terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

MEMÓRIA ORAL (26)

ADELINO E A TEORIA DO VIVER COM BEM MENOS
Adelino Silvestre é um funileiro que conseguiu com o passar dos anos manter seu próprio negócio e de um jeito pouco singular. Montou uma funilaria de automóveis e têm uma clientela que lhe mantém uma movimentação o ano todo. Já teve muito mais, mas devido à problemas de saúde, preferiu reduzir e continuar tocando a vida com muito menos que antes. Prefere não crescer, pois com o ritmo atual está plenamente satisfeito. Hoje, quem adentra o espaço físico de sua oficina observa um amplo espaço não todo ocupado, com poucos funcionários, porém todos com bastante ocupação. Tanto que acaba de me contar sobre a recusa do serviço de um cliente de anos: "Ele me trouxe o carro mês passado, disse que sópoderia atendê-lo no final do próximo. Quis indicar quem fizesse tudo de imediato, mas ele preferiu esperar para fazer aqui comigo".
Histórias como essa existem aos montes, só que quase todos quando se deparam com situações similares pensam logo em ampliar o negócio, contratar mais funcionários e gerenciar algo mais rentável. Adelino já passou por tudo isso. O barracão é seu, todo pago e quando foi conquistando a confiança dos clientes fez exatamente isso, cresceu, chegando a ter 16 funcionários trabalhando sob suas ordens. Não demorou muito ficou doente e quando um médico disse-lhe que teria que "dar um breque" se quisesse continuar vivo, o estalo foi imediato: "Tinha 16 pessoas diferentes aqui dentro, cada um com um problema diferente, uma expectativa e um modo diferente de trabalhar. Era o pára-raios de todos eles. Ganhavamuito mais que hoje, mas não vivia direito, pois a maior parte do tempo passava aqui dentro. Meus problemas de hipertensão foram se agravando e cheguei ao meu limite. Hoje tenho 3, 4 comigo e dei uma guinada em minha vida. Não estou totalmente recuperado, mas sou outra pessoa. Tenho mais tempo para mim, minha família e menos preocupações na cabeça".
Quem o conhece sabe tratar-se de uma pessoa boníssima, daqueles boas praças que, logo no primeiro bate-papo, tem-se a certeza de estar diante de uma pessoa de confiança, um amigo. Foi assim que me senti ao adentrar sua oficina pela primeira vez. Fui indicado por um conhecido dele, pois precisava de uns reparos na lataria do automóvel. Quando bati os olhos em sua figura, reconheci uma pessoa que não via há muitos anos e de quem guardava boas recordações. Adelino havia também frequentado o campo doARCA – Associação Recreativa e Cultural Antarctica, um antigo campo varzeano de Bauru, na vila Antárctica. Com um sorriso dos mais agradáveis, relembramos histórias e estórias daqueles tempos e descobri ali um amante do samba e do Carnaval carioca: "Fui por mais de dez anos seguidos aos carnavais cariocas e tenho uma paixão muito grande pelo povo, pelo futebol e pelo modo bonachão e irreverente deles levarem suas vidas. Adoro o samba deles e sempre que vou trago presentes para meus funcionários". Tanto é verdade que um deles trabalhava naquele dia com uma camisa do Flamengo. Havia ido lá somente combinar o preço para recuperar um amassado no carro, acabei ficando mais de uma hora numa conversa que não acabava mais. Adelino tem um imã para segurar as pessoas por lá. Fui ficando e voltando.
Ele sabe contar uma história como poucos e a cada reencontro ficava estebelecido uma verdadeira festa. Foi assim, quando o reencontrei num local pouco inusitado, a sala de espera de um hospital, quando ambos íamos ser atendidos, após alguns exames de início de ano. Eu com os meus problemas de trigliceres alta e ele, com dores fortes no joelho e a hipertensão a lhe atormentar a vida: "Sabe aquelas dores noturnas, quando você tem vontade de bater com o joelho na parede. Tô assim e acho que não vou escapar de uma nova cirurgia, pois ainda quero voltar a bater minha bolinha". Enquanto esperávamos o atendimento iniciamos uma conversa sobre atendimento médico: "O tipo de atendimento já melhora ou piora o nosso problema. Essas dores me levaram outro dia para o Pronto Socorro e lá percebi o clima tenso. Local cheio de gente, muita espera. Quando chegou minha vez, o médico estava de cabeça baixa e antes que pudesse levantar, pedi educadamente um minuto de sua atenção, só um, onde iria lhe expor um pequeno probleminha que me atormentava e que achava poderia ser solucionado por ele. Ele levantou a cabeça, me viu sorrindo e sorriu também. Foi o melhor atendimento que tive. Me medicou, esperou fazer efeito, conversamos sobre minha profissão e a dele. Esqueci até das dores. Tive uma noite tranquila, acho que até melhorei em função da forma como fui atendido".
Essa é sua forma de viver, bonachão e despreocupado. Espera aí, despreocupado em termos, pois não existe como se isolar dos problemas desse mundo. E ele continua se envolvimento com tudo, tanto que muitos já lhe causaram sérios problemas de hipertensão: "Assimilava tudo, da equipe toda ao meu lado e isso me causou sérios problemas. Já pensou em 16 pessoas trazendo seus problemas e preocupações, com aquela tensão toda, filho doente, noite mal dormida, grana que faltava para o pão, briga com o vizinho, tudo caia na minha mesa. Era quem tinha que estar pronto para ouvir e resolver tudo para a maioria deles e quando vi, os meus problemas foram se agravando. Não têm como parar de vez, pois nem aposentado sou, mas diminui o ritmo consideravelmente. Foi o que fiz. Viver com bem menos é mais do que possível. Faço isso sem arrependimento". Conferi isso quando ele recebeu um cliente e amigo, o advogado Célio Parisi, cuja caminhonete estava ali já há duas semanas e ficariam mais outras tantas. São amigos de longa data e Célio não traz o carro ali somente porque o serviço é bom, traz pela amizade, pela conversa sadia e pelo clima. Naquele dia, eu trazia uma camisa da escola de samba Mangueira para Adelino e todos tiramos uma foto ao lado de seu caminhonete. Papeamos até alguém lembrar que tínhamos obrigações a cumprir.O que se percebe é que Adelino tem um lista incomensurável de amizades e todos acabam dando uma paradinha, meio que obrigatória na porta de sua oficina. Num outro retorno, após uma alongada conversa lá dentro, assunto resolvido, saímos para as despediddas na rua e nos deparamos com Amaro, um ex jogador do BAC – Bauru Atlético Clube, 68 anos, pinta de galã, pois está com uma forma física invejável. Amaro Carrara foi um dos mais brilhantes meia-esquerdas e pontas do futebol bauruense e a sua chegada adia minha despedida. Nova conversa é iniciada na calçada, Amaro pega seu álbum de fotografias e vamos todos rever o passado. Adelino olha para mim e ri, abraça o amigo e por mais de vinte minutos o assunto trabalho não é mencionado. E é um tal de "Por onde anda fulano? Que foi feito de beltrano?". Na minha despedida, percebo uma movimentação, ambos caindo na real e Amaro começa a explicitar os reais motivos de sua ida até lá. Aproveito para me despedir, meio na surdina. É assim que devem ser todos os dias do funileiro Adelino, que do alto dos seus 58 anos, toca seu barco, rodeado de gente amiga e fiel. Da última vez que lá estive, entre um café e uma água, me disse: "Você sabe que pagamos tudo o que fazemos por aqui mesmo. Não fui nenhum santo, hoje aindo peno, mas me reencontrei. Vivo intensamente, entre amigos, familiares, o trabalho e o lazer, do qual não abro mais mão. Domingo passado, peguei esposa e filhos e fui tomar o café da manhã, aquele luxuoso lá no Alameda (Alameda Quality Center), a R$ 14 reais por pessoa. Saí de lá que não queria mais ver comida, muito menos almoço". Adelino ainda não conhece, mas essa mudança no ritmo de vida é algo que muitos estão fazendo. Um deles, o ex-assessor de imprensa da presidência da República, Ricardo Kotscho, lançou até um livro sobre o tema: "Uma vida nova e feliz... sem poder, sem cargo, sem carteira assinada, sem crachá, sem secretária e sem sair do Brasil" (Ediouro, 2007), classificado como de "alta-ajuda", pois contribui para quem está disposto a dar uma guinada em sua vida, buscando uma vida mais simples. Kotscho, quando do lançamento, disse estar muito feliz com a nova vida, porém "meu único sonho sonho agora é sair do cheque especial". Adelino, com certeza, vai concordar em genêro, número e graú.
Henrique Perazzi de Aquino, escrito em 25/fevereiro/2008.
UMA DICA DE LEITURA (14)

