sábado, 26 de novembro de 2022

DICAS (226)


E ELE SE ACHAVA FAZENDEIRO*
* Meu 85º texto para o semanário DEBATE de Santa Cruz do Rio Pardo, edição nas bancas hoje:
Essa história me foi contada entre risos. Aconteceu num bar aqui de Bauru. Um amigo estava por ali e com vestimenta dando e entender ter votado em Lula. Saiu para fumar e foi seguido por alguém, este eleitor de Bolsonaro. “Eu sou Bolsonaro e você é Lula. Eu te respeito e só não admito o MST ocupar terras”, diz este ao meu amigo.

Ele, me diz ter para momento como este, já na ponta da língua uma reação recheada de ironia e maledicência. “Eu também te respeito, mas me diga, você é por acaso proprietário rural? Eu sou, tenho 35 alqueires e não vejo motivo para preocupação, pois o MST não está interessado em pequenos produtores como eu”, diz.
O cara se surpreendeu com a resposta e para tentar ao menos se igualar e não ficar por baixo dá uma carregada da resposta: “Eu tenho 100 alqueires e tenho receio”. Rindo meu amigo lhe disse: “Tenha receio não, pois juntando a minha e a sua propriedade não vai dar para abrigar quase ninguém. Eles não estão interessados em pequenas propriedades como a nossa. Durma tranquilo”.

Já enfezado a resposta foi para acirrar a discussão: “Eu sou grande proprietário, sou fazendeiro”. Mal terminou de dizer isso e recebeu a devida resposta, pois percebeu que o tal do fazendeiro estava exagerando no que dizia ser seu: “Eu além de ter essa pequena propriedade, trabalhei a vida inteira no Banco do Brasil e na área de financiamento rural. Terras como as nossas passam longe de ser consideradas fazenda, grandes propriedades. Somos pequenos proprietários”.

O dito fazendeiro se irritou e quando ouvir do oponente, que ele era aposentado do Banco do Brasil, com propriedade rural e eleitor do Lula não se segurou: “Você é do time dos parasitas”. Sem se altercar, o deixa mais nervoso com sua resposta, o comparando com proprietário sem grande expressão: “Meu caro, sou assumido pequeno e administro bem o que possuo. Arrendei 75% das terras para plantarem eucaliptos e vivo tranquilo, com ganhos consideráveis. Sem medo de ser feliz”.
Isso irrita ainda mais o sujeito, que achava iria contar vantagem, se viu encurralado e ironizado. A percepção era de que, ele devia ter na verdade, talvez uma chacrinha, quanto muito um sítio e se achava, por causa disso, fazendeiro. Não conseguiu nem explicitar o que cultivava em sua área e assim o diálogo foi minguando. Na verdade, meu amigo disse a mim que, o cara se sentiu diminuído com a constatação dele passar longe se ser o que dizia da boca pra fora.

Na sequência, diz ele, “o cara queria me agredir no meio do bar, pois não tinha mais argumentos. E eu ainda defendendo o Lula e demonstrando o que seria feito de incentivo para pequenos como nós com o novo Governo”. Devo ter sido irônico demais da conta.
Na verdade, deve ter muita gente pela aí se vangloriando de algo do qual passam ao largo. E por fim, conclui a mim: “Desmonto esses todos que chegam querendo cagar regra de que o MST seja perigoso e quando averiguo, nem terras possuem e ainda por cima se acham do agronegócio. Para cada um tenho um jeito de fazê-los cair no ridículo”. Gostei da tática e já penso em colocar em prática para tudo o mais que virá pela frente. Não adianta esbravejar, mas sim, deixá-los sem reação e com a brocha na mão.
Henrique Perazzi de Aquino, jornalista e professor de História (www.mafuadohpa.blogspot.com).

EIS A POESIA EXISTENTE NO FUTEBOL
"O gol, Richarlison, João Cabral, Pasolini neste texto lindo!

