O PREÇO E O PRAZER DA INDEPENDÊNCIA - Editorial de Carta Capital 204, 28/08/2002
CartaCapital completa um ano como semanal, orgulhosa dos seus leitores e anunciantes
Cartas de leitores chegam em número crescente. Na larga maioria, cartas de dignos cidadãos interessados nos destinos do País e da nação. Bom sinal. Escolho uma, vem a calhar. Escreve Henrique Perazzi de Aquino, de Bauru SP (emailmailto:hpachancelas@ig.com.br)"Todos nós sabemos que os grandes conglomerados de mídia estão em crise econômica (poucos são os que não estão nesses bicudos tempos neoliberais). Imaginem os médios e pequenos conglomerados, entre os quais incluo CartaCapital? O padecimento deve ser maior e mais doloroso, pois não usufrui o beneplácito do poder constituído. Essa é a paga pelo não engajamento na mais antiga profissão do mundo, a prostituição (no caso, a de idéias e não menosprezando aquelas que exercem verdadeiramente esse ofício)". "Escrevo sobre o tema ao verificar o número de páginas de anúncios publicitários das duas últimas edições da revista, nº 202 com 15 páginas de anúncios e a nº 203 com apenas 9 páginas. Não deve estar sendo fácil, porém, nós leitores, podemos oferecer como consolo a satisfação de ler uma revista enxuta, com o melhor texto entre as semanais, independente e não atrelada a nenhum interesse, que não o da verdade."
"Resistir é preciso. Contem conosco e acreditem, os milhares de fiéis leitores estão se propagando. Contem para nós, a quantas anda a tramitação do pedido de empréstimo junto ao BNDES? Queremos muito participar do dia-a-dia da revista que escolhemos para ler em família e indicar para os amigos."
Henrique assina-se amigo, o amigo secreto de quem todo jornalista precisa e que acaba de se revelar. Sim, esta amizade comove, e também oferece a oportunidade de alguns esclarecimentos e considerações. CartaCapital vive em regime de austeridade desde o lançamento, o que talvez explique por que sua editora, não por acaso Confiança, não enfrenta uma crise econômica. A escassez de anúncios aflige a mídia em geral, como não podia deixar de ser em bicudos tempos neoliberais, exacerbados no Brasil pelo desastre do governo FHC. De todo modo, sobrevivemos com um mínimo de honra e um máximo de coragem. A coragem é indispensável. Mesmo porque não faltam as provas de que pagamos pelo não engajamento na mais antiga profissão do mundo (sem menosprezo às profissionais do ofício). Por exemplo. Há alguns meses, a Brasil Telecom, empresa do Grupo Opportunity, propôs a CartaCapital a inserção de volume respeitável de anúncios, por seis meses, com pagamento antecipado mês a mês. Acordo fechado, pagamentos pontuais, não mais que três anúncios, bem abaixo da programação possível. Ficou o crédito para o anunciante. No decorrer do período, Daniel Dantas, big boss do Opportunity, sofreu um revés judiciário em Cayman, ao cabo de caudalosa demanda acompanhada anos a fio por CartaCapital. A qual, como se sabe, fiscaliza o poder onde quer se manifeste, a bem da prática correta do jornalismo.
CartaCapital cumpriu o dever de relatar o último capítulo do entrecho na sua edição nº 194, de 19 de junho passado. Esta semana fomos laconicamente informados de que a Brasil Telecom suspende os pagamentos e rasga o acordo. Faz sentido, da seguinte maneira: o senhor Dantas imaginava poder comprar o nosso silêncio. A conclusão é óbvia, igual a esta: o tycoon verde-amarelo às vezes se engana. Resistir é preciso. Ou melhor, é natural para quem não perde a crença na grandeza do Brasil. Não se espantem com a palavra, disse grandeza e confirmo. CartaCapital sabe que a dimensão e as potencialidades do País transcendem as mazelas do poder contingente, a incompetência e a ferocidade da sua elite, a hipocrisia dos nossos falsos capitalistas e a resignação dos miseráveis. Sabemos, ainda, que nada virá, ao menos por enquanto, do BNDES. A Confiança não confia nos instrumentos do poder e o pedido de empréstimo, anunciado pelo acima assinado na televisão com um discurso enfeitado por expressões em inglês por ele nunca dantes navegadas, e proclamado por idêntica pompa nestas páginas, não passou de um toque irônico. Inócuo, quem sabe. Ingênuo jamais. CartaCapital completa com esta edição um ano de vida como semanal. Com a consciência em paz e o orgulho da amizade dos leitores e anunciantes que seguem a nos prestigiar. Cartas como a de Henrique Perazzi de Aquino são muito mais que consolo.