BLOG DO ANONIMATO
Conheci o pessoal da Anonimato quando fui com o filho no Anime Dreams em Sampa. Eles estavam por lá num stand e quando vi a capa do fanzine, não resite, acabei me aproximando e trouxe para casa. As histórias lá contadas são muito próximas da minha proposta de Memória Oral. Deixei lá meu e-mail, para um contato futuro e ele veio. O Luiz Carvalho, fez um convite para que adentrasse o blog deles (www.anonimatosa.blogspot.com). Entrei e gostei muito do que vi e li por lá. Passo a dica, pois o que fazem é de responsa. Além do mais, imprimem isso tudo em sulfites grampeadas e saem entregando na porta de universidades, eventos, praças... Confiram.

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

FRASES DE UM LIVRO QUE JÁ LI (10)


GILBERTO MARINGONI E SEU LIVRO SOBRE A VENEZUELA

Trata-se de um dos reis do traço nacional, pintando e bordando pelos mais diferentes lugares e publicações. Gosto mais de chamá-lo por Beto Maringoni. É como, nós daqui de Bauru carinhosamente o chamamos. Sim, Beto é daqui da terrinha, escapuliu cedo e ganhou o mundo. E o mundo se abriu para ele, como nesse livro básico sobre a Venezuela e seus seculares problemas. "A Venezuela que se inventa – Poder, petróleo e intriga nos tempos de Chávez" é algo meio que básico para se entender o que se passa no país da República Bolivariana. Ele fez um belo lançamento por aqui em 2004, lá no Templo Bar, quando ganhei o livro, já na fila da compra, da professora Nilma (ex do Duka). Lembro até do dia, foi em 01/04/2004 (está lá na dedicatória), quando ele deixou gravado: "40º Aniversário da maior merda que fizeram com o Brasil". O livro está num lugar de destaque lá no meu mafuá e dele reservo algumas frases:
- "Vale a pena tentar decifrar porque este governo provoca tanto ódio em seus opositores".

- "O processo chavista não tem como meta o socialismo, mas a luta pela soberania nacional e pela integração latino-americana. (...) O centro de sua estratégia econômica é o controle do petróleo por parte do Estado e a diversificação da atividade produtiva, com justiça social".

- "República Bolivariana, nome que dá à multiplicidade de mudanças que pretende realizar".

- "Chavéz assume um país na lona, imerso numa crise estrutural há duas décadas, desde que o período áureo da economia petroleira virou fumaça.- "(...)...faz o país andar aos solavancos".

- "...na Venezuela ninguém paga fisco". - "Poucas coisas ocorrem na Venezuela que não tenham, direta ou indiretamente, a ver com o petróleo. (...) Petróleo também é o pano de fundo sobre o qual se movem o governo Chávez e seus oponentes".

- "Clientelismo, fisiologismo e corrupção eram também as características de um tipo de dominação que, no rever so da medalha, reprimia duramente qualquer contestação mais consistente. (...) O anestesiamento social que a renda petroleira possibilitou passou a fazer parte da própria vida política e cultural do país".

- "a PDVSA fica conhecida como um Estado dentro do Estado" (...) "O perfil dos militares venezuelanos não se assemelha àquela visão do gorila que vê os civis como inimigos. (...)...militares na política não eram sinônimo de Pinochet.(...) Jamais deixou de existir uma força revolucionária nos quartéis".

- "Desde 1986, no interior do Exército, MBR-200 iniciara uma intensa discussão sobre como e quando promover um levante armado contra o regime. (...) ...a tentativa de golpe teve o significado simbólico de buscar um rompimento com um sistema que não resolvia os problemas da população.(...) Sua popularidade beirou a verdadeira idolatria".

- "A democracia não pode existir se os povos não comem" Rafael Caldera, senador vitalício- "Tendo aparecido na cena pública apenas seis anos antes, o tenente-coronel era quase um outsider na política eleitoral, que surfava sobre as ruínas de um modelo partidário esgotado. (...) O ex-militar não foi eleito no bojo de um crescimento vigoroso do movimento de massas, mas foi caudatário de uma formidável e espontânea onda de descontentamento e rebelião. (...) ...uma das tarefas do governo eleito tem sido a de construir, a partir do aparelho de Estado, um movimento organizado e arraigado entre a população. (...) De obscuro militar golpista e preso político, tinha se tornado a figura política mais importante da Venezuela num espaço de pouco mais de seis anos".

- "...o fato de Chávez ter colocado a questão social com enorme força no centro da mesa venezuelana"

- "É o primeiro presidente que trata de criar vasos comunicantes com os despossuídos. Porém, não sabe fazê-lo e os projetos não se materializam" deputado socialista espanhol Emílio Menéndez Del Valle, no jornal El País, 26/07/2003

- "A Venezuela conseguiu se tornar um ente atípico entre as economias petroleiras, como Irã, Iraque, Arábia Saudita e Nigéria. O país construiu, a partir da segunda metade do século XX, instituições e entidades mais democráticas que seus parceiros da OPEP.

