sexta-feira, 19 de setembro de 2008

UMA ALFINETADA (38)
DESTINOS LIGADOS PELA EMOÇÃO
Na semana passada um grande amigo e jornalista dos mais conceituados morre aos 68 anos, após uma vida intensa, escrevendo com uma independência muito em falta nos dias de hoje (como é difícil escrever sem qualquer tipo de vinculação ou interesse). Fausto Wolff era seu nome. Ficou famoso nos tempos d'O Pasquim. Não tinha papas na língua e sofreu muito por causa disso. Lia sua coluna diariamente pela internet, no site do Jornal do Brasil RJ. Era o que me fazia clicar no site do jornal. Enviava emails seguidos para ele. Ele respondia alguns, outros publicava em sua coluna. Não nos conhecíamos pessoalmente, mas tínhamos algo em comum: o país precisa sair desse negócio de via única, ser mais justo e olhar mais para o social. Quem pensa dessa forma está sempre próximo um do outro.

Escrevia sempre para elogiar seus escritos. Numa das vezes, sua resposta foi de arrasar quarteirão. Ele doente, ausente por uns dias do jornal, escrevi para saber se havia melhorado. Eis sua resposta: "Obrigado pelos elogios, mas o faça também direcionado à direção do jornal, pois a coisa por aqui continua muito difícil e tenho contas a pagar". Eu me arrepio só de rever aquele momento. Vivo com a mesma angústia e estou constantemente encostado na parede, escrevendo algo que pode me custar o emprego, mas não deixando de fazê-lo. Cutucar o poder tem um preço e "eles" cobram, muitas vezes, pedindo sua cabeça. Fausto sempre desceu a lenha, mas assim como todos nós, tinha contas a pagar e devia perder o sono por causa disso. Isso dói.

Deixamos de fazer um monte de coisa da qual acreditamos, tudo para continuar apegado aos caraminguás que pagam nossas contas. Novamente fui me lembrar disso ontem, quando adentrei um bar da cidade e sou recebido por um amigo de longa data. Sei que ele anda em dificuldades e me abraçou de uma forma calorosa, daquelas suplicando para não o abandonar, ficar ali, ouví-lo e se possível, até ajudar. Eu desmorono nesses momentos. Olho para minha vida, me identifico com o que presencio diante de mim. Se ficasse ali, cairíamos os dois num pranto de dar gosto, tal a semelhança de problemas sem solução. A vida anda mais dura do que nunca e esse amigo, um excelente profissional no que faz, está num péssimo momento, com os negócios estagnados e sem encontrar uma saída. Conversar nessas horas ajuda bastante, mas também não resolve, pois de um duro para outro, as contas vão continuar descobertas.

Outro amigo do peito, alguns meses atrás caiu numa depressão de dar gosto.Deixou todos muito preocupados, quando ameaçou desistir de tudo. Foi uma junção de tudo, grana, coração, emprego, idéias... Com um desfecho tendo a depressão financeira como pano de fundo, passa-se a zanzar como barata tonta. Meus melhores amigos (e eu também) não sabemos fazer "negócio" (e nem queremos), nem ganhar grana, nosso negócio é bem outro. Queremos tocar nossas vidas, nem pensamos em ficar ricos, mas necessitamos de um mínimo, para não entrar em completa insolvência. Viver na corda bamba faz parte de uma rotina já assimilada, o difícil é quando nem um mínimo passa pelas mãos. Sempre convivi com situações de pouca grana, mas nunca com a falta total dela.Querer ajudar os outros, tomar conhecimento do sofrimento alheio e sofrer junto é algo inerente a quem pensa num mundo mais justo e sabe que ele é possível. Mas está tão difícil encontrar a solução.

Henrique Perazzi de Aquino, 48 anos lendo Machado de Assis, que já dizia há cem anos atrás: "O melhor dos bens é o que não se possuiu". Em tempo: os desenhos são do argentino Miguel Rep e foram "subtraídos" do Página 12 (um jornal que faço questão de ler quase diariamente - www.pagina12.com.ar).

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