quarta-feira, 31 de março de 2010

DROPS - HISTÓRIAS REALMENTE ACONTECIDAS (27)

GOLPE MILITAR, 31/03, CAPIM FINO E MINHA QUEIMADURA
31 de março de 1964, nesse dia teve início ao nefasto período militar no Brasil, quando tropas militares vindas de Minas Gerais adentraram o Rio de Janeiro, culminando no dia seguinte, dia 1º de abril, um fatídico Dia da Mentira, a uma das maiores farsas históricas que esse país teve notícia. Do golpe, historiadores já contaram quase tudo, pouco a acrescentar. De minha parte, sempre reafirmo que os militares foram meros instrumentos de uma elite, que não aceitava mudanças sociais no país. Fizeram o jogo sujo e com as armas nas mãos pegaram gosto pela coisa e ficaram no poder por longos anos. Da elite, a mesma de hoje, digo que a luta continua, pois o sistema de antanho é o mesmo de hoje. E enquanto esse sistema persistir, pode até não ser os militares, mas sentindo-se ameaçados, os mesmos de ontem usarão outros para fazer o serviço sujo. Disso não tenham dúvidas. Vejo também que todos nossos vizinhos estão a resolver as pendências com o período militar e nós, numa soma de cumplicidade e medo, adiamos até a própria revisão da história. Pactos com quem nos fez tanto mal, mais uma especialidade conciliatória dessa indiferente sociedade brasileira.

Do dia do início do golpe, uma história pessoal vivida por mim. Tinha quatro anos e morava com meus pais e irmãos numa casa ao lado de uma estação ferroviária, que não mais existe, a de Capim Fino, pertencente ao extinto ramal férreo da Cia Paulista Estrada de Ferro, num trecho que saia de Dois Córregos, passava por Mineiros do Tietê, depois Capim Fino e Campos Salles, quando o ramal bifurcava, tomando dois rumos (informações passadas pelo meu pai, Heleno Cardoso de Aquino, chefe da estação naquele local e ano). Vivemos ali até 1966, quando a estação e o ramal foram fechados e meu pai transferido para Mineiros do Tietê, onde nasceu meu irmão Edson. Ralph Mennucci Giesbrecht, em seu site http://www.estacoesferroviarias.com/ relata o seguinte sobre Capim Fino: “Funcionou até 1966, quando, com o fim do ramal, foi desativada. Foi demolida. Seu local até agora não foi encontrado por mim e por outros pesquisadores que o tentaram: pessoas da cidade de Mineiros do Tietê dizem que no lugar onde existiam a estação e a vila ferroviária, existe hoje uma rotatória, em terra, no meio de um canavial. Não fui até o local, onde, segundo o pessoal da cidade, não existe um tijolo sequer que lembre que um dia existiu lá um vilarejo (depoimentos de 10/10/1999). A estação ficava, ao que parece, longe do povoado do mesmo nome, mas ainda não se conseguiu ter certeza de que sua localização era onde foi apontada”. Meu pai fala até hoje sobre o triste destino do lugar onde trabalhou: “Aquilo tudo está dentro da propriedade de uma fazenda do ex-prefeito de Bauru, o Oswaldo Sbeghen. Não deve ter mais nada”. Vou confirmar isso pessoalmente com Sbeghen e como passo sempre por lá, existindo algum resquício, vou registrar o fato.

Mas o que queria contar não era isso. Dia 31/03/64, Capim Fino e algo a me marcar para sempre. Morando ali, meu pai ouvindo rádio, som alto, o golpe sempre implantado, todos com medo, algo assusta uma moça que trabalhava em casa e ela despeja pela janela uma grande panela de arroz, caindo o líquido pastoso e quente bem nas minhas costas (poderia ter sido pior, imaginem no rosto). As marcas trago até hoje, uma queimadura que me toma todo o lado direito das costas. Essa minha marca, feita a água quente, que carregarei comigo até meus últimos dias. Não me lembro quase nada daquele tempo (pudera, tinha meros 4 anos), mas tenho vagas recordações minhas daquele dia, correndo e gritando. Meu ódio do golpe não advém daí, mas posso considerar que foi reforçado. Só foram feitas “cagadas” no país em nome desse brutal movimento militar, com repercussões bem claras até nossos dias. Tudo isso, o golpe e a queimadura ocorreram num dia 31 de março, exatos 46 anos atrás.
OBS.: A famosa charge do militar empoleirado na mesa é do FORTUNA, as duas fotos de Capim Fino são do site do Ralph (os únicos registros fotográficos que conheço de fotos de lá) e a da quiemadura é gileteada da internet, sem que tenha conseguido identificar o autor. A última foto, tirada em 1964, é a única que minha mãe localizou lá da época de Capim Fino, nela, pela ordem, mana Helena (6 anos), mana Erci (2 anos) e eu (4 anos).