- "Agora o Estado cobra a renda, é investidor e dirige a atividade" Ali Rodriguez Araque, presidente da PDVSA

- "...a Venezuela nunca teve uma indústria nacional de cultura, preferindo importar o que se produz no exterior. Assim, são poucos os que conseguem divulgação mais ampla nos meios de comunicação extremamente elitistas e monopolizados do país".

- "A Venezuela tenta ser um pólo de resistência governamental ao neoliberalismo na América Latina, a exemplo de Cuba" (...) Chávez está longe de merecer a simpatia de boa parte dos acadêmicos e não há uma produção artística à altura do que ocorre nas terras de Bolívar. (...) Não sei se toda a intelectualidade é antichavista, mas quem tem espaço na imprensa são os opositores".

- "Chávez combina as qualidades de dirigente político com as de um animador de programas de auditório. Não há marketing profissional, há poucas pesquisas de opinião, mas há faro, muito faro. Ou feeling, como se diz no Brasil".

- "Busca, a partir da conquista de uma parcela do aparelho de Estado – o governo federal -, aprofundar o enfrentamento com as classes dominantes tradicionais, que o odeiam, mantendo um diálogo constante com os eternos barrados no baile".

- "A América é ingovernável. Os que serviram à revolução araram no mar. A única coisa que se pode fazer na América é emigrar" Bolívar, em 1826, nos anos finais de sua vida, já tuberculoso e cheio de amarguras.- "O culto a Bolívar, o pensamento bolivariano tem sido adaptado em diferentes épocas por diferentes personagens para diferentes fins" historiador D.F. Maza Zavala

- "É interessante ver como Chávez articula o pensamento de Simón Bolívar pelo seu viés mais decididamente antiimperialista, derivado do nacionalismo militar. Citações de passagens de sua vida e obra são uma marca registrada dos discursos do ex-tenete coronel".

- "Com Chávez finalmente somos alguém", dizem constantemente seus entusiastas entre o povo. "Alguém que pode mudar o país".

- "Quem anda pela capital não deixa de sentir uma certa semelhança com o Rio de Janeiro. (...) Cerca de 10]9% da população economicamente ativa está sem trabalho. (...) O ponto positivo para Chávez é que não há nenhum candidato que ultrapasse a barreira dos 20% de popularidade".

- "...resulta numa administração extremamente centralizada e personalizada. (...) O governo ressente-se da falta de quadros capacitados para exercer funções de comando no aparato estatal.(...)...este processo todo é possível porque a oposição é muito mais desorganizada do que ogoverno".

- "(...) enquanto a revolução chilena era pacífica, a nossa, com o apoio do Exército, é pacífica e armada! Pacífica e armada!" a intelectual Margarita López-Maya

sábado, 23 de fevereiro de 2008

UMA ALFINETADA (20)
Quem me lê por aqui sabe que toda semana publico um texto n'O ALFINETE, aquele que "pica mas não fere", lá de Pirajuí. Todo sábado o jornal está nas bancas daquela cidade e hoje, juntinho com o exemplar dessa semana, sai aqui o texto publicado lá. Confiram:

UMA HISTÓRIA URBANA E FIDEL


1. Vou ao supermercado com minha mãe. Na saída, já no caixa noto uma senhora de uns 50 anos indagando de forma acintosa a funcionária do balcão de atendimento, sobre o paradeiro de um par de óculos. A moça diz não tê-lo visto por ali e que devia ter esquecido em outro lugar. A senhora estava um tanto inconformada e dizia que, "todos devemos ter Deus no coração, sermos mais honestos com o semelhante e não ficar com nada que não nos pertence". Um belo discurso, feito com a voz um tanto alterada, quando sua acompanhante adentra o mercado dizendo: "Você não vai acreditar, achei seu óculos pendurado no cinto de segurança do carro". Com a cara mais lavada desse mundo, ela ainda tem o disparate de falar olhando para a funcionária: "Pois, estava agora mesmo brincando aqui com a moça sobre esse assunto".



Não deu outra. Lembrei de um texto que havia lido recentemente, uma história chinesa contada pelo escritor uruguaio, Eduardo Galeano: "Na hora de ir para o trabalho, um lenhador dá falta do machado. Observa seu vizinho: tem o aspecto físico de um ladrão de machados, o olhar e os gestos e o modo de falar de um ladrão de machados. Mas o lenhador encontra sua ferramenta, que estava caída por ali. E enquanto torna a observar seu vizinho, constata que não se parece nem um pouco com um ladrão de machados, nem no olhar, nem nos gestos, nem no modo de falar".
2. Fidel solicita aposentadoria aos 81 anos, gerando comentários dos mais variados. Um deles repercuto aqui. O Estadão, na sua capa, em 20/02, numa fala entre aspas do dono, o Ruy Mesquita profetiza: "O regime castrista é a maior tragédia política da história da humanidade". Eu, cá do meu canto, retruco. Tragédia? O país tem todos seus problemas de educação (totalmente gratuita e abrangendo 100% da população), saúde (mais médicos por habitantes do que nos EUA) resolvidos, não existe desigualdade social, muito menos problemas de moradia e de emprego. Fazem frente a qualquer outro país do continente em qualquer modalidade olímpica. Todos comem o suficiente, sem excessos. São é pobres, mais pobres do que esse Brasil e infinitamente mais que o vizinho rico do norte. E, como pobreza é uma espécie de doença para o neoliberal modelo vigente, dá-lhe críticas. Porque Cuba deveria alterar seu ritmo? Acho que por lá a coisa não anda nada ruim. Façamos nossas comparações com os demais países do planeta e veremos quem é que precisa de abertura e de modificações profundas. Experimente perguntar para um catador de papéis, para um frentista, um balconista ou para a grande maioria de nossa população, que vive com menos de R$ 600 mês, o que lhe falta. Lá não falta e não se faz necessário essa busca incessante e doentia pelo vil metal. Reflexões...


Henrique Perazzi de Aquino, 47 anos, mais brasileiro do que nunca, mas sem a mediocridade de criticar por criticar um outro modo de vida, mais saudável e menos estressante que o vivido por aqui. Sejamos sensatos.

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

RETRATOS DE BAURU (13)

CIDINHA DO AZULÃO DO MORRO
Aparecida Brito Caleda, esse é o nome de batismo da Cidinha do Azulão do Morro, na verdade, como todos a conhecem. Essa negra, sempre sorridente, batalha o ano todo (e muito), fazendo um verdadeiro carnaval, com sol ou chuva, com dinheiro ou sem ele, para a população do jardim Jaraguá e adjacências. Rema o ano inteiro, correndo em busca de patrocínios variados, incertos, promessas e tudo o que possa angariar de benefícios para sua comunidade. Têm folego de gato. Recebe uma ajuda (que ninguém é de ferro), de sua motocicleta para a travessia diária feita pela cidade. Seu nome não está somente associado com festa, pois sem um intenso trabalho nada do que se vê na avenida é possível. Cidinha é a verdadeira expressão do termo “sangue, suor e lágrimas” (com um pouco de folia, claro).

terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

UM COMENTÁRIO QUALQUER (9)

FIDEL CASTRO - sem palavras

E nesse momento são necessárias palavras...

