Eu já escrevi dela algumas vezes por aqui. Ela anda muito pela cidade e poucos a notam. Perto dos 70 anos, ela é cuidadora de idosos e faxineira, mora só e resiste ao seu modo e jeito, tentando passar desapercebida diante de tantas cabeças distorcidas no mundo atual. Paro sempre para um bate papo e saber das novidades, de como tem conseguido tocar o barco adiante e ela me conta histórias duras, outras alegres, mas todas carregadas de algo bem dela, um amor pela vida e pelas escolhas que fez na vida. Ela é mais uma mulher trans, umas das poucas que conseguiu chegar até sua idade intacta, incólume e com uma bagagem de força incrível. Nesse dia dessas fotos estava perto do terminal rodoviário, primeiro parou para descansar perto do Bauruzinho, permaneceu por ali um bom tempo e depois voltou a caminhar. Faz muito isso, me diz ser melhor do que ficar em casa, trancada e olhando para as paredes. Ela sai, circula pela cidade, na maioria dos lugares a pé, vida regrada, com poucos amigos, mas fiéis, como certa feita me relatou. Ela me comove, me chama a atenção pela solidão com que a vejo pelas ruas de Bauru. Poucas vezes a vejo conversando com outras pessoas e isso me fez se aproximar e puxar conversa. Histórias como a dela, de como tiveram a coragem de dar o salto, seguir pelo caminho que sua cabeça lhe indicava é dessas para enternecer, me fazer parar o carro no meio fio e ir cumprimentar, dar um aperto de mão e querer saber se está tudo bem. Ela sempre me diz, "tudo bem" e pouco fala, mas seus olhos tem histórias que gostaria de um dia relatar, até para perpetuar algo feito com sangue, suor e lágrimas, mas também com alegria, perseverança e esperança. Todos temos muita esperança, de dias melhores, de dar a volta por cima, de vencer barreiras, de fazer sucesso, de ser vistos e principalmente de não ser desprezado. Eu, sempre que a vejo, paro e a reverencio, pois sei que por detrás do que vemos, tem alguém que batalha muito para continuar tendo a altivez demonstrada nessas fotos.
Macacos me bloguem. Aderi. Estarei juntando aqui, direto do meu mafuá particular, translucidação da minha bagunça pessoal, uma amostra de escritos variados, onde cabe de tudo (quase!) um pouco, servidas sempre, de forma desorganizada, formando um mural esclarecedor do pensamento de seu escrevinhador.
Pegue carona aqui e ao abrir a tampa do baú, constate como encaro tudo isso. Deixo cair rostos, palavras; alguma memória. O diálogo se instaura.
Abracitos do
Henrique Perazzi de Aquino - direto de Bauru S.P.
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