terça-feira, 28 de maio de 2019

AMIGOS DO PEITO (160)


ODE A AMIZADE

Eu e o fotógrafo Zanello. Muitas histórias juntos, uma amizade ultrapassando barreiras, mais de décadas de excelente convivência. De uma simples trombada na rua, ideias e confissões. A sua simplicidade me conquistou, numa espécie de amor a primeira vista. O reencontro sábado passado quando caminhava pela avenida Rodrigues Alves, ele todo pimpão, barba recém feira, paletó de terno e um sorriso de orelha a orelha. Paro, trocamos um fraterno abraço e lhe pergunto: "Qual o motivo da alegria?". Ele não se contém e me me conta várias histórias ao mesmo tempo. Gosto dele exatamente por causa disso, ele é um sujeito dado, franco e cheio de boa conversa. O motivo, fico sabendo, é salutar. Após tantos anos de labuta, contribuindo para a Previdência não se sabe nem como, conseguiu a tão almejada aposentadoria. E o fez no exato momento quando, se demorasse um bocadinho mais, após a aprovação da tão decantada reforma da Previdência, com certeza não mais o faria e teria que amargar, pelo menos mais uma década de contribuição.

Ele acabara de voltar de um serviço, um casamento civil e mostrava a versatilidade de seu novo celular, com duas câmeras de fotos. "Henrique, eu sempre andei com aquelas máquinas a tira colo e hoje, continuo para fazer pose, pois talvez os clientes não entendam muito bem e nem compreendam ao me ver tirando fotos lá no cartório ou mesmo nas igrejas e com o celular. Mas é a mais pura verdade, esses novos celulares possuem uma definição muito melhor que muitas das melhores máquinas que já tive". E para provar tira algumas fotos minhas e mostra como é o resultado, as amplia e pede para que verifique a definição. Eu, com o meu, também percebo isso, mas continuo intercalando, ora a maquininha portátil, ora sacando o próprio celular e clicando o objeto do interesse. Ele me mostra fotos tiradas com o celular hoje no cartório, intercaladas também com outra máquina, essa daquelas pesadonas, hoje não mais penduradas em seu pescoço como até bem pouco tempo. "Eu tiro as fotos com a profissional e ofereço um vídeo grátis, esse feito com o celular", diz.


Zanello conta isso para abrir o leque de conversas que virá pela frente. Mesmo conseguindo sua tão almejada aposentadoria, algo que nem pensa em fazer é permanecer trancado dentro de casa. "Você me conhece, sabe que gosto de estar na rua, ver as pessoas e ir registrando seus momentos. A aposentadoria, agora junto com o salário da esposa me dá mais segurança para fazer o que gosto e com mais afinco, mais dedicação e até esmero. Vou continuar fazendo o que sempre fiz a minha vida inteira. Eu vou atrás dos meus serviços, descubro eventos, percebo de longe onde vão precisar de um fotógrafo e vou pra lá, me ofereço. tenho muitos clientes fixos, que me conhecem de longa data. Faço de tudo, desde o tradicional casamento, como festas variadas, torneios de futebol e de esporte em geral. Essas festas com políticos, sempre alguém me chama e depois proponho o meu pacote. Hoje eu não levo somente a foto revelada, mas junto levo também um disquete com os originais, além de quando possível, acrescentado com alguma gravação. Eu mesmo faço tudo, todas as etapas. Só não revelo, no mais monto tudo".


Ele é o que pode ser considerado como mambembe, um fotógrafo à moda antiga. Tempos atrás, ele foi convidado a ir contar suas experiências profissionais para alunos universitários na disciplina de Fotografia. Não se avexou e sabe que, todos deram a devida atenção, pois ele é possuidor de histórias que a molecada desconhece. "Eles entram na universidade para ouvir histórias de grandes profissionais e daí se deparam com alguém como eu. Eles nem imaginam o que faço para continuar conseguir meus trabalhos, onde os faço, o que já passei. Minhas histórias chamam a atenção". Aproveita e me conta uma: "É minha tradicional. Fui fotografar uma festa familiar de um povo da roça. Dentre as fotos quis aparecer numa foto com eles, montei a máquina em cima de um tripé, regulei 10 segundo e sai correndo para me posicionar junto deles. Para minha surpresa todos saíram também correndo, achando que algo pudesse estar em vias de ser disparado. Até explicar pra eles, depois foi só risada".