terça-feira, 30 de março de 2010

DIÁRIO DE CUBA (49)

PENÚLTIMO DIA NA ILHA, REFLEXÕES E UMA CERTA MELANCOLIA
No último relato, passado em 25/03/2008, uma terça-feira, reproduzi partes das conversas de despedidas que tivemos, eu e Marcos Paulo, com dois cubanos, Hilda Marin e Fábio González. Ambos nos deram muitas explicações sobre o funcionamento da máquina cubana. Falo mais dela, enfermeira aposentada, possuia uma renda de aproximadamente 600 pesos cubanos quando na ativa, valor depois reduzido, com o qual consegue viver dignamente. Quando o marido faleceu, como ela também possuia rendimentos, não recebeu nada. Se não tivesse ocupação, receberia a pensão dele. Vejo justeza nisso, pois num país onde o acúmulo de dinheiro não diz nada, não existe motivos para acúmulos de aposentadoria, sendo somente uma mais do que suficiente.

Mais detalhes que fui anotando do cotidiano cubano. O homem cubano se aposenta aos 60 anos e a mulher com 55 anos. Só o estudante uniformizado não paga as passagens de ônibus. Os idosos pagam normalmente, pois todos possuem renda suficiente para tanto. Uma de suas filhas se aposentou como arquiteta e teve a renda reduzida, como a de todos por lá. Conseguiu continuar exercendo a mesma atividade e manter o mesmo salário antigo, com algum acréscimo. Está em estudos no Congresso cubano uma ampla reforma previdenciária e o consequente aumento do salário dos aposentados. Porém, todos por lá estão mais do que cientes de que o que recebem é mais do que sificiente para levarem uma vida digna, sem faltar comida no prato e tendo quase tudo sobsidiado pelo Governo. Não existe os sobressaltos do sistema capitalista.

Após essas duas visitas, bate em nós uma tristeza muito grande, pois somente teríamos pela frente em Havana, o dia inteiro de amanhã e mais meio no dia seguinte. Fomos espiar algumas coisinhas para levar de lembrança, como um Havana Club, o rum em garrafinhas pequenas (noventa centavos de peso cada). Liagamos a TV na TeleSur e Chávez dá uma entrevista coletiva para a imprensa estrangeira, durante um almoço em Caracas, pouco antes de ambarcar para sua primeira viagem ao Brasil naquele ano. Pouco depois, dois intelectuais latinos discutem os problemas brasileiros e um deles proclama: "Os países latinos unidos são auto-suficientes em tudo, não precisam de mais ninguém, só precisam estar unidos". Como não gostar de ouvir isso?

Venta muito nesse dia em Havana e Marcos prefere não sair do hotel à noite. Eu quero, mesmo que seja para uma pequena volta na praça Copellia. Circulo pelo interior do grandalhão hotel Habana Libre e tiro fotos de cada detalhe no seu saguão principal. Para diante do cinema, bem na esquina, entre a praça e o hotel e fico bem mais que meia hora olhando para as pessoas a circularem de um lado para outro, fugindo do forte vento. Volto acabrunhado ao hotel, quando noto que os dezenove dias programados estão a se findar. Resta o dia de amanhã e nele vou conhecer os lados da estação ferroviária de Habana. Aguardem no próximo relato.
ALGO DA INTERNET (30)

REPASSANDO PARA QUEM NÃO CONHECE O “PÉ-DE-SERRA”
A operação Bandeirantes do governador José Serra
Na manifestação dos professores da rede pública estadual de São Paulo, nesta sexta-feira (26), o ditador José Serra (PSDB/SP) ordenou a Polícia a bater nos professores. Além da violência policial, relatos dão conta que o governo José Serra infiltrou agentes policiais da P2 (serviço reservado, ou seja, a polícia secreta da PM) em meio aos professores, para provocar tumulto e causar baderna, a fim de provocar antipatia popular contra o movimento pacífico e justo dos professores por um salário digno.

O Professor de Filosofia de Jundiaí, Fernando Ribeiro, presenciou quando um dos muitos policiais infiltrados pelo governo na manifestação “tentava atear fogo em um veículo, buscando incriminar os manifestantes”. Com o policial à paisana identificado, professores e estudantes saíram à caça do marginal que buscou refúgio entre os policiais militares. “Tentaram colocar fogo no carro para culpar o protesto. Como agiram com muita força, numa ação desproporcional, queriam uma justificativa”.

