quinta-feira, 6 de novembro de 2025

FRASES DE LIVROS LIDOS (225)


CIDADES E LIVROS
1.) "A ARTE DO ENCONTRO", DO PAULO GARCEZ, REVERENCIA O RIO DE JANEIRO DOS TEMPOS DO PASQUIM
Este livro eu trouxe de um sebo paulistano e quando dei com os olhos nele, disse sem pestanejar, "é meu". Paguei R$ 85 pilas. "Arte do Encontro" é a reunião das fotos que fizeram história, todas tiradas poelo Paulo Garcez, que pode não ter um nome dos mais conhecidos, mas suas fotos sim, pois foi um dos maiores do hebdomadário carioca Pasquim. Ele tirou fotos não só para o jornal e suas famosas entrevistas, como registrou o Rio de Janeiro nos anos 70/80 e ao ir revendo as fotos, muitas delas já conhecidas, é como se passasse um filme na cabeça do velhote que aqui escreve. Além do maravilhamento visual, o livro tem mais, pois conta com prefácio de Millôr Fernandes e Sergio Augusto, dois dos que melhores escrevem neste país. E cada foto possui um longa legenda explicativa de nada menos que Ruy Castro. Juntei tudo e sei, o livro é imperdível e impagável, como o era o Rio e suas entranhas naquele período.
Os personagens retratado pelas lentes do Garcez deram vida ao Rio, o tornaram ainda mais famoso. Muitos lá são verdadeiras lendas vivas e ao vê-los nas fotos, eu muito moço na época, encantado com o que lia n'O Pasquim ou mesmo no Jornal do Brasil, que comprava aqui na banca de jornais da praça Machado de Mello, com edições diárias chegando via trens. Garcez estava presente em todas as paradas de sucesso, conviveu com tudo e todas, foi aquilo que pode ser imortalizado como "testemunha ocular da História". O livro é de fotos, mas confesso, perdi mais tempo nele que em muitos outros só com escritos, pois em cada foto eu ficava horas a divagar e sonhar, mente posta em funcionamento. São ao todo 158 fotos e nelas, escancaradamente ali o Rio de Janeiro exposto em suas entranhas, dirtia mesmo, vísceras. Cito alguns do fotografados: Helio Oiticica, Nelson Rodrigues, Sergio Cabral (pai), Tom, Vinicius, Jaguar, Ivan Lessa, Luiz Carlos Maciel, Fernanda Montenegrto, Chico, Fernando SAbino, Ferdy Carneiro, Albino Pinheiro, Leila Diniz, Ciro Formigão Monteiro, Nara Leão, Carlinhos Oliveira, Sergio Porto, Rubem Fonseca, Rubem Braga, Houaiss, Nelson Cavaquinho, Maria Lucia Dahal, Marcos de Vasconcellos, Tarso de Castro, Drummond, Niemeyer, Lan, Otto Lara Resende, Ziraldo, Paulo Francis, Elis, Madame Satã, Manabu Mabe, Antonio Callado, Jorge Amado, Afonso Arinos, Marilia Pera, Grande Otelo, Glauber Rocha, Cacá Digues, Rui Guerra, Walmor, Jô, Dina, Gal, Paulinho Viola, Caymmi, Miêli, Manolo e tantos outros.
O Rio está ali retratado na sua exatidão. Eu fui apresentado a todos eles pelo Pasquim e os conheci, todas e todos por causa do jornal, que me endoidecia. Tanto fizeram com minha cabeça que, aos 17 anos aportei por lá sózinho, me hospedei num hotelzinho fuleiro em Copacabana, o Copalinda e bati perna, indo pra lugares onde hoje, creio eu, não iria mais sem estar acompanhado de um batalhão, como a ladeira da Saint Roman, sede do jornal. E a Lapa, vasculhei desde então seus cantos todos. Anos depois, já com a firma de chancelas, cai de boca no Rio e agora, quando estou aquietado, contido e com restrições - inclusive financeiras de locomoção -, o livro aqui do meu lado é pura tentação. Eu andei pela Penha, a da chacina, fui na inauguração do Museu da Favela, quando o Gil era ministro e molhei os pés no Bacião de Ramos. E fiz do Rival, aqueles botecos no entorno do teatro, o meu point. Eu reabro o livro em qualquer página e as histórias fluem, pipocam na minha mente.

