domingo, 31 de dezembro de 2017

BEIRA DE ESTRADA (87)


NICANOR VENDE O EXCEDENTE DE SUA PRODUÇÃO NAS RUAS DE BAURU

Das trombadas da vida a gente vai conhecendo pessoas das mais interessantes. Isso acontece comigo a todo instante e das mais diferentes formas e maneiras. Na última sexta, fui buscar a mana Helena, ali num brechó do lado do Sebo Literário, rua Antonio Alves, entre a rua Batista de Carvalho e a avenida Rodrigues. Estaciono o carro e quando ela se aproxima observamos vindo pela calçada um jovem com uma carrinho de mão, caçamba de plástico, armação de madeira, dessas com as abas altas e abarrotada de hortaliças. Era uma espécie de carro alegórico, muito verde nas cores, na contraposição com o alaranjado do plástico do carrinho. E ele descia parando, primeiro no salão de cabeleireiros e depois, junto a minha mana, pois fez questão de comprar cheiro-verde e limão (depois fico sabendo ter sido rúcula).

Se não me engano seu nome é NICANOR (não sendo me corrijam) e em poucos minutos conta sua história. Ele mesmo é um pequeno produtor ali na região de Aymorés, assentamento já legalizado e de gente produzindo há mais de uma década, belas experiências que precisam ser relatadas e multiplicadas. Diz que, no seu pequeno pedaço de chão, planta de tudo, mas o principal são as hortaliças. Tem até estufa e entrega diariamente para dez restaurantes na cidade e como sua produção tem aumentado, coloca o excedente no seu carro, amarra o carrinho na parte superior e escolhe a cada dia um lugar diferente na cidade e sai vendendo. Tudo, segundo ele, de primeira qualidade, sem agrotóxicos. Já conquistou clientela pela cidade afora.

Falo que conheço alguns lá de Aymorés, dentre eles o Zé Maria, o homem do bambu. Ele abre um sorriso e pede para quando o encontrar, perguntar sobre quem é o Nicanor, sua luta e seu trabalho. Percebo naquela manhã e vejo nele um lutador, batalhador, desses que foi à luta e ao seu modo e jeito deu um jeito em sua vida. Conquistou um pedaço de terra, onde planta e mora, tirando dali o seu sustento. Conseguiu ir conquistando espaços, clientes fixos e indo além disto, pois expandiu sua plantão, cobriu boa parte e sai pelas ruas vendendo sua produção. Para comprovar o que me diz abre seu celular e mostra fotos de tudo o que diz. Fico maravilhado e quando o vejo, tão alegre e senhor de si, mostrando com orgulho os seus feitos, eis a prova cabal de que o povo conquistando seu direito pela terra vai dar a volta por cima e provar que o latifúndio é exploração, bem diferente de povo manuseando seus pedaço de chão.

Gente, Nicanor é a comprovação de que terras ociosas deste país precisam, mais e mais, estarem nas mãos dos pequenos produtores. Em primeiro lugar, para promoção de uma ampla reforma agrária ainda insipiente neste país, depois para ver esses todos, hoje famélicos, sem eira nem beira, tendo um lugar que lhe é devido, até pela imensa quantidade de terras ociosas, mal aproveitadas ou de propriedade duvidosa espalhadas país afora. Nicanor conquistou seu espaço e mostrou a que veio, um lutador, um que pegou a terra sem nenhum cultivo e dentro do que pode ir fazendo, aos poucos, chegou a um patamar onde pode ser considerado vitorioso. E o brasileiro precisa vencer, conquistar seu espaço dentro desta nação e todos dar a volta por cima. Não existe outra saída. Inertes e perdidos nada farão, já com algo de concreto nas mãos, a real possibilidade deste país se transformar e ser transformador.

Vendo experiências de sucesso como a dele, confirmo uma só certeza: este país precisa urgentemente ser ocupado, dividido entre os brasileiros e todos juntos, um irmanado no outro, ir galgando os obstáculos, superando os problemas e após alguns anos, poder contar sua própria experiência de sucesso, como me fez Nicanor, numa calçada no centro da cidade. Um verdadeiro ano bom e novo só será possível com essa gente toda num pedaço de chão e trabalhando em algo engrandecedor. Sonho em ver muitos Nicanores vicejando pela aí.

HPA – desejando a tudo, todas e todos dias melhores, com uma justa distribuição de renda.

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