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

MEMÓRIA ORAL (25)

UM DIA EXCEPCIONAL NO HOSPITAL ESTADUAL

O Hospital Estadual Bauru faz um atendimento regionalizado, preenchendo deficência local e regional no atendimento ambulatorial e também clínico. Muitos aportam diariamente nos seus guichês em busca de tratamento médico. É comum ver ambulâncias e lotações das mais variadas cidades estacionando ali por perto logo nas primeiras horas do dia. Um desses atendimentos é prestado na Farmácia de Medicamento Excepcional. Para o paciente fazer jus a receber o medicamento prescrito pelo médico, ele obrigatoriamente, com a receita em punho, vêm até esse guichê e faz seu pedido. Espera um tempo determinado, podendo chegar até a 30 dias, onde são consultados estoque, feitas novas compras, voltando para buscá-lo na data marcada.
Conferi esse processo no dia 11/2, segunda-feira e o que vi foi de assustar. Na entrada principal é feita uma triagem, conferindo se o medicamento está realmente disponível. Só assim é dada uma senha e a orientação para o local onde irão aguardar serem chamados. O salão é imenso, com outros variados tipos de atendimento no mesmo local. Particularmente nesse dia, o que mais gera espera é o da retirada dos medicamentos. No canto desse grande salão, com espaço para umas 50 pessoas sentadas, tudo está cheio e todos os presentes completamente antenados com o barulhinho do sinal eletrônico, avisando que mais um número está sendo chamado. Na placa ali está escrito: "Retire seu cartão de acesso e aguarde a chamada do painel". A espera nesse dia está infernal, demorando até três horas e nem todos esperam esse tempo pacientemente.
Todos ali já passaram pelo médico e estão somente aguardando para retirarem seus medicamentos, muitos denominados de alto custo, tendo que retornar todos os meses. Quem necessita do medicamento todo mês tem que seguir rigorosamente as datas previamente marcadas, pois corre o risco de ficar sem ele. Cheguei por volta das 13h e o que vi foi muita gente estressada com a demora desse dia. O portador da senha 455 veio buscar medicamento para a esposa. Diz que custa mais de R$ 700 reais e não tem como pagar: "Pegava no Posto de Saúde e lá faltou algumas vezes, tendo que ir até o juiz para resolver. Há uns dois anos passou para esse Hospital. O remédio nunca faltou, mas tenho que enfrentar essa espera. Chega-se aqui bom e com a demora, ao sair já estou também doente, com os nervos em frangalhos. Depois chego no ponto e o ônibus demora mais um tanto. É a gota d'água. Para explodir é um pulo".
O portador da senha nº 464 me alerta para uma placa logo ali na frente: "Olhe lá, diz: Queremos ouvir você. Só que ninguém diz nada, somos todos cordeirinhos". Outro, o com o número 502 na mão é mais controlado: "Nunca vi isso aqui dessa forma, venho todos os meses e sempre é no máximo umas 15 pessoas na fila. Hoje passou dos limites. Se levantasse todo mundo, eles iam ter que fazer alguma coisa. Lá no atendimento, tem lugar para três pessoas, mas em certos momentos só tem uma. Assim fica difícil". Não precisa muito para ouvir outra reclamação, a do dono da senha 458: "Nêgo não tá pensando no dia de amanhã. Se hoje tá assim, imagina daqui há uns vinte anos. Terreno eles possuem aqui de montão. Precisam é olhar mais para a gente". O 492 veio com a mãe, pegou a senha, sentou e marinheiro de primeira viagem achou que sairia logo. Ela, com 70 anos, ouviu sobre o tempo de espera e a fez levar embora. Foi aconselhado a fazer tudo o que tem que fazer na cidade e só depois voltar, pois nada está andando rápido nesse dia.
O 472 foi mais esperto, trouxe uma revista e quando me aproximo desabafa: "Já estou ficando preocupado, pois estou quase terminando a leitura e tem uns 30 números na minha frente". Uma garota veio acompanhar a avó e acaba tentando fazer o tempo passar manuseando o seu celular, enquanto a vó procura assunto com a vizinha de cadeira: "Ela quer sair, ir lá fora, mas não posso deixar, não conheço isso aqui direito. E se não acho ela mais depois?". O 356 quando percebe estar chegando o seu número, levanta e vai mais perto da porta de entrada. Contei os minutos que ele ficou lá dentro, foram menos que quatro. Quer dizer, o atendimento até que é rápido, mas é que muita gente está por aqui hoje. Nisso, o portador do nº 441 me alerta que mais um guichê começou a atender. É uma esperança de que tudo vá um pouco mais rápido. Percebo que a portadora da senha 499 achou um lugar vago, mas logo levanta esbravejando: "Fora o tempo de espera ainda ter que tolerar sentar ao lado de gente com cheiro de suor forte é demais. Prefiro continuar em pé". Foi dar uma volta lá fora em busca de ares mais respiráveis. Um senhor de óculos, o 508 sabe que terá que esperar muito, observa o atendimento e comenta: "Se tirarem aquele velho, que é lento demais e colocar outro mais novo, com mais vontade, eu até que teria uma chance de sair mais cedo disso aqui". Um outro, de uma cidade vizinha está preocupado com a hora que fecha o hospital: "Perguntei pro moço e ele me disse que as cinco e meia fecham, mas quem estiver aqui dentro, tendo senha são atendidos".
Às 14h54 chamam o nº 398 e umas 50 pessoas continuam sentadas nos bancos disponíveis, outras tantas, circulam pelo salão e não desgrudam os olhos do painel. Duas senhoras estão revoltadas, acabaram se conhecendo na espera e para passar o tempo conversam, falam das novelas, do BBB e quando o assunto rareia voltam às reclamações: "Ouvi que uma das moças do atendimento está de férias e somente um guichê vai atender". É isso que ninguém entende, tinham dois guichês atendendo, agora voltou a ser somente um. Nada do que ouço difere muito um do outro, vejam o 485: "Quando cheguei tinha umas 120 pessoas na minha frentre. Já faz uma hora que estou aqui e a coisa não anda". Andar até que anda, mas não rende e o calor, cujo termômetro marca 30º, pelo abafado do lugar, com ventiladores desligados, a sensação térmica é de muito mais. Muita gente transpira e o desconforto aumenta.
Uma moça conta 48 números na sua frente e pergunta para um mais experiente: "Quero ir no mercado, será que dá tempo?". "Você está de carro?", pergunta o homem. Ela responde que sim, que o mercado é ali perto, uns 600 metros. Ela caba indo, mesmo ouvindo: "Se eles voltarem a ter dois atendentes, você corre risco de perder a vez". Quem eu vejo voltar é aquele que havia levado a mãe embora, o 492: "Levei ela em casa, dei uma passada no serviço, fui ao banco, chupei sorvete lá fora, encontrei dois conhecidos do bairro e papeamos um pouco lá fora e ainda faltam 42 números para o meus. Se soubesse, teria ficado mais". A 528 dorme com a cabeça encostada na parede e de vez em quando acorda sobressaltada. Olha para o painel e logo está a dormir de novo. Lá do fundo ouço algo repetitivo: "Não costuma ser assim. Não sei se fechou algum atendimento na cidade, pois dessa vez está demais. Esse era um dos setores que não gerava reclamações, mas hoje está demais".
Todos reclamam muito entre si, numa insatisfação generalizada, mas ninguém quer se identificar. Ouço o 524 falando disso: "Eu preciso do remédio, estou sendo humilhado aqui, mas temo perder o benefício do remédio gratuito se reclamar e causar problema para os funcionários. Eles podem inventar uma história qualquer e me bloquear o remédio. Não posso correr esse risco". No geral, é isso o que acontece com a grande maioria ali. Vou numa rodinha e ouço outra coisa: "Nesse sistema de senha não tem idoso, nem doente. O que vale é a senha, velho, moço, todos esperam a mesma coisa". Observando melhor nota-se muitos jovens vindo buscar os medicamentos para os mais velhos da família. Uma senhora de boné faz tricô para passar o tempo. No alto falante uma funcionária anuncia: "Pedimos a todos os pacientes fazerem silêncio. Permaneçam em silêncio". Com ironia, um lá do fundão diz: "Nem conversar pode, temos que além de tudo ficar de boca fechada".
E assim deve ter sido até o final da tarde. De todos que saiam do atendimento, outra constatação: "Conheço o pessoal que trabalha na entrega dos remédios. São todos legais e fazem o que podem. Estava bravo quando chegou minha vez, fui tão bem atendido, conversaram de forma tão agradável comigo que me desarmaram. Não tive como falar nada para eles. Afinal, eles não tem culpa de nada, são meros funcionários e fazem o que podem". Também não constatei se a demora é sempre dessa forma, mas que nesse dia foi, isso foi.
obs.: a última fora saiu fora de foco propositalmente.