Outro flagrante involuntário, foi a foto da Agência Estado que correu a imprensa e a internet. A Agência Estado produziu uma "barriga" (no jargão jornalístico), ao divulgar a legenda como: manifestante carrega policial durante confronto. Depois a Polícia Militar de São Paulo emitiu uma nota.

O manifestante da foto não era manifestante. Era policial militar à paisana. O regulamento da Polícia Militar não permite aos policiais usar barba. Então o agente da foto, se estava em serviço, à paisana, só pode ser da P2, da polícia secreta, para poder usar barba. A foto abaixo, de Yuri Gonzaga, com outra visão, mostra que a policial socorrida estava separada dos manifestantes pelo cordão de isolamento policial. Não vamos ser levianos de acusar o policial a paisana da foto de estar ali fazendo qualquer arbitrariedade, até prove em contrário. Mas vamos exigir do ditador José Serra explicações sobre que história é essa de usar policiais infiltrados em movimentos sociais, em manifestações feitas às claras, em público, com data e hora marcada, e à luz da dia. Não existe qualquer atividade clandestina, nem criminosa, a ser investigada numa greve de professores por salários dignos e pela melhor educação. Existe crime no policial infiltrado que tentou incendiar um carro, se passando por professor, e foi impedido de cometer o crime pelos verdadeiros professores. Neste caso, José Serra está criando um grupo clandestino na polícia, de característica paramilitar, para fazer operações de sabotagem contra quem ele considera adversário político. A Assembléia Legislativa Paulista precisa investigar que missões são estas, destes policiais infiltrados em movimentos sociais. Triste fim de José Serra (PSDB/SP), que chega aos 68 anos de idade, corrompido pelo poder, a ponto de reeditar uma versão repaginada da Operação Bandeirantes, dentro da polícia que está hoje sobre seu comando.
Obs do HPA.: Esse texto está circulando na internet (desconheço sua autoria) e trata de um assunto dos mais sérios, o uso de policiais a paisana em operações ditas especiais (lembram-se do atentado no RioCentro?), muito em voga no período da ditadura militar. Se comprovado, seu uso nos tempos atuais é algo não só para repúdio público, mas punição. A Polícia Militar não pode e não deve ter em seus quadros efetivos, gente paga por nós, para realizar tarefas tão torpes.

segunda-feira, 29 de março de 2010

BEIRA DE ESTRADA (02)

UMA LIVRARIA NA BOLÉIA - Meu novo texto edição Revista do Caminhoneiro, março de 2010 (Tiragem de 100.000 exemplares)

O baiano José eu conheci num restaurante, num posto, beira de estrada, estado do Rio, lá pelos lados da região dos Lagos, pouco depois de Rio das Ostras. Já se vão uns seis anos e dele gostaria de ter notícias. Foi inusitado o encontro, estava com muita fome, vinha do Rio sem qualquer parada e ali aportei devido a uma placa, com dizeres mais ou menos assim: “Comida Caseira – Preço Camarada - Confiram”.


Foi o que fiz. Adentro o cheiroso estabelecimento e dou de cara com uma cena a me encher os olhos de contentamento. Esqueci até da fome, a me roer as entranhas. Numa mesa, já quase no final de sua refeição, o tal baiano, rodeado de livros, espalhados em cima de sua mesa. Isso mesmo, comia e tinha ao seu lado, como companheiros na empreitada, uns vinte livros, alguns empilhados e outros abertos. Não havia como não notar o que ali se passava, pois ele dava garfadas em sua comida e virava páginas de livros, quase que instantaneamente. Lia com uma régua a lhe marcar a linha da leitura. Uma mão no garfo e outra na régua, os olhos em ambas as coisas.


Chamava a atenção de muitos. Fiz meu prato e escolhi sentar ao seu lado. De imediato percebendo minha inquietação, tanto que nem bem esperou estar sentado para perguntar:

- Gosta de ler?


Foi o bastante para iniciarmos uma animada confabulação. Eu tinha pressa, ele mais ainda, pois depois vim a saber, caminhoneiro, sua carga ainda estava sob o bruto. Seu depoimento foi algo marcante, nunca antes visto nas minhas andanças. Já havia presenciado caminhoneiros que gostavam de andar com um livrinho enfiado debaixo dos braços, mas esse passou dos limites, pela quantidade e exposição de suas preferências.