2.) DEPOIS DA VITÓRIA DE MANDANI EM NOVA YORK, FUI EM BUSCA DE ALGO SOBRE A CIDADE LENDO TOM WOLFE E PAULO FRANCIS
Nova York sempre foi uma cidade fascinante. Estive nela por três vezes e aprendi a gostar do que vi. Conheço pouco dos EUA, circulei por umas dez cidades, uns quatro dias em cada, dá para conhecer pouco, mas algo a gente saca logo de cara. Nova York é um mundo a parte. Outras podem chegar perto, como New Orleans, que fui duas vezes e Chicago, uma vez, mas nada se iguala a NY. Lá tem de tudo e tudo é possível, até mesmo um candidato muçulmano derrotar Trump, quando o país inteiro está sob a avalanche autoritária deste ditador. Quando soube do resultado e de como foi se consolidando essa improvável candidatura, a única conclusão possível é que, NY é mesmo surpreendente. Creio até que já foi mais, mais não perdeu o charme e esse cadinho de continuar sendo a resistência norte-americana.
Quando estive lá pela segunda vez, começava a nevar e uma passeata contra Trump, ele no seu primeiro mandato, com aquele mundaréu defronte um imenso edifício dele. Me enfiei nos meio dos cartazes e presenciei depoimentos avassaladores, muito reveladores. Hoje, quando vi muita gente comemorando a vitória de Zohan Mandani, lembrei-me daquele dia e de como nada é surpreendente por lá. Tenho aqui no Mafuá um livrão, 916 páginas, onde seu autor, Tom Wolfe, descreve em minúcias algo das entranhas desta cidade, o que a move e como se dão suas relações de poder. É o catatau "A Fogueira das Vaidades", escrito em 1987 e quando publicado no Brasil, saiu com prefácio de nada menos que Paulo Francis. Impossível não voltar a buscá-lo na na estante. Reli o prefácio e lá havia grifado isso: "A cidade que mais atrai a atenção da mídia mundial, que é o centro da mídia mundial, com suas emissoras de televisão, jornais e editoras, cidade que tem os mais ricos museus do mundo, seja para apresentar o moderno ou o clássico, e cidade que é a mais rica do mundo".
Francis a idolatrava, tanto que foi para lá e nunca mais voltou. Mais do escrito por ele: "NY tem favelas que nada ficam a dever aos horrores do quarto mundo africano, que vemos na televisão. (...) Morar em Manhattan é a aspiração de todos os habitantes dos outros distritos, mas é caro. (...) Wolfe escreveu um romance de como vive a gente de NY. (...) Hoje, jornais, rádio e televisão invadiram a privacidade de todas as camadas sociais. (...) ...relata a vida da classe média que tem que contar os tostões para morar em Manhattan". E fala muito bem do escritor Tom Wolfe, como alguém que conseguiu mudar o rumo do romance americano. Na verdade, Wolfe é um bom contador de história, como o foi Dickens e Balzac. Diria que no Brasil, algo como Aldir Blanc, Lima Barreto, Machado de Assis, Sergio Porto, Marcos Rey, Ruy Castro, João Antonio e Fernando Moraes.
Nunca que uma eleição como essa para prefeito seria possível em 99% das demais cidades norte-americanas, pelo menos neste momento. Mandani não só ressucita o Partido Democrata, como reacende o fogo da necessária oposição à Trump. Nas comemorações, vi um enfrentamento que achava não ser mais possível, mesmo ciente de que ocorre protestos em vários lugares do país neste momento. Tirei o livro do Wolfe da estante e o vasculho com muita curiosidade. Instigante isso de conhecer profundamente as entranhas de uma cidade e, pelo visto, este é o romance certo para entender algo mais dessa apaixonante cidade. Da última vez, eu e Ana Bia, nos perdemos por ruas, lugares onde ela tinha frequentado décadas atrás e em em cada quarteirão, vi diante dos olhos, vários países se alternando diante de mim. Num lugar assim é impossível alguém querer controlar a mente das pessoas, colocando uma viseira, como a dos cavalos, impedindo-os de enxergar o que se passa. NY pensa e pulsa diferente do restante do país, a prova está aí. E a partir de agoram tudo pode voltar a ser imaginado, até uma reviravolta. Wolfe descreve o caos urbano, mas não deixa de insinuar, acomodação não é algo pairando naqueles ares.

