“SEU HENRIQUE, O SENHOR FAZ TEMPO QUE NÃO CONVERSA COM GENTE AQUI DAS QUEBRADAS, NÉ?”, OUÇO E ME CONFORMOTudo ocorreu hoje de manhã e a conversa reveladora se deu numa loja de material de construção, com o gerente do estabelecimento que me atendeu para comprinhas urgentes, reforma necessária lá pelos lados do Mafuá. Escolhi um estabelecimento nos altos do jardim Bela Vista e não identifico o lugar, nem as pessoas com quem conversei, mas revelo e destrincho a conversa. Fiz as comprinhas e puxei conversa, pois o assunto que rolava entre as pessoas ali no espaço para os clientes era o resultado das eleições.
Seu Zé – assim o identificarei -, me vendo com adesivo de candidato petista no vidro do carro estacionado bem na frente da loja e me achando interessado em entrar na discussão, diz sem que perguntasse:
- Meu caro, ninguém aqui votou em nenhum candidato do teu partido. Olha que já ouvi e vivenciei muita coisa sobre as realizações do PT aqui em Bauru e no país, mas falaram muita coisa de vocês e desde então não os vejo mais aqui. Falaram aquilo tudo na TV e ninguém veio aqui para se defender. Nessa eleição mesmo, não vi esse candidato que você ainda tem exposto aí no vidro do carro, nem o a prefeito, o moço novo. A gente vota em quem anda por aqui, conversa com a gente e mesmo desconfiando, estão por aqui. A quanto tempo o senhor não vem aqui desse lado da cidade assuntar sobre isso que estamos a conversar?
- Faz tempo, muito tempo. Primeiro leve em consideração a pandemia, estou praticamente recluso desde março deste ano, mas te confesso, isso que me diz, faz tempo que o PT e também outros segmentos como o que atuo, da esquerda, circulam pouco, cada vez menos e assim, como me diz, esse espaço foi ocupado por outros. Te vi cumprimentando um senhor também comprando, parecia ser pedreiro, falou algo dando a entender ser religioso. Esses estão bem presentes por aqui não? – me responde e também deixa pergunta no ar, perguntando meu nome e a partir de então, em cada resposta, faz questão de me chamar pelo nome.
- Seu Henrique, eu não conheço o senhor, sei que já veio aqui outra vez, junto de um senhor que é pedreiro e conhece a gente, mas percebo ser gente do bem. Só por isso me abro e falo algo mais. Sim, os religiosos não saem daqui e estão por todos os lugares. Eu continuo gostando de uma cervejinha e churrasco, eles me olham meio atravessado, pois gostam mesmo é de quem seja igual a eles. Mais ouço quando diante deles, mas sempre estão tentando influenciar o que fazemos. Não chegam impondo, mas dizem claramente de que lado estão e em quem, por exemplo, votam. O nome dessa moça, que a gente conhecia da televisão surgiu assim, dessas conversas. Eu ouvi muitos deles, que antes iam votar no médico e depois de um certo tempo optaram por ela. Foi uma mudança de rumo e não sei te explicar, mas vi isso ocorrendo aos poucos e na última semana, estava bem mais no ar. Deu no que deu. Gente que defende o que senhor defende são muito poucos por aqui. Conheço dois no máximo e na maioria das vezes não querem se misturar e nem entrar nas rodinhas de conversa. Isso faz toda a diferença. O senhor mesmo, ouviu as conversas, não conhecia ninguém, ficou quieto, não falou nada e veio só conversar comigo. A gente precisa ser mais entrão e também entrar na conversa deles, pois eles entram na conversa dos outros. Isso é conquista de espaço – me diz.
Eu não esperava uma conversa tão reveladora. Assuntei mais e como ele estava conversador, lhe disse se já havia decidido o voto no segundo turno.
- Seu Henrique, o senhor deve ser uma cara estudado, tem um carrão e escolheu a gente pra comprar. Fez bem, veio indicado pelo que veio da outra vez contigo e sabe, temos preços melhores que os grandões. Se aqui está, me escolheu para gastar seu dinheiro e puxa conversa, te digo que votei em alguém que nem chegou perto, a Rosana. Eu vi ela e vi naquele jeito, no olhar, no jeito de falar passava confiança, mais que todos os outros. Aqui todos estavam com o Raul, alguns mudaram, pois o conversê estava bravo para votar na Suéllen nos últimos dias. Eu ainda não decidi, mas tô vendo todos por aqui já mudando. São sinais que percebo das conversas. Eu não posso me expor muito, pois posso desagradar alguns e perco clientes. Fico na minha e sei que vou votar. Quero ver mais, mais se me perguntar do seu partido, se quer minha opinião, te digo, apareçam mais, conversem mais, se exponham e digam ao que vieram, mas não só agora. Eu ainda acredito em muita coisa que ouvi de vocês e se me diz que mentiram, por que nada fizeram ou demoraram demais pra vir aqui nessas rodas continuar falando de tudo o que o Lula fez. Eu sei que ele fez, mas faltou gente defendendo ele. Volte sempre aqui, nem que for só para o cafezinho. Eu sei que faz pouco esse tipo de coisa, mas faz toda a diferença.
E antes de ir embora, me presenteia com um chapéu de palha, desses de abas bem largas, tipo mexicano e na despedida ainda me diz:
- Esse chapéu é para que volte sempre. Gostei da conversa. O senhor deixa a gente falar e não cagou regra pra cima de mim, mas sei tem muita coisa pra me dizer. Devagar eu e todos por aqui, podemos ir ouvindo mais e mais. Use o danado do chapéu para não queimar esse telhado baixo que o senhor tem na cabeça.
Fiquei de voltar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário