MEMÓRIA ORAL (85)UM AVATAR DO ALVORADA EM BAURU
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A exposição patrocinada pela Prefeitura de São Paulo,
"Puras Misturas", acontece na capital paulista num imenso prédio dentro do Parque do Ibirapuera. Ali estão expostos ricas coleções, valorizando expressões artísticas e culturais de nosso povo. Uma riqueza popular reunida de forma única. Algo me chama a atenção, a "Avatares do
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Alvorada", que justamente neste mês, quando a cidade de Brasília completa 50 anos, mostra em variados lugares espalhados pelo país, como foram reproduzidos as famosas colunas do Palácio do Alvorada. Desde fachadas de casas, edifícios, esculturas em jardins e reproduções variadas em pinturas. No texto exposto na parede, algo elucidativo:
"Da prancheta de Oscar Niemeyer, as colunas do Palácio do Alvorada botaram o pé na estrada. Replicam-se em inusitadas aventuras visuais. É o candango que
sobrevive, com sua participação na utopia do país".O interesse possui um motivo bem bauruense. Conheço um avatar das famosas colunas encravado num dos bairros mais populares de Bauru, o Bela Vista. Desde criança aquela casa localizada a cem metros da Praça dos Expedicionários, quase ao lado onde antes estava localizada a PRG8 e hoje, a sede da TV Tem, chamou minha atenção, pois as famosas colunas da capital da República estão ali retratadas. E ontem, 21 de abril de 2010, a capital do país completou 50
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anos. Muito se falou dela, shows ocorreram e toda a obra do famoso e centenário arquiteto esteve novamente em evidêndia. E aqui por Bauru, nada sobre a casa com as tais colunas.
Hoje, por volta das 9h bato palmas diante da mesma, localizada no cruzamento das ruas Horácio Alves Cunha e Padre Nóbrega e quem me atende pela janela é
Sandra Mara Rosa, 51 anos, moradora atual e filha do construtor da casa,
Reynaldo Rubens Rosa, falecido em 2006. Quando fica ciente dos motivos que lá estou abre um sorriso e me permite fazer fotos. Confirma que seu pai inspirou-se nas
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famosas colunas e que a casa foi inteira levantada sózinho por ele, numa área ainda não totalmente preenchida de residências, demorando aproximadamente uns quatro anos para ser concluída. "Meu pai trabalhou como construtor a vida inteira. Ninguém o conhecia pelo nome, mas pelo apelido, seu Pininho. Eu acompanhei toda sua construção, tenho algumas lembranças e uma foto da família toda diante da casa já pronta, quanto tinha por volta de uns seis anos",
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conta.
Uma história puxa outra e Sandra lembra outra: "Lembro que quando ele acabou tudo, passou uma pessoa e disse que aquilo lembrava uma imagem de Nossa Senhora Aparecida. Meu pai derrubou tudo, pois ele queria que tivesse a cara da nova capital do país. Fez tudo novamente, até ficar com a cara que queria". E não existe como não fazer a comparação, pois tudo é muito parecido. Certeza mesmo de datas ela me pede
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para voltar no final do dia, quando chamaria seu outro irmão
Sérgio Richard Rosa, 50 anos, para contar algo a mais sobre a construção, pois ele quando menino, ficava ao lado do pai enquanto ele levantou a casa. Volto e ambos estão a me esperar. Sérgio tinha quatro anos e diz ter até ajudado seu pai a fazer massa para levantar as paredes, no que Sandra afirma não ser lá muita verdade, mas que estava presente observando tudo, isso é mais pura verdade.
"Eu vi tudo isso ser levantado, ele fez tudo sózinho, eu era muito
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pequeno, mas dei minha contribuição. Deve ter demorado uns quatro anos para levantar tudo e ficar pronta. Essa é a casa da família e isso que ele fez é motivo de muito orgulho para todos nós. Ele desenhou e fez tudo com bastante simetria, pois trabalhava com construção, era sua especialidade e aqui caprichou mais. Não usou forma nenhuma, tudo foi feito em pequenos tijolinhos e cacos. Deu uma trabalheira danada", relata.
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Nisso quem aparece é a matriarca da família, dona
Eva V.S. Rosa, 73 anos e de sua memória novas histórias: "Demorou bastante para fazer a casa inteira, mas essa parte foi a que mais deu trabalho. Ele trabalhava fora e vinha fazer a nossa depois do seu expediente. Imagina como era, fazia até durante a noite. De uma coisa eu tenho certeza, a nossa casa ficou pronta antes da própria cidade de Brasília".
Enéas, esposo da Sandra reune fotos da
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família no computador, me envia por e-mail e a principal delas é a do seu Pininho. Dona Eva me diz que ali defronte a casa, todo final de tarde ficavam reunidos uma grande quantidade de trabalhores, todos sentados do outro lado da rua a observar seu marido levantar as colunas. Dela sai a informação mais preciosa, a de onde ele copiou para levantar as colunas. "Um dia ele trouxe para casa uma revista, acho que a Manchete, com uma reportagem sobre Brasília e disse que faria nossa casa com a frente igual aquelas da nova capital. Recortou a foto e copiou tudo dela. Fez vários desenhos olhando somente
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para essa fotografia. Lindo, não? ". Ficou lindo mesmo e isso lá se vão bem uns quarenta e tantos anos. A casa resiste ao tempo e é o orgulho da família.
Antes de me despedir, Richard me puxa pelo braço e pede para não esquecer de algo: "Pedi ao vereador Roque Ferreira, meu amigo, para que tente transformar o nome do meu pai em uma nova rua de Bauru. Ele fez casas pela cidade inteira e só por essa obra de arte
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aqui, merece não?". Merece sim, Roque deve se empenhar nisso e esse rico patrimônio da família é cuidado por todos. Tudo está intacto, a área do mesmo jeito que foi projetada pela cabeça do seu criador. Saio de lá pensando na exposição Puras Misturas, nesse perfeito Avatar do Alvorada e em outra coisa a lembrar da capital aqui pela região. Um pequeno distrito, em Piratininga, na estrada para Santa Cruz do Rio Pardo, denominado "Brasília Paulista". Desse nada sei, nunca estive lá, mas isso já é outra história.
OBS.: Para ver as fotos grandonas, clique em cima delas.