segunda-feira, 17 de outubro de 2022

CARTAS (248)


O ÚLTIMO DESEJOSilvinha foi oposição em Arealva SP, cidade paulista dominada pelo bolsonarismo. Seu filho atende aquilo que seria sua expressa vontade. *
* Este texto foi pensado e idealizado para tentativa de publicação na revista semanal Carta Capital, de onde Lula poderia tomar conhecimento dessa história, assim atendendo pedido do filho de Silvia, assim conheceria algo mais destes que tanto o admiram.

Essa história só foi possível ser aqui contada pelo fato de André Luiz Faquetti Figliolia, 46 anos, no dia do falecimento de sua mãe, Silvia Maria Faquetti, 64 anos, ter saído da pequena Arealva, interior paulista, 26 km de Bauru, decidido a encontrar uma bandeira do PT para cobrir o seu caixão. Desistiu de procurar em Arealva, dirigindo-se até Bauru, onde no Calçadão, rua do comércio central, saiu perguntando por gente do PT. Cruzou com um homem numa bicicleta, quatro bandeiras de plástico ali fixadas e dele recebe a informação: “Algumas quadras abaixo, numa banca, militantes distribuem material de campanha”. Um bolsonarista ouve sua conversa e lhe aconselha: “Cuidado, estão roubando celular ali na frente”. Ele dá de costas para tal conselho, percebe a intenção depreciativa e segue até o local indicado, na denominada Esquina da Resistência, ponto de encontro, convergência de militantes e atos de protesto na cidade.

Diz não saber até agora como o fez. Criou coragem, chega juntos dos militantes e ao se deparar com uma grande estendida na mesa no local pede: “Eu não quero material de campanha, quero uma bandeira, essa aqui”. Quem o atende, por coincidência é o presidente do PT local, Cláudio Lago: “Não serve essas de plástico, pois essa de pano é única e ficaremos sem”. Ele se explica: “Vou te contar, minha mãe acaba de falecer, somos de Arealva, era amava o PT e Lula, morreu de câncer. Quero realizar seu sonho, o de cobrir o caixão com uma bandeira vermelha do PT”. Na sequência, ele e a esposa começam a chorar quando Claudio tira todo o material nela depositado e lhe entrega. Falam pouco mais, outros observam a cena e assim, o casal e seus dois filhos partem.

Arealva, assim como a maioria das cidades do interior paulista, são hoje redutos bolsonaristas. No primeiro turno, a votação no presidente foi de 60,51% e a de Lula 33,12% na cidade, de um total de 1554 votos. Já foi pior, pois em 2018, este índice ultrapassou os 80%. Na última semana antes da eleição, carreata anunciava antecipadamente a participação de mais de 250 veículos com as cores verde-amarelo. Nas empresas da cidade, quase que abertamente, o pedido dos empresários para cravarem o voto em Bolsonaro e o conselho: “Do contrário, perdendo a eleição, quase certo teremos desemprego em massa”. Enfim, este o clima por lá, onde um dia o PT acabou se aliando ao poder local, nas mãos do PSDB e assim, foi praticamente sufocado e contido. Mesmo diante deste quadro, algo resiste, persiste e insiste justamente pela contramão.

Ou melhor, resistia, pois com o falecimento da Silvinha – como era carinhosamente chamada -, no último sábado, 15/10, com ela se foi uma história de quem enfrentou de fato o poder constituído local. Paulistana, militante petista desde a década de 70, mora em Arealva há 30 anos, desde a decisão de mudar de ares, vindo morar junto da mãe e com ela montar uma barraca na prainha do rio Tietê, banhando a cidade e por ali sem poluição. A mãe, também paulistana, porém com seus pais arealvenses, chegou antes, se fixou e acabou convencendo também a filha. O sonho da barraca durou pouco, nem chegando a participar de licitação para oficializar o que até então era sem regulamentação. Com curso de Técnico em Enfermagem, concluído em Bauru, acabou por trabalhar concursada na Prefeitura e depois no Lar dos Vicentinos. O emprego público se foi ainda no estágio probatório, tudo por causa de sua constante militância, intransigente em suas ideias, algo não aceito pelos “donos do poder local”. “Ou se adequa ou será demitida por justa causa”, foi o recado recebido e não acatado.

