Em New Orleans estávamos com a bauruense Giovana e por duas vezes fomos saborear guloseimas em duas patisseries, ao estilo francês. Muitos pães adocicados e salgados variados. Cai de boca. Numa delas, a mais requintada, preços idem, Ana conversa ao telefone com Lucas Melara, este no Brasil, alguns dias ao lado da mãe. Ambos ouvem Ana Bia louvando os doces com nomes franceses, que não decoro de jeito nenhum. Ela lá na louvação, entro na conversa e digo: "Lá em Arealva tem igual, com denominação brasileira e preço bem mais barato". Ela me fez uma cara de reprovação, do outro lado da linha, Lucas gargalha. Ela me passa o telefone, falo com ele. "Tô aqui gargalhando, eu e minha mãe, com isso de numa padaria de Arealva ter algo como os que comem aí, croque monsieur". Rimos e lhe digo: "E por que não?". Um pão de forma na chapa, muito do bem feito, pode muito bem ser feito em qualquer das nossas padarias.
Escolhi Arealva por acaso e, dependendo de como você pede, creio, fazem até melhor. Dá pra fazer uma discussão acadêmica a respeito, mas no momento, em plena viagem - e longe de Arealva -, continuo a degustar os croque monsier e pagando o que me pedem. Posso até tentar ver se sai algo assim quando por lá voltar. Conheço padarias, muitas delas ao redor de Bauru e uma de Arealva, sei tem pães divinais. O escrito acontece em tom de brincadeira, mas o que levo a sério é isso de pagar caro por um algo aqui fora e quando no Brasil reclamamos do preço de um feito com mais adereços. Lembrei disto na viagem de trem entre Washington e New York, num momento quando a fome bate e, pelo menos, mais uma hora de viagem pela frente.
PROCURANDO NO WEST VILLAGE, A MORADA DE GEORGE STONEY, ANTIGO POUSO DE ANA BIA EM NOVA YORK
O documentarista norte-americano George Stoney, veio ao Brasil pela primeira vez para ministrar curso na PUC Rio e ali, por coincidência do destino, acabou conhecendo a então aluna de Design Ana Bia. Ela de posse de uma câmera cedida por ele, o encaminhou para as favelas cariocas, nascendo daí um intenso relacionamento profissional. Ele, mestre em Vídeo Documentário na NYU - Nova York Universit, acabou por abrigar a então aluna várias vezes em seu pequeno apartamento no bairro novaiorquino de West Village. Entre idas e vindas, ele acabou voltando ao Brasil e ali produziu vários documentários, inclusive um épico com índios amazônicos. Sempre acompanhado pela parceria iniciada lá atrás e desde então, tendo prosseguimento. Isso foi já há algum tempo atrás e hoje, janeiro de 2024, mais de uma década de seu falecimento, Ana me leva ao bairro e tenta se lembrar do lugar onde ele residia.
O bairro é boêmio, abrigando muitos estadudantes da famosa universidade particular e também uma nata de resistentes personagens, até hoje levando uma vida na contramão do modelo dito americano de vida. Circulamos por várias ruas, após nossa chegada hoje do almoço de Washington e isso nos tomou a tarde toda. A rua Waverly é tortuosa e toma rumos esquisitos, sem sequência lógica e só mesmo perguntando para moradores do lugar. Perambular por aquelas ruas, para um interiorano como este HPA é algo como estar em pleno delírio. Vou e quero ir registrando tudo. Ana segue me contando as histórias e só mesmo, perguntando aqui e ali para conseguir se lembrar de algo já distante na mente, mais de 40 anos atrás.
Chegamos lá, fotografamos o local, o número 214, um prédio onde George morava no 5º andar, sem elevador e com calefação ruim. O professor era a dedicação em pessoa para o que fazia, mas nãoestava nem aí para tudo o mais. Quando vinha ao Brasil, vinha com uma mera sacolinha de roupas, as mesmas vistas com ele quando das visitas de Ana aos EUA. Seus filmes, reconhecido por inúmeros cineastas, de Spike Lee a Oliver Stone, ambos alunos dele, assim como Paulo Betti no Brasil. Vivencio isso hoje, circulando com um frio, quase nevando, perambulando e conhecendo também algo do bairro. Revejo numa das ruas, pouco abaixo da Washington Square Park, um loja de LPs e fitas cassetes, talvez a última ainda resistindo em Manhathan.
O lugar é inebriante. Adentramos uma loja da NYU, mas nada encontramos de referência ao antigo mestre. Voltamos para as ruas e só saímos dali quando a noite começa a cair. Na memória desde escriba, cada cantinho fotografado ficará registrado como algo mais de um dos lugares mais interessantes dentro dessa imensa cidade. TAlvez não conseguisse circular sózinho por estes descaminhos, não fosse a ajuda de Ana e a cada dia, eu tendo lá em casa uma caixa com mais de 50 fitas de vídeo deste cineasta, possa um dia começar a passar tudo para uma mídia a resistir a passagem do tempo. Depois deste passeio, me interesso cada vez mais em fazer algo perlo acervo ainda mantido no meu mafuá. Hoje, ao conseguirmos encontrar a casa dele, revivo algo do interesse de Ana por essa história e este rico personagem da vida norte-americana. Não fizemos mais nada no dia de hoje, pois além de nos tomar todo o tempo, as conversas que vieram depois, nos levaram até o final do dia, quando exaustos caímos na cama e, confesso, sonhei com essa bela história.
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