- Sou baiano e peguei gosto pela leitura desde meus tempos de moleque. Meu pai trabalhava na Prefeitura e mesmo não sabendo ler trazia livros para casa. Pedia conselhos para a moça da biblioteca e ela indicava os clássicos. Li todos ao longo de minha vida. Não parei mais. Virei caminhoneiro e não conseguindo viajar sem ter livros na boléia, sempre trouxe alguns na mala. As viagens tornaram-se mais longas e tinha sempre que trazer cada vez mais livros. Daí tive a idéia de trazer comigo muitos dos que já tinha lido e ir trocando. No começo foi difícil, tinha que parar nas cidades e descobrir quem poderia ir trocando comigo, mas hoje, muitos já me conhecem e troco por tudo quanto é lugar. Você nem imagina como tem caminhoneiro que gosta de uma boa leitura?


Não parou mais de falar. Foi pouco menos de uma hora de pouca argumentação, pois, sempre à procura de novos interlocutores, descobrindo-me interessado, fiquei sabendo de toda sua história, nos mínimos detalhes. Muito rica e sempre recheada de livros, muitos livros. Se hoje me perguntarem o que ele transportava não sei, mas alguns dos títulos ainda me recordo. Tinha, entre outros, um “Tocaia Grande”, do Jorge Amado, “Roleta Chilena”, do Alfredo Sirkis, “Cartas da Mãe”, do Henfil e “Triste Fim de Policarpo Quaresma”, do Lima Barreto. Desse, me contou a história toda, ali em poucos minutos. “Me identifico com o funcionário público, o Policarpo, pois tenho muito dele dentro de mim, sou um brigador, como ele”, me disse.


Na saída ajudei-o a levar os livros até seu caminhão e como sempre carrego também alguns, efetuamos nossas trocas. Fico com um dele, o “Quem matou Palomino Molero?”, do Mario Vargas Llosa por um que não queria me desfazer, mas foi inevitável, o “Um diário do Ano da Peste”, do Daniel Defoe. Cheguei a pedir uma dedicatória, mas fui desaconselhado: “Prefiro não, pois dificulta mais as trocas. Se cada um for escrever nos livros, em pouco tempo não sobrará mais espaço vazio”. Tentei argumentar, mas o homem foi irredutível.

Mal deu tempo de me despedir, pois outro vinha até ele com um livro nas mãos. Anotei seu endereço, um telefone residencial, que se perdeu ao longo do tempo. Nunca mais o vi, nem dele tive notícia. Continuo com meu hábito de nunca viajar desacompanhado, sempre tendo livros como companhia e dessa forma, nunca me senti só. Pouco voltei para os lados onde o encontrei, mas dele trago boas recordações e toda vez que vejo algum caminhoneiro com um livro debaixo do braço, bate aquela saudade do seu José, um baiano que fez disso sua maior distração e alegria na vida. Por onde andará o livreiro das estradas?


HPA, 49 anos, professor de História, caixeiro-viajante e contador de histórias (e de estórias).

domingo, 28 de março de 2010

UMA DICA (55)

DOIS FÓRUNS, O URBANO MUNDIAL E O SOCIAL URBANO, RIO EM 24/03
À trabalho no Rio de Janeiro é inevitável presenciar o que acontece pela cidade e estar por lá e não ir aos dois Fóruns, ambos ocorrendo simultaneamente na sua quase revitalizada zona portuária é coisa que pode passar batido para muitos, não para mim. No dia 24/03, quarta, corri com meu trabalho e fui presenciar o que rolava em ambos. Quem primeiro me deu o toque, foi o amigo Latuff, que no dia anterior já havia me dito da importância de lá estar. Fui e fiquei o dia todo, até não mais poder e os pés doerem pelo cansaço e as mãos pelo peso dos papéis que fui juntando. Primeiro a ansiedade por vivenciar algo único, a possibilidade de estar ao lado de gente do mundo todo, numa babilônia de difícil repetição. Tentei me comunicar da melhor forma possível, em português ou no espanhol macarrônico (farei um curso ainda este ano), pois meu inglês é quase nulo. Perdi muita coisa por causa disso e me redimo, mea culpa, pois oportunidades houveram e sempre as desperdicei. Depois, pela possibilidade de vivenciar problemas urbanos nacionais, todos discutidos à luz do mesmo pensamento e entendimento que o meu.

