Cito dois, dentre os dez, estes terminados. O primeiro é “De hoje não passa”, troca de correspondência entre o carioca Eduardo Goldenberg (meu amigo) e o paulista Julio Bernardo. A edição é da Mórula RJ, 128 páginas. Na apresentação, Júlio define o motivo de me envolver e ter ido em busca de um livro, onde um escreve algo do Rio e o outro responde de Sampa: “Não é você que larga a vida, é a vida que larga de você”. O pano de fundo do livro tem a mesa de bar como roteiro. A usam para dizer de tudo e assim, versam de forma bonachona sobre tudo. O livro é saboroso e, neste momento brasileiro, me alivia, me faz dar uma flanada diante de tanta coisa séria ocorrendo. Não que isso não seja sério, diria mesmo, necessário. Eu atuo e estou inserido seriamente, mas adoro um bar e as conversas dali provenientes. Eis algumas frases selecionadas:
- Todas as águas do Edu levam sempre à Tijuca, aos amigos, às histórias emotivas, ao samba e à adoração por Brizola e Aldir Blanc – duas paixões que dividíamos sem saber (Julio).
- Chega uma hora em que precisamos admitir as próprias derrotas e pelo menos cogitar mais seriamente a data da falência final (Julio).
- Botequim bom é um verdadeiro hospital de almas. (...) A Zona Norte, a Tijuca, é – ousaria dizer – o palco perfeito pro suicida exercer seu ofício único no átimo do gesto corajoso. Eu só não perdoo o suicida exibido. O que perturba por conta de seu gesto, como a besta que se atira diante de um trem e fode com o dia inteiro de trabalho de uma massa de gente que não tem nada a ver com o covarde (Eduardo).- Não faço bem o estilo daquele que planeja passar o outono da vida acomodado no conforto do marasmo de um cotidiano asséptico (Julio).
- As pessoas tem que voltar a praticar a sagrada arte da melancolia. (...) por que as pessoas pararam de trocar cartas? (...) Meu dia se torna santo quando sento à mesa e escrevo (Eduardo).
- Eu não sei porque as pessoas pararam de trocar cartas, mas desconfio. As pessoas não têm mais o que dizer, o que contar. Estamos fodidos (Eduardo).
- O exemplo de Judas nos mostra que péssimas alianças ocorrem desde que o mundo é mundo (Julio).
- Melhor perder do lado certo que ter vitórias cretinas ao lado de quem não presta, seguindo o assim pensamento precioso do saudoso Darcy Ribeiro (Eduardo).
- Eu seguirei daqui escrevendo, acho que essa é a única coisa que sei fazer quase direito, além de ter gosto até que razoável pela bebida (...) Como disse um belo dia o fabuloso Zé Rodriz, meus discos, meus livros e nada mais. Porque não confio em escritor que não lê (Julio).
- Hoje meu principal patrimônio é a consciência de que não deixarei nenhum legado. Não apenas no Brasil – nos mostram que o homem percorre uma trajetória que pouco tem a ver com a tal da utópica evolução. (...) A tentação do fracasso é irresistível (Julio).
Meu outro livro, também de cabeceira por estes dias é uma releitura da obra do paulistano Marcos Rey, principalmente suas crônicas. Tenho me identificado bastante com as andanças dele pelas entranhas de cantos quase indescritíveis da capital paulista, muito ao estilo de Adoniran Barbosa e João Antonio - e o primeiro, João do Rio. Creio ter conseguido comprar todos seus livros e por preço assim, R$ 5 reais cada. Para mim valem muito. Neste lido, o “Soy loco por ti, América!, Global Editora SP, 2005, 168 páginas. Outro da mesma laia, o adorável João Antonio fez o prefácio e nele escreve: “Hoje, numa rua de Botafogo, um homem vai aporrinhado. E só aporrinhado pode ir. (...) Olhar de humanismo desencantado que, apesar dos tropeços e porradas, a vida não conseguiu tornar cínico. (...) Dessa máquina de moer gente ninguém sairá inteiro, sejam falsários, radialistas da madrugada, esposas mal amadas, publicitários ou escribas mambembes, atores, atrizes e diretores, cabos eleitorais ou motorisdtas de táxi, prostitutas ou cafetinas, ricos, pobres, dependentes e pingentes urbanos e até os alegres rapazes e menininhas em flor pré-64, da lamentável esquerda-festiva-etílico-lítero-perfumada-musical. (...) Haverá um mundo melhor? Hay um mundo mejor, pero és caríssimo”. Nas frases algo mais deste brilhante escritor:
- Dinheiro novo é tão suspeito como a virtude duma virgem velha.
- Um falsário, como um príncipe, não pode permitir intimidades.
- Inocente as pessoas vão deixando impressões digitais por toda parte, o que pode causar embaraço mesmo às que nada fizeram. O cinema dá exemplos disso. Decidi não deixar impressões nem em papel higiênico.
- Um segredo compartilhado é um segredo desvendado. Todas as pessoas gostam de confessar. Se não fosse assim os padres não teriam trabalho. Nunca se confessou?
