quinta-feira, 17 de outubro de 2019

DOCUMENTOS DO FUNDO DO BAÚ (134)


BOBEANDO QUEM AINDA PODE NOS REVELAR ALGO DA HISTÓRIA PODE DESAPARECER E COM ELES SE ESVAIRÁ UMA POSSIBILIDADE DE CONHECER ALGO MAIS DO PASSADO - DE UM BATE PAPO NUM BOTEQUIM
Joaquim Mendonça e esposa Nádia Naura - Foto JC
Esse título é doloroso, mas parte da História não está gravada e ainda perpetuada em escritos, registros gravados ou coisa parecida e sim, na mente de alguns dos personagens que dela fizeram parte. Quando esses se vão e nada foi registrado, parte da História se vai com eles, ou pelo menos a versão das quais participaram. Ontem, sentado numa mesa de bar, a do Japa na rua primeiro de Agosto, ao lado do Banco do Brasil, eu, o memorialista Antonio Pedroso Junior, que com seus livros e registros muito já produziu nesse sentido e um dos personagens a me fazer escrever esse texto, JOAQUIM MENDONÇA. Ali tomando um café com sorvete, papo vai, papo vem, em pouco mais de uma hora tomei conhecimento de muita coisa que nem imaginava, bastidores da vida bauruense, posses, demissões, conchavos, como se deram muitas promoções, muitas delas arrumadas de uma forma bem conhecida na vida nacional, pelo tal do jeitinho. Joaquim esteve presente nos bastidores do período nefasto militar da última ditadura, a que por 22 anos transformou a vida nacional e de certa forma, institucionalizou o que vemos hoje como norma: o amigo do amigo é mais importante que tudo. Em Bauru, como não podia deixar de ser, o ocorrido não merece ser esquecido, até para podermos dar nomes aos bois, saber de fato como se deu algumas das passagens vistas até então gloriosas, mas em muitos casos, pouco virtuosas. E nada como, falar com quem vivenciou aquilo. Difícil é fazer essas pessoas falarem, gravarem, perpetuando um registro que vai além da História.
Joaquim Mendonça dia homenagem comunista Arconcio.

Lancei a bola ontem para o Pedroso. Gostaria muito de conseguir ver gente como Joaquim Mendonça contando de tudo um pouco do que já vivenciou na vida, as entranhas com o poder. Ele sabe muito e igual a ele, cada vez menos pessoas, poucos, dando até para se contar nos dedos, talvez de uma só mão. Perder essa rara oportunidade é algo pelo qual qualquer historiador não pode deixar passar. Deixei o Pedroso instigado para em cada retorno seu, uma gravação e disso um livro, não só com ele, mas com outros. Certa feita, creio que um ano antes de falecer, o memorialista Gabriel Ruiz Pelegrina, que muito sabia da história dessas plagas, mas pouco contou de fato em seus livros, me disse textualmente: "Por muito tempo eu não pude contar muitas coisas nebulosas da história de Bauru. Hoje talvez já possa fazê-lo, pois os personagens já se foram há muito tempo e mesmo seus herdeiros também". Eu e tantos outros perdemos a oportunidade e com ele se foram muitos fatos pelo quais não se guardam registros escritos, mas somente na memória de quem os vivenciou. Eu e Pedroso, ambos já alquebrados, não podemos perder muito tempo. Só o bate papo de uma hora de ontem já seria suficiente para dar uma boa agitada no que foi produzido até hoje, a tal História Oficial que até então temos conhecimento. Desvendar isso é quase uma obrigação, algo ainda a ser feito, com algo surgindo nos dias atuais e já mostrando toda sua eficiência. Dois livros recém lançados dão luz a essa minha tese. Algo deles conto num texto escrito por mim com exclusividade para o jornalista Chu Arroyo publicar na edição saindo amanhã do seu jornal, o Pedra de Fogo e aqui reproduzido:

"ISSO A GLOBO NÃO MOSTRA
A história de nossas cidades, tanto de Bauru, Lençóis Paulista ou todas as demais ainda é escrita pela visão dos vencedores. Em casos esporádicos se encontra a versão dos derrotados, a do povo trabalhador, campesinato, obreiro, o que rala no dia a dia e carrega tudo às costas, ou seja, a da imensa maioria da população. Esses possuem pouca voz, pelo menos entre os memorialistas e historiadores a registrar o passado. Olho para uma estante que possuo só com livros contando a História de Bauru e constato isso. A versão oficial predomina e ela escamoteia, falseia com a verdade dos fatos, pois na maioria das vezes aquele retratador possui algum vínculo com os donos do poder e desta forma, faz a abordagem puxando a brasa para o lado destes.