Primeiro, é claro, o 5º Fórum Urbano Mundial, que esse ano ocorreu no Rio, no período de 22 a 26 de março. Para lá foram atraídos mais de 16 mil inscritos e um outro tanto de gente que fez inscrição na hora. O tema foi “O direito à cidade: unindo o urbano dividido”. Já de cara algo que me tocou, quando num folheto li que “o propósito de fechar as lacunas existentes em muitas áreas da vida cotidiana das cidades, como o abismo entre ricos e pobres, entre governos e autoridades municipais e entre governo, autoridades municipais e entre governo, autoridades locais e legislação, no que concerne às questões de gênero e juventude”. As cidades crescem, geram riquezas e isso gera cada vez mais, resíduos e poluição, em outras, estagnação, decadência urbana e aumenta da exclusão e intolerância social. Discutir isso e propor soluções é tudo de bom. Sei que o “oba-oba” nesses locais são mais do que inevitáveis, sendo o mais importante extrair o máximo de situações que vão se criando nos contatos feitos. Logo de cara, um grande burburinho pelos corredores, pois presencio a diretora-executiva da ONU-HABITAT, Anna Tibaijuka e o ministro do Interior brasileiro, Márcio Fortes percorrendo os estandes. Ouço uma parte dos discursos, mas o que me detém mesmo é a presença de gente do mundo todo. Vou andando e conversando com vários, desde franceses, africanos das mais variadas nacionalidades, afegãos, l atinos mil e gente de rincões nunca imaginados, como Arábia, Madagascar, Kwait, Paquistão e tantos outros. Fujos dos estandes onde visualizo aquelas obras feitas com o claro intuito de benefício político. Os EUA, Israel, alguns países europeus e até latinos tentam nos fazer engolir gato por lebre. Não caio mais no conto do vigário, pois sei que na maioria das vezes, onde existem entidades arrecadatórias mundiais, sem controle, muito se mostra de realizado, mas pouco deve ser o realmente feito. Vou juntando folhetos e CDs de todos e irei lendo aos poucos, separando o verdadeiro joio do trigo. Espio palestras e conferências, sem me ater a nenhuma em específico. Trago muitos (mas muitos mesmo), folhetos de variadas experiências mundo afora, que irei selhecionando e distribuindo para os que acredito, possam fazer deles uma melhor utilização que a minha. Pude presenciar a divulgação de muita coisa boa sendo feita e poder compartilhar disso será gratificante. A não compreensão do homem convivendo pacificamente dentro de um moderno condomínio fechado, tendo ao lado de fora do muro uma favela é o que move em busca das soluções. Para mim, elas não existem dentro do capitalismo, pois ele favorece e incentiva cada vez mais a divisão de classes e a exclusão social. Porém, buscar soluções vindas de outros rincões é algo que não pode ser desperdiçado. Sai de lá com um grande nó na cabeça e buscando algo de concreto nas coisas que irei lendo e folheando nos próximos dias

Atravesso a avenida Rodrigues Alves, com seus barracões portuários em transformação, ando mais um pouco e adentro a avenida Barão de Tefé, na Saúde, onde encontro um imenso barracão a abrigar o Centro Cultural de Ação à Cidadania (a entidade que leva a cara do Betinho). Ali esteve abrigado a versão tupiniquim, ouseja, o Fórum Social Urbano, também conhecido por lá como dos Movimentos Sociais. No título do mesmo, “Nos bairros e no mundo, em luta pelo direito à cidade, pela democracia e justiça urbanas”, meu interesse cresce. Buscava isso mesmo, um espaço popular de debate sobre as cidades e estava diante de uma concreta versão, bem diante de outra, a promovida pela ONU. Não vi no outro a possibilidade da participação dos setores mais populares da população e aqui todos representados. Pronto, estava em casa. Circulei por todo seu espaço, até com mais desenvoltura que no outro, cheio de pompa. Tudo aqui mais simples, desde o crachá e o credenciamento. Senti pelas conversas, todas travadas em português, que ali ocorria uma rica troca de experiências e até o “fortalecimento das articulações entre coletivos de movimentos sociais e organizações que discutem a cidade e lutam por uma sociedade igualitária no mundo inteiro”. Os debates estavam divididos em quatro eixos temáticos: Criminalização da pobreza e violências urbanas; Megaeventos e globalização das cidades; Conflitos socioambientais na cidade e justiça ambiental e Grandes projetos urbanos e lutas em áreas centrais e portuárias. Chego no momento em que no palco principal acontecia um debate sobre a falta de participação popular nas decisões sobre os investimentos bilionários em grande projetos de marketing urbano, citando como exemplo prático o do Pan no Rio. Essa questão esteve no coração do projeto "Cidades para as pessoas, não para o lucro", do qual consegui aproveitar boa parte. Depois fui circular pelo espaço, indo até a área de alimentação, com barracas simples cedidas a entidades de lutas dos direitos, principalmente da Baixada carioca. Em cada banca, um militante pronto a conversar e expor um ponto de vista sobre o momento. Na de camisetas, um ativista a vender as mesmas; na de filmes, todos de temática social, na de roupas e artesanato, um cadinho de várias experiências concretas junto a comunidades pobres e na do SindPetro, a eterna luta do “Petróleo tem que ser nosso”. E a cada dia, tudo encerrado com shows populares e a reunião de todos os presentes, numa confraternização de valores e interesses em comum. Arrastando duas bolsas (a de trabalho e a com folhetos do evento - essa muito mais pesada), fiquei até quando deu e pude aguentar. Material para debate e aprofundamento teórico trouxe bastante. Espero ter tempo para fazê-lo, como tento nesse momento, num final de tarde dominical com muita chuva caindo lá fora.