“Minha mãe sempre foi polêmica, revolucionária no exato sentido dessa palavra. Agitadora e incontida até onde deu. Na cidade, ia aos botequins sozinha, cantava nesses lugares e chocou o puritanismo reinante. Demorou para ser entendida e respeitada, mas conseguiu, porém os empregos se foram, um por um e agora, nos últimos meses, antes da doença agravar, vendia salgados de porta em porta. Sei que, muitos na cidade, não falavam com ela, por causa do PT”, conta André, seu único filho. Ele morou na cidade por 8 anos, dos 32 aos 40, fazendo de tudo um pouco, como a mãe, desde serviços de pedreiro a cuidador de propriedades, mas voltou para a capital, em busca de melhores salários e segundo ele, “ar mais arejado”. Na abertura de sua página no Facebook (https://www.facebook.com/silviamaria.faquetti), para melhor conhece-la, eis como ela mesmo se define: “eu sou um porre, só falo a verdade, brigo pelos meus direitos, sou justa e o que tiver que falar...”.

Por lá permaneceram Silvia e a mãe, Neusa Bombini Bueno Faquetti, 82 anos, zeladora predial na capital paulista e espécie de faz tudo em Arealva. “Minha filha foi uma brava guerreira. Não tinha como pedir para ela ser diferente ou aceitar as coisas como rolavam na cidade. Ela batia de frente, peitava, falava grosso, podia ser com quem fosse, inclusive com o dr Elson (Elson Banuth Barreto, 77 anos, médico e prefeito de muitos mandatos, todos pelo PSDB). Aqui nessa cidade ela lutou muito, contra tudo e contra todos. Querida e odiada, muita fibra, garra e sempre disposta, quase sempre atuando sozinha, pois muitos por aqui se calam, medo do confronto”, conta.

André conta mais do velório e enterro da mãe: “Quando estive em Bauru comprei uma dessas caixinhas de som e coloquei samba no velório. Alguns acharam estranho, se escandalizaram, mas era o que ela gostava, desde Beth Carvalho até Zeca Pagodinho. Ela assim queria, como a bandeira do PT sob o caixão, que permaneceu lacrado, pois não queria que ninguém a visse do jeito como veio a falecer. Na noite de sábado, tirei a bandeira e a levei para casa, com medo de sumir, recolocando sob o caixão no domingo. O diácono católico rezou sem reclamar com ela estendida sob o caixão. Ela é tão petista que, no dia da eleição, disse ao seu médico se não podia ter alta por um dia, pois queria ir votar no seu velhinho. Foi de cortar o coração, mas não podia mais se locomover sozinha”.

Neste clima, assim se foi Silvinha, deixando saudade nos que, como ela, resistem em Arealva, ela abertamente e outros tantos veladamente. Enterro consumado, dona Neusa agora está só na cidade, sem a agitação provocada pela filha e André, voltando para sua residência na capital paulista, com a esposa e os dois filhos, resume tudo em poucas palavras: “Eu queria muito fazer essa história chegar até o Lula, até para encorajá-lo a não desistir nunca, pois ele deixou uma legião por aí, gente igual minha mãe. Estes resistem e assim como ela, sei que outros tantos subiriam nas tamancas ao ver o muro, mais de 20 metros, pintado com aquele ‘Deus, Família, Pátria e Liberdade’, ladeados de duas bandeiras do Brasil na entrada da cidade. O sangue de minha mãe ferve com essas manifestações de explícito conservadorismo. A diferença é que ela gritava, esgrimava contra tudo e todos, mas hoje a maioria se cala”.

outra coisa
NÃO TEM IGUAL, NA PERIFERIA DE BAURU, FORTUNATO ROCHA LIMA, CÓPIAL MAL AJAMBRADA DO PADRE KELMAN É EXPULSO DO BAIRRO E AOS GRITOS: "AQUI É LULA!"
Não brinquem com o Fortunato. Essa gente sabe o que faz. Domingo passado, uma carreata/motociata a favor do capiroto pela cidade e nela, um engraçadinha travestido de padre Kelson, decide ir até o Fortunato importunar a vida de quem lá mora. Eis o vídeo de como se deu o encontro com a comunidade: https://www.facebook.com/henrique.perazzideaquino/posts/pfbid0ND4rawr7tBxvxV6ii8y8mFE4MDRpDM2uuvLcRSH54m5BauJLuaJbSbowREsvmhffl

"É fácil fazer manifestação em bairro nobre rodeado de burguês velho e tiazona oxigenada com camiseta da CBF. Desafio o bauruense bolsonariano a colocar bandeira do Brasil no carro e fazer uma carreata bem devagar lá no Fortunato ou Ferradura Mirim. Tô falando de consciência de classes, madame!", Wagner Fatore.

outra história
EM IARAS QUEREM CASSAR A TITA DO ASSENTAMENTO POR TER PRESTADO ASSISTÊNCIA A FERIDO EM ACIDENTE - O REAL MOTIVO É POR SER DE ESQUERDA E INCOMODAR O PODER LOCAL
Quem não se lembra do que acabou de ocorrer em Curitiba, quando os vereadores se reuniram e resolveram dar o seu jeito de extirpar do seu meio, aquele que remava contra a maré do que era ali decidido. Inventaram um problema, deram sequência e votaram pela expulsão, que pela banalidade e mediocridade da decisão, totalmente sem fundamento, foi revertida pelas instâncias superiores do Judiciário.