Henrique Perazzi de Aquino, escrito em 12 de fevereiro de 2008.

sábado, 16 de fevereiro de 2008

UMA ALFINETADA (19)

Esse texto saiu publicado lá no Alfinete de ontem e hoje já sai por aqui. Tudo para que deixemos de continuar confundindo alhos com bugalhos. Pelo menos é assim que penso...

AFINAL, O QUE SERIA ISSO MESMO?
Recebi recentemente uma carta, na qual o missivista rotulava de“comunista” todos os prováveis beneficiados com altas pensões derivadas de ações dos nossos Anos de Chumbo, ou seja, provenientes dos que penaram com a ditadura militar. O que me chamou a atenção na carta foi autilização do termo comunista e de que todos os que lutaram contra a ditadura tinham idéias de implantar no Brasil um regime tipo castrista-cubano. Achei uma má utilização da expressão. É sobre isso que quero discorrer aqui. Vejo muita confusão na utilização do termo “comunista”.

Hoje em dia, muitos que lutam pelo social, por reforma agrária, melhorias salariais, contra o neoliberalismo e as opressões do capitalismo são taxados dessa forma. Todos colocados num mesmo balaio, com a mesma pecha. Não que isso venha a ser pejorativo. Longe disso, pois o termo “comunista” encontrado no dicionário é belo demais. No Dicionário Sacconi encontrei: “sistema econômico e político baseado na teoria de Karl Marx (1818-1883) e Friedrich Engels (1820-1895), segundo o qual os bens da terra, o produto do trabalho e os meios deprodução pertencem à comunidade ou ao Estado”. Entende-se que ninguém é dono de nada, tudo pertencendo ao Estado que, por outro lado, lhe proverá de tudo, saúde, educação, cultura, alimentação, emprego, etc. E isso é tão ruim assim? O que sei é que até hoje esse sistema não conseguiu ser implantado na sua essência. E se o fosse, não veria motivos para reclamações, pois seria um verdadeiro paraíso.


Virando tudo do avesso, sabemos que todo religioso tem como pretensão ir para o Paraíso após sua morte. E o que seria esse tal Paraíso? Para mim,algo bem parecido com o que prega o Comunismo, pois com a morte deixamos para trás propriedades, contas bancárias, posses e bens materiais. No Paraíso a vida é harmônica, de paz generalizada, inclusive sem preocupações financeiras. O verdadeiro comunismo prega algo muito parecido, onde todos serão iguais e gozarão dos mesmos direitos e obrigações, sem ricos e pobres, opressores e oprimidos. Não vejo nada melhor do que isso ocorrer aqui nessa vida terrena. Quem se oporia à sua implantação e execução? O paraíso aqui.


Antes que me rotulem de louco e também de “comunista”, deixo claro que ouso indevido do termo é danoso. Na grande maioria das vezes, o fazem com o intuito de agredir, menosprezar, desqualificar o oponente, com a intenção de que fique numa situação constrangedora. Quando criança ouvia que comunista comia criancinha. Queriam incutir o mêdo em quem nem sabia direito o que era aquilo. Misturavam e continuam misturando alhos com bugalhos. A tática é desmerecer e nada explicar, mas até quando? Parece que o que perdura é o mêdo de uma classe contra outra. Hoje, quando o mundo caminha perigosamente para um pensamento único, impondo que o neoliberalismo seja essa possibilidade para o Paraíso taxa-se de comunista todo aquele que luta para mudar o estado atual de injustiças. Longe de ser um ato comunista ou não, nossos 500 anos de História comprovam que, aqui no Brasil uma elite cruel só acumulou e não pensa em distribuir nada. Isso, além de ser contra os preceitos religiosos, infelicita o país, pois mantém uma casta arrogante, cruel, predatória e gananciosa mamando nas tetas do poder (aquelas que nunca secam). E, propor que essa elite pague impostos, remunere melhor seus súditos, cumpra as leis decentemente não é nada tão aviltante assim.


Não entendam isso como apologia de nada. Nasci e cresci dentro do capitalismo, sou cria dele, usufruo dele, mas não consigo entender essa nossa eterna má distribuição de renda e injustiças sociais. Luto para mudar esse estado de coisas e nem por isso sou comunista. Ou sou? Não estou preocupado com isso. E deveria?