OBS.: Hoje ao voltar das estradas fiquei a procurar um velho texto sobre os Economistas (amanhã é o dia deles). Revirei esse bagunçado mafuá e nada. No entanto, reencontrei de tudo um pouco. Esse editorial que aqui publico, escrito pelo jornalista MINO CARTA (anos depois, em 2006, o trouxe para Bauru no OLA - Observatório Latino-Americano), após receber uma carta minha sobre o primeiro aniversário da revista como semanal é motivo de um orgulho desmedido de minha parte. Preciso colocar numa moldura e fixar na parede. Escrevo para órgãos de imprensa desde o final dos anos 70, quando comecei a ler o Pasquim. No JC saem cartas minhas desde aqueles anos (eles possuem muita paciência comigo). Na medida do possível irei postando textos antigos, escritos por mim ao longo desses anos. Esse, lá se vão sete anos. Leiam também esse no: http://www.terra.com.br/cartacapital/204/index.htm
6 comentários:
Henrique
Eu também sou leitor de Carta Capital. Diante das demais revistas semanais brasileiras é a única que pode ainda ser lida com certa isenção, as demais são todas tendenciosas. Admiro a luta deles, única também na imprensa brasileira, contra os desmandos do banqueiro criminoso, o Daniel Dantas. No trecho citado por Mino, em carta enviada por ti, percebo uma preocupação com a pequena quantidade de anúncios. Isso persiste, pois na última edição contam com apenas 11 páginas ocupadas. Não sei se continua contando, mas eles continuam mais enxutos que nunca. Na última edição uma matéria das mais interessantes sobre os incógnitas da gripe, em algo que a grande imprensa parece não querer tocar. Leio e divulgo a revista, como ti. Ela é muito boa. Parabéns pela homenagem que o Mino lhe prestou. Acho também que deve emoldurar a página, pois foi algo grandioso.
Orlando P. Cunha
Essa revista não é a que defende o governo Lula de forma intransigente?
E sobre isso nada...
CARO ANÔNIMO
Defendo com unhas e dentes a Carta Capital exatamente por esse motivo, ela não é hipócrita como as demais, que fazem a crítica pela crítica. Quem lê de fato a revista sabe o quanto ela também crítica Lula e o atual Governo, mais não cai no pensamento único a nos dominar de criticar com intuito golpista. A Carta é diferenciada e nos mostra o verdadeiro Brasil. Das demais, Veja, IstoÉ, Época, possuem algo facilmente identificável: fazem o jogo da elite nativa, a mesma que tanto infelicitou esse país quinhentão.
Henrique, direto do mafuá
dia desses vendo uma entrevista na tv preve o idiota do apresentador disse que cancelou a assinatura da revista carta capital porque ela está muito tendenciosa de uns tempo pracá, disse preferir a "isençao" da veja, é mole?
um abraço...
Lázaro Carneiro
Quem poderia ser esse idiota que não consegue enxergar o mal que a VEJA faz ao país, vendo falta de isenção em CARTA CAPITAL. Não sei, mas imagino. Se for esse que imagino, enxerga tudo pelo avesso.
Jornalismo do jeito que ele pratica é imparcial? Me respondam.
Paulo Lima
Henrique
Mino Carta é talvez o jornalista com maior credibilidade no país. Revistas e jornais com a assinatura desse profissional são coisas raras, diante de um mar de mediocridade. Você lê um excelente revista e ser homenageado por ela é algo a ser enaltecido. Parabéns.
do seu amigo de Jaú, Clóvis Cunha
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