades como que conformadas com a situação e apoiando as restrições. Seria isso mesmo? Hoje pela manhã bato um longo papo com um velho amigo carioca, o fotógrafo RUI ZILNET, morador de Santa teresa, mas com incursões profissionais diárias por toda Zona Norte, um que já morou aqui por Bauru e da conversa um algo mais, exatamente o que ainda não havia conseguido vislumbrar com toda exatidão. Juntei partes de nossa conversa e coloquei tudo entre aspas e reproduzo aqui, só para terem uma ideia de como alguém vivencia e está se processando a questão na prática: “Olha, como sempre, a mídia vem apresentando coisas que nós, que aqui vivemos, não estamos conseguindo presenciar. Não digo que esteja uma maravilha, mas não é bem do jeito que a TV mostra não. Como você bem sabe, circulo por todos os cantos do Rio e da Baixada, voltando muitas vezes na madrugada. Como sempre, eles ampliando a coisa. Há lugares, que, realmente, precisamos ter um pouco mais de parcimônia, mas não é como eles alardeiam não. É uma mídia porca, fazem de coisas pontuais, uma sensação sem tamanho e danosa. Dia desses divulgaram um arrastão no Leme, que não aconteceu. Sabe lá de quando foram aquelas imagens. Tenho vários amigos que passaram o dia na praia e me disseram que não houve nada. Filtrar a todo instante o que divulgam, interesses vis sempre acima de tudo. Nesta noite passada, voltei na madrugada de uma atividade cultural na Gamboa, passando pela área de Central do Brasil com a maior tranquilidade. O Brasil inteiro fica com uma visão distorcida da nossa cidade por causa deste comportamento desta mídia cretina, a mesma que tenta a qualquer custo derrubar o governo. Fico pasmo com comentários de amigos, que não saem de seus reduzidos espaços, que só circulam pelos shoppings da cidade, sobre os comentários de violência e do transporte coletivo. Nunca antes vi um transporte coletivo com tão boa qualidade como agora no Rio, BRT funcionando que é uma maravilha, facilitando a vida de milhares de trabalhadores todo dia. Os trens funcionando no horário, limpos, com ótimo ar condicionado, oferecendo conforto aos pobres. Isso é horrível para os ricos. Você já visitou alguma UPA no Rio de Janeiro? Se não o fez, faça uma visita quanto estiver aqui. Logicamente muita coisa precisa melhorar, mas para que a gestão pública melhore, o povo também tem que melhorar a sua maneira de enxergar as coisas. Não tenho mais paciência para escutar reclamações de quem nada faz para melhorar e só visualiza a desgraça. Pessoas que nada querem de melhor para o país. Só querem o melhor para as suas próprias vidas. Não vejo nada de bom nas intenções de quem diz que é contra a corrupção, a não ser em defesa deles próprios. Tudo que venha a favorecer o pobre "estará" revestido de corrupção. Tenho cada vez mais nojo de quem lambe os pés e saco de quem detém o poder, principalmente o econômico.”

- Publiquei em 24/05/2016: “A EXPOSIÇÃO COM AS FOTOS DO PARA-QUEDAS EM PANO, MARAVILHAS DO RUI ZILNET EXPOSTAS – O TIPO POPULAR NO CENTRO DOS ACONTECIMENTOS - Eu sempre gostei demais desse Festival Internacional de Teatro de Bonecos, nesse ano completando a 6ª edição. Dentre as muitas homenagens rolando esse ano, uma me chama em especial a atenção. No hall do Teatro Municipal, o palco principal do festival, existem outras exposições, mas um delas retrata algo mais do que marcante dessa aldeia bauruense. Trata-se da "PARA-QUEDAS – SALTO CONTRÁRIO – FOTOS DE RUI ZILNET". Ambas as coisas me comovem muito, primeiro, a trajetória de vida e a história vivenciada pelo eterno palhaço das ruas bauruenses, um que ao lado de sua Nega Maluca dançava defronte muitas lojas no centro da cidade, num trabalho realizado por ele, seu ganha pão, após ter seu circo fechado. Ele, com um microfone numa mão e noutra segurando sua nega, em peripécias mil e algo que, nunca mais sai da memória de quem tenha presenciado a cena. Na outra ponta, Rui Zilnet, um fotógrafo mais do que profissional, desses raros, sensíveis até a medula e envolvidos com as coisas da rua de uma cidade, ou daquela onde passe ou viva. Da junção, só podia mesmo dar noque deu, uma bela exposição. (...)“RUI ZILNET é gaúcho, fotógrafo e jornalista, dos bons e de uma velha cepa, resistente e persistente, ainda encantando-se com temas que o fazem virar as questões do avesso. Começou a carreira no Rio de Janeiro, sendo um dos seus primeiros empregos a já extinta Última Hora. Sempre com uma máquina na mão fez história e tem muita coisa para contar. Acabou aportando em Bauru décadas atrás quando veio trabalhar para a Editora Abril, na experiência de lançarem a Vejinha Interior (a Abril era mais palatável). Ficou por aproximadamente três anos na cidade e por aqui fez amizades eternas, circulou pelos lugares mais marcantes e acabou por firmar um amor mais do que eterno por um tema que tem tudo a ver com a cidade, a ferrovia. Os laços com a cidade não se dissolveram com a partida e sempre volta, com o fez semanas atrás e num dia inteiro ficou a fotografar a degradação férrea do famoso entroncamento do passado. Foram mais de 800 fotos, mostrando cada detalhe de uma situação mais do que caótica. Rui faz isso não só para mostrar o que sabe fazer bem feito, tirar fotos, mas com o intuito de mover céu e terra para dar o seu quinhão possibilitando o retorno das ferrovias no Brasil. O Rui não para de querer buscar solução para isso tudo, inquieto e inquietante, pois expõe com clareza os males já feitos e insiste que solução existe. Instigante caminhar ao seu lado.”.

