UMA MÚSICA (9)
Do Zé Ramalho eu tenho a coleção quase completa. Vozeirão inigualável e um cantante dos mais valorosos desse torrão. Hoje, está aqui em Bauru, lá no SESC e seu show é imperdível. Poderia citar dezenas de canções suas que, ainda embalam minha vida, mas a que deixo a letra aqui é uma daquelas com temática social, letra de um trio nordestino. É um discurso, uma fala emocionada, que não me canso de escutar no meu mafuá. Faz parte do CD "Nação Nordestina", de 2000:
"O MEU PAÍS" - letra e música - Livardo Alves, Orlando Tejo e Gilvan Chaves
Tô vendo tudo, tô vendo tudo / Mas, bico calado, faz de conta que sou mudoUm país que crianças elimina /Que não ouve o clamor dos esquecidos /Onde nunca os humildes são ouvidos /E uma elite sem deus é quem domina /Que permite um estupro em cada esquina / E a certeza da dúvida infeliz / Onde quem tem razão baixa a cerviz / E massacram - se o negro e a mulher / Pode ser o país de quem quiser / Mas não é, com certeza, o meu país
Um país onde as leis são descartáveis / Por ausência de códigos corretos / Com quarenta milhões de analfabetos / E maior multidão de miseráveis / Um país onde os homens confiáveis / Não têm voz, não têm vez, nem diretriz / Mas corruptos têm voz e vez e bis /E o respaldo de estímulo incomum / Pode ser o país de qualquer um / Mas não é com certeza o meu país
Um país que perdeu a identidade / Sepultou o idioma português / Aprendeu a falar pornofonês / Aderindo à global vulgaridade / Um país que não tem capacidade /De saber o que pensa e o que diz / Que não pode esconder a cicatriz /De um povo de bem que vive mal / Pode ser o país do carnaval / Mas não é com certeza o meu país
Um país que seus índios discrimina /E as ciências e as artes não respeita /Um país que ainda morre de maleita /Por atraso geral da medicina /Um país onde escola não ensina /E hospital não dispõe de raio - x /Onde a gente dos morros é feliz /Se tem água de chuva e luz do sol /Pode ser o país do futebol /Mas não é com certeza o meu país
Tô vendo tudo, tô vendo tudo /Mas, bico calado, faz de conta que sou mudo / Um país que é doente e não se cura /Quer ficar sempre no terceiro mundo /Que do poço fatal chegou ao fundo / Sem saber emergir da noite escura /Um país que engoliu a compostura /Atendendo a políticos sutis /Que dividem o brasil em mil brasis /Pra melhor assaltar de ponta a ponta /Pode ser o país do faz-de-conta /Mas não é com certeza o meu país
Tô vendo tudo, tô vendo tudo /Mas, bico calado, faz de conta que sou mudo.
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