Henrique Perazzi de Aquino, há 47 anos, sendo taxado, carimbado, rotulado,pré-julgado como tal, porém, no entanto, sei lá: não tendo certezas demais nada.
PS: a ilustração é um Gilete Press de um excelente desenho do Airon.
UMA MÚSICA (17)

DESENREDO - GONZAGUINHA

Quando comprei esse LP (bolachão), lá na saudoso Discoteca de Bauru, do Sílvio, eu tinha somente 18 anos. Esse sambão carnavalesco histórico fez minha cabeça para sempre. Não existe um só Carnaval que não me pegue cantando essa música, pois conheço sua letra de cor. Desenredo é do Gonzaguinha e do Ivan Lins (uma dupla e tanto, não?) e faz parte do LP, Gonzaguinha da Vida (Você se lembra daquela nêga maluca que desfilou nua pelas ruas de Madureira?), da EMi, de 1978. Sintam o clima:

"No dia em que o jovem Cabral chegou por aqui ô ô/ Conforme diversos anúncios na televisão/ Havia um coro afinado da tribo Tupi/ Formado na beira do cais cantando em inglês/ Caminha saltou do navio assoprando um apito em free bemol/ Atrás vinha o resto empolgado da tripulação/ Usando as tamancas no acerto da marcação/ Tomando garrafas inteiras de vinho escocês/ Partiram num porre infernal por dentro das matas ô ô

Ao som de pandeiros, chocalhos e acordeon/ Tamoios, tupis, tupiniquins, acarajés ou carijós (sei lá quem mais!)/ Chegaram e foram formando aquele imenso cordão,/ Meus Deus quibão/ E então de repente invadiram a avenida central,/ Mas que legal/ E meu povo vestido de tanga adentrou o coral/ Um velho cacique dos pampas sacou do piston/ E deu como aberto em decreto mais um carnaval/ E assim a 22 daquele mês de abril/ Fundaram a escola de samba Unidos do Pau-Brasil".

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

DICA DE LEITURA (13)

UM BLOG SÓ DE CARTUNISTAS - IMPERDÍVEL

Eu viajo por tudo quanto é lugar que vou vendo coisas feitas por cartunistas, chargistas, os tais mestres do traço. Onde os descubro, pode ter certeza, por lá estarei. Nessa semana, uma grande amiga (mais do que isso), a Maria Luiza Carvalho me deu nova dica, um blog só de charges. Fui conferir e a dica já está aqui. Se não é uma dica de leitura, é uma grande dica de quem tem visão e lê o que está escrito por traz de cada desenho desses. São sete cobras, Airon, Jorge Barreto, Mastrotti, Jodil, Vasqs, Verde e Ed Sarro, todos juntos produzindo, como eles mesmos disseram por lá, "uma graça todo santo dia". Vale a pena conferir. Eu já viciei:

http://os7.zip.net

HOMENS TRABALHANDO
Após 3 anos de cervejadas e muita conversa jogada fora, decidimos trabalhar. Aliás, segundo o ditado chinês "Trabalhe naquilo que gosta e nunca mais trabalhará na vida",resolvemos não trabalhar. Somos 7 cartunistas que postarão diariamente humor e opinião. Se você gosta disso, seja bem-vindo! Caso contrário, vá trabalhar!!!Conheça esses 7 santos! Tem que ser santo pra achar uma graça por dia - com tantos dias cabeludos que andam pela aí. Vejam a graça em cima do fato - ou embaixo, se tiverem sorte.Os 7 estão aqui ó - é só clicar: http://os7.zip.net

terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

RETRATOS DE BAURU (12)

LULINHA, O SINDICALISTA

Se alguém perguntar por um tal de Aguinaldo Silva, pouco gente vai associar ao conhecido Lulinha. Por esse nome todos o conhecem. É personagem marcante e insubstituível em toda e qualquer manifestação sindical na cidade. Ainda mais agora que, comanda o carro de som da CUT. Seu nome, como fica evidente, é uma alusão ao seu envolvimento com a CUT, o PT e os movimentos sociais. Além de toda essa participação ativa e necessária, Lulinha presidiu o Conselho Municipal da Água, na sua segunda gestão e ajudou a fazer a história também desse movimento. Por tudo o que representa, faltou aqui a grande foto, uma dele empunhando o microfone em qualquer uma das tantas manifestações que já esteve presente.

domingo, 10 de fevereiro de 2008

MEMÓRIA ORAL (24)