Ele gosta também de uma boa viola, já tendo participado de várias duplas sertanejas na cidade e até ajudado a apresentar um programa de rádio. Ali atua do mesmo jeito e maneira quando está com a máquina na mão. Sabe ir levando tudo na maciota, com seu jeito simples, modesto, porém ciente de tudo. Percebe muito bem quando alguém quer tirar vantagem pra cima do seu trabalho. Deixa até onde pode, mas em alguns momentos, me diz, é obrigado a desancar com a pessoa, ainda mais quando essa passa dos limites. "As pessoas podem me achar simplão, mas não sou bobo não. Caipira não é bobo. Eu sou um sujeito do interior, da roça, gosto de trabalhar para esses, mas mesmo entre eles tem os aproveitadores. A gente tem que estar esperto em todo lugar". Ele conta isso, mas também diz não saber fazer outra coisa e não saber o que seria de sua vida se não fosse a fotografia, algo que o acompanha desde bem umas três décadas.

Ele vai sempre lá pelos lados do Mafuá. Passando pelas cercanias, para sua moto e se aproxima. Nas quartas a tarde toca na missa da igreja Aparecida e vez ou outra, passando em frente, vendo uma porta aberta, assunta como anda as coisas pro meu lado. Ele desabafa comigo e eu com ele. Somos confidentes um do outro. Já me contou muitas agruras vividas e por viver, daí também me abro e acabamos até trocando conselhos. É muito bom ter gente como o Zanello nos rodeando. Eu gosto muito, pois nesse mundão véio, danado de problemas, percalços pra todos os lados, quando vejo alguém com a sapiência desse matuto se aproximando, afrouxo o cinto, relaxo e vamos pras risadas. Foi o que se sucedeu ali na calçada da Rodrigues, bem em frente onde o seu Bau tinha seu sebo e defronte uma loja de outro conhecido seu, um também resistente fotógrafo, com sua vitrine cheia de aparelhos antigos e peças de máquinas, apetrechos lindos de se ver, raros, impecáveis, mas de pouca saída nos dias de hoje. Ele me fala desse desinteresse pelas coisas que até bem pouco tempo tinham tanto valor e hoje tão pouco. Com ele, engato um assunto no outro e para me desvencilhar do danado, tive que apelar, dizer que estavam me esperando pro almoço, estava atrasado, tempo curto, pois do contrário, a conversa se estenderia até não mais poder.


A gente sempre deixa um bocadinho pro próximo encontro. Peço para ele passar lá pelas bandas do Mafuá e sei, ele é desses que marca e comparece, vai mesmo. Ter Zanello como amigo é mais que um luxo, uma deferência especial. Eu e ele vamos tateando por esse mundo abestado, cavocando aqui e ali, escarafunchando algo para fazer e assim tocamos nossas vidas, algumas vezes pra frente, outras nem tanto, mas sempre tentando caminhar pra frente.


JÁ BUSCASTE HOJE TUA CARGA DE LENHA NO MATO?
"Com a disparada do preço dos combustíveis e do gás de cozinha muitos brasileiros estão passando por essa situação ilustrada na capa de O GLOBO nesta quinta. E olha que as empresas dos Marinhos são "sócias" nisso tudo. A impactante foto da capa é de autoria de Márcia Foletto e mostra a casa de dona Jurani em Senador Vasconcelos, Zona Oeste do Rio de Janeiro. E vem mais por aí com o super aumento da energia elétrica, vida que segue...", João Carlos Godoy.

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