- Publiquei em 12.01.2019: “A MELHOR COISA DO MUNDO É ESTAR RODEADO DE AMIGOS POR ONDE A GENTE SE ENCONTRE (Papo com proprietário da Livraria Folha Seca RJ, junto com Rui) - O interior da livraria é mais que uma loucura. Ali tudo o que gosto. CDs só da nata do samba. Livros só com temática de samba, futebol, carnaval, pessoas que fazem ou fizeram a história do Rio e tudo sobre a cidade se São Sebastião do Rio de Janeiro. Esporadicamente algo de outros temas, mas tem que ser de gente com afinidades com a proposta da casa. Rui senta e conta sua história, diz como se salvou graças a um acordo de última hora com alguém lá de cima que lhe concedeu umas horas extras e delas faz uso da forma mais divinal possível, tocando a vida mais suave, sem aflições e correrias. Cada um conta algo da sua. Rodrigo ouve tudo e tenta trabalhar. Sua mãe, dona Ferrari é um doce de pessoa, lembra muito minha finada mãe e por isso fiz questão de lhe dar um baita abraço, quando revivi algo da minha, do qual morro de saudades. Todos nós estamos mais do que irritados, descontentes e irados contra o FEBEAPÁ produzido pelos bolsomínios nesses apenas 11 dias de desGoverno. Desencontros dantescos levando o país a breca. E nós todos resistindo e sobrevivendo em guetos, como esse onde estamos e felizes ao nosso modo e jeito, pois ao lado de gente ao menos pensando e agindo por um interesse e ideal coletivo e único, libertar de novo esse país, reconduzi-lo para caminhos novamente arejados”

- Publiquei em 22/04/2019: “REGISTROS DE RUI ZILNET NAS OFICINAS DA NOB, MAIS DE DEZ ANOS ATRÁS E SUA FALA HOJE: "Me entristece ter acompanhado a degradação do maior patrimônio arquitetônico e de integração social de Bauru, pela ganância de uma empresa qual seu único objetivo é lucro financeiro, aumentando a cada dia o passivo com a sociedade local". Pouca coisa ou quase nada mudou de lá para cá. Rui é carioca e morou em bauru tempos atrás, quando atuava na Veja Interior, uma publicação não mais existente. De sua passagem pela cidade, registros de imenso valor histórico”.

Depois de tudo isto, só diria mais uma coisa, IMPERDÍVEL...


Eis o link para assistir a entrevista de 1h20: https://www.facebook.com/henrique.perazzideaquino/videos/4073991772630801

COMENTÁRIO FINAL: O que vai sair de cada entrevista a gente só fica sabendo no desenrolar da mesma. Mesmo com tudo preparado, Rui Zilnet preferiu um enfoque diferente do que havia pensado no começo e optou por contar em detalhes duas histórias vivenciadas aqui em Bauru quando de sua passagem pela cidade. Deixei a coisa rolar, pois se essa era a sua vontade e o que propunha era mais que interessante, creio ter até ultrapassado o que havíamos inicialmente imaginado. Ele estava precisando desabafar, soltar algo, colocar pra fora. Começa sua fala com algo contundente sobre o momento político e a “Esquerda Zona Sul”. Quando começamos a falar de Bauru, opta por contar primeiro algo ocorrido com ela na cidade. Morando perto da praça Rui Barbosa, foi acompanhando um grupo de meninos de rua, morando em casarões abandonados e o que veio a seguir é uma história aterradora, de perseguição, intimidação, que quase termina em algo trágico. Depois, consegue postar fotos tiradas por ele nas oficinas da NOB, registrando toda sua degradação, enquanto falava sobre o descaso para com a ferrovia no país, evidenciando o caso Bauru, famoso entrocamento, com muitos itens abandonados. Foi emocionante. Depois, sua fala sobre o papel dos neopentecostais na vida do país é pra prender a respiração, muito contundente. Tento finalizar com algo do Rio de Janeiro, mas o tempo já havia superado o máximo possível e finalizamos sem maiores aprofundamentos, mas com opiniões bem interessantes. Como tudo que faz, Rui se preparou e veio pronto para descrever em detalhes algo ocorrido com ele e o registro foi feito de forma apaixonante.

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