terça-feira, 22 de janeiro de 2008

UMA MÚSICA (14)
Parabolicamará
Ouço Gilberto Gil desde pequeno e sempre gostei muito. Tenho quase todos seus LPS (os tais bolachões) aqui no meu mafuá, dos quais não me separo. Esse aí é um dos que curto de montão. Quase todas as músicas são muito boas e dentre elas, essa que foi uma premonição aos dias atuais.

música e letra: Gilberto Gil 1991
Antes mundo era pequeno/ Porque Terra era grande/ Hoje mundo é muito grande/ Porque Terra é pequena/ Do tamanho da antena parabolicamará/
Ê, volta do mundo, camará/ Ê, ê, mundo dá volta, camará/ Antes longe era distante/ Perto, só quando dava/ Quando muito, ali defronte/ E o horizonte acabava

Hoje lá trás dos montes, den de casa, camará/ Ê, volta do mundo, camará/ Ê, ê, mundo dá volta, camará/ De jangada leva uma eternidade/ De saveiro leva uma encarnação/ Pela onda luminosa/ Leva o tempo de um raio/ Tempo que levava Rosa/ Pra aprumar o balaio/ Quando sentia que o balaio ia escorregar

Ê, volta do mundo, camará/ Ê, ê, mundo dá volta, camará/ Esse tempo nunca passa/ Não é de ontem nem de hoje/ Mora no som da cabaça/ Nem tá preso nem foge/ No instante que tange o berimbau, meu camará

Ê, volta do mundo, camará/ Ê, ê, mundo da volta, camará/ De jangada leva uma eternidade/ De saveiro leva uma encarnação/ De avião, o tempo de uma saudade/ Esse tempo não tem rédea/ Vem nas asas do vento/ O momento da tragédia/ Chico, Ferreira e Bento/ Só souberam na hora do destino apresentar

Ê, volta do mundo, camará/ Ê, ê, mundo dá volta, camará


Gilberto Gil: "Eu queria fazer uma canção falando dos contrastes entre o rural e o urbano, o artesanal e o industrial, usando um linguajar simples, típico de comunidades rudimentares, e uma cadência de roda de capoeira. Aí, compondo os primeiros versos, quando me ocorreu a palavra 'antena' - seguida de 'parabólica' - para rimar com 'pequena', eu pensei em 'camará' [palavra usada comumente nas cantigas de capoeira como vocativo] para completar a linha e a estrofe. Como 'parabólica camará' dava um cacófato, eu cortei uma sílaba 'ca' e fiz a junção das palavras, criando o vocábulo 'parabolicamará'. Uma verdadeira invenção concretista; uma concreção perfeita em som, sentido e imagem. Nela, como um símbolo, vinham-me reveladas todas as interações de mundos que eu queria fazer. Aí se tornou irrecusável prosseguir e, mais, fazer daquilo um emblema do conceito, não só da canção, mas de todo o disco.

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