"É famoso o artigo escrito por Pasolini sobre a final da Copa de 1970 comparando o estilo de jogo do Brasil e da Itália, onde dizia que o futebol italiano - por contiguidade o futebol europeu - era prosa e o futebol brasileiro - portanto latino-americano - era poesia. Desde 82, a primeira Copa que eu acompanhei, não via uma seleção jogar com tanto gosto quanto essa.

O gol do Richarlison foi um poema de João Cabral: preciso, geométrico, sem firulas. Evoco outro italiano lembrado hoje em memes que se espalharam pela internete: Leonardo Fibonacci, o matemático que desenvolveu na idade média a sequência de cálculos que leva seu nome e ilustra essa imagem. A torção de corpo do jogador, fazendo no ar um movimento espiral para chutar a bola de voleio com força e precisão na direção da rede, sem chances para o arqueiro sérvio, pode ser comparada a uma espiral de nautilus, o desenho que representa a sequência matemática encontrada no arranjo arquitetônico de folhas, sementes, troncos, copas, flores, pétalas e outras formas encontradas na natureza.

Volto a Pasolini que cravou: "Há no futebol momentos que são exclusivamente poéticos: trata-se dos momentos de gol. Cada gol é sempre uma invenção, uma subversão do código: cada gol é fatalidade, fulguração, espanto, irreversibilidade. Precisamente como a palavra poética." O gol de Richarlison foi um espanto, uma fulguração e ainda um desagravo por tudo que ele representa como renovação do futebol brasileiro, pelo seu engajamento político e social, pelo contraponto à atitude de Neymar que prometeu dedicar o primeiro gol ao futuro ex-presidente, como resposta àquela geração de jogadores que transformavam o campo em templo religioso com suas comemorações proselitistas. O Brasil pode até não levar o título, mas esse jogo já lavou a alma e a camisa verde e amarela."
- Makeli K.

TODOS NÓS, SOMOS MUITO MAIS DO QUE UM BANDO DE FDPs
Escrito após Gilberto Gil ser chamado de Filho da Puta, no Catar, onde se encontra, inserido no contexto da Copa do Mundo. Meu dileto amigo Márcio Blanco Cava, o Márcio ABC da TV Tem escreveu e endosso integralmente:

“Filho da puta”, disse um dos agressores covardes de Gilberto Gil no Qatar. Deixemos para a Justiça botar no rabo desses vagabundos inconsequentes que, aqui e lá fora, emporcalham nossa imagem, envergonham nossa gente, diminuem nosso país. Num exercício de paciência, fiquemos por ora apenas com as palavras do agressor. Realmente, Gil, você é um grande filho da puta! Um grande filho da puta de um monstro da música, um grande filho da puta de um ícone da cultura nacional, um grande filho da puta de um homem respeitado mundialmente por sua importância para a arte, um grande filho da puta de uma voz fundamental de nossa poética musical, um grande filho da puta de um compositor que embalou e segue embalando nossos sonhos de um mundo melhor, um grande filho da puta de um intérprete que tantas vezes nos faz chorar, rir, dançar, amar, rebolar feito crianças inocentes ao som da sua voz, um grande filho da puta de um rei negro que nos leva ao êxtase, ao encanto, à consciência de uma nação filha da puta que infelizmente depende de um filho da puta qualquer para nos mostrar o quanto podemos ser filhos da puta por não sabermos ainda defender como deveríamos artistas que, como você, são maravilhosamente filhos da puta, mas de uma filhadaputice tão fodida que só nos fazem amá-los fodidamente, seu grande filho da puta de um anjo que veio para combater tanta gente estúpida!"

O ALGO MAIS: "Que justiça? A mesma que condenou o Lula? A mesma que condena jovens pobres e negros das periferias e absolve os canalhas burgueses que espoliam dinheiro público e absolve agentes do Estado que assassinam pobres nas periferias? Muita ingenuidade acreditar na justiça burguesa. A solução é a tomada do poder pelos trabalhadores", Alexandre Silvestre Casaldáliga deu a palavra final. 

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