COMENTÁRIO QUALQUER (191)

MAFUANDO NOVAMENTE NA ALDEIA BAURUENSE
1.) QUANDO A BOLHA ESTOURA

Milhares de famílias vivem hoje sob o fio da navalha, segurando o que lhes resta de dignidade pelas pontas, quase se soltando, pois com o aumento das dificuldades, quase adentrando a um novo mundo, sem lar, sem um porto seguro para chamar de seu e assim conseguir se abrigar da intempéries todas. Quando essa bolha estoura, o começo de uma nova vida, sem um lar, vivendo nas ruas e com as perspectivas todas reduzidas. O aumento dessa situação dentro do mundo proporcionado pelo neoliberalismo é uma das maiores crueldades sendo colocadas em prática hoje, sem dó e piedade pelos atuais governantes, uns mais preocupados com as leis de mercado, com os negócios do que com o ser humano.

Miguel Repiso retrata hoje na tira do Página 12 o estouro dessa bolha e na de um mês atrás, o que é o viver nas ruas, o novo lar dentro dos lixões das esquinas das ruas argentinas. Isso me dói profundamente e esse o maior motivador de me opor com unhas e dentes a tudo o que tenha por detrás de si algum resquício de neoliberalismo. Não existe nenhuma possibilidade de dignidade humana dentro desse tipo de regime, pois ele é em todos os seus atos excludente e discriminatório. Rejeito quem tece qualquer elogio ao neoliberalismo, essa vertente cruel e insana do capitalismo predatório, doente e insensível.

2.) A SIRENE DA PADARIA A CADA NOVA FORNADA DE PÃES

Ouvi essa ontem e confesso, esses relatos me arrebatam. Sei estar diante de um momento muito triste na história deste país, dominado pelos piores, algo pelo qual devemos resistir com unhas e dentes, mas assim mesmo, em alguns momentos me ponho a ainda buscar tempo para outras reflexões. Uma amiga me encontrou casualmente na rua ontem e nem sei como desembocamos nesse assunto, o dela um dia lá pelos lados do Geisel, quando ouve uma sirene se espalhando pelo bairro. Fica sem saber, olha para os lados, não sabe se era alerta para algo. Foi quando pede informação e lhe dizem ser o aviso de uma padaria local. Eles a cada nova fornada de pães acionam o botão da sirene, som invadindo o bairro e desta forma e jeito, todos por lá estão avisados: Saiu nova fornada de quentinhos pães. Virou algo usual no bairro e ao ouvirem a sirene todos para a padaria. Muito singelo...

3.) QUEM POSSUI TATUAGEM DE LIVROS NO CORPO SÓ PODE SER GENTE BOA – LAYS TEM DUAS
Eu vou conhecendo as pessoas nas trombadas pelas andanças pela aí. Vou sempre nas agências dos Correios em busca do atendimento para envio do meu material de trabalho, conheço muitos dos seus funcionários, altos papos. O pessoal mais antigo da agência central eu os tenho na maior estima. Padecem muito com as transformações da empresa, nessa tentativa de privatização da empresa, que até bem pouco tempo era uma preciosidade, joia da Coroa, hoje não mais. Alguns antes da eleição defendiam o novo como ousado, hoje ninguém mais ousa seguir apoiando quem os irá destruir. O caso Correios uma coisa, as pessoas que lá atuam bem outra. Pois bem, chego para o atendimento hoje e me deparo com a atendente tendo no braço uma tatuagem de livro. Parei, olhei, observei melhor e comentei: “Quem tem uma tatuagem de livros no braço só pode ser gente muito boa”. Ela sorriu e o texto a seguir surgiu do que já descobri dela.

LAYS ORDANI tem 29 anos e 8 anos de Correios. Casada, mora no Jardim Marilu, não tem filhos, mas por outro lado tem 3 gatos, desses do tipo que fazem de tudo e mais um pouco dentro de uma residência. Ela convive muito bem com os danadinhos e tira tudo de letra, por um simples e ótimo motivo, ela adora ler, livros de toda espécie e natureza. Nos dois braços tatuagens tendo o livro como pano de fundo, num um ex-libris e noutro uma citação do Pequeno Príncipe. Impossível não chamar a atenção, ainda mais num país onde a maioria, infelizmente, lê muito menos do que deveria e assim sendo, lendo menos, é mais facilmente enganada. Diz ler desde quando se conhece por gente e a mais remota lembrança do gosto e preferência pelos livros vem dos pedidos que fazia ao pai, desde a mais tenra idade, para esse ler gibis pra ela. Não parou mais e mais que isso, o gosto não terá mais fim enquanto viver. Comento com ela disso de ler em filas e sobre um site argentino só com fotos de gente lendo nas ruas, metrôs, filas, etc. Ela me cita outro, o Instagram “Vi você lendo”, só de fotos de paulistanos pegos com a mão na massa, ou seja, com leituras variadas e múltiplas nas mãos. Ali mesmo detrás do balcão de atendimento, ela conta que a tatuagem mais aproxima que afasta e sempre surgem pessoas iniciando uma boa conversa, como o fiz, exatamente por visualizarem livros gravados em seus braços. Lays, assim como eu, não sai de casa sem carregar um na algibeira, no seu caso, na bolsa, pronto para ser acionado em caso de qualquer lugar onde tenha que esperar por meros minutos. O livro salva qualquer um do tédio, da insônia, do estado depressivo e da falta de assunto, pois quem lê sempre tem vários na ponta da língua. Pois bem, conheci Lays hoje e já escrevo dela, mais uma com um divinal vício, o da leitura.

4.) HPA VOLTANDO AO MAFUÁ E SENDO RECEPCIONADO PELO SEU AMIGO CHARLES
Ele estava incontrolável e me emocionou ontem no retorno, após dez dias longe de casa. Na chegada ao me ver, disparou para o portão, ficou dando voltas, latindo de alegria e ao adentrar a casa, me cheirava tanto, insistentemente, algo irresistível. Ainda tinha comigo o cheiro da estrada, dos percursos todos dos últimos dias. Nos abraçamos cordialmente e intensamente. Meu guardião, meu baita amigo Charles é mesmo para vergar esse velho e cansado lobo das estepes. Me derreto todo diante de tanta formosura. Cães são arrebatadores e só quem os tem sabe o que é essa proximidade, esse elo praticamente inquebrantável.