3.) NESTE "GARRINCHA X PELÉ", MUITO DE PAU GRANDE E POUCO DE BAURU E SANTOS
Meu primeiro livro lido em novembro foi um emprestado pelo amigo jornalista Aurélio Alonso, o "Garrincha x Pelé - A influência da mídia na carreira de um jogador", um trabalho de conclusão de curso de Filipe Mostaro, de Juiz de Fora MG. Aurélio me conta comprou por uma bagatela na feira dominical. Leu, gostou e me emprestou. E como sabem, livro emprestado é pra ser devolvido meio que rápido. Comecei a ler na sala de espera do dentista e lá quase o devorei por inteiro. Foram 96 páginas lidas num vapt-vupt e nele algo dessa suposta disputa, nada para desvendar quem é melhor, mas sobre como a mídia tratou a ambos.
Na descrição das histórias de vida, inevitável a citação de Paulo Grande, como torrão natal de Garrincha e pela sua simplicidade, toda a importância da cidade em toda sua vida. Bauru é também citada, assim como Três Corações e Santos, mas Pelé foi muito além disso. Tem duas frases coletadas no livro, ambas sobre Garrincha e muito significativas. "Foi um pobre e pequeno mortal que ajudou um país inteiro a sublimar suas tristezas. O pior é que as tristezas voltam, e não há outro Garrincha disponível", Carlos Drummond de Andrade e "Daqui a 400 anos toda vez que falarem de futebol, terão que falar de Mané Garrincha", João Saldanha.
Eu adoro ir grifando as frases que vou lendo. Neste não pude fazê-lo, pois o livro não é meu - ainda. Uma de Eduardo Galeano é imperdível sobre essa transformação do futebol em negócio: "A medida que o futebol se fez indústria, foi desterrando a beleza que nasce da alegria de jorgar simplesmente porque sim... (...) O futebol segue sendo o mais apaixonante dos esportes, até agora não se inventou nada digno de comparação. Quanto ao futebol como negócio, parece cada vez mais uma piada de mau gosto". Sobre Pelé a mais significativa do livro, para mim, foi a : "Pelé fez gols de todos os jeitos possíveis e impossíveis, difícil não é fazer 1000 gols como pelé, difícil é fazer um gol como Pelé", também do Drummond. A discussão de quem foi melhor talvez passe antes do lado esportivo, pelo lado da disputa social e econômica entre Rio e São Paulo. "Destacando que Pelé é mineiro e Garrincha nasceu no interior do estado do Rio de Janeiro. Os dois eram os melhores jogadores dos melhores time do Rio e São Paulo na éoca: Santos e Botafogo; e essa disputa dequem era melhor começou nesta época".
Pelé nunca se preoucupou com dinheiro ao longo de sua vida, ao tempo que Garrincha, passou muitos perrengues, inclusive depois da separação de Elza Soares, que o amparava. Chegou a voltar para sua Pau Grande. Das diferenças entre ambos, Pelé se preparava para os jogos, algo inimaginável em Garrincha. Toda vez que, o livro resvala em Pau Grande, algo interessante, pois Garrincha em sua simplicidade fez o nome dessa cidade, na época também associada ao tamanho do pênis do jogador, que diziam era imenso, assim como seu futebol. A tese do Mostaro se aprofunda com teorias acadêmicas e eu estava interessado em detalhes ainda desconhecidos deambos os craques. O livro vale por estes detalhes. Alguns muito ienteressantes e envolvendo uma cabra. Mas isso já é um história que se contar, me chamarão de obsceno e sem noção.

triste notícia
PAULO FRATESCHI, UM DOS BONS DA MILITÂNCIA PETISTA
A morte de Paulo Frateschi é uma tragédia que atravessa o país pelo absurdo e pela dor.
Ex-deputado do PT, dirigente histórico e amigo pessoal de Lula, Frateschi foi esfaqueado pelo próprio filho em São Paulo.
A mãe tentou intervir e também ficou ferida. Ele não resistiu.
Mais do que uma notícia, o episódio expõe as fraturas silenciosas das famílias brasileiras.
Nenhum legado político, nenhuma biografia pública é imune à dor privada.
Por trás das siglas e das disputas ideológicas há um homem, uma família, e uma tragédia que escapa a qualquer explicação simplista.
Paulo Frateschi foi uma figura importante na construção da esquerda paulista.
Militante desde os anos 1980, participou da fundação de diretórios, campanhas e debates sobre democracia e desigualdade.
Hoje, o Brasil perde um dos seus quadros mais humanos, num cenário que mistura o drama familiar com o colapso da saúde mental e o esgotamento emocional de uma sociedade adoecida.
A política se constrói no coletivo, mas a dor é sempre individual.
O país que Paulo ajudou a construir precisa, mais do que nunca, olhar para o sofrimento que corre dentro das casas, nos silêncios e nos surtos que ninguém quer ver.
Texto de Beta Bastos

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