OBS.: Nas fotos, todas minhas, as do lado esquerdo, do Fórum Social Urbano e do lado direito, do Fórum Urbano Mundial

sábado, 27 de março de 2010

MEUS TEXTOS NO JORNAL BOM DIA (65 e 66)

JUNIOR - publicado na edição de hoje do diário BOM DIA de Bauru, 27/03

Saio sempre que posso para uma comidinha fora de casa. Nesses momentos não gosto muito das inovações. Sou mais pelo tradicional, ou seja, uma receita que tem dado certo por tantos anos não precisa necessariamente ser alterada. Freqüento alguns lugares cujos proprietários abriram a casa e ali criaram receitas perfeitas, quase definitivas. Algo supimpa. Quem conhece um pouco de cozinha sabe muito bem o que quero dizer. Ia a uma pizzaria desde meus tempos de calça curta e a impecável receita sempre servida no ponto, respeitada. Esse o grande motivo de voltar ali. Porém, nem tudo transcorre da mesma forma do outro lado do balcão. O patriarca, o fundador da casa e criador da receita fica velho e uma hora precisa pendurar as chuteiras. Eis que passa o negócio para o filho, o Jr e esse não satisfeito com o andamento do negócio, o mesmo que até então havia dado muito certo, muda tudo. O Jr tem diploma, é Phd numas coisas novas, cheio de invencionices e maldizendo o convencional. Chega e já quer colocar chocolate na pizza, enche as bordas com recheio agridoce e mistura sabores. Se o deixarem muda até o formato e a coloração da massa da pizza. Diz que assim está inovando, atendendo expectativas e com amplas possibilidades de crescer. Presencio algo assim e até o atendimento muda, algo mais engalanado. Perto dos 50, não tolero mais certas coisas e com toda fleuma que me é peculiar, mal fui servido, pago a conta, deixo tudo ali no prato e apenas digo: “Tchau, fui!”. Tem Jr que é uma praga.


‘VEJA’ - texto publicado na edição do jornal diário BOM DIA, 20/03

Mensagem eletrônica enviada por um conhecido me induz a acreditar em algo abominável, um atentado para quem preza pela verdade factual dos fatos. Confira: “A Revista Veja é uma das mais sérias revistas do país, cuja qualidade equipara-se aos mais importantes órgãos de mídia do planeta”. Não passo daí, pois ele é muito mal informado e recebe informação por fonte nada confiável. Ou talvez siga a linha editorial da mais nefasta publicação da imprensa brasileira. E aceite cegamente e diga amém em relação a aquilo que lê, sem qualquer tipo de contestação e preocupação com a veracidade com os fatos. Até as pedras do reino mineral sabem que a revista Veja move-se por uma moral e indignação seletiva. É a maior inventora de adjetivos do planeta. Para qualquer crítica ou denúncia, o mínimo recomendável é que se tenha base, sustentação e eles aboliram isso. Agem como se o fizessem na defesa da moral e do país, mas com a ponta do rabo mais do que exposto. Querem um exemplo. Foram falar de Che Guevara e não tendo como criticá-lo, alegaram que tinha mau hálito, não tomava banho, fedia e falava palavrão. Para a Veja o MST é um bando, o Daniel Dantas é um anjo e só o PT é corrupto. Essa é a linha da publicação que atenta contra qualquer recomendação desses manuais de bom uso do jornalismo. “Puro desespero de causa, não servem nem para embrulhar peixe”, diria Turco Fala Mansa, com o sarcasmo que lhe é característico, na mesa do bar que freqüento lá na vila Cardia. Rindo muito, concordo e deleto o tal e-mail.