Algo muito parecido ocorre hoje em Iaras, interior de São Paulo e uma cidade com um assentamento do MST e grande concentração de ativo movimento social. Uma vereadora, TITA DO ASSENTAMENTO ali atua e incomoda o prefeito, pois constesta seu modus operandi, assim como o de muitos vereadores. Eles necessitavam de um motivo para dar cabo de alguém tão pró-ativa e foi o que fizeram. Juntaram histórias mirabolantes e estão finalizando um processo, todo construído na penumbra da mentira e de acusações sem fundamento. Se aproveitaram dela ter socorrido uma pessoa, prestes a falecer, o que veio a ocorrer depois, quando diante da demora do atendimento, ela mesmo prestou o serviço de primeiros socorros. Foi socorrer o acidentado e lhe acusam de imprudência. Ou seja, buscaram no fundo do baú de malversações e maledicências algo para incutir dolo e assim sacam da vereadora a contestar o status quo da intolerância e do descaso para com os cidadãos desvalidos da cidade de uma localidade.

O caso é este e o PT paulista e outras instituições ligadas aos movimentos sociais já se pronunciaram em solidariedade à Tita. Hoje, neste momento vivido pelo Brasil o que ocorreu em Curitiba e agora se repete em Iaras é a nova cara de como estão a resolver e não mais tolerando a permanência de políticos de esquerda e com comprovada militância nos parlamentos. Simplesmente, buscam um motivo, mesmo tosco e pueril, assim promovendo o serviço sujo. Desta feita é com a Tita, amanhã com outro, depois mais outro, até permanecerem só entre eles, os ditos vetustos cidadãos de bem.

Abaixo o texto da Nota de Solidariedade do PT Estadual:
"Nota de Solidariedade do PT Paulista à vereadora de Iaras SP
A Comissão Executiva do Partido dos Trabalhadores do Estado de São Paulo manifesta toda sua solidariedade à vereadora Tita do Assentamento, da cidade de Iaras, na região de Bauru. A parlamentar petista é alvo de perseguição política.
Tita está sofrendo diversas acusações injustas por exercer sua função parlamentar e de cidadã. Sob o pretexto de falta de decoro, membros da Câmara Municipal estão dispostos a cassar o mandato de nossa companheira.
Mais grave ainda pesar sobre ela a acusação de ter removido um corpo, quando na verdade estava prestando socorro a uma pessoa que estava em risco de morte (e infelizmente veio a óbito), pois o socorro estava demorando a chegar.
O PT do Estado de São Paulo apoia de forma irrestrita a companheira Tita do Assentamento, que tanto nos honra na luta por uma sociedade mais justa e igualitária, buscando melhores condições de vida, principalmente para aquelas pessoas que vivem da terra. Por isso repudiamos completamente as acusações contra ela, bem como estaremos lado a lado na luta pela manutenção de seu mandato.
São Paulo, 11 de outubro de 2022 - Comissão Executiva do Partido dos Trabalhadores do Estado de São Paulo".

OBS deste HPA: Perceberam a similaridade de algo na história da Silvinha de Arealva e na da Tita do Assentamento, de Iaras? A primeira, foi demitida do serviço público por ousar continuar sendo diferente e Tita, está encaminhada para ser cassada por ousar ser uma vereadora cobrando de fato o poder público municipal. Algo assim se repete neste momento por diferentes lugares dentro deste Brasil onde vivemos.

O "L" DE LULAR (15)
Mauro Landolffi é professor da rede pública e nas horas vagas faz o que mais gosta, circula pelas ruas bauruense e registra tudo. 

Isso mesmo, ele e sua câmara fotográfica fazem parte já do cotidiano desta cidade. Acumula fotos com intensidade para pulsar e pensar, provocando belas discussões, desde as acadêmicas, até as de botequins. Está onde os fatos acontecem e na último sábado, esteve também pela Esquina da Resistência, tirando fotos, quando aproveitei de sua presença e fiz, ao meu modo e jeito, o seu ofício, ou seja, o fotografei. 

No momento, claro, o sinal de estar na lida e luta, com Haddad e Lula, enfim, um sujeito antenadíssimo com as transformações que tanto necessitamos. Sigo acompanhando seus registros e aqui nessa galeria está a engrandecer o lado dos que buscam um país mal justo, altaneiro e menos odiento, como o vemos hoje.

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