Triste constatação. Por sorte, tenho visto o surgimento de uma nova visão sobre fatos do passado e isso é mais que alvissareiro. Uma nova geração de pesquisadores querendo fugir do trivial e fuçando nas origens de nossas cidades, no que de fato ocorreu e mostrando uma visão dando a devida importância para o protagonista até então deixado de lado. Os índios massacrados na região, vistos como quem impediam a chegada do progresso, dizimados por truculentos grupos contratados por fazendeiros passaram batido ao longo do tempo e hoje sendo mostrados como de fato o foram, perversos, cruéis, insanos, produtores de muita violência. O progresso em nossa região sempre foi travestido de uma disfarçada forma de violência, pois o mais forte sempre impôs sua vontade a fórceps, de cima para baixo, calando a voz do mais fraco, do dito oprimido. Ler essa versão após ampla pesquisa, inclusive tomando como base os livros até então produzidos, traz luz para revelações até então nunca lidas.

Dois livros em Bauru retratam isso de maneira bem evidente e demonstram estar surgindo algo novo, desvendando de fato a História como de fato se deu, sem aquela cobertura de que o processo foi suave, tranquilo e sem traumas. Cito a ambos. Em "Fronteira Infinita: índios, bugreiros, escravos e pioneiros na Bahurú do século XIX", os professores Luís Paulo Césari Domingues e Edson Fernandes dissecam o que foi de fato o período mais obscuro de nossa história, o do desbravamento da região onde está hoje assentada nossas cidades. Noutro, o “O pulsar da resistência – A história de Alberto de Souza, um homem entre revoluções”, o advogado e jornalista Arthur Monteiro Alves disseca a história de um contestador, desses que larga tudo e luta pelo ideal de muitos, sofrendo por causa disso, uma vida inteira tentando reverter o poder vigente, sendo penalizado e privações perdurando até o fim de sua vida.

São retratos bem precisos desse outro lado, ainda pouco desvendado de uma história clamando por ser revista, desvendada e contada de fato e de direito. Li a ambos e confrontei com tudo o que havia até então sido publicado e a constatação é somente uma: a carência, não só de boa leitura, como de revelações verdadeiras, originais e substanciosas de um passado ainda nebuloso, acobertando fatos que se deram de um jeito e nos foram repassados de outro. A História clama por isso. Num momento de obscurantismo, com a chegada de um desGoverno remando para tornar o país cada vez mais dependente, subserviente e alicerçado em interesses nada populares, ter ao menos quem nos mostre algo do passado, com esse viés de que a mentira não perdura para sempre, um alento. Que muitas outras obras surjam e desvendem aos nossos olhos algo ainda não totalmente entendido".


OBS.:
Na primeira foto Joaquim Mendonça e sua esposa, a jornalista Nádia Naura, registro do Jornal da Cidade e na segunda, evento ocorrido em junho de 2008, tendo Joaquim junto a demais numa homenagem ao ativista político comunista Arconcio Pereira.

3 comentários:

Anônimo disse...

Ativista político comunista? É isso mesmo?
Parece que ser comunista é bom. 100 milhões de mortes é um número legal?
É preferível ser nazista do que comunista.
Veja a situação da Venezuela!

Henrique disse...

meu caro anônimo:
Alguma confusão em seu questionamento.
Quem mata no mundo não é o comunismo, esse prega a igualdade de condições, ninguém explorando ninguém, algo como Cristo queria fazer e foi crucificado. Quem mata é exclui é o capitalismo e hoje essa vertente neoliberal, mais cruel e insana, colocando gente nas ruas como nunca se viu e os deixando à míngua, miséria total e morrendo aos milhares, diria, milhões. A Venezuela sofre um bloqueio advindo do Grande Irmão do Norte, esse o causador em primeiro lugar da imensa maioria dos seus males. Não confunda as bolas, nem alhos com bugalhos. E qual o mal em ser ativista político comunista? Sempre houveram e não tínhamos esse espanto. Se nem a convivência com os pensamentos desiguais é mais permitido por gente como tu, estaríamos a um passo de sermos mortos pelo simples fato de pregar que todos deveriam ter oportunidades, sermos mais igualitários. Vejo aqui dos motivos do atual papa sofrer tanto com mentes tão estreitas. Seu caso é patológico, doença incurável.

Henrique - direto do mafuá

Anônimo disse...

Pode incluir na lista de livros, o do Thiago Moratelli, "Trabalho de Empreitada" onde disseca o trabalho de construção da Estrada de Ferro NOB. Mostra as lutas dis ferroviários e o papel que cumpriu Machado de Mello na exploração dos trabalhadores e na matança de índios.
Roque Ferreira