sexta-feira, 26 de março de 2010

UMA CARTA (45)

NOTÍCIAS E MANCHETES DOS JORNAIS BAURUENSES NOS ÚLTIMOS DIAS
Viajo por cinco dias e ao voltar quero comentar algumas coisas:
1- “Pedágio agora é cobrado em ambos os sentidos”, é a manchete. O que mais vejo nas estradas paulistas são as praças de pedágio, viçosas e altaneiras, parece que regadas com farta água, tal o esmero em funcionar e florecer. A indignação vem do fato de que onde havia uma praça de pedágio num só sentido, obras rápidas e rasteiras estão em fase conclusiva para a terem em ambos. Cobra-se na ida e na volta. Estamos num mato sem cachorro e numa delas li uma clara advertência: “Desviar de pedágio é crime: Ande dentro da lei”. Credite tudo isso a esse magnânimo governo estadual e suas obras, sempre voltadas ao interesse popular.

2- Teatro Municipal praticamente paralisado, tudo às moscas. Havia captado uma mensagem de que isso ocorreria porque havia um trabalho direcionado e de incentivo às ações nos bairros, diversificação cultural na acepção da palavra. Achei ótimo e aguardei. Hoje a resposta ao abrir os jornais, na Coluna do Rufino, a inauguração do “Projeto Som na Rua”, com a participação de três bandas e para não se esquecer de levar um quilo de alimento não perecível aos carentes. Estava todo pimpão, quando fui ler com mais atenção e constatei tratar-se de ação cultural na vizinha cidade de DUARTINA. Tudo volta à estaca zero, pois o nosso teatro continua fechado e a periferia sem nada. Dá para entender uma coisa dessas? Nem aqui, nem lá, nem em lugar nenhum. Já em Duartina...

3- Vejo que o tal do Grupo Pró-Bauru está voltando a funcionar e propondo ações voltadas para “conscientizar a população para a importância do voto”. Li até o fim e fui em busca do nome das entidades participantes e já fiquei preocupado logo de cara: cadê as entidades ligadas aos movimentos populares? Nenhuma, só representantes dos mais abastados (sob comando da CIESP). Daí, tiro minhas conclusões: o tal grupo defende os interesses desses e a grande massa que forme um outro grupo para lhe defender e conscientizar, se assim achar conveniente. Que isso fique bem claro, pois as evidências não mentem, jamais. Interesse popular de massa é coisa bem distante do que luta e almeja todos os integrantes do tal Grupo. E se “eles” estão se organizando, buscando ter seus representantes no próximo pleito, que o mesmo ocorra, com o mesmo espaço midiático para a grande massa trabalhadora e periférica. Uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa. Cada um na sua trincheira e não venham tentar me convencer do contrário.

4- Por fim, algo a merecer efusivos aplausos: o prefeito Rodrigo consegue desembaralhar os meandros burocráticos da questão da compra da Estação da NOB e efetiva o negócio. Ponto mais do que positivo. Além de comportar a Câmara Municipal e Secretarias Municipais, algo a chamar a atenção, o uso para atividades culturais (além de muito trem nela - estação sem trem não é estação). A primeira será na virada Cultural (sempre utilizada em todas versões anteriores) e para ações futuras concretas. Por enquanto, a euforia e passado esse momento, despontará o acompanhamento da implantação das ações propostas. Esse será um papel que todos os envolvidos precisarão ter com o maior critério.

5- E a Greve dos Professores da Rede Pública paulista, comandada pela combativa Apeoesp? Precisamos falar disso, muito, bater na tecla da insensibilidade patronal (de quem mesmo?). Não me esqueci disso, não! Falo aqui nos próximos dias...

OBS.: Todas as fotos postadas aqui são minhas e foram tiradas na Virada Cultural de 2008, no evento dentro da Estação da NOB, inclusive com a presença do então vereador, hoje prefeito, Rodrigo Agostinho. E nesse momento ele anuncia, não só a compra da estação, mas a volta dos eventos por lá. Ele sabe que lá tudo dá muito certo. Viram uma Câmera na 1ª foto? A Lygia M. Cintra, unespiana e acreana filmou tudo e possui um vídeo valoroso sobre tudo o que foi feito naquele ano. Na última foto, eu e Tatiana Calmon (junto de uma amiga dela). Ela, esposa do maior incentivador da venda da estação para a Prefeitura, o sindicalista e vereador, meu amigo, Roque Ferreira.