UMA VIAGEM COM A SANGUE-RUBRO
Quarta-feira de Cinzas, 15h e acontece mais uma excursão da torcida organizada do Esporte Clube Noroeste, a Sangue-Rubro, dessa vez com destino a São José do Rio Preto, onde a "maquininha vermelha" enfrentaria o lanterna do Paulistão, em sua 1ª Divisão, o time do Rio Preto. O jogo estava marcado para às 19h30 e diante de quase 300 km de distância, nada melhor do que sair com bastante antecedência. O convite me foi feito por Geraldo Pires, ferroviário aposentado e maquinista da Maria Fumaça, além de ter sido um dos fundadores da torcida. Convite aceito, na hora marcada, lotação quase completa, uma aglomeração das mais ecléticas se forma defronte um dos portões do estádio do Noroeste.
Na porta do ônibus sou recebido por José Roberto Pavanello Silva, ou simplesmente Pavanello, como é conhecido o presidente dessa resistente torcida noroestina. Dentre tantas outras já existentes, a Sangue persiste, sendo a única legalizada. Para adentrar o ônibus a única exigência é o pagamento de R$ 10 reais e dá-lhe estrada. Com meia hora de atraso, para não deixar ninguém para trás, a saída pelas ruas de Bauru se faz com muitos nas janelas, entoando os costumeiros gritos de qualquer torcida: "A Sangue-Rubro é jogador de arquibancada. A Sangue-Rubro nunca pára de torcer. Ôôô (...) Norusca vai jogar e eu vou. Norusca é minha vida".
Vou fazendo o reconhecimento do pessoal. No fundo, com um grande isopor no corredor, Juraci vende cervejas e refrigerantes. Surge um papel, logo colado na parede: Não aceitamos cheques. Seu estoque mal dá para os primeiros 30 km, pois ao passar pelo trevo de Iacanga, a cerveja já havia acabado. Muitos ali são velhos conhecidos e estão juntos em quase todos os jogos, gerando um animado bate papo. Marquinhos, filho do Geraldo é batedor de bumbo da torcida e entre risadas diz estar no "paredão", pois não é nenhum "santinho": "Já faz tempo que estou nessa situação, já venci alguns e aqui continuo. Dessa vez quem vai me fazer companhia é a Priscila, nossa musa".
Priscila Silvana Garcia é da nova geração de torcedores e faz parte de uma facção recentemente criada, a Comando Feminino. Loira, muito sorridente, traz faixa para fixar no estádio e outras colegas consigo. Quando o pessoal do fundão resolve jogar um carteado, recorrem a ela, pois pelo visto, nunca esquece de trazer o baralho. O jogo começa com o barulho de praxe e ela está entre as duplas. Nisso, algumas coisas são oferecidas entre os bancos, como um aparelho de MP3 por R$ 30 reais e uma camisa preta do Norusca, pelo mesmo valor. Jogatina encerrada, José Fernando Gomes Brumati, o Fernadão, um parrudo e divertido torcedor do Bauru 16, começa a vender uma rifa por R$ 2 reais o número. O prêmio é a nova camisa oficial da torcida. Tudo é vendido rapidamente e por ironia do destino, ganho a camiseta logo na primeira viagem. A recebo das mãos do Pavanello e logo visto o novo fardamento.
As histórias não param de ser contadas. Numa delas, Pavanello lembra uma excursão onde o Marquinhos estava atrasado: "Ele sem telefone, sem cartão, liga a cobrar para a então rádio 710, que ficava aqui junto ao estádio. Quem atende é o Zé da Barca, o responsável pelo esporte e o Marquinhos folgadamente pede para avisar para o esperarem, pois está a caminho. E ele veio me avisar. Coisas desse tipo só com o nosso pessoal". Num outro banco quem chama a atenção é Kelly, 6 anos, acompanhada do pai e já integrada ao grupo, pois a galera até "pega devagar" nos palavrões, tudo pela sua presença e a de outras mulheres. Na passagem pelo pedágio em Catanduva ouço de um deles: "Seu Damião (Damião Garcia, o presidente do clube) costuma vir na frente, paga para a gente. Ele ajuda muito nossa torcida". Na parada, pouco antes da chegada é inevitável o troca-troca das comandas no restaurante. Nem todos participam dessa aventura e ao final, entre risos, os que dela se beneficiaram comemoram entre si.
Pouco a pouco vou reconhecendo outros integrantes do troupe, como um professor da USC, um instrutor aposentado do SENAI e uma figurinha das mais carimbadas em várias atividades da cidade, seu Raja Mattar, 65 anos, frequentador assíduo dessas viagens: "Estou nessa faz tempo. Não gosto de ficar em casa. Prefiro vir conferir ao vivo e me dou bem com todo mundo, estou mais do que enturmado". Logo a seguir chegamos na frente do estádio Anísio Haddad, com uma hora antes do início da partida. Pavanello com os anos todos de janela, tenta resolver um probleminha com a entrada dos instrumentos no estádio: "Enviei tudo certinho, com bastante antecedência e quando vieram demonstrar desconhecimento, saquei das cópias de minha pasta e resolvi tudo. Pra cima de mim, depois de tudo que já passei, aqui não, sei todos os procedimentos". Ele é mesmo bastante prevenido e além de coordenar tudo pessoalmente, confere a entrada dos instrumentos, das faixas e dos uniformizados com carteirinha de torcedor. Traz consigo uma pasta, cheia de documentos, pronto para tudo e dela não se separa.
Outros chegam de carro e se juntam ao grupo, num total de umas sessenta pessoas. O estádio é amplo e está um tanto vazio, recebendo um público de aproximadamente mil pessoas. A situação do Rio Preto não favorece a vinda de muitos torcedores, pois em sete jogos, empataram um e perderam todos os outros. Ficamos no lado oposto das tribunas, eles do lado de lá, nós do de cá. Bem acomodados, faixas estendidas, a TV Tem local vem até o grupo e faz entrevistas com a garota Kelly e com a Priscila. O batuque não pára e perdura por quase todo o jogo. Rojões estouram bem depois do time deles entrar em campo, gerando um comentário ao meu lado: "Um time que não acerta nem o momento exato de estourar os rojões merece mesmo o lugar onde estão".
O jogo já tinha lá os seus dez minutos quando uma grande faixa da torcida organizada deles, Os Fanáticos é fixada, gerando outro comentário: "Que raios de fanáticos são esses que chegam só agora. Fanático mesmo chega bem antes". Às 8h, quando termina a transmissão da Hora do Brasil, a rádio Metrópole AM começa a transmitir e todos com radinhos entram na sua sintonia. No intervalo, quatro dos nossos, tiram a vestimenta vermelha e a paisana vão buscar cerveja no bar do estádio, bem no meio do aglomerado deles. A vendida do lado de cá, sem álcool não havia agradado a rapaziada. Outro da torcida, o batuqueiro Shell, reencontra um conhecido e engatam uma conversa sobre uma pescaria. O papo vai longe até ser chamado às pressas: "Voce veio aqui para batucar ou pescar?"
Aos 22' do segundo tempo, sai o gol do Noroeste, creditado para Otacílio, o artilheiro do time e do campeonato. Nem a festa se acalma e ele mesmo faz o segundo. Festa total na torcida, principalmente para um sósia do jogador que, entre nós, faz o maior sucesso. A torcida animada canta, puxada por Geraldo, parodiando um velho samba: "Explode coração na maior felicidade. É lindo, meu Noroeste, sacudindo o coração dessa cidade". O jogo termina 2x0 e para sair do estádio, só esperando toda torcida deles ir embora. Na saída, Pavanello nos conta que foi procurado pelo chefe do policiamento: "Ele me pediu para não pararmos em lugar nenhum na cidade, irmos embora direto, pois não queria problemas".
E assim foi feito. Todos no ônibus e dá-lhe estrada. Pavanello senta com a turma do fundão, o Urutu, o Uau-uau (dono de uma perua de lanche com esse nome), o Fernandão, o Gera, o Marquinhos, eu e outros. Vão surgindo histórias e mais histórias, todas de antigas viagens. Merecedoras de um texto à parte. A parada num posto acontece a contragosto de Pavanello que, queria chegar antes da meia-noite em Bauru e avisa sobre o problema das comandas: "Cada um sabe muito bem o que faz. Ninguém aqui é criança. Quem entra numa errada por causa disso, não espere minha ajuda". Ele ainda tem que buscar os retardatários no restaurante e tudo prossegue, com mais e mais histórias. Por volta das 0h40 chegamos e tudo fica mais ou menos acertado entre eles para estarem no sábado no jogo em Bauru, contra o Bragantino e no outro domingo, viajarem para São Paulo, contra a Portuguesa.

LEGENDA DAS FOTOS:
5280: Geraldo, de azul e a turma do fundão / 5281: Marquinhos, o cartaz, Juraci e seu pequeno comércio / 5284: Priscila do Comando Feminino / 5290: Recebo a camisa oficial do Pavanello / 5294: A galera na parada antes da chegada / 5297: A aglomeração defronte o estádio / 5305: Seu Raja, de branco entre os torcedores / 5309: O sósia do artilheiro Otacílio faz sucesso / 5315: Pavanello contando histórias na viagem de volta.
Henrique Perazzi de Aquino - escrito em 09/02/2008.
AMIGOS DO PEITO (5 E 6)

MEUS PAIS - BODAS DE OURO

Para quem ainda não sabe o meu mafuá fica localizado na casa dos meus pais. Desde a separação, voltei ao lar deles e ocupo um amplo espaço por lá. Ele, Heleno, 79 anos e ela, Eni, 70 anos são duas preciosidades, jóias raras. Falo de todo mundo, mas quando me deparo com eles, fico sem palavras e engasgado. Hoje, passamos um dia mais do que especial em nossas vidas (minha e de meus três irmãos), pois ambos completaram 50 Anos de casados, Bodas de Ouro. Ainda estou emocionado com tudo o que possibilitamos a eles e eles a nós. São meu melhores e mais fiéis amigos.
UMA ALFINETADA (18)

A QUESTÃO DO CARTÃO CORPORATIVONão se fala em outra coisa. Esse é o assunto do momento. Eis mais um motivo para nova crise e talvez até uma CPI. Fala-se em novo escândalo, mas venho aqui minimizar um pouco a coisa. Não vejo motivos para o alarme ser ligado. Vejo o tal Cartão Corporativo como um instrumento moderno, que permite melhor controle do que o velho talonário de cheques. O Governo Lula acertadamente o mantém aberto desde o início, permitindo a todos acompanhar os gastos feitos nos tais cartões, graças à política de transparência pública. Até 2004 essa possibilidade simplesmente inexistia. Pode-se falar mal de Lula o quanto quiserem, mas desde o início do seu Governo está tudo lá na internet. Ninguém fez investigação nenhuma para descobrir isso ou aquilo, bastando apenas acessar o site do Transparência. Os nomes e os gastos sempre estiveram lá. Sendo assim, quem fez algo errado que pague pelo que fez.