- Queria apenas conversar com alguém, ter um assunto. Os anseios da alma são flutuantes: se às vezes desejava esconder-me, outras necessitava de contato e diálogo.
- A gente aprende tudo tão depressa quando não tem nada a fazer.
- O desemprego não advém da preguiça, mas podem caminhar juntos. Especialmente se o caminho leva à cadeira de um bar. (...) O desempregado leva ao menos a vantagem de não precisar levantar cedo.
- Ficamos horas sentados no bar, apenas vendo as pessoas passarem. Aprendi a assistir o que se chama de espetáculo da vida. Não havia nada mais inédito, variado, chamativo e colorido do que o desfile de transeuntes numa avenida central, principalmente ao cair da tarde. A diversificação de formas, cores, gestos e expressões é infinita quando se observa os passantes de uma mesa de bar. A simples maneira de andar não se repete duas vezes. Todos têm duas pernas mas andam de maneira diferente.
Eis algo do que ando lendo, até para não enlouquecer definitivamente. No mais, o pau continua comendo solto e este HPA, envolvido em cada contenda que nem lhe conto. Algumas conto.
O bloco do Tomate não segue o regramento de escolas de samba e blocos carnavalescos para o Carnaval, pois não desfila no Sambódromo - este ano, numa avenida qualquer da cidade - e sim, por tratar-se de bloco de rua, comunica para a Cultura Municipal e com um mínimo, a presença da corte real, os reis Momo, Rainha do Carnaval, os da Terceira Idade e a da Diversidade. Solicitação feita, solicita também autorização para colocar no Calçadão um carro de som, propiciando um som adequado para a descida do bloco. Nada mais.
Por estes dias, estive na Cultura algumas vezes, junto de Dulce Baté, ela correndo atrás da documentação para viabilizar que o Estrela do Samba de Tibiriçá consiga desfilar e receber o prometido pela Prefeitura - essa a parte maias complicada. Hoje, 17h, o prazo final da entrega da documentação e muitos deixando para a última hora. Não credito isso aos carnavalescos, mas principalmente para quem, hoje faltando 19 dias para a festa começar, tudo ainda insipiente. Com muitas indefinições, os carnavalescos tentam ao seu modo e jeito se adequar aos tempos fundamentalistas regidos pela atual mandatária.
O Carnaval, apesar de tudo, desse monte de bestialidade jogando contra, sempre vence e se mostra atuante e pujante. Neste ano, tudo está sendo feito no improviso, no corre-corre. O desfile na rua será uma colcha de retalhos e a grana para viabilizar a festa, chegará algo como uns 5 dias antes da festa e outra parte não se sabe quando depois. Os detalhes de compromisso assumido são perversos para quem faz o Carnaval, mas mesmo assim, eles insistem e tentam fazer o melhor que podem.
O Tomate torce para uma festa bonita, mas sabe das dificuldades, com todos correndo contra o tempo. Nosso ofício foi protocolado dia 25/01 e aguardamos resposta. Passo por lá dia sim, dia não e a resposta é sempre a mesma: A documentação corre pela aí. Tomara não nos surpreendam com nada em cima da hora. De qualquer forma, dia 18/2, estaremos na praça Rui Barbosa e às 12h, desceremos o Calçadão, Imbrocháveis da Alegria, fervendo com os desmandos todos.
Foi com essa pergunta que Victor Hugo Morales, o radialista do programa de rádio La Mañana, na 750 de Buenos Aires instiga outro a falar na sequência pelas ondas radiofônicas na manhã desta segunda, 30/01. A resposta deste é o tema do que quero aqui escrever: "Não, a mudança não termina nunca". Essa é uma alusão sobre todos os envolvimentos pelos quais estamos enfurnados ao longo da vida. Comento sobre o último, a tentativa frustrada de golpe de estado contra a democracia. Eles, os perversos, fizeram e aconteceram, meteram os pés pelas mãos e perderam feio. Mas isso não quer dizer que foram derrotados, pois a ultradireita continua pela aí e, se neste momento, estão um tanto recuados, até ocultos, não quer dizer que arrefeceram. Estão só se preparando para um novo ataque, pois o que fazem será sempre o descalabro. Portanto, creio que os que acham vitoriosos neste momento precisam ter a plena consciência de que, nada está ganho. A luta nunca está ganha e daqui por diante, terá intensidade ainda maior. Portanto, quando vejo alguns na lida e luta arrefecendo a intensidade do que fazem, enxergo muito perigo nisso, pois é o querem, que nos contentemos somente com o feito da inviabilidade deste primeiro ataque concreto e nos acomodemos. O momento é de muita união, ir pra cima e não dar espaço para esses bestiais, criminosos, perigosos, algo muito perto do fascismo e nazismo, continuarem mostrando seus dentes. "A mudança não termina nunca" e neste momento, mais do que nunca se faz necessário estar atento e forte contra tudo o que está em curso. É sobre isso minha preocupação.
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