PÃO E SANGUE - HAIKAIS - DALTON TREVISAN
Esse escritor curitibano sempre fez a minha cabeça. O bom e eterno "Vampiro de Curitiba" está presente no meu mafuá em vários livros. Adoro seus textos curtos e diretos. Possui um poder de escrever tudo com poucas palavras, bem conciso, preciso e perpicaz. É ler e saborear algo indescritível. Nesse livrinho curto, ele tem uns haikais maravilhosos. Escolhi alguns:1. Assustada a velha pula da cadeira, se debruça na cama:
- João. Fale comigo, João.
Geme fundo, abre o olhinho vazio, soluça um palavrão:
- Bruuuxa... Diaaaba...
- Ai, que susto. Graças a Deus.
2. Nhô João, perdido de catarata negra nos dois olhos:
- Me console que, em vez de Nhá Biela, vejo uma nuvem.
- Me console que, em vez de Nhá Biela, vejo uma nuvem.
3. Ao se vestir, escolhe a camisa mais florida.
- Ele não sabe que se enfeita para a morte.
4. Era um home trôpego, calça branca, sem camisa, a faca enterrada no peito e sangrando.
- Aí, o que você fez?
- É coisa minha. Ninguém tem nada com isso.
5. A velhinha meio cega, trêmula e desdentada:
- Assim que ele morra eu começo a viver.
6. No gesto mágico, duas vezes nua. João se contém para, de mão posta, não cair de joelho. Quem vê uma mulher nua já viu todas? Aí se engana, cada uma é todinha diferente. Ah, que bom, aprender tudo outra vez.
7. Reinando com o ventilador, a menina tem a ponta do mindinho amputada. Dias depois, você descobre as três bonecas de castigo, o mesmo dedinho cortado a tesoura.
(extraído do livro "Pão e Sangue", editôra Record RJ, 1988)
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