O que não podemos continuar é sendo hipócritas de achar que tudo é um grande fim de mundo. Fim de mundo é continuarmos colocando o dedo na ferida atual e relevando a do passado. Hoje, a transparência é evidente, já no passsado, no Governo anterior não existia e ninguém fala disso. Vejam os números: em 2001 foram gastos R$ 213,6 milhões e em 2002 a bagatela de R$ 233,2 milhões com os tais cartões. As datas referem-se ao Governo de FHC, onde não existia o sistema atual de você poder conferir na internet como foram efetuados os gastos. No atual Governo, os gastos foram reduzidos e mantêm-se numa média anual de R$ 143,5 milhões.

Existe sim, uma clara e evidente manipulação na mídia, que cutuca um lado e joga sujeira para debaixo do tapete em outro. Novamente deixo aqui registrado que a transparência atual não existia e devemos louvar sua existência hoje. Hoje, sabe-se que um ministro gastou menos que R$ 10 reais com tapioca está ali na internet, mas continuamos não sabendo como os secretários do Governo Estadual paulista fazem para pagar os jantares no famoso restaurante Fasano, pois essas contas são fechadas e não são publicadas. E por que pede-se CPI somente para um e não para o outro? Essa é a hipocrisia reinante. Escândalo é quando não existe a tal transparência, quando se oculta o gasto. Por aqui, quem facilita a identificação ainda é acusado de mancomunar-se com falcatruas. Durma-se com um barulho desses. Lula institui a Transparência quando tudo é feito às claras e recebe pau, FHC e os Governos Estaduais não o fazem e são isentos. São coisas que não consigo entender.

Repasso isso para nossa região. Muitas cidades permitem gastos de secretários, assessores e nada divulgam sobre esses extratos (em Bauru nada disso é permitido). Ainda persiste muitas Prefeituras pagando celulares ilimitados para gente do alto escalão e essas contas não são divulgadas. Podem sim, serem conferidas quando um Promotor as exige, mas do contrário estão lá fluindo calmamente como um rio sem obstáculos.Isso não é transparência. Transparência é ter a coragem de publicar tudo. Lula erra ao permitir a execração de sua ministra negra, que usou indevidamente e devolveu, sendo que, num passado não tão distante, jatinhos da FAB foram usados por ministros de Estado para viagens à Fernando de Noronha (lembram-se do FHC Tur?) e nada foi devolvido, nem as pessoas foram exoneradas. Dois pesos e duas medidas. Aguardo ansioso a publicação de onde são gastos o dinheiro do orçamento paulista, da mesma forma que o Governo Federal publica todos os seus. Que os múmeros abaixo não passem desapercebidos: total em 2007, R$ 75 milhões de cartões no Brasil inteiro, enquanto só no estado de SP foram gastos R$ 108 milhões. Nosso rico estado está gastando mais do que o país todo e isso não gera nenhuma curiosidade da mídia nativa. Quando formos brincar com essa questão dos cartões, não devemos expor somente a carinha barbuda do presidente e isentar a dos governadores, pois esses são muito mais nocivos, quando não expõem seus gastos. Sabe por que essa CPI não vai dar em nada? Simplesmente porque começa a aparecer os gastos com os cartões tucanos e como, nem mídia, nem ninguém está interessado em pegar tucanos, vão acabar deixando por isso mesmo.

Henrique Perazzi de Aquino, 47 anos, abolindo de vez o talonário de cheques para utilizar 24h por dia um cartão de débito, porém mantendo saldo no vermelho, como dantes.

sábado, 9 de fevereiro de 2008

UMA FRASE (13)BERNARD SHAW - ESCRITOR IRLANDÊS
"Cansado de ouvir um americano falando sobre pátria e patriotismo, perguntou a um amigo se sabia qual era a diferença entre uma vaca ruminando e um patriota americano mastigando chiclete. E, sem pestanejar, ele mesmo respondeu:
- É que logo você nota o olhar inteligente da vaca".
FRASES DE UM LIVRO QUE JÁ LI (9)

OS PREZADOS LEITORES, FLÁVIO RANGEL, GLOBAL EDITORA, 1981
Flávio Rangel além de ótimo escritor foi teatrólogo, com mais de 40 peças escritas. Fez história também no jornalismo brasileiro, publicando crônicas nos mais diferentes órgãos de nossa imprensa, desde O Pasquim, Senhor e na Folha de SP. A convite de Cláudio Abramo ele veio para uma das melhores fases que a Folha já teve em toda sua história. O resultado foi esse livro que, mesmo com o passar dos anos, continua fazendo parte do meu mafuá. Algumas frases dele:

- "Aí, fui pegar meu carro no estacionamento. Na parede, uma porção de frases: Não aceitamos cheques, não nos responsabilizamos pelos objetos deixados, não lavamos, não permitimos o uso do telefone, não temos troco: não isso e não aquilo. Julguei que todas as frases poddiam ser unidas numa só: 'Não temos educação', ou, para usar uma expressão chancelada e liberada por Brasília: Não encham o saco".
- "...o Brasil não poderia fazer melhor figura no Jogos Olímpicos porque nosso povo é subnutrido e se alimenta mal. Agora li que o Governo ficou irritado com as críticas. Em vez de ficar irritado com a fome, irrita-se com quem a denuncia. Tão Brasil".
- "...ultimamente, toda vez que pergunto o preço de alguma coisa, sento logo antes para não quebrar a espinha".
- "Sempre pensei que um terrorista, de esquerda ou de direita (são todos iguais) necessitava antes de mais nada de um bom divã de psicanalista, amor e humor. Os fatos vivem me dando razão".
- "E pensava também quando chegará o dia em que as sociedades modernas organizem uma Escola Superior de Paz, como de certo modo desejava Aristóteles, que substituia os 'War College' e as 'École Superière deGuerra', tão imitadas mundo afora".
- "...jogo é a única esperança dos pobres de tirar a cabeça da lama".
- "Estava pensando nessa misoginia do macho nacional, que sedeitar três minutos num divã de psicanalista descobre logo seu lado feminino".