quinta-feira, 25 de março de 2010

UM COMENTÁRIO QUALQUER (63)

OS BOUQUINISTES DE PARIS E A LIVRARIA/SEBO NO RIO
Essa é para quem adora devorar livros e não se cansa de ficar entre eles nos sebos espalhados país afora. Nas idas ao Rio de Janeiro tenho o meu local, um que bato cartão, esqueço do tempo (e até de que devo e preciso trabalhar). Na última terça, 23/03, voltei ao LE BOUQUINISTE LIVRARIA, na rua Visconde do Rio Branco 28, encravado pouco acima da Praça Tiradentes, a caminho do Campo de Santana e na boca do Saara. Dessa vez fui em busca de CDs de MPB para minha coleção. Tinha pouco tempo e fuçando entre as prateleiras, achei quatro preciosidades, pagando por tudo a bagatela de R$ 10 reais. Só não vasculhei prateleira por prateleira em busca de livros e achados outros, pois tinha visitas de vendas marcadas. Contas a pagar me puxavam para o lado oposto.

No blog http://www.viverparis.blogspot.com/ achei um texto interessante sobre os precursores do termo “bouquiniste”. São relatos de um brasileiro vivendo em Paris. Leiam: “Instalados na margem direita, da pont Marie ao quai du Louvre, e na margem esquerda, do quai de la Tournelle ao quai Malaquais, os bouquinistes de Paris são verdadeiros símbolos culturais da cidade. Com suas características caixas metálicas verdes se debruçando para o rio, propõem a venda de livros antigos, revistas de segunda mão, cartões postais, selos antigos, velhos cartazes publicitários, fotos e até raríssimas historias em quadrinhos. Livreiros de ofício, apaixonados pela propagação cultural, seus pequenos stands são testemunhas oculares da historia de Paris. A tradição dos bouquinistes começou por volta do século XVI, quando pequenos livreiros ambulantes começaram a surgir em Paris. Por pressão das grandes livrarias, um regulamento de 1649 proibiu qualquer tipo de “livraria portátil” e a venda de livros sobre a Pont Neuf - o principal ponto onde os livreiros ambulantes se concentravam. Em 1859, concessões bem regulamentadas são instauradas na cidade de Paris e os bouquinistes podem então se estabelecer em pontos fixos às margens do Sena. Em 1930 são fixadas as normas de padronização e dimensionamento das boîtes - as famosas caixas verdes dos bouquinistes. Instalados sobre mais de três quilômetros ao longo do rio Sena, os bouquinistes parisienses foram declarados em 1992 patrimônio cultural mundial da UNESCO” (09/01/2009 – escrito por Jackson Martins). O pessoal de Paris também possuem um site, em francês é claro: http://www.bouquinistedeparis.com/

A história dos bouquinistes parisienses é de encantar os olhos e ver aquelas fotos antigas, todos às margens do Sena sempre me chamaram muito a atenção. É claro que o nome da livraria carioca foi extraído dali e pedi para Milena, uma quase menina, a filha do livreiro Gama, para bater umas fotos ali dentro. Gama é conhecido de todos os amantes de livros e está com o ponto há exatos quinze anos. Seu espaço é peculiar, uma loja com uns 5 metros no máximo de largura e uma infinidade de profundidade. Quer dizer, você chega, visualiza dois corredores e uma prateleira no meio. Segue vendo livros por todos os lados e poros. Num corredor você vai, noutro volta e com livros do teto até o chão. O prédio é antigo e tudo se encaixa, principalmente ao nome onde Gama foi buscar inspiração para o do seu negócio. Tudo está catalogado e não é difícil buscar o que se deseja. É necessário tempo, muito tempo. Sebo é como bater papo com pessoa idosa, tudo não pode e não deve ser feito às pressas. Tanto um como o outro necessita de tempo, um para contar todas as histórias que estão guardadas em sua memória e outro para ver desvendados todas as preciosidades de suas estantes, cantinho por cantinho. E quando existe isso, perco a noção de tudo o mais. A livraria lá do Rio me deixa assim, prostrado diante de suas estantes, como tenho certeza, ficaria diante daquele amontoado de preciosidades às margens do Sena.
OBS. 1: As duas primeras fotos foram retiradas do blog Viver Paris e as demais são minhas, tiradas no sebo carioca.
OBS. 2: Nos próximos posts, os dois textos que havia me comprometido, um sobre o encontro da prostituta Gabriela e do chargista Latuff e os relatos do 5º Fórum Urbano Mundial e o Fórum Social Urbano, patrocinado